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Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-1

2 CARACTERIZAÇÃO DUMA BACIA HIDROGRÁFICA


2.1 BACIAS HIDROGRÁFICAS

Uma bacia hidrográfica é uma região definida topográficamente, drenada por um curso de água
ou um sistema interligado de cursos de água, tal que a única entrada de água na região seja a
precipitação e todos os caudais efluentes sejam descarregados através de uma única saida (secção
de referência da bacia).

Quando o balanço hídrico é realizado na região correspondente a uma bacia hidrográfica, ele
torna-se consideravelmente simplificado já que a única entrada de água corresponde à
precipitação e a saída de água se faz numa única secção. Também para a gestão dos recursos
hídricos a bacia hidrográfica constitui a unidade mais conveniente pois é a nível da bacia que se
verificam as relações mais estreitas entre:

• recursos hídricos a montante e a jusante;


• recursos de água superficiais e de águas subterrâneas;
• consumos a montante e disponibilidades a jusante, em termos de quantidade e qualidade;
• modificações na ocupação do solo ou obras hidráulicas no rio e nas margens e modificações
morfológicas ou das características do escoamento a montante e a jusante, por vezes a
distâncias de dezenas de quilómetros.

Tudo isto justifica o papel privilegiado desempenhado pelas bacias hidrográficas em estudos
hidrológicos e de gestão de recursos hídricos. A figura 2.1 representa as principais bacias de
Moçambique e a figura 2.2 a bacia do rio Malema, afluente do rio Lúrio.

A bacia hidrográfica é limitada pela linha de separação das águas. Esta linha passa pelos
pontos de máxima cota entre bacias, seguindo pelas linhas de cumeada, podendo no entanto
existir pontos mais altos no interior da bacia. A linha de separação divide a região onde a
precipitação caída vai dar origem a escoamento drenado através da secção de referência das
regiões vizinhas, drenadas por outros cursos de água.

A definição dos limites da bacia hidrográfica torna-se menos precisa quando se considera o
escoamento subterrâneo. Assim, distingue-se por vezes a linha de separação topográfica ou
superficial da linha de separação freática ou subterrânea. Na situação ilustrada pela figura 2.3,
a precipitação que se infiltra acima da camada geológica impermeável acaba por se escoar numa
bacia vizinha.

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Figure 2.1 Principais bacias de Moçambique

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Figure 2.2 Bacia do rio Malema

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Figure 2.3 Limites duma bacia hidrográfica

Nesta situação, a definição dos limites da bacia hidrográfica não se pode fazer sem ambiguidade
visto que apenas uma parte da precipitação caída acima da camada geológica impermeável se
infiltra enquanto outra parte se transforma em escoamento superficial na bacia. Por outro lado, os
níveis freáticos variam ao longo do ano o que tem como consequência a variação da linha de
separação freática. Por isso, normalmente e para efeitos práticos, despreza-se o efeito introduzido
pelo escoamento subterrâneo, junto aos limites da bacia. A incorreção cometida é negligenciável
com a excepção das bacias com muito pequena dimensão ou com características geológicas
particulares.

O comportamento hidrológico duma bacia hidrográfica é essencialmente uma função das


características climáticas da região (precipitação, evaporação) e das características fisiográficas
da bacia. As características fisiográficas podem ser agrupadas da seguinte maneira:

• características geométricas - área de drenagem;


- perímetro;
- índice de compacidade;
- factor de forma.

• características do sistema de drenagem - constância do escoamento;


- ordem;
- densidade de drenagem.

• características do relevo - curva hipsométrica;


- altitude média;
- altura média;
- perfil do rio;
- inclinação média do leito;
- declividade dos terrenos;
- rectângulo equivalente;
- declive médio
- índice de declive de Roche;

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- curva hidrodinâmica;
- coeficiente de massividade;
- coeficiente orográfico.

• características de geologia, solos e vegetação

2.2 CARACTERÍSTICAS GEOMÉTRICAS

2.2.1 Área de drenagem

A área de drenagem é a área da projecção horizonal da superfice da bacia hidrográfica, sendo


normalmente determinada por planimetria ou por utilização de GIS (Sistema de Informação
Geográfica), em cartas com escalas (no caso de Moçambique) entre 1:250,000 e 1:50,000.

