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A ORDEM ECONÔMICA EM DISPUTA

CF/88

EACH-USP DANILO SÉRGIO DE SOUZA


16/05/2018 danilosergioborges@gmail.com
ORDEM ECONÔMICA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
1988

Competência para legislar sobre matéria econômica:

Art. 21 - União

Art. 25 - Estado

Art 30 - Municípios e DF
INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA

Intervenção Direta

- Estado como empresário.


- Pode se dar na forma de participação (em concorrência) ou
absorção (monopólio).
- Instrumento: empresa estatal ou de economia mista.

Intervenção Indireta

- Estado enquanto ente político.


- Pode ser por direção (normas impositivas) ou indução (normas
dispositivas/benefícios)
- Instrumento: edição de normas jurídicas.
CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA - ESTRUTURA

Título VII – Da Ordem Econômica e Financeira.

Estrutura:

- Princípios Gerais;

- Política Urbana;

- Política Agrícola e Fundiária;

- Sistema Financeiro Nacional.


FUNDAMENTOS, OBJETIVOS E PRINCÍPIOS

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho


humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados
os seguintes princípios: (…)

Fundamento: trabalho e livre iniciativa (ordem econômica material – Art 1°, IV)

Objetivo: dignidade da pessoa humana (Art 1°, III)

Princípios: soberania nacional; propriedade privada; função social da propriedade; livre


concorrência; defesa do consumidor; defesa do meio ambiente, redução das desigualdades
regionais e sociais; busca do pleno emprego; tratamento favorecido para as empresas de pequeno
porte constituídas sob as leis brasileiras (capital nacional)
A valorização do trabalho humano

- Valor Social (em hermenêutica position matters)

- Possibilita Igualdade de Condições (John Rawls)

- Emprego – aumenta capacidades (Amartya Sen)

- Promove condições de participação política (Movimentos


Sindicais)

- Crítica: Foi elevado ao patamar de elemento único de cidadania (sô


trabalhadô e Richard Sennett – A Corrosão do Caráter)
Livre Iniciativa

- Expressão da vontade humana;

- Vontade de potência, criação, invenção (Nietzsche)

- Destruição Criadora (Schumpeter)

- Criação Destruidora (Luc Ferry)

- Importante conquista para as liberdades individuais: expressão,


religiosa, associação etc.

- Valor Social (Art. 1°, IV) Teoria dos Sentimentos Morais (Smith)
e Sobre Ética e Economia (Sen)
Justiça social

- Teoria das Partidas (John Rawls)

- Teoria do Intervalo Lexical (John Rawls – e.g,. Bolsa Família)

- Rerum Novarum (1891 Leão XIII) – questão operária

- La justice sociale est fondée sur l’égalité des droits pour tous les peuples et la possibilité
pour tous les êtres humains sans discrimination de bénéficier du progrès économique et
social partout dans le monde. Promouvoir la justice sociale ne consiste pas simplement à
augmenter les revenus et à créer des emplois. C’est aussi une question de droits, de dignité et
de liberté d’expression pour les travailleurs et les travailleuses, ainsi que d’autonomie
économique, sociale et politique.(Déclaration de l’OIT sur la justice sociale pour une
mondialisation équitable).
A soberania nacional

- A soberania econômica do Estado significa que o mesmo deve ser


independente perante os demais Estados

- Responsability to Protect (R2P) – Relativização das Soberanias.

- OMC como Tribunal Internacional de Defesa da Soberania


Econômica:

A atuação brasileira, junto a OMC, no Contencioso Embraer-Bombardier,


representou um exemplo de defesa da soberania econômica nacional. Note-
se que, no ano de 1996 ocorreram às primeiras queixas canadenses de que o
PROEX (Programa de Financiamento a Exportações de Aeronaves Civis)
estaria subsidiando a Embraer.
A propriedade privada

- Constitucionalizada desde a Carta de 1824;

- Passa de uma defesa absoluta para uma defesa relativa.

Função Social da Propriedade

Art. 182.
§ 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às
exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no
plano diretor.

