Você está na página 1de 63

Psicologia Social

Contemporânea

Psicologia Social das


Organizações
Profa. Luciana Martins
Relativo
Relativoaaalma,
alma,
psyché,
psyché,psíquico.
1. A Psicologia Social como
psíquico.
Da anima
Da anima
(Aristóteles),
(Aristóteles),oo
primeiro
primeiroTratado
campo de conhecimento
Tratado
em
emPsicologia
Psicologia

“Na vida anímica individual aparece


integrado sempre, efetivamente, “o
outro”, como modelo, objeto, auxiliar ou
adversário, e, deste modo, a Psicologia
Individual é ao mesmo tempo e desde
um princípio Psicologia Social, em um
sentido amplo e plenamente justificado”
(Sigmund FREUD).
 É possível uma Psicologia que não seja
uma Psicologia Social já que não tem
sentido conceber um indivíduo isolado
de seu contexto social?
“Toda Psicologia é Social. Esta afirmação
não significa reduzir as áreas específicas da
Psicologia à Psicologia Social, mas sim
cada um assumir dentro de sua
especificidade a natureza histórico-social do
ser humano. Desde o desenvolvimento
infantil até as patologias e as técnicas de
intervenção, características do psicólogo,
devem ser analisadas criticamente à luz
dessa concepção do ser humano - é a
clareza de que não se pode conhecer
qualquer comportamento humano, isolando-
o ou fragmentando-o, como existisse em si
e por si.
Também, com esta afirmativa não negamos
a especificidade da psicologia Social – ela
continua tendo por objetivo conhecer o
indivíduo no conjunto de suas relações
sociais, tanto naquilo que lhe é específico
como naquilo em que ele é manifestação
grupal e social. Porém, agora a Psicologia
Social Poderá responder à questão de como
o homem é sujeito da história e
transformador de sua própria vida e da sua
sociedade, assim como qualquer outra área
da Psicologia” (Silvia LANE).
1.1 Concepção de ser humano como
produto histórico-social
 Rompimento das dicotomias:
indivíduo x sociedade – subjetividade
x objetividade
 Objetivo último: realidade concreta,
construída historicamente, que
permitirá conhecer o ser humano em
sua totalidade
 Objeto: a relação dialética unívoca
entre objetividade e subjetividade na
constituição do psiquismo humano.
“Quase nenhuma ação humana tem por
sujeito um indivíduo isolado. O sujeito
da ação é um grupo, um ‘Nós’, mesmo
se a estrutura atual da sociedade, pelo
fenômeno da reificação, tende a
encobrir esse ‘Nós’ e a transformá-lo
numa soma de várias individualidades
distintas e fechadas umas às outras”
(GOLDMAN, 1947 apud LANE, 1993, p.
10).
“ [...] o homem fala, pensa, aprende e
ensina, transforma a natureza. O
homem é cultura, é história. Este
homem, que vai além do seu aspecto
biológico, não sobrevive por si e nem é
uma espécie que se reproduz tal e qual,
com variações decorrentes de clima,
alimentação, etc. O seu organismo é
uma infra-estrutura que permite o
desenvolvimento de uma superestrutura
que é social e, portanto, histórica”
(LANE, 1993, p. 12).
“O ser humano traz consigo uma
dimensão que não pode ser
descartada, que é a sua condição
social e histórica, sob o risco de termos
uma visão distorcida (ideológica) de
seu comportamento. [...]. Portanto,
caberia à Psicologia Social recuperar o
indivíduo na interseção de sua história
com a história de sua sociedade -
apenas este conhecimento nos
permitiria compreender o homem
enquanto produtor da história (Ibid., p.
12-13).
 Palavra de ordem: transformação
social.

 Materialismo histórico-dialético 
Psicologia Marxista  perspectiva
rompe de vez com a P.S. cientificista
2. Indivíduo-Sociedade: a relação
fundante da Psicologia Social
 A Psicologia Social é compreendida
como o estudo dos fenômenos sociais
na sua dimensão subjetiva.
 Interessa compreender os fenômenos
sociais a partir da análise da
subjetividade que vai sendo constituída
ou modificada no decorrer da atuação e
inserção social, constituindo, ao mesmo
tempo os fenômenos (BOCK;
GONÇALVES, 2003).
 O que somos, a forma como nos
apresentamos, o modo como estamos
constituídos tem qual relação com as
formas de organização, de produção e
de relações mantidas na sociedade, na
qual estamos inseridos? (Ibid.)
 A perspectiva sócio-histórica da
Psicologia Social:

Compreende e concebe o homem como


um ser constituído nas relações
sociais e nas atividades que
desenvolve, coletivamente, para
produzir sua sobrevivência e de seu
grupo social.
“O ser humano traz consigo uma
dimensão que não pode ser
descartada, que é a sua condição
social e histórica, sob o risco de termos
uma visão distorcida (ideológica) de seu
comportamento” (LANE 1993, p. 12).
 É necessário captar a mediação
ideológica na dinâmica social,
considerando a sociedade como
produto histórico-dialético (relações
entre os homens e instituições sociais),
a fim de não reproduzi-la como fato
inerente à “natureza” do homem (LANE,
1993).
 Toda Psicologia é social!