A área de drenagem tem uma importância enorme nos valores dos escoamentos, que se podem,
duma maneira geral, considerar funções crescentes da área. A área da bacia do rio Malema
(centro-norte de Moçambique) é de 2,600 km2.

2.2.2 Perímetro

O perímetro da bacia é o perímetro da projecção horizontal da superfície da bacia hidrográfica.


O perímetro da bacia do rio Malema é de 342 km.

2.2.3 Índice de compacidade

O índice de compacidade ou índice de Gravelius, Kc, é a relação entre o perímetro da bacia e o


perímetro dum círculo de área igual à da bacia:

Kc = P/(2πR), em que A = πR2 define o valor de R. Então:

P 0.282 P
Kc = =
A A

π

Kc é sempre maior ou igual à unidade apenas se tendo Kc = 1 para uma bacia de forma circular.
Kc é um valor adimensional que não depende da área mas da forma da bacia sendo tanto maior
quanto mais essa forma se afaste da circular. Note-se que quanto maior fôr Kc menos compacta é
a bacia. Apresentam-se na figura 2.4 algumas formas esquemáticas de bacias e os respectivas
índices de compacidade. A título de exemplo, a bacia do rio Malema tem um valor de Kc = 1.89.

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Figura 2.4 Índices de compacidade para várias formas de bacias


Se imaginarmos uma precipitação instantânea e uniforme sobre a bacia, o escoamento a que ela
dá origem surgirá concentrado na secção de saída ou mais distribuido ao longo do tempo
conforme a forma da bacia seja próxima da circular ou irregular. Assim, em igualdade de outros
factores, a tendência para grandes cheias será tanto mais acentuada quanto mais próximo da
unidade for o valor de Kc.

2.2.4 Factor de forma

O factor de forma, Kf, é a relação entre a largura média e o comprimento da bacia, definido
como o comprimento, L, do seu curso de água mais longo. A largura média, l, é definida como a
largura dum rectângulo com o mesmo comprimento e com a mesma área:

l = A/L

Kf = l/L = A/L2

Se se considerar as primeiras três bacias representadas na figura 2.4, os seus factores de forma
são aproximadamente 0.25, 0.50 e 1. As bacias com factores de forma baixos são as que têm
formas estreitas ou irregulares. Nestes casos, é menos provável a ocorrência de chuvas intensas
cobrindo simultâneamente toda a sua extensão e, por outro lado, os escoamentos resultantes
surgem na secção de saída mais distribuidos ao longo do tempo pelo que, em igualdade de outros
factores, bacias com Kf baixos terão menos tendências para grandes cheias do que bacias com Kf
elevados. O valor de Kf para a bacia do rio Malema é de 0.1 aproximadamente.

2.3 CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA DE DRENAGEM

2.3.1 Constância do escoamento

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Os rios e seus afluentes podem classificar-se como perenes, intermitentes e efémeros, de


acordo com o critério da constância do escoamento.

Os rios perenes são os que, em condições naturais1, escoam água durante todo o ano quer por
terem afluentes com diferentes regimes de alimentação quer por terem uma alimentação contínua
de águas subterrâneas. É normalmente o caso dos rios mais importantes de Moçambique, como o
Maputo, o Umbelúzi, o Incomáti e o Limpopo, na região sul.

Os rios intermitentes são os que em geral têm água durante a época húmida e secam na estiagem.
Durante a época húmida beneficiam da precipitação e dum nível freático alto enquanto que,
durante a época seca, o lençol freático desce a um nível inferior ao do leito do rio, não
permitindo fazer a sua alimentação. Podem referir-se como exemplo os rios Mazim’chopes e
Govuro.

Os rios efémeros apenas têm água durante e imediatamente a seguir aos períodos de precipitação,
não recebendo escoamento subterrâneo. Podem citar-se como exemplo os rios Movene e
Impamputo.

2.3.2 Ordem

A ordem dos cursos de água é uma classificação que reflecte o grau de ramificação da rede
hidrográfica da bacia. Pode ser feita a partir dum mapa em que estejam representados todos os
canais naturais suficientemente bem definidos quer correspondam a cursos de água perenes,
intermitentes ou efémeros.