§ 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia


e justa indenização em dinheiro.
Função Social da Propriedade

- Largo do Paysandu;

- Pinheirinho;

- Patrimônio da União: Terras de Marinha, Alphaville, Petrópolis


(Enfiteuse)

- Commission Stefano Rodotà: Des assemblées territoriales de


juristes itinérants recueillent de réflexions, destinées à produire un«
Code des biens communs », alliance inédite entre juristes et
mouvements sociaux. (Napoles)
Livre Concorrência.

- CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)

- Controle de Estruturas e Controle de Condutas.

- Caso CADE- BACEN (12.529/2011 x 4.595/64)

- Acordo entre Concorrentes pode ser:


- colusivo
- ganho de eficiência

Parâmetro é a livre iniciativa e o consumidor.

- Hipster Antitrust: Gigantes de tecnologia e efeitos destas


concentrações, Blockchain (R3 Consortium)
A defesa do consumidor

- Debate em torno do tema Hipster antitrust é se o Direito da


Concorrência deve defender a livre iniciativa e as inovações e
emprego derivadas desta ou o consumidor de preços e práticas
abusivas.

- Importância enquanto status de cidadania;

- Crítica dos teóricos da sociedade do consumo (Baudrillard).

- Lei nº 8.078/90 (Lei de Defesa do Consumidor)


A defesa do meio ambiente

- Direito de 3° Geração – Solidariedade e Fraternidade às futuras


Gerações;

- Exploração consciente;

A redução das desigualdades regionais e sociais

- Solidariedade Federativa

- Novo Pacto Federativo (metáfora do Suplicy)


Busca do Pleno Emprego

- Criação da Secretaria de Controle de Empresas Estatais (SEST) pelo


Decreto n° 84.128, de 29 de outubro de 1979.

- PEC 241/55

- Em 1943, o economista polonês Michael Kalecki advertia que nenhum governo manteria o pleno emprego
se soubesse como fazê-lo, devido à desconfiança dos grandes empresários em relação à manutenção do pleno
emprego por meio do gasto governamental.

Para Kalecki, seriam três os motivos desta oposição. Em primeiro lugar, haveria a reprovação à
interferência governamental na questão do emprego. Em segundo lugar, haveria a reprovação à utilização
dos gastos governamentais para o investimento público e o subsídio ao consumo, com a crença dos
empresários no risco de nacionalização de setores entregues à iniciativa privada33. Finalmente, a objeção
mais importante à manutenção do pleno emprego por meio do gasto governamental derivaria da reprovação
pelo empresariado das mudanças sociais e políticas advindas da manutenção do pleno emprego. Afinal, sob
um regime de pleno emprego, o despedimento dos empregados deixaria de exercer sua função disciplinar (a
“disciplina da fábrica”), minando a posição social dos empresários. (Thomas Pikety)
O tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital
nacional de pequeno porte

- Conteúdo Nacional;

- Pequeno Empresário é a base da economia;

- Potencial de Inovação.

- Inovação como vantagem competitiva.


Modelos político-econômicos.

Modelo Liberal - A proposta da nascente teoria é que todos podem alcançar o mais alto
nível de prosperidade de acordo com seu potencial, aplicando seus valores, atividades e
conhecimentos, com o maior grau de liberdade possível, em uma sociedade que reduza
ao mínimo os inevitáveis conflitos sociais

Modelo Keynesiano - Defesa da intervenção estatal na economia, protecionismo


econômico, contra o liberalismo econômico, Defesa de medidas econômicas estatais que
visem à garantia do pleno emprego. Este seria alcançado com o equilíbrio entre demanda
e capacidade de produção.
Modelos
político-econômicos.

