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2020/930101204329-17685-JEF

PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais de São Paulo
Alameda Jau, 389 - Jardim Paulista - CEP 01420-001
São Paulo/SP Fone: (11) 2766-8911

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TERMO Nr: 9301177214/2020
PROCESSO Nr: 0003540-90.2017.4.03.6321 AUTUADO EM 04/10/2017
ASSUNTO: 040108 - PENSÃO POR MORTE (ART. 74/9) - BENEF. EM ESPÉCIE/ CONCESSÃO/ CONVERSÃO/
RESTABELECIMENTO/ COMPLEMENTAÇÃO
CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO
RECTE: CRISTIANE EDREIRA LOPEZ
ADVOGADO(A)/DEFENSOR(A) PÚBLICO(A): SP254945 - RAUL MARTINS FREIRE
RECDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - I.N.S.S. (PREVID) E OUTRO
ADVOGADO(A): SP999999 - SEM ADVOGADO
DISTRIBUIÇÃO POR SORTEIO EM 07/08/2020 12:18:15

JUIZ(A) FEDERAL: FERNANDA SOUZA HUTZLER

[# I – RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela corré CELINA PEREIRA DO CARMO em face da
sentença que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido da parte autora para reconhecer a
existência de união estável por mais de anos entre ela e o segurado falecido Inocêncio Pereira do Carmo e
determinou o restabelecimento da pensão a partir da data da audiência (08/10/2019). Foi concedida a tutela de
evidência para determinar ao INSS o desdobramento do benefício com a implantação da cota de pensão por
morte à autora.

Em suas razões recursais (arquivo 69) a corré CELINA PEREIRA DO CARMO sustenta
que não ficou comprovada a existência de união estável, bem como a dependência financeira em relação ao
falecido. Afirma que não ficou comprovada a existência de conta bancária em comum. Argumenta que a
recorrida desvirtuou as provas que deveria produzir, pois apenas juntou documentos relativos a processos que
tramitam e tramitaram na Justiça Estadual. Alega que a autora juntou fotografias aleatórias, sem especificar
datas. Acrescenta que os depoimentos não comprovam a alegada união estável. Afirma que estava acostumada
com o fato de que o falecido tinha relacionamentos extraconjugais, embora sempre arcando com as despesas
dela. Alega que a escritura pública de união estável declara um período que não corresponde à realidade, pois,
embora o falecido tivesse mantido um relacionamento com a recorrida, nunca residiram juntos nem as
testemunhas conseguiram precisar o período de forma clara. Por estas razões, pretende a reforma da r. sentença
ora recorrida.

O INSS informou o cumprimento da determinação judicial, com a reativação do NB 21/


180.213.035-4, com DIP em 01/05/2020 (arquivo 71).

Apenas a autora apresentou contrarrazões (arquivo75).

É o relatório.

II – VOTO

O benefício postulado de pensão por morte independe de carência e tem dois requisitos
essenciais para a sua concessão: qualidade de segurado do instituidor até a data do óbito e a qualidade de
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dependente da beneficiária. Em se tratando de cônjuge ou companheiro, dependentes integrantes da primeira


classe prevista no art. 16, I, da Lei 8.213/91, a dependência econômica é presumida.

Toda a controvérsia limita-se à efetiva existência da união estável por mais de dois anos entre
a autora CRISTIANE EDREIRA LOPEZ (nascida em 26/03/1972) e o segurado falecido (Inocêncio Pereira
do Carmo, óbito em 24/11/2016), na forma do artigo 77, §2º, V, “c”, item 6 da Lei nº 8213/91, visto que a
qualidade de segurado do suposto instituidor já restou certificada na r. sentença.

Pois bem.

A união estável é a convivência entre homem e mulher, alicerçada na vontade dos conviventes,
de caráter notório e estável, visando à constituição de família (VIANA, Marco Aurélio S., “Da União Estável”.
São Paulo, Saraiva, 1999, p. 29). Alguns elementos importantes para a configuração desse estado de fato são
extraídos do conceito: fidelidade presumida dos conviventes, notoriedade e estabilidade da união, comunidade de
vida e objetivo de constituição de família, conforme previsto no artigo 1.723, caput, do CC c/c art. 226, § 3º, da
CF.