Um critério de ordenação que por vezes tem sido seguido é o de considerar como de ordem 1 os
cursos de água que não são afluentes de qualquer outro; de ordem 2 os que são afluentes dos rios
de ordem 1; de ordem n+1 os que são afluentes dos cursos de água de ordem n. Este critério é de
aplicação simples e quase nada dependente do pormenor com que a rede hidrográfica está
representada no mapa. No entanto, apresenta como significativas desvantagens o facto de
poderem surgir como tendo a mesma ordem rios de dimensão totalmente distinta. Em
Moçambique, tanto o Zambeze como o Infulene seriam rios de ordem 1 por este critério.

Um critério mais seguido actualmente é o de Horton-Strahler: são considerados de ordem 1 as


linhas de água iníciais, que não recebem quaisquer afluentes; a junção de duas linhas de água de
ordem 1 origina uma linha de água de ordem 2; a junção de dois rios de ordem n gera um rio de
ordem n+1. Assim, os troços terminais dos grandes rios têm números de ordem bastante altos.

A figura 2.5 ilustra a utilização destes dois critérios.

1
É necessário referir o rio “em condições naturais” por causa das grandes modificações de regime de escoamento introduzidas por tomas
de água e por albufeiras de armazenamento.

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Figure 2.5 Critérios de ordenação de cursos de água

2.3.3 Densidade de drenagem

A densidade de drenagem, λ, é a relação entre o comprimento total dos cursos de água duma
bacia, sejam eles perenes, intermitentes ou efémeros, e a área da bacia:
∑ li
λ= i
A
λ é dado em km-1 e varia normalmente entre 0.5 e 3.5 km-1. A densidade de drenagem é também
um indicador da tendência para a ocorrência de cheias numa bacia hidrográfica. Com efeito,
numa bacia bem drenada o escoamento superficial é rapidamente canalizado para linhas de água
bem definidas e pode surgir concentrado na secção de referência da bacia. Naquelas bacias mal
drenadas (λ baixo), a precipitação vai originar sobretudo escoamento sub-superficial e
subterrâneo que se processam com muito mais lentidão, não originando por isso picos de cheia
elevados.

2.4 CARACTERÍSTICAS DO RELEVO

2.4.1 Curva hipsométrica

A curva hipsométrica é a curva A(z) em que A é a área da bacia que se situa acima da altitude ou
cota z referida ao nível do mar. A área pode ser expressa em km2 ou em percentagem da área
total da bacia. A curva hipsométrica é obtida a partir da carta hipsométrica, carta onde a
representação das altitudes é feita por curvas de nível ou por qualquer outro processo de
representação gráfica. A figura 2.6 apresenta um exemplo de curva hipsométrica. A figura 2.7
apresenta a curva hipsométrica da bacia do rio Malema.

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Figure 2.6 Curva hipsométrica

Figure 2.7 Curva hipsométrica do rio Malema

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2.4.2 Altitude média

A altitude média da bacia, Z, é dada pela expressão:


Atotal

∫ 0
z ⋅ da
Z=
Atotal

O integral dá a área limitada pela curva z(A) e pelos eixos coordenados, podendo ser fácilmente
calculado por uma fórmula de integração numérica a partir da curva hipsométrica. Um processo
mais expedito é o de assimilar o integral a um somatório:
Atotal n

∫ z ⋅ da = ∑ z i Ai
0 i=1

em que Ai é a área da bacia entre as curvas de nível i e (i+1) e zi a média das altitudes dessas duas
curvas de nível.

A altitude média é uma característica com grande influência em variáveis hidrometeorológicas


como a precipitação e a temperatura. Em Moçambique, as zonas de maior altitude (Gurué,
Milange, Angónia, Lichinga) são as regiões de maiores precipitações anuais médias e mais
baixas temperaturas mínimas.

2.4.3 Altura média

A altura média, H, é dada pela expressão:


Atotal

∫0
h ⋅ da
H=
Atotal

em que h é a cota acima da secção de referência ou de estudo, em vez de z que é a altitude ou


cota referida ao nível do mar. Assim, se estivermos a tomar como secção de referência a foz no
oceano, as alturas h coincidem com as altitudes z; se a secção de referência fôr, por exemplo, a
secção de confluência do afluente com o rio principal, então para esse afluente ter-se-á:

h = z - zconf
ou h = z - z100

já que toda a bacia (100%) do afluente se situa acima de zconf. Daqui se tira imediatamente que

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H = Z - z100

A altura média da bacia dá-nos uma ideia se a bacia é muito ou pouco acidentada. Normalmente,
as bacias com maiores alturas médias apresentam quedas mais importantes que podem por vezes
ser aproveitadas para a produção de energia hidroeléctrica.