Por fim, o Estado tem um papel


fundamental de estimular as
economias. (Captalisme
Cognitive, Marianna Mazzucato).
Link: TED Talking.
https://www.ted.com/talks/mariana_m
azzucato_government_investor_risk_t
aker_innovator?language=pt-br#t-423
934
Função Alocativa:
Estado deve prover a sociedade dos bens e serviços que não interessam à iniciativa
privada ou não seriam suportados por ela, ou são previstos como serviços essenciais por
constituição ou lei (defesa nacional, justiça, segurança etc)

Função Distributiva:
deriva do Estado de Bem-Estar Social, voltados para realização dos direitos de segunda
geração (direitos sociais : previdência, saúde, assistência social, pleno emprego), para
tanto se vale da tributação progressiva para custear a “solidariedade”, política de
distribuição de renda. (Lei Elói Chaves, 1929 – Caixa de Previdência Social).
l’IFI de Macron. L’Impôt Sur La Fortune Immobilière.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do
Brasil. 3ª ed. São Paulo: Global Editora, 2015.

O grande desafio que o Brasil enfrenta é alcançar a necessária lucidez para concatenar
essas energias e orientá-las politicamente, com clara consciência dos riscos de
retrocessos e das possibilidades de liberação que elas ensejam.

O povo brasileiro pagou, historicamente, um preço terrivelmente alto em lutas das


mais cruentas de que se tem registro na história, sem conseguir sair, através delas, da
situação de dependência e opressão em que vive e peleja.

Nessas lutas, índios foram dizimados e negros foram chacinados aos milhões, sempre
vencidos e integrados nos plantéis de escravos.
O povo inteiro, de vastas regiões, às centenas de milhares, foi também sangrado em
contrarrevoluções sem conseguir jamais, senão episodicamente, conquistar o comando
de seu destino para orientar o curso da história.

Ao contrário do que alega a historiografia oficial, nunca faltou aqui, até excedeu, o
apelo à violência pela classe dominante como arma fundamental da construção da
história.

O que faltou, sempre, foi espaço para movimentos sociais capazes de promover sua
reversão.
Faltou sempre, e falta ainda, clamorosamente, uma clara compreensão da história
vivida, como necessária nas circunstâncias em que ocorreu, e um claro projeto
alternativo de ordenação social, lucidamente formulado, que seja apoiado e adotado
como seu pelas grandes maiorias.

Não é impensável que a reordenação social se faça sem convulsão social, por via de
um reformismo democrático.

Mas ela é muitíssimo improvável neste país em que uns poucos milhares de grandes
proprietários podem açambarcar a maior parte de seu território, compelindo milhões
de trabalhadores a se urbanizarem para viver a vida famélica das favelas, por forma
da manutenção de umas velhas leis.
Não foi assim. Desencadeou-se sobre mim o vendaval da vida. Um câncer me comia um pulmão inteiro
e tive de retirá-lo. Para tanto, retornei ao Brasil, reativando as candentes luzes políticas que dormiam
em mim nos anos de exílio. Tudo isso e, mais que tudo, uma compulsiva pulsão romanesca que me
deu, irresistível, assim que me soube mortal e que, desde então, me escraviza, afastando-me da tarefa
que me propunha.

Agora, uma nova pulsão, mortal, reaviva a necessidade de publicar este livro que, além de um texto
antropológico explicativo, é, e quer ser, um gesto meu na nova luta por um Brasil decente.

Portanto, não se iluda comigo, leitor. Além de antropólogo, sou um homem de fé e de partido. Faço
política e faço ciência movido por razões éticas e por um fundo patriotismo. Não procure, aqui,
análises isentas. Este é um livro que quer ser participante, que aspira a influir sobre as pessoas, que
aspira a ajudar o Brasil a encontrar-se a si mesmo.
TODOROV, Tzvetan. Os inimigos íntimos da democracia. São
Paulo: Companhia das Letras, 2012

Na obra, o autor rechaça toda hermética sistematicidade e aridez argumentativa.

Todorov percorre por sete capítulos os elementos econômicos e sociais que


enfraquecem a democracia a ponto de afirmar que havia mais democracia na Grécia
antiga do que nos dias atuais.
Nas entrelinhas de seu texto, pode-se depreender um senso republicano da vida: a
democracia é capaz, através do equilíbrio de seus vários elementos constitutivos
(poder do povo, fé no progresso, liberdades individuais, economia de mercado,
direitos naturais, sacralização do humano), tornar a vida um pouco mais hospitaleira à
humanidade dos homens: indivíduo e sociedade não se tornam polos dicotômicos,
mas sim braços de um mesmo rio.
A partir de meados da década de 70, o regime ditatorial militar, que vigorou no Brasil
durante vinte anos, começou a explicitar sinais de esgotamento, em um processo que
culminou com a realização da Assembleia Nacional Constituinte nos anos de 1987 e
1988 e resultou na atual Constituição Federal.

