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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.754.008 - RJ (2018/0176652-5)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO


RECORRENTE : H F - ESPÓLIO
REPR. POR : H F - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : LUIZ CLÁUDIO FÁBREGAS E OUTRO(S) - RJ030130
MARCELO FÁBREGAS - RJ144875
TAWNNI BARCELLOS RABELLO - RJ196797
RECORRENTE : AMB F
ADVOGADO : LUIZ CLAUDIO DE LIMA GUIMARAES COELHO E OUTRO(S) -
RJ096724
RECORRIDO : M DA F
ADVOGADO : AFONSO FEITOSA E OUTRO(S) - RJ023409
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DE


DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE ARROLAMENTO
E PARTILHA DE BENS. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE A
CASAMENTO SEM SEPARAÇÃO DE FATO.
1. À luz do disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, a
pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não está na
inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência
de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende
proteção jurídica. Nesse viés, apesar de a dicção da referida norma
também fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que,
normalmente, precede a separação de direito e continua após tal ato
formal) que viabiliza a caracterização da união estável de pessoa casada.
2. Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou
seja, inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união
estável de pessoa casada. Nesse contexto normativo, a jurisprudência do
STJ não admite o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou de
união estável concomitante a casamento em que não configurada
separação de fato.
3. No caso dos autos, procedendo-se à revaloração do quadro fático
delineado no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de
cujus) mantiveram relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o
demandado era casado quando iniciou tal convívio, não tendo se separado
de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora sobre a
preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal)
não foi devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos
em sentido contrário.
4. Desse modo, não se revela possível reconhecer a união estável
alegada pela autora, uma vez que não foi atendido o requisito objetivo para
sua configuração, consistente na inexistência de relacionamento de fato
duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica.

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5. Uma vez não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável,
não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação
analógica da norma do casamento putativo à espécie.
6. Recursos especiais do espólio e da viúva providos para julgar
improcedente a pretensão deduzida pela autora.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do


Superior Tribunal de Justiça acordam, por unanimidade, dar provimento aos recursos
especiais de H F - ESPÓLIO e de A M B F, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os
Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente) e Marco
Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Sustentaram oralmente o Dr. LUIZ CLÁUDIO FÁBREGAS, pelas partes
RECORRENTES: H F - ESPÓLIO e A M B F, e o Dr. AFONSO FEITOSA, pela parte
RECORRIDA: M DA F
Brasília (DF), 13 de dezembro de 2018(Data do Julgamento)

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO


Relator

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VOTO

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhor Presidente, também eu


cumprimento os Advogados pelas combativas sustentações orais e cumprimento o
eminente Relator pelo minucioso voto, ao qual adiro. Penso que a pretensão deduzida
pela concubina vai contra a literalidade do art. 1.727 do Código Civil, segundo o qual as
relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar constituem
concubinato – o que ficou provado nos autos foi que eram relações não eventuais,
relações que perduraram mais de uma década, ou seja, não eventuais. Mas a lei já
descreve claramente o que significa uma relação não eventual entre um homem e uma
mulher impedidos de se casarem, a saber, o concubinato.
Tenho reservas à tese de que seja possível existir uma