2.4.4 Perfil do rio

O perfil do rio é a representação gráfica da função z(L) em que z é a cota duma dada secção do
rio e L a respectiva distância à foz.

A figura 2.8 apresenta a título de exemplo o perfil do rio Malema e dos seus afluentes Namparro,
Mutivasse, Nataleia e Lalace. Note-se que a marcação de distâncias para os afluentes em sentido
contrário ao rio principal, a partir da confluência, torna o gráfico mais legível do que seria se
todas as distâncias fossem marcadas no mesmo sentido. O perfil dum rio dá uma noção imediato
das zonas de quedas importantes, grandes extensões quase planas e mais facilmente inundáveis,
etc.

2.4.5 Inclinação média do leito

A inclinação média do leito obtem-se dividindo a diferença entre as cotas máxima e mínima do
leito pelo comprimento do rio. É também possível determinar de modo análogo a inclinação
média dum troço do rio.

A partir da figura 2.8, pode-se calcular que a inclinação média de todo o leito do rio Malema é de
0.00859 mas que o troço de 135 km de jusante tem uma inclinação de apenas 0.00278.

2.4.6 Declividade dos terrenos

Quanto maior a declividade dos terrenos maior será a velocidade com que se dá o escorrimento
superfícial e, consequentemente, menor será o tempo que a água leva a atingir o sistema de
drenagem, facilitando o aparecimento de maiores pontas de cheias. Para tal contribui também o
facto de maior declividade corresponder a uma menor infiltração de água no solo. Por outro lado,
as maiores velocidades agravam o problema da erosão do solo.

A declividade dos terrenos duma bacia é normalmente obtida por amostragem:

• marcam-se, por exemplo a partir duma quadrícula aposta ao mapa da bacia, um número
elevado de pontos no interior da bacia;
• para cada ponto determina-se a declividade a partir das duas curvas de nível entre as quais o
ponto se situa;
• fica-se assim com uma distribuição estatística das declividades o que permite igualmente
obter a declividade média da bacia.

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Figure 2.8 Perfis do rio Malema e afluentes

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Um outro método para determinar a declividade média dos terrenos é o método do Alvord.

Suponha-se a bacia representada numa carta com curvas de nível espaçadas de D (por exemplo,
D = 20 metros). A figura 2.9 representa as curvas de nível às cotas n-D, n, n+D.

Figure 2.9 Método de Alvord.

Considere-se a curva de nível à cota n. A faixa de terreno entre as curvas de nível à cota n-D/2 e
n+D/2 está representada a tracejado na figura.

Se se designar por dn a largura média dessa faixa, a declividade média dos terrenos nessa faixa
será dada por in = D/dn.

Se o comprimento da curva de nível à cota n for Ln, então:


D Ln = D L n
in =
d n Ln An

em que An é área da faixa a tracejado.

Este raciocínio é aplicável a qualquer faixa de terreno correspondente a uma curva de nível da
carta. Portanto, pode-se definir a declividade média dos terrenos da bacia como a média
ponderada das declividades médias de todas as faixas que compõem a bacia.

∑ An i n ∑ DL
I= = D Ln =
∑ An ∑ An A

em que L é o comprimento total das curvas de nível de equidistância D existentes na bacia e A é


a área da bacia.

Esta método é, assim, bastante prático pois, conhecido D, basta determinar A com um planímetro
(ou GIS) e medir L com um curvímetro (ou GIS). Note-se que, sendo I um valor adimensional,
se deve exprimir tanto L como D em km e A em km2.

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2.4.7 Rectângulo equivalente

O rectângulo equivalente é o rectângulo com área e perímetro iguais aos da bacia, isto é:

2(Le+le) = P
Le * le = A

Pode-se ressolver as duas equações para obter Le e le:

2
P
Le = + P -A Só é válida para P ≥ 16 A
2

4 16
2
P
le = - P -A
4 16

A bacia do rio Malema tem A = 2,600 km2 e P = 342 km, donde se tira para o rectângulo
equivalente:

Le = 154 km;
le = 17 km.

