Você está na página 1de 3

Óleo de Coco

– Milagre para

Artigo
Emagrecer ou Mais
um Modismo?

Alessandra Rodrigues – Nutricionista, Mestre em Ciências


pela Universidade de São Paulo (USP).

O
uso do óleo de coco para O óleo de coco é classificado FIGURA 1 – Composição dos ácidos
tratamento da obesidade como gordura saturada. Sabe-se que graxos do óleo de coco (adaptado
de DebMandal M, Mandal S. , 2011)
tem recebido grande des- o nível de saturação determina a con-
taque na mídia, fato que refletiu sistência da gordura em temperatura
uma corrida dos consumidores às lo- ambiente. Quanto maior o grau de 50

45

jas buscando uma solução milagrosa saturação, mais dura a gordura será. 40

35

para perda de peso. De acordo com No entanto, o óleo de coco é uma


Fally acid (%)

30

os defensores do óleo de coco, este exceção, pois apesar de ser altamente 25

20

ajuda a prevenir e tratar uma série saturado, é liquido, devido à predo- 15

de condições médicas. Entretanto, é minância de ácidos graxos de cadeia


10

preciso ter cautela, afinal o óleo de média (AGCM), que correspondem 0


C6:0 C8:0 C10:0 C12:0 C14:0 C16:0 C18:0 C18:1 C18:2

coco é uma gordura e, como qual- a 70-80% de sua composição, con- Fally acid constituent

quer outra, quando consumida em forme indicado na figura1 1, 2.


FIGURA 2 – Composição de
excesso, engorda. Adeptos da Co- Na figura 2, podemos verificar a triglicérides do óleo de coco
conut diet indicam que o indivíduo descrição da combinação de triglicé- (adaptado de DebMandal M,
deve consumir 3 colheres de sopa do rides do óleo de coco, onde é possí- Mandal S. , 2011)
óleo de coco por dia. Em uma colher vel observar o predomínio do ácido 25

de sopa há 117 Kcal e 13,6g de gor- láurico, que parece ter menos efeitos 20

dura, ou seja, mais calorias que uma deletérios no perfil lipídico do que o 15
TAG (%)

colher de manteiga ou azeite. ácido palmítico, presente em gordu- 10

ras saturadas de origem animal, por 5

Conhecendo um Pouco Mais exemplo. 1, 2, 3 0

Sobre o Óleo de Coco O fato do óleo de coco possuir


a

La

La

La

La

PP

O
pL

M
La

O
PO
La

M
pC

La

La

La
La

La

M
La
pC

La
C

La
La
C

La
C
C

O Coco (C. nucifera) pertence à fa- maior quantidade de AGCM, dife-


TAG combination
TAG: triacylglycerol, Cp: caproic, C: capric, La: lauric, M: myristic, P: palmitic, O: oletic

mília Arecaceae (Palmae) e à subfa- rentemente de outras gorduras satura-


mília Cocoideae. O óleo é, em ge- das, faz com que tenha um compor-
ral, extraído a frio a partir da massa tamento metabólico distinto em vir-
do coco. tude de suas características estruturais.

