Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
O objetivo deste ensaio é apresentar os conceitos fundamentais da Teoria dos Processos
Civilizadores, desenvolvidos por Norbert Elias, visando demonstrar seu potencial como
referencial teórico-metodológico em pesquisas nas Ciências Humanas e Sociais.
Abstract
This essay aims to present the Civilizing Process Theory fundamental concepts, developed by
Norbert Elias, trying to demonstrate its potential as a theoretical-methodological reference in
the Human and Social Sciences researches.
Keywords: Norbert Elias. Civilizing Process Theory. Theoretical-methodological reference.
.
1 Introdução
Em uma visita ao museu, ao entrar em contato com o passado através dos objetos ali
expostos, é possível perceber que as formas de pensar e se comportar modificaram-se ao
longo do tempo. Ao observar a história do telefone, por exemplo, cuja invenção é tributada a
Graham Bell, notam-se as características de seu tempo, desde os materiais utilizados para a
fabricação até a forma de contatar as pessoas, por intermédio de uma central. O ato de
telefonar demandava muito mais tempo em comparação aos dias de hoje. Entre o invento,
datado de 1876, e a popularização dos telefones celulares, o saber acumulado ao longo das
gerações acerca de comunicação a longa distância foi sendo sintetizado até chegar a um
patamar de desenvolvimento que permitiu o contato entre as pessoas via ondas de rádio. Em
pouco mais de cem anos, os hábitos relacionados ao ato de telefonar foram modificados: da
necessidade de estar em um local específico da casa para atender ao aparelho até realizar uma
chamada de vídeo, via internet, enquanto caminha no parque do outro lado do mundo.
Esse avanço tem relação com a tecnologia disponível e está associado às estruturas
sociais e psicológicas de seu tempo. As novas formas de ser e de pensar decorrentes de
mutações nas estruturas sociais, possibilitadas por inventos que colaboram para o
estreitamento das relações entre os indivíduos, como o telefone, contribuem para alterações
nessas mesmas estruturas, que, ao se modificarem, demandam outros padrões à constituição
psicológica dos indivíduos em dada formação social. Esse contínuo de transformações
configura o processo civilizador, que na tendência atual tem caminhado para a regulação
constante e altamente diferenciada do comportamento.
A noção de processo civilizador foi desenvolvida por Norbert Elias, sociólogo que
publicou suas formulações iniciais em 1939. Em uma abordagem de longa duração
(aproximadamente 700 anos), o autor estudou, de maneira comparada, as mudanças e
processos sociais que colaboraram à transformação dos costumes europeus, da Idade Média
ao Renascimento, o que lhe permitiu observar que, de maneira interdependente, os padrões de
conduta socialmente aceitáveis se transformam ao longo do tempo em conformidade com as
modificações das estruturas sociais. Tais transformações se direcionam ao estabelecimento de
uma conduta “mais diferenciada, uniforme e estável” (ELIAS, 1993, p. 196), possível por
meio da monopolização da força física e da tributação, da crescente estabilidade dos órgãos
centrais da sociedade, da progressiva divisão de funções e do incremento das cadeias de
interdependência, que paulatinamente fez necessária uma nova forma de regulação dos
impulsos.
Para desenvolver este estudo, que deu bases à Teoria dos Processos Civilizadores,
Norbert Elias precisou desenvolver um conjunto de noções que lhe permitissem analisar o
fenômeno para além dos conceitos da sociologia vigente. Assim, passou a utilizar termos
como interdependência, figuração e habitus, conceitos que podem ser aplicados no estudo dos
mais variados fenômenos sociais, como o processo de ensino e aprendizagem de
comportamentos, os aspectos sociais da personalidade humana e os costumes de um
determinado povo – para citar alguns exemplos.
Nesse sentido, este ensaio objetiva apresentar os conceitos fundamentais da Teoria dos
Processos Civilizadores, desenvolvidas por Norbert Elias, visando demonstrar seu potencial
como referencial teórico-metodológico em pesquisas nas Ciências Humanas e Sociais. Para
tanto, foram utilizados como fonte para a pesquisa bibliográfica os livros de Elias publicados
em português, complementados – quando necessários – de comentários de pesquisadores
brasileiros que se dedicaram a perspectivar seus objetos de pesquisa sob o ponto de vista da
Teoria dos Processos Civilizadores.
Espera-se que este trabalho possa evidenciar o amplo potencial da perspectiva teórico-
metodológica de Elias, contribuindo, assim, para que mais pesquisadores considerem a Teoria
dos Processos Civilizadores como referente em seus estudos, favorecendo, ao mesmo tempo,
um processo de renovação temática, ao perspectivar novos ou velhos temas sob uma outra
teoria.
2 Desenvolvimento
Para Elias, somente em combinação com tais monopólios é que o autocontrole vai
requisitando graus mais elevados. Paulatinamente, as pressões externas que exigem
determinado padrão de comportamento vão sendo individualizadas, passando a compor uma
segunda natureza, um habitus. Com a monopolização da força física – que, no caso das
sociedades modernas, encontra-se em poder do Estado, através da justiça, da polícia e da
prisão – o indivíduo é protegido contra ataques violentos ao preço da repressão de suas
paixões. Assim, quanto maiores e mais estreitas são as redes de interdependência da qual um
indivíduo faz parte, bem como “a ampliação do espaço mental além do momento presente,
levando em conta o passado e o futuro” (ELIAS, 1993, p. 198), maior será o grau de
autocontenção, resultando em uma mudança na constituição psicológica conhecida como
“civilização” (ELIAS, 1993, p. 197).
Se a estrutura das figurações é correspondente à estrutura de personalidade dos
indivíduos que a compõem e à forma como se comportam, logo, mudanças em suas
configurações alteram também as formas de expressão socialmente aceitáveis dos
sentimentos. Nesse sentido, quanto mais diversificada uma sociedade, maiores são as esferas
da vida reguladas. Isso não significa dizer que as sociedades ocidentais em estágios inferiores
eram/são ausentes de autocontrole; tratam-se de padrões distintos. O que passou a ocorrer a
partir da monopolização da força física e da crescente estabilidade dos órgãos centrais foi o
estabelecimento de um tipo diferente de autolimitação: mais desapaixonado, com menor
oscilação no comportamento e maior equilíbrio na expressão das emoções. De acordo com
Elias (1993, p. 202):
As pressões que atuam sobre o indivíduo tendem a produzir uma transformação de
toda a economia das paixões e afetos rumo a uma regulação mais contínua, estável e
uniforme dos mesmos, em todas as áreas de conduta, em todos os setores de sua
vida. E é exatamente na mesma direção que operam as compulsões desarmadas.
3 Considerações finais
4 Referências
CHARTIER, R. Prefácio. In: ELIAS, N. A sociedade de Corte. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
______. Escritos & ensaios. Vol. 1: Estado, processo, opinião pública. Rio de Janeiro, Jorge
Zahar, 2006.
______. Norbert Elias por ele mesmo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
______. O processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.