Figure 2.10 Rectângulo equivalente do rio Malema

A figura 2.10 faz a representação do rectângulo equivalente para a bacia do rio Malema. Nele
marcaram-se as várias curvas de nível espaçadas de formas a representarem as correspondentes
áreas. Por exemplo, a área entre as curvas de nível de 700 e 800 m é de 20 x 17 = 340 km2 . As
áreas são obtidas a partir da curva hipsométrica.

2.4.8 Índice de declive médio

O índice de declive médio, Ii, entre as curvas de nível de cotas Zi e Zi-1 é dado pela relação:
Z i - Z i -1
Ii = 2,
Xi
em que Xi é a distância entre as duas curvas de nível no rectângulo equivalente. Por exemplo, no
caso da bacia do rio Malema, o índice de declive médio entre as cotas 1,300 e 1,400 m é:

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1,400 - 1,300
I= = 0.0159
6,300

enquanto que ele é apenas de 0,0024 entre as cotas 600 e 700 m.

2.4.9 Índice de declive de Roche

O índice de declive de Roche, Ip, é o índice de declive médio para toda a bacia. No exemplo do
rio Malema, o rectângulo equivalente permite calcular

1,900 - 465
I p= = 0.00932
154,000

2.4.10 Índice de declive global

O índice de Roche é muito afectado se a bacia tiver pequenas áreas de grande altitude. Afim de
representar mais fielmente as características médias da bacia, o índice de declive global, Ig,
exclui as áreas correspondentes aos 5% mais altos e aos 5% mais baixos da bacia:

Z 5 - Z 95
Ig=
Le

Para a bacia do Malema, obtem-se:

1,400 - 540
Ig= = 0.00558.
154,000

Como é evidente, Ig é sempre inferior a Ip. Os valores de Z5 e Z95 são obtidos a partir da curva
hipsométrica.

2.4.11 Curva hidrodinâmica

A curva hidrodinâmica representa, a menos dum factor constante, as possibilidades energéticas


da bacia.

Se se considerar um volume de água V caindo duma altura h, a energia potencial que lhe
corresponde é

En = ρgVh Joules (com as unidades do Sistema Internacional), ou


En = 2,722 Vh KWh (com V em Mm3 e h em m).

Considere-se agora o caso dum rio sem afluentes onde estão identificadas diversas secções

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(figura 2.11) e marquem-se os pontos (Vi, hi).

Figure 2.11 Curva hidrodinâmica


h é a cota da secção e V o volume anual médio que nela se escoa. A área delimitada pela curva
V(h) multiplicada pelo factor 2,722 dá a energia potencial total correspondente ao escoamento do
rio, designando-se por potencial fluvial bruto.
h max
En = 2,722 ∫ Vdh 3
0

Considere-se agora o caso dum rio com afluentes como se representa na figura 2.12. O processo
de representação da curva V(h) pode ser repetido para o rio principal e para os afluentes, à
semelhança do caso anterior, permitindo determinar o potencial fluvial bruto de cada afluente e
da totalidade da bacia.

Figura 2.12 Curva Hidrodinâmica para um rio principal e os


afluentes

A determinação do potencial fluvial bruto implica o conhecimento dos volumes escoados nas
diversas secções. Quando tal não acontece e se dispõe apenas de cartas topográficas com a
indicação da rede de drenagem, pode utilizar-se a curva hidrodinâmica para uma primeira ideia
do potencial energético da bacia.

A curva hidrodinâmica baseia-se na hipótese da proporcionalidade entre áreas drenadas e


volumes escoados:

V1 =V2 =V3
= ... = K,
A1 A2 A3

hipótese válida em primeira aproximação desde que toda a área tenha características climáticas,
geológicas e de solos homogéneas. Então:

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h max h max
En = 2,722 ∫0
V ⋅ dh = 2,722 K ∫
0
A ⋅ dh

Portanto, se se traçar uma curva semelhante às das figuras 2.11 e 2.12 mas em que os volumes
escoados são substituidos pelas correspondentes áreas de drenagem, teremos a curva
hidrodinâmica.