Este esgotamento era exatamente de uma política repressiva fundada no milagre


econômico.

Concentração econômica.
Que legitimidade democrática teria um texto constitucional tecnicamente perfeito,
contendo apenas normas consideradas, por especialistas, como essenciais, se não
refletisse a complexidade dos conflitos existentes na sociedade, o que só se tornou
possível mediante a ampla participação social em seu processo de elaboração?

Esse questionamento é feito por Walder de Góes, em artigo publicado no período de


realização da Assembleia Nacional Constituinte:
“A crítica à Constituinte diz que seus integrantes não sabem distinguir entre lei
constitucional e lei ordinária e, ainda, que produziram um anteprojeto detalhista e
contraditório. Ainda bem. Caso não estivéssemos tendo a confusão conceitual, as
contradições e o detalhismo, o debate estaria sendo pobre. O processo constituinte
está envolvendo e apaixonando uma grande massa de brasileiros justamente por
aquelas razões. Se, em vez do que está ocorrendo, duas dezenas de sábios houvessem
envolvido a Constituinte, fazendo-a aprovar rapidamente um texto enxuto e coerente,
que debate teríamos? A Constituição iria refletir um consenso restrito, uma
coerência também restrita e seria ilegítima”. (Diário da Assembléia Nacional
Constituinte, 27/07/1987, pp. 3.633/3.634)
Observação semelhante consta de pronunciamento do constituinte Octávio Elísio
(PMDB-MG) durante os debates na ANC:

“Temos consciência de que não basta um bom texto, com belos enunciados de
princípios, uma Carta Constitucional perfeitamente articulada segundo as exigências
do Direito Constitucional. É fundamental seu conteúdo, e tão importante quanto seu
conteúdo é o processo político no qual o povo se fez participante ativo”. (Diário da
Assembléia Nacional Constituinte, 13 de agosto de 1987, p. 4.315)
LASSALLE, Ferdinand. Que é uma Constituição?. Tradução de
Manoel Soares. São Paulo: Global Editores, 1987.

Ferdinand Lassalle entendia como boa e duradoura a Constituição escrita que


correspondesse à Constituição real e tivesse suas raízes nos fatores do poder que
regiam o país.

Segundo o autor:

“Onde a Constituição escrita não corresponder à real, surge inevitavelmente um


conflito que não é possível evitar e, mais dia menos dia, a Constituição escrita, a folha
de papel, sucumbirá, forçosamente perante a Constituição real, a das autênticas
forças vitais do país (sejam estas de oprimidos ou opressores)” (p. 56).
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico - 3ª
Ed, 2011. Editora Método.
É preciso reconhecer que a economia apresenta uma conotação política indelével. A
inversão dos termos também parece ser verdadeira, pois a política parece sempre realizar
uma leitura (não exclusiva) econômica de suas opções e encaminhamentos. Não se
desconhece, como anota Dalla Via (1974: 50), o “evidente protagonismo que tiene la
economia em el campo político”. Ademais, como pondera Oscar Dias Corrêa, “[v]erdade
é que política e economia se condicionam” (1994: 26).

Consoante lição precisa e valiosa de Bernard Chénot (apud Corrêa, 1994: 27): “a
realidade hoje é tal que não é possível estudar os problemas econômicos sem analisar
a organização do Estado, nem compreender e apreciar a estrutura e o funcionamento
dos órgãos deste sem se debruçar sobre os problemas econômicos”.
É neste sentido que alguns autores empregam a expressão “economia política” ou
“política econômica”. Utilizando esta última terminologia, Vincenzo Tosi (1935: 187)
considera-a como “l’azione dello Stato e degli Enti politici minori (Provinci Comuni)
nel campo economico, sia che si esplichi con iniziative dirette, sia che si manifesti
mediante una própria ingerenza sull’attività privata”.