Toda Psicologia, ao tratar do indivíduo,


de alguma forma, considera suas
relações com a sociedade.
Indivíduo x Sociedade: uma falsa
dicotomia:

 Não há, basicamente, uma


contradição entre indivíduo e
sociedade. O indivíduo é um ser
histórico-cultural que é constituído
pelas inter-relações sociais (BONIN,
2001, p. 60).
 O homem não sobrevive a não ser
em relação com outros homens.
Desde o seu nascimento, até mesmo
antes, o homem está inserido num
grupo social.
 Robson Cruzoé:
Quando o homem está sozinho, como
Robson Crusoé, é um ser humano que
tem o habitus próprio de sua sociedade
de origem, na qual se constituiu 
expresso através do jeito de andar, de
externar emoções, de usar
instrumentos que adquiriu nas relações
e vivências anteriores.
“O homem é um ser social por natureza.
Entende-se aqui que cada indivíduo
aprende a ser um homem nas relações
com os outros homens, quando se
apropria da realidade criada pelas
gerações anteriores, apropriação que
se dá pelo manuseio dos instrumentos
e pelo aprendizado da cultura humana”
(BOCK et al., 1999, p. 142).
 A questão do individualismo:
Individualismo bastante acirrado na
sociedade ocidental  muitos conflitos
próprios do momento histórico, devido à
dinâmica da história e do homem
 Os homens podem vir a se
representarem como seres isolados em
oposição à sociedade.
 A tessitura de redes na dinâmica
social:

No processo de construção humana,


o indivíduo sofre influência e, ao
mesmo tempo, influencia o mundo
em que vive, traçando as redes que
compõem a sociedade - ainda que
esta passe por tais transformações.
“O “verdadeiro” eu não está
enclausurado e isolado dessa
sociedade. É somente uma ilusão. O
indivíduo não é estranho à sociedade.
A vida social supõe entrelaçamento
entre necessidades e desejos em
uma alternância entre dar e receber.
A razão e a mente não são
substâncias, mas produtos de
relações em constantes
transformações” (BONIN, 2001, p. 60).
3. Indivíduo, Cultura e
Sociedade
A constituição do sujeito humano:

 Ocorre numa rede intrincada de


relações em que se interpenetram os
aspectos biológicos - havendo, desde o
início, comportamentos inatos ligados à
sua estrutura biológica -, psíquicos e
sócio-culturais.
 O ser humano nasce numa
determinada cultura que, então, vai
sendo assimilada – e, ao mesmo
tempo, transformada – na medida em
que se relaciona com o outro/mundo.
 As pessoas se constituem em um dado
sistema cultural, formando uma rede de
inter-relações na qual se influenciam
mutuamente.
 Cada indivíduo desempenha um papel
ativo no meio em que vive, sendo
sujeito/agente do seu processo, o que
nega uma perspectiva de determinismo
social  nesta interatividade ele é,
simultaneamente, produto e produtor.
O conceito de cultura:

 É extremamente complexo;
 Não se limita ao fenômeno mental, no
que se refere aos processos lógico-
cognitivos de assimilação dos dados
culturais;
 Nem à simples incorporação de
padrões de comportamento e à
produção de desejos exclusivamente
individuais (GEERTZ apud BONIN, 2001).
 A cultura se forma em um conjunto
compartilhado de vivências, cujos
significados são atribuídos na esfera
pública.