Para se obter o valor do potencial energético multiplica-se a área delimitada pela curva
hidrodinâmica pelo factor (2,722 * K). O valor de K pode ser estimado por uma das seguintes
vias:

• se numa secção (de preferência, a jusante) se conhecer o valor do volume anual médio V e
sendo A a respectiva área drenante, virá K = V/A, com K em m se V em Mm3 e A em km2.
• se não houver quaisquer dados de escoamento na bacia, utilizar o valor de K calculado para
uma bacia vizinha com características similares.

As figuras 2.13 e 2.14 apresentam as curvas hidrodinâmica e do potencial fluvial bruto da bacia
do Malema. As curvas diferem entre si porque a bacia não tem características homogéneas de
precipitação e, por isso, os escoamentos não são proporcionais às áreas.

2.4.12 Coeficiente de massividade

O coeficiente de massividade é o quociente entre a altura média da bacia, em metros, e a sua


área, em km2. O coeficiente de massividade da bacia do rio Malema é de 340/2,600 = 0.13. Este
coeficiente toma valores elevados para pequenas bacias com grandes desníveis e valores baixos
para grandes bacias de relevo pouco acentuado. No entanto, os respectivos valores podem ser os
mesmos para bacias muito diferentes. Por exemplo, uma bacia pequena com relevo pouco
acentuado e uma bacia grande com grandes desníveis podem ter valores muito próximos de
coeficiente de massividade.

2.4.13 Coeficiente orográfico

O coeficiente orográfico é o produto da altura média pelo coeficiente de massividade. O


coeficiente orográfico permite fazer a distinção de situações em relação às quais o coeficiente de
massividade dá indicações dúbias. Admite-se que a fronteira entre relevo pouco acentuado e
relevo acentuado é marcado pelo valor do coeficiente oregráfico igual a 6. O coeficiente
orográfico da bacia do rio Malema é de 44.

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Figura 2.13 Curva hidrodinâmica do rio Malema e alguns


afluentes

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Figura 2.14 Curvas do potencial fluvial bruto da bacia do rio


MalemaCARACTERÍSTICAS DE GEOLOGIA, SOLOS E VEGETAÇÃO

A geologia duma bacia hidrográfica e o tipo de solos dela resultante têm uma grande influência
no movimento da água na bacia, em particulação no que toca ao escoamento, superfical e
subterrâneo.

A geologia define a existência de formações permeáveis e impermeáveis e de aquíferos bem


como a forma como os aquíferos são alimentados e contribuem para alimentar o escoamento dos
rios. A geologia condiciona a localização do nível freático que tem grande importância para o
fenómeno da evapotranspiração. Os rios que comunicam com importantes lençóis freáticos são
normalmente rios perenes, com caudais significativos mesmo durante as estiagens.

O tipo de solos e das camadas geológicas superficiais condicionam fortemente a permeabilidade


dos terrenos e, consequentemente, a infiltração, fenómeno que está na base da recarga dos
aquíferos. Terrenos pouco permeáveis dão origem a que toda a precipitação se transforme
rápidamente em escoamento superficial, gerando por isso cheias mais intensas e de menor
duração.

A geologia e os solos duma bacia são também importantes factores condicionantes da erosão
superficial. As formações mais recentes (do Holoceno e Pleistoceno) assim como formações
calcáreas e graníticas muito alteradas são as mais fácilmente erodíveis. A erosão superficial nos
terrenos da bacia hidrográfica constitui a fonte do caudal sólido que tem de ser transportado pelo
rio.

A cobertura vegetal também tem bastante importância para os fenómenos hidrológicos. Duma
maneira geral, terrenos com florestas e matas têm maiores infiltrações e menores velocidade de
escoamento superficial do que terrenos nus ou cultivados. Isso ajuda a diminuir a erosão
superficial dos terrenos e origina cheias mais prolongadas e menos intensas. Por outro lado, o
tipo de vegetação influencia fortemente o fenómeno de evapotranspiração.

A geologia, os solos e a vegetação têm importância não apenas em grandes bacias hidrográficas
mas mesmo em pequenas bacias urbanas, como é evidenciado pelos grandes problemas de
erosão que se verificam em algumas das principais cidades de Moçambique como Maputo,
Nampula, Nacala e Pemba.

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