Economia política, pois, seria a expressão da atividade do Estado no campo


econômico. Toda a ação do Estado, ainda que seja denominada classicamente ou
popularmente como política, deve-se encontrar definida e orientada por normas
jurídicas, podendo-se falar, quando da atuação econômica do Estado, de uma política
econômica. Seria a economia pública, como lembra ainda, Vincenzo Tosi (1935: 21).
Anota Vital Moreira (1974: 9) que “desenvolver o conceito de constituição
econômica implica necessariamente a consideração da constituição econômica de
um determinado sistema social”.

Norbert Reich (1985: 68-72) elenca quatro possíveis abordagens acerca da expressão
em análise, cada qual constituindo um núcleo de posicionamento completamente
diverso dos demais.
Norbert Reich – Mercado y Derecho. (1985)

1° - O específico sistema econômico em concreto adotado, independentemente de uma


consagração constitucional expressa.

2° - O conjunto de preceitos constitucionais que buscam nortear a intervenção do


Estado para uma determinada direção e para a prestação de determinadas funções.

3° - Seria o conjunto de instrumentos que a Constituição defere ao Estado para levar a


termo a intervenção na economia.

4° - Seria a Constituição econômica não apenas a previsão daqueles instrumentos


propensos à intervenção, mas igualmente a contemplação dos limites da intervenção
estatal.
Sabino Cassese: 3 sentidos de “Constituição econômica.

Primeiro: consoante o autor, poderia ser considerada como fórmula que agrupa as
normas da Constituição em sentido formal que disciplinam as relações econômicas e,
ainda, normas que, apesar de estarem em leis, seriam de relevância constitucional.

Segundo: apoiado nas lições de Albert Venn Dicey, Cassese considera “non solo
analisi delle norme costituzionali e delle leggi, ma anche analisi dei mutamenti
dell’opinione pubblica”.

Terceiro: sentido admitido pelo autor, ter-se-ia a Constituição econômica “non


abraccia soltanto le norme costituzionali (primo significato), le leggi e l’opinione
pubblica (secondo significato), na anche um cerchio più ampio, il “diritto vivente”.
Para Böhm a Constituição econômica consistiria na “decisão global”, consciente e
sistemática, “sobre a espécie e a forma do processo de cooperação econômico-social”
(apud Moreira, 1974: 18).

“De outro modo, a CE designaria apenas a decisão, constante de uma ordem normativa,
por uma situação desejada” (Moreira, 1974: 28-29).

Para Vital Moreira, a Constituição econômica não é uma “seção geográfica autônoma”
das constituições (políticas), devendo aquela se autonomizar em relação a esta
concepção, sem, entretanto, isolar-se dela.
Consoante José Afonso da Silva (1999: 765), a Constituição econômica deve ser
compreendida “como a parte da Constituição que interpreta o sistema econômico,
ou seja: que dá forma ao sistema econômico”.

Vital Moreira (1974: 5) apresenta a seguinte definição: “A constituição econômica” é,


pois, o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos
definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma
de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma
determinada ordem econômica.
Autores defendem que a Constituição formal e econômica são dicotômicas por dois
motivos:
(i) o processo legislativo ter sido um “Frankstein social”, e a CF ser um retalho de
aspirações e esperanças, (ii) pelo caráter especial do tema.

Porém erram em ambos, pois (i) ainda que tenha sido um retalho, uma vez fechada é
imperativo que uma hermenêutica constitucional seja integrativa e coesa – assim a
solidariedade do art. 1º tem que ser coerente com a função social da propriedade no art.
170 (existência digna, justiça social, III-função social da propriedade, II-livre iniciativa
(valor social)) –, (ii) este econômico não foge do tecido social e político da CF/88.
Pode-se considerar a Constituição econômica formal como a parcela da Constituição
que abriga e interpreta o sistema econômico (material), ou seja, que confere forma ao
sistema econômico (no caso brasileiro, em sua essência, capitalista).

A Constituição econômica formal brasileira consubstancia-se na parte da


Constituição Federal que contém os direitos que legitimam a atuação dos sujeitos
econômicos, o conteúdo e limites desses direitos e a responsabilidade que são
inerentes ao exercício da atividade econômica no país.