abril 2012 – ABESO 56 – 5


Os AGCM são rapidamente ab- sobre o perfil lipídico e os resulta- sumo do óleo de coco) mostrou que
sorvidos no intestino, mesmo sem dos mostraram que houve maior au- o consumo do óleo de coco parece
sofrer ação da enzima lipase pan- mento do colesterol plasmático to- não ter relação com aumento do ris-
creática. Os ácidos graxos de cadeia tal, do LDL-colesterol (lipoproteína co de doenças cardiovasculares. En-
longa (AGCL), por outro lado, ne- de baixa densidade), mas também tretanto, os próprios autores discu-
cessitam da lipase pancreática para do HDL-colesterol (lipoproteína de tem sobre como tal relação é difícil
a absorção e são transportados pela alta densidade) quando preferida a de ser estabelecida em estudos ob-
linfa para a circulação sistêmica na dieta rica em AGCM5. servacionais. Os motivos são a falta
forma de quilomícrons, para de- Outro modo de utilização do de acurácia dos métodos de investi-
pois atingir o fígado, onde eles pas- óleo de coco é na forma de suple- gação nutricional, além da grande
sam por beta-oxidação, biossíntese mentos. Neste caso, as evidências são variação intraindividual da ingestão
de colesterol, ou são resintetizados insuficientes e, além de benefícios alimentar, variação genética, varia-
como triglicérides. Já os AGCM são desconhecidos, não sabemos os ris- ção entre sexos, entre outras8.
transportados pela veia porta para o cos que podem estar envolvidos.
fígado, onde são rapidamente oxi- Suplementos de Óleo de Coco
dados, gerando energia. Ao contrá- Suplementos de Óleo de Coco X Perda de Peso
rio dos AGCL, os AGCM não par- X Dislipidemias Em relação à perda de peso, os estu-
ticipam do ciclo de colesterol e não O consumo de óleo de coco e de dos com suplementos a base de óleo
são estocados em depósitos de gor- outros suplementos foi avaliado em de coco são extremamente escassos e
duras4. ratos e mostrou que, apesar do alto de baixo grau de evidência.
Tais características fazem com teor de gordura saturada, o óleo de Os defensores do óleo de coco se
que óleos tropicais, como o óleo de coco parece ter efeitos benéficos para baseiam na teoria de que os AGCM
coco, sejam indicados para trata- a saúde cardiovascular, desde que são facilmente oxidados a lipídeos e
mento da hiperquilomicronemia em consumido em doses moderadas. não armazenados no tecido adiposo,
substituição a outros óleos vegetais. Entretanto, os autores concluem quando comparados aos AGCL. Por
que ainda são necessários mais estu- esta inferência, e pelo fato do óleo de
Formas de Utilização do Óleo dos para indicação efetiva deste su- coco ser rico em AGCM e pobre em
de Coco plemento6. AGCL, seu uso poderia ter efeito no
O óleo de coco pode ser utilizado São poucos os estudos que ava- tratamento da obesidade.
em substituição a outros tipos de liaram a suplementação do óleo de Um estudo conduzido em hu-
gordura no preparo dos alimentos. coco e resultados no perfil lipídi- manos concluiu que o uso do óleo
Com as descobertas dos malefícios co em humanos. Um estudo duplo de coco virgem, por ter alto teor de
da gordura trans, a indústria alimen- cego e randomizado selecionou 17 AGCM, parece ser benéfico para re-
tícia vem buscando alternativas para homens saudáveis, com atividade fí- dução de gordura abdominal, em
o preparo de alimentos. Uma das al- sica de leve a moderada, sem histó- especial em homens, sem alteração
ternativas tem sido o uso de óleos rico de hipertensão ou aterosclerose significativa do perfil lipídico, mas
tropicais, como o óleo de coco. Ob- e sem nenhum tratamento medica- vale ressaltar que este estudo foi rea-
viamente, a retirada da gordura trans mentoso. Os participantes recebe- lizado em apenas 20 indivíduos, não
traz benefícios no perfil lipídico e ram 70g de AGCM proveniente de foi duplo cego e o acompanhamento
no risco cardiovascular. No entan- óleos vegetais. Os resultados mostra- foi feito por apenas quatro semanas4.
to, não se sabe se a substituição da ram que a dieta com AGCM elevou Outro estudo conduzido por um
gordura trans por gordura saturada, o colesterol plasmático total, o LDL, grupo de Alagoas estudou 40 mu-
principal fonte de gordura do óleo a razão LDL e HDL7. Portanto, o lheres entre 20 e 40 anos, que fo-
de coco, poderá ser benéfica. Sabe- uso do suplemento teve um efeito ram randomizadas em dois grupos -
mos que gordura saturada está asso- desfavorável no perfil lipídico. um que recebeu óleo de coco e, ou-
ciada à elevação do colesterol total. Por outro lado, os resultados de tro, recebeu óleo de soja - de forma
Um estudo dinamarquês compa- estudo realizado em uma população duplo-cega por 12 semanas, além
rou dietas ricas em AGCM e AGCL da Indonésia (região com alto con- de orientação dietética, com nutri-

6 – ABESO 56 – Abril 2012


cionista, com dieta hipocalórica e plementação de um óleo que mis- co quanto para o emagrecimento.
orientação para prática de ativida- turou AGCL e AGCM por oito se- É importante ter em mente que a
de física. Como resultado, a suple- manas pareceu ser positiva para re- gordura saturada do óleo de coco,
mentação de óleo de coco não al- dução de peso e melhora do perfil mesmo que com melhor composi-
terou o perfil lipídico e a perda de lipídico de homens com hipertrigli- ção que outras fontes de gordura sa-
peso foi idêntica nos dois grupos. ceridemia10. turada, deve ter seu consumo restri-
No entanto, os autores verificaram Em contrapartida, outro estudo to. Ainda é válida a recomendação
redução de circunferência abdomi- que avaliou a relação entre o com- de que uma dieta de alta qualidade
nal no grupo com óleo de coco em primento da cadeia de ácidos graxos, para saúde deve limitar a ingestão de
relação ao óleo de soja. (-1,4cm vs saciedade pós-prandial e ingestão gordura saturada (7% do valor caló-
0,6cm). Os pesquisadores conclu- alimentar em homens magros con- rico total da dieta), substituir gor-
íram que é necessário acompanha- cluiu que não existe evidência de que dura saturada por monoinsaturada
mento por um período prolonga- o comprimento da cadeia de ácidos e poliinsaturada, aumentar o consu-
do para estender tal recomendação graxos tenha efeito sobre apetite ou mo de ômega 3, fibras solúveis, ve-
a outras populações e que mais es- ingestão alimentar11. getais e frutas12,13,14.
tudos devem ser conduzidos. Além O uso de suplementos a base de
disso, esse mesmo estudo mostrou Conclusão óleo de coco está longe de ser um
que a suplementação do óleo de Fica claro que, apesar das diversas te- milagre para emagrecer. Certamen-
coco teve uma tendência a elevar os orias positivas sobre o óleo de coco, te seu uso é mais um modismo, sem
níveis de insulina circulante9. os estudos ainda são escassos e con- respaldo científico e que, portanto,
Em uma população chinesa, a su- troversos, tanto para o perfil lipídi- deve ser desestimulado. c