 Importa estudar esses processos


em estruturas de significados formados
publicamente.
 Sentidos produzidos na esfera
pública:

Trata-se de sentidos que são


produzidos no espaço público, pois
para que se forme uma dada cultura é
preciso que seja compartilhada entre os
indivíduos, produzindo-se assim o
sentido.
 O termo “público” “significa que algo é
compartilhado também visualmente,
como em rituais e na fabricação e uso
de artefatos” (BONIN, p. 65).
 Ênfase na rede de inter-relações:

Através das atividades, objetos,


artefatos e símbolos compartilhados
 para além de crenças,
conhecimentos e outros processos
mentais individuais  isto é, nas
atividades concretas dos indivíduos
em interação.
 Concepção de sujeito histórico-
social:

Ao nascer cada indivíduo se depara


com um social já formado, instituído
pelas gerações anteriores, ou seja, um
conjunto de normas sociais instituídas e
expressas pela cultura, que vai sendo
introjetada através das inter-relações
humanas.
 O papel do outro:

Desde o princípio da vida, o outro


desempenha um papel significativo
na existência humana, a começar
pelo núcleo familiar, em que ocorrem
as primeiras identificações - bastante
significativas na história do sujeito -, o
que o torna social por natureza.
“[...] apesar de o indivíduo ser
considerado como produto da história
e da cultura, é também um ser
intencional e criativo, em constante
transformação, e que, coletivamente,
pode mudar o próprio processo
cultural que o constitui” (BONIN, 2001,
p. 70).
 A importância dos aspectos culturais
na constituição humana: as diferentes
concepções de “eus”

Cultura americana: “eus”


independentes
Cultura japonesa:“eus”
interdependentes.
 A cultura americana: as pessoas se
vêem, em geral, independentes e
autônomas, tendo habilidades e valores
únicos e agindo segundo atributos
internos.

 É mais importante para o indivíduo


sobressair-se, ser único, elevando,
assim, sua auto-estima, mesmo que
isto cause conflitos com os outros 
eus independentes.
 Cultura japonesa: o “eu” faz parte do
grupo em que a pessoa está inserida,
de forma que os outros participam na
definição de si.

 “o ‘eu’ não existe em si e é um


produto de relações que se definem
face aos outros em determinadas
situações”  eus interdependentes.
 A ação da pessoa ocorre em
conformidade com as expectativas de
outrem  não se colocando em
primeiro lugar e buscando harmonizar
seus interesses e atributos pessoais
com os dos demais  eus
interdependentes.
A concepção de “eu”
(interdependente):

 Está calcada na empatia pelo outro,


resultando em um comportamento
polido e autocontido, com vistas a
favorecer a harmonia do grupo em
termos de equivalência de
comportamentos.
comportamentos
 Ser diferente para o japonês: exceto
para os notáveis, implica no risco da
exclusão, que configura um pesadelo.

 Não se estimula, pois, a competição


interna, cujos feitos criativos são
compartilhados, sendo inconcebível
sobressair-se no grupo.
 As Emoções:
Podem reforçar estas construções do
“eu” de forma mais independente ou
interdependente:

 Ações e emoções “focalizadas no


‘eu’:  típicas de pessoas egoístas,
por ex.,  inaceitável para um sujeito
de ego interdependente, uma atitude
imatura, uma dificuldade para uma
harmonia grupal.
 A solidariedade:

Considerada como fonte de um self


interdependente, funcionando como o
ideal do grupo (BONIN, 2001).
 Nas culturas que enfatizam o “eu”
independente:

As motivações estão ligadas à


necessidade de expressar
realização individual, em que o
indivíduo procura ser bem sucedido,
realçar sua auto-estima e aumentar
sua auto-realização.
 A relevância para os “eus”
interdependentes:

Demonstrar e desenvolver
motivações sociais, em prol do outro,
sendo modesto e procurando agir de
acordo com as expectativas de seus
pares (BONIN, 2001).
A sociedade:

 É o conjunto das relações


interpessoais (não estando acima
dos indivíduos), sendo construída na
interação contínua entre os mesmos,
produzindo culturas e sub-culturas.
 Um universo de diversidade cultural 
gerando a formação de grupos
heterogêneos a partir do intercâmbio de
práticas, conceitos e valores globais,
nacionais e regionais.

 A construção do “eu” na vida social:


 Ocorre em sua pluralidade cultural,
a qual abrange valores universais e
locais.
4. Psicologia Sócio-Histórica:
uma das vertentes da
Psicologia Social Crítica
 Autores soviéticos de expressão:
Vigotsky, Leontiev, Luria:
 Buscam uma psicologia livre do
pensamento burguês, que não separe o
homem de seu mundo social, revendo o
conhecimento segundo a perspectiva
materialista histórica e dialética.
 Vigotsky: questiona a existência da
natureza humana e da consciência
como algo intrínseco e a-histórico. Seu
projeto levará à superação das
dicotomias: mundo interno x mundo
externo; indivíduo x sociedade;
objetividade x subjetividade.
 O homem:
 Constrói sua “natureza”;
 É construído socialmente e é produtor de sua
existência;
 Adapta-se à natureza e a modifica segundo
as suas necessidades;
 Cria os objetos e os meios de produção
destes objetos e desta forma desenvolve a
cultura.