Consoante Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1990: 8), o Direito constitucional


econômico “há de voltar-se para o controle do poder econômico. Ou seja, do poder
que decorre da riqueza, seja esta privada, seja pública”.
Dessa maneira, como bem enfatiza Dalla Via, tem-se um Direito constitucional
econômico em relação ao Direito constitucional, “dentro del cual se identifica por
razones de especialización pero no de método” (1999: 52).

Não há diferença de método entre a análise do Direito Constitucional Econômico e do


Direito Constitucional.

Metodologia sistêmica.
Dentre os principais temas a serem enfrentados, encontram-se:
- A questão do direito de propriedade (especialmente dos meios de produção);

- Da liberdade em geral (especialmente a empresarial), na busca de definição de seus


contornos.
Conceito de ordem econômica.

Mas não é possível ignorar completamente a realidade socioeconômica do país e partir


para uma análise enclausurada no âmbito normativo-abstrato.

Lembremos, neste passo, da crítica pertinente que fez João Mangabeira (1934: 225):
“Substituiu-se o direito que se ia formando, ao impulso da vida e pela forma das
necessidades econômicas, por uma escolástica jurídica, segundo a qual a substância, a
realidade é o conceito abstrato, e do direito consiste mais na aplicação complicada e
sutil desses entes de razão do que no reconhecimento de fatos, usos e costumes
peculiares a cada povo e a cada civilização”.
A expressão designa uma parcela da ordem jurídica, conforme aponta Eros Grau (1997:
41): “Ainda que se oponha à ordem jurídica a ordem econômica, a última expressão é
usada para referir parcela da ordem jurídica. Esta, estão – tomara como sistema de
princípios e regras jurídicas –, compreenderia uma ordem pública, uma ordem privada,
uma ordem econômica, uma ordem social”.
A ordem econômica constitucional seria o conjunto de normas que realizam uma
determinada ordem econômica no sentido concreto, dispondo acerca da forma
econômica adotada. “Designando o conjunto de normas e instituições jurídicas
que têm por objeto as relações econômicas, ela abrange necessariamente planos
jurídicos distintos (direito público, direito privado) e ramos jurídicos diversos
(direito comercial, direito civil, direito do trabalho, direito administrativo etc.)”
(Moreira, 1974: 58).
Poder-se-ia, a partir da concepção mencionada, vislumbrar – como reconhece o próprio
Vital Moreira – que a Constituição econômica surja a partir da ordem econômica, ou
seja, que esta constituiria e legitimaria aquela.

Isso, contudo, deve ser afastado de imediato, porque implicaria em subverter a


verdadeira relação que já entre ambas: é a Constituição econômica que constitui a
ordem econômica – assim como ocorre entre a Constituição em geral e a ordem
jurídica em geral.

Não há novidade aqui: é a Constituição a norma máxima, que determina, delimita e


legitima o restante do ordenamento.
Será?

Pois na medida em que ela foi escrita já existia uma realidade econômica consolidada e
que se expressou naquele caldo, no retalho social de construiu a CF/88.

Podendo esta realidade econômica ter sido imposta ou pactuado de modo democrático
e histórico.

Neste sentido é que ela é dirigente, para corrigir distorções no horizonte do dever-ser
(devir constitucional – reforma agrária, função social da propriedade, dignidade, bem-
estar dos habitantes das cidades, etc).
Crítica ao modelo Liberal.

O Estado Liberal, segundo, dentre outros, o professor Fábio Comparato, é estático,


conservador, cuja única tarefa é a de “government by law”, isto é, produzir direito, por
meio da edição de leis.

Os mecanismos de Feios e contrapesos, além de impedirem o Estado de fazer o mal,


isto é, ameaçar as liberdades e garantias individuais, também o impedem de
empreender políticas ou programas de ação a longo prazo, revelando, assim, a
inadequação estrutural dos poderes públicos nesse tipo de Estado.
A Constituição de 1988 é uma constituição dirigente, pois define, por meio das
chamadas normas constitucionais programáticas, fins e programas de ação futura
no sentido de melhoria das condições sociais e econômicas da população.

Conforme assinalou Paulo Bonavides, a partir da Constituição de 1988, o Estado


passou não apenas a conceder, mas a fornecer os meios de garantir e efetivar os direitos
sociais (entre outros, mandado de segurança coletivo, mandado de injunção e
inconstitucionalidade por omissão).
A função do Direito num Estado de Direito moderno não é apenas negativa ou
defensiva, mas positiva: deve assegurar, positivamente, o desenvolvimento da
personalidade, intervindo na vida social, econômica e cultural. O Estado de Direito
atual não se concebe mais como anti-estatal.

O arbítrio dos poderes públicos é evitado mediante a reserva da lei e do princípio


democrático, característicos do Estado de Direito. A busca de melhorias sociais e
econômicas dá-se sem o sacrifício das garantias jurídico-formais do Estado de Direito.

Afinal, a liberdade é inconcebível sem a solidariedade, e a igualdade e progresso


socioeconômicos devem fundar-se no respeito à legalidade democrática.
Com o Estado Social, o “government by policies” substitui o “government by law” do
liberalismo.

A base do Estado Social é a igualdade na liberdade e a garantia do exercício dessa


liberdade. O Estado não se limita mais a promover a igualdade formal, a igualdade
jurídica. A igualdade procurada é a igualdade material, não mais perante a lei, mas por
meio da lei. A igualdade não limita a liberdade. O que o Estado garante é a igualdade
de oportunidades, o que implica a liberdade, justificando a intervenção estatal.

As leis constitucionais só servem, no Estado Liberal, então, para garantir o status quo.
Deve-se deixar claro que o Estado não é único opressor, assim como nem sempre o
Estado-mínimo é isento de interesses. Não há vazio de poder.

Tradicionalmente, essa fundamentação material é dada essencialmente pelos direitos


fundamentais. A fundamentação pode limitar-se a princípios, denominados por
Canotilho princípios materiais estruturantes (Estado de Direito, Democracia,
República), ou estender-se à imposição de tarefas e programas que os poderes públicos
devem concretizar.
Se o Estado constitucional democrático não se identifica apenas como Estado de
Direito formal e quer legitimar-se como Estado Social, surge o problema da
Constituição dirigente, que passa pela questão da legitimação além dos limites formais
do Estado de Direito, baseando-se também na transformação social, na distribuição
de renda e na direção pública do processo econômico. A Constituição deixa de ser
apenas do Estado, para ser também da sociedade.

(exemplo: bolsa família por meio de lei, programa do Estado e não de governo; outros
direitos também).
Hoje, abandona-se o ordenamento majoritariamente repressivo e afirmam-se novas
funções do Direito, de condição e incentivo do processo social.

A Constituição enquanto lei fundamental tende a refletir a interdependência do


Estado e da sociedade (ela é estatal e social).

A amplitude e a indeterminação do texto constitucional não supõe, segundo Konrad


Hesse, a incapacidade da Constituição para regular a vida do Estado e da sociedade.
As constituições dirigente, como a nossa de 1988, vêm sendo duramente criticadas nos
últimos tempos.

Em 1982, Canotilho já tratava do tema:


“A ‘desconstitucionalização’ de matérias em nome de uma desestadualização’ e
‘desregulamentação’ mostra as consequências a que uma apressada crítica contra a
juridicização conduz: aquela – a desestadualização – propõe a substituição da
normatividade constitucional pela ‘economização da política’ e da vinculação jurídica
do sistema político pelas ‘leis econômicas’; esta – a desregulamentação – pede a
minimização da vinculação jurídica dos fins políticos para tormar mais claudicante o
estatuto político social já alcançado (direitos dos trabalhadores, medidas sociais,
garantias de qualidade de vida).
A Constituição dirigente não estabelece uma linha única de atuação para a política,
reduzindo a direção política à execução dos preceitos constitucionais, ou seja substitui
a política. Pelo contrário, ela procura, antes de mais nada, estabelecer um fundamento
constitucional para a política, que deve mover-se no âmbito do programa
constitucional. Dessa forma, a Constituição dirigente não substitui a política, mas se
torna a sua premissa material.

A definição dos fins do Estado não pode nem deve derivar da vontade política
conjuntural dos governos. Os fins políticos supremos e as tarefas do Estado encontram-
se normalizados na Constituição.
José Joaquim Gomes Canotilho, em sua última obra “Direito Constitucional e
Teoria da Constituição”, afirma que:

o problema fundamental da constituição na atualidade é o de saber ponderar as


medidas liberais e estatais que devem informar o texto constitucional para que a
Constituição continue sendo o documento fundamental da res publica sem se converter
em instrumento totalizador com concepções unidimensionais do Estado e da sociedade.
Ele afirma, também, que os textos constitucionais de cunho dirigente (como a
Constituição portuguesa de 1976 e a brasileira de 1988) perderam a capacidade de
absorver as mudanças e inovações da sociedade, não podendo mais integrar o todo
social, tendendo a exercer uma função meramente supervisora da sociedade, não mais
diretiva.

As constituições dirigentes padeceriam de uma “crise de reflexividade”, ou seja, não


mais conseguiriam gerar um conjunto unitário de respostas, dotado de racionalidade e
coerência, às cada vez mais complexas demandas e exigências da sociedade.
O ordenamento jurídico passaria a ser um ordenamento de coordenação, viabilizando a
autonomia dos sistemas para maximizar sua racionalidade interna.

Embora não possa impor soluções para os sistemas, o ordenamento jurídico levaria
esses sistemas, com base nos princípios da “responsabilidade social” e da “consciência
global”, a uma reflexão sobre os efeitos sociais de suas decisões e atuação, induzindo-
os a não ultrapassar situações limite em que todos perderiam.
Esse modelo do direito reflexivo não está livre de críticas.

Destacaremos apenas uma, que diz respeito ao fato de que, para funcionar sem grandes
traumas, a sociedade depende do acatamento pelos vários sistemas de princípios da
“responsabilidade social” e “consciência global”. Ou seja, critica-se a “utópica”
pretensão do Estado e da Constituição de quererem regular a vida social mediante um
programa de tarefas e objetivos a serem concretizados de acordo comas determinações
constitucionais e, em seu lugar, propõe-se, não menos utopicamente, na nossa opinião,
que os vários sistemas agirão coordenados pela ideia de “responsabilidade social”.

Princípio responsabilidade. Hans Jonas.


Ao invés de propor a concretização constitucional Canotilho limitou-se a substituir a
inefetividade das políticas estatais previstas nas chamadas constituições dirigentes pela
responsabilização da sociedade civil pela implementação dessas mesmas políticas.

Brasil - B3 Índice de Sustentabilidade Empresarial – Privado - Voluntário.

França – Loi Fabius, L’Article 116 NRE, Grenelle I e II, TEEC.


Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a Constituição de 1988 agravou a
governabilidade brasileira ao sobrecarregar o Estado de tarefas, sem providenciar
os recursos para as mesmas, ou seja, preocupou-se com a distribuição de riquezas,
não com a produção delas.

Critica da esquerda ao modelo de crescimento dos governos Lula, fundado no


consumo como standard de cidadania.

O principal diz respeito à relativização dos direitos privados pela sua função social. O
bem-estar coletivo deixa de ser responsabilidade exclusiva do Estado e da sociedade,
para conformar também o indivíduo.
A autonomia privada deixou de ser um valor em si. Os atos de autonomia privada,
possuidores de fundamentos diversos, devem encontrar seu denominador comum na
necessidade de serem dirigidos à realização de interesses e funções socialmente úteis.

(Teoria da imprevisão que protege o hipossuficiente, vedação do abuso de direito,


breach of the contract theory)
PERLINGIERI, Pietro. Manuale di diritto civile. Editore: Edizioni Scientifiche
Italiane, 2017.

“A ausência de atuação da função social, portanto, faz com que falte a razão da
garantia e do reconhecimento do direito de propriedade”.

Em última análise a função social obedece à lógica utilitarista, pois exige a


maior felicidade ao maior número de pessoas pela otimização dos bens.

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