Como se vê, a caracterização da união estável exige que a convivência seja pública, contínua,
duradoura e com o objetivo de constituição de família.

Esclareço, ademais, que a Turma Nacional de Uniformização (TNU), sensibilizada com a


dificuldade encontrada pelos conviventes para demonstrar a existência da união estável, em alguns casos, firmou
posicionamento no sentido de que a união estável pode ser comprovada por outros meios de provas admitidos
em direito, que não somente a prova documental. Nesse sentido é a Súmula 63 da TNU: “A comprovação de
união estável para efeito de concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material”.

É importante mencionar, aliás, que até então, a lei previa expressamente a necessidade de
início de prova material somente para a comprovação de tempo de serviço (art. 55 da Lei 8.213/91).

No entanto, recentemente, foi editada a Medida Provisória 871/2019, que introduziu o §5º ao
artigo 16 da Lei 8.213/91, passando a exigir o início de prova material contemporânea também para a
comprovação da união estável, exceto na ocorrência de motivo de força maior e ou caso fortuito.

De toda forma, o certo é que, se não houver início de prova material ou se a prova documental
se mostrar “fraca”, a prova oral deverá ser suficientemente robusta para comprovar a união estável.

No caso em concreto, a parte autora juntou prova documental e prova oral, alegando que
conviveu em união estável com o falecido desde 2007 até a data do óbito em 24/11/2016, visto que o mesmo se
encontrava separado de fato da corré CELINA PEREIRA DO CARMO, mas pagava pensão alimentícia à sua
ex-esposa. Vejamos.

A pensão por morte foi concedida administrativamente à corré CELINA na qualidade de (ex)
cônjuge que recebe pensão alimentícia, bem como, à autora CRISTIANE, na qualidade de companheira por
prazo inferior a 02 anos, com DIB em 24/11/2016 e DCB em 24/03/2017 (vide arquivo 10), pois a autarquia
previdenciária considerou a existência de união estável somente a partir de 05/03/2015 (fl. 33 do arquivo
3).

Primeiramente, constato que o segurado falecido (Sr. Alcides) veio a óbito com 73 anos de
idade (fl. 4 do arquivo 3), sendo certo que embora permanecesse com status de casado a corré CELINA
PEREIRA DO CARMO, restou comprovado que se encontravam separados de fatos, tanto que a própria corré
Celina ingressou com Ação de Alimentos contra seu ex-esposo, sendo que na petição inicial da citada ação, disse
que: “Ocorre que o Requerido passou a se relacionar com outra mulher, sua atual companheira, separando-se
de fato da Autora”, confessando, assim, tanto que não residiam mais no mesmo endereço e que não se
mantinham mais casados, quanto que o ex-cônjuge mantinha outra companheira à época (fls. 02 do arquivo 47).

A certidão de casamento (fl. 16 do arquivo 47) não contém averbações acerca de separação
consensual ou divórcio, o que não impede o reconhecimento de que os cônjuges tenham se separado de fato,
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em especial, diante da prova acima descrita.

A conta em nome do falecido no endereço situado à Rua Rangel Pestana, 26, apartamento
114, Centro/São Vicente (SP), datado em 25/12/2015 (fls. 4 do arquivo 49), que é o mesmo endereço da corré
CELINA (fl. 15 do arquivo 47), pode ser justificado pelo fato de ser comum, na prática, os ex-cônjuges que
saem de casa não transferirem todas suas contas para o novo endereço (ao menos por algum tempo ou até por
esquecimento).

A escritura de união estável entre a parte autora e o falecido foi lavrada em 05/03/2015 (
fls. 10-12 do arquivo 3) e, contendo a informação de convivência entre a autora CRISTIANE e o segurado
falecido desde o ano de 2007.

A alegada existência de conta conjunta com o falecido (fls. 23-26 do arquivo 3) não contém
data da formalização da contratação do serviço nem assinaturas.