Referências Bibliográficas 6. Naghii MR, Darvishi P, Ebrahimpour Y, Gha- sponse to oil with medium- and long-chain
1. Mahan K, Escott-Stump S. Alimentos, Nu- nizadeh G, Mofid M, Hedayati M, Asgari AR. fatty acids in body fat and blood lipid pro-
trição e Dietoterapia. 9 ed. São Paulo: Roca, Effect of combination therapy of fatty acids, files of male hypertriglyceridemic subjects.
1998.49-50. calcium, vitamin D and boron with regular Asia Pac J Clin Nutr 2009;18 (3):351-358.
2. DebMandal M, Mandal S. Coconut (Cocos physical activity on cardiovascular risk fac- 11. Poppitt S.D., Strik C.M., MacGibbon A.K.H.,
nucifera L.: Arecaceae): in health promotion tors in rat. J Oleo Sci. 2012;61(2):103-11. McArdle B.H., Budgett S.C., McGill A.-T.
and disease prevention. Asian Pacific Jour- 7. Ferreira AMD, Barbosa PEB, Ceddia RB. The Fatty acid chain length, postprandial satiety
nal of Tropical Medicine. 2011; 241-247. influence of medium-chain triglycerides and food intake in lean men. Physiology &
3. N. M. de Roos, E. G. Schouten, and M. B. Ka- supplementation in ultra-endurance exer- Behavior.2010; 101:161–167.
tan, “Human nutrition and metabolism: con- cise performance. Rev Bras Med Esporte. 12. American Dietetic Association. Position of
sumption of a solid fat rich in lauric acid re- 2003;9(6):413-419. the American Dietetic Association and di-
sults in a more favorable serum lipid profile 8. Lipoeto NI, Agus Z, Oenzil F, Wahlqvist ML, etitians of Canada: dietary fatty acids. J Am
in healthy men and women than consump- Wattanapenpaiboon N. Dietary intake and Diet Assoc. 2007;107:1599-1611.
tion of a solid fat rich in trans-fatty acids”, the risk of coronary heart disease among 13. American Dietetic Association. Nutrition
Journal of Nutrition. 2001; 131(2): 242–245. the coconut-consuming Minangkabau in Care Manual. Disorders of lipid metabo-
4. Liau KM, Lee YY, Chen CK, Rasool AHG. An West Sumatra, Indonesia. Asia Pac J Clin lism, hypercholesterolemia, overview. nu-
open-label pilot study to assess the efficacy Nutr 2004;13 (4):377-384. trition care manual web site. http://nutri-
and safety of virgin coconut oil in reduc- 9. Assunção ML, Ferreira HS, Santos EAF, Ca- tioncaremanual.org/content.cfm?ncm_con-
ing visceral adiposity. ISRN Pharmacology. bral Jr R, Florêncio MMT. Effects of dietary tent_id_72856. Acessado em 19 de março
2011;2011:949686, 1-7. coconut oil on the biochemical and anthro- de 2012.
5. Tholstrup T, Ehnholm C, Jauhiainen M, et pometric profiles of women presenting ab- 14. Dietary Guidelines for Americans, 2010.
al. Effects of medium-chain fatty acids and dominal obesity. Lipids. 2009; 44:593–601. US Department of Health and Human Ser-
oleic acid on blood lipids, lipoproteins, glu- 10. Liu Y, Wang J, Zhang R, Zhang Y, Xu Q, Zhang vices, US Department of Agriculture. http://
cose, insulin, and lipid transfer protein activi- J, Zhang Y, Zheng Z, Yu X, Jing H, Nosaka N, www.health.gov/dietaryguidelines/2010.
ties. Am J Clin Nutr. 2004;79(4):564-9. Kasai M, Aoyama T, Wu J, Xue J. A good re- asp. Acessado em 19 de março de 2012.

abril 2012 – ABESO 56 – 7

Você também pode gostar