 Concepção de homem:
 Um ser ativo, social e histórico → resultado
de uma determinada abordagem
metodológica do homem, da história e da
sociedade: o materialismo histórico-dialético.
4.1 Pressupostos do Materialismo
histórico-dialético
 Concepção materialista:
 A realidade material tem existência
independente em relação à idéia, ao
pensamento, à razão;
 Existem leis na realidade, numa visão
determinista;
 É possível conhecer toda a realidade e
suas leis.
 Concepção dialética:
 A contradição é característica fundamental de tudo
que existe, de todas as coisas;
 A contradição e sua superação constante é a base
do movimento de transformação constante da
realidade;
 O movimento da realidade está expresso nas leis da
dialética (lei do movimento e relação universal; lei da
unidade e luta de contrários; lei da transformação da
quantidade em qualidade; e lei da negação da
negação) e em suas categorias.
 O movimento da realidade está expresso nas leis da
dialética (lei do movimento e relação universal; lei da
unidade e luta de contrários; lei da transformação da
quantidade em qualidade; e lei da negação da
negação) e em suas categorias.
 Concepção histórica:

 Só é possível compreender a
sociedade e a história através de uma
concepção materialista e dialética → a
história deve ser analisada a partir da
realidade concreta e não a partir das
idéias, buscando-se as leis que a
governam (visão materialista), e as leis
da história, além de materiais, são as
leis do movimento de transformação
constante, que tem por base a
contradição.
 “O homem é ativo (o homem da ação, do
trabalho), social (o trabalho só se realiza em
sociedade) e histórico (a ação, em
sociedade, do homem sobre a natureza
transforma a natureza e o próprio homem
[...]. E a realidade, a natureza não pode ser
pensada sem a presença do homem que a
transforma. [...] o materialismo histórico e
dialético, que afirma a realidade como
independente da razão, ou da “idéia”
(materialismo), mas afirma também o
movimento constante da realidade, a partir
da contradição (dialética) e a relação
intrínseca entre a ação do homem e o
movimento da realidade (história)” (BOCK;
GONÇALVES, 2003, p. 49).
 As leis que regem as sociedades e
os homens:
 São históricas, não são alheias aos
homens porque são resultado de sua
ação sobre a realidade (trabalho e
relações sociais); mas são leis
objetivas, porque estão na realidade
material do trabalho e das relações
sociais.
4.2 Categorias fundamentais:

 Atividade
 Consciência
 Identidade
 A Atividade:
– É categoria do psiquismo na medida em
que é a partir da atividade que o homem
participa de um grupo social em um
determinado momento histórico, tornando-
se um indivíduo;
– Neste processo, a partir da atividade sobre
o objeto, desenvolve o psiquismo.
 A Consciência:
 Não existe sem a matéria;
 Só se desenvolve no cérebro humano, de um
homem que tem atividade e vida social →
tem uma natureza social, embora seja algo
do indivíduo
 Está ligada à atividade social do homem, ao
trabalho e só aparece nesse processo
 É subjetiva, mas não existe sem a realidade
objetiva→ expressa uma unidade entre
objetividade e subjetividade.
 Atividade:
 A categoria atividade refere-se à ação do
homem sobre a realidade;
 Só ocorre dentro de relações sociais
estabelecidas historicamente
 É definida pelo lugar que o indivíduo ocupa
socialmente dentro da forma de organização
do trabalho;
 Nas sociedades de classe essa organização
envolve desigualdade e opressão social.
 Consciência: se desenvolve em relação
com a atividade, no processo contraditório de
movimento da sociedade.
“O trabalho (atividade para garantir a
sobrevivência de si e da família) é o fio
condutor, o ponto de partida, o
elemento fundamental em relação ao
qual a consciência se processa; é o
cerne da categoria atividade;
indissociável da categoria consciência”
(SAWAIA apud BOCK; GONÇALVES,
2003).
 Identidade:
– Compõe com atividade e consciência o
substrato da subjetividade
– Refere-se ao que o indivíduo é, àquilo no
que ele se constitui no processo de
desenvolvimento da consciência em
relação com a atividade;
– O indivíduo é metamorfose.
– Linguagem:
 É mediação importante no processo de
desenvolvimento da identidade, a partir do
movimento entre atividade e consciência;
 É entendida como instrumento e, ao mesmo
tempo, como elemento formador da
consciência;
 É produzida social e historicamente, com
significados sociais e históricos, com a
presença da questão ideológica.
 O desenvolvimento do psiquismo:
O discurso produzido pelos
indivíduos permite ter acesso ao
processo de desenvolvimento do
psiquismo como resultado da relação
entre atividade – consciência –
identidade.

Você também pode gostar