Por sua vez, a autora foi a declarante do óbito na Certidão de Óbito e apresentou notas fiscais
de serviços funerários (fls. 4 e 21-22 do arquivo 3) e o comprovante de endereço em seu nome com cota
condominial com vencimento em 20/11/2016 indicando a rua Frei Gaspar, nº 2282, apartamento 15 – Parque
São Vicente/ São Vicente/SP.

Na certidão de óbito contém o endereço do falecido à Avenida Embaixador Pedro de


Toledo, 593, apartamento 704, Centro – São Vicente/SP, mesmo endereço constante da Ação de Alimentos
movida pela corré CELINA (fl. 12 do arquivo 2), o que demonstra que a própria corré indicou o endereço do
ex-marido como o mesmo da autora.

Em depoimento pessoal, a autora CRISTIANE disse que viveu com o falecido por 10 anos,
desde 2007, e, em 2015, fizeram uma escritura de união estável. Disse que residiu com o falecido, a partir de
2007, na Frei Gaspar e, a partir de 2009, na Embaixador Pedro de Toledo. Informou que o inventário ainda
está em curso e que o falecido pagava as despesas da corré. Disse que tinha conta poupança conjunta com o
falecido, em 2009/2010.

Muito embora no depoimento pessoal a corré CELINA tenha dito que “nunca se separou e
apenas foi residir em outro apartamento, mas sempre manteve relacionamento amoroso com ele”, na Ação de
Alimentos por ela interposta restou dito pela mesma que ingressou com ação de alimentos por ter se separado
de fato do falecido e que ele convivia com outra pessoa.

A informante Luciana informou que é amiga da autora e que o falecido era companheiro da
autora. Disse que eles residiam no Gonzaguinha, mas nunca foi até a casa deles. Informou que conheceu o
falecido como companheiro da autora no aniversário do primeiro ano do filho da depoente, que, atualmente, está
com 13 anos. Disse que viu a corré no enterro e que desconhece a convivência entre esta e o falecido.

A informante Maria Del Carmem disse que era amiga íntima do casal. Informou que a autora e
o falecido viviam em um apartamento na Biquinha e que, a partir de 2009, passou a conviver com o casal, na
casa deles e na da depoente. Aduziu que, inclusive, a depoente e o marido chegaram a viajar com a autora e o
falecido. Disse que com o marido encontraram a autora e o falecido na praia, em 2007, e este apresentou aquela
como companheira, na ocasião. Disse que o casal chegou a residir no apartamento da Frei Gaspar, mas não
frequentou este local, só o da Biquinha.

A testemunha Maria Aparecida disse que conheceu a autora por meio do falecido, quando eles
passaram a conviver. Informou que conhecia o falecido desde 2004 e que era sua manicure e o atendia
inicialmente no salão e, a partir de 2006, na residência da depoente, às sextas-feiras. Disse que ele mencionava
que estava vivendo com outra pessoa e que estava feliz. Afirmou que ele lhe disse que residiu na casa dela e que,
depois, voltou para a casa dele. Disse que a autora não era mera namorada do falecido e que eles conviveram
cerca de 10 anos juntos. Esclareceu que conhece a corré e que, nas conversas que tinha com o falecido, soube
que eles não mais possuíam relação amorosa.

Desse modo, restou claro que a prova documental e a prova testemunhal foram coerentes e
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uníssonas quanto a comprovação da existência de união estável entre a autora e o falecido por mais de dois
anos.

Assim, os elementos constantes dos autos são suficientes para a conclusão de que a autora
viveu por mais de dois anos com o falecido.

Portanto, o restabelecimento da pensão por morte à autora é devido, devendo a r. sentença ser
mantida pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei 9.099/95.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso da corré CELINA PEREIRA DO


CARMO.

Condeno a parte autora, recorrente vencida, ao pagamento de honorários advocatícios, que


fixo em 10% do valor atualizado da causa. Na hipótese, enquanto a parte for beneficiária de assistência judiciária
gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98 do Código de Processo
Civil.

É o voto.

<#III - ACÓRDÃO

Visto, relatado e discutido este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a
Décima Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região – Seção Judiciária de São
Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora
Fernanda Souza Hutzler.

São Paulo, 24 de setembro de2020 (data do julgamento). #>#]#}

FERNANDA SOUZA HUTZLER

Juíza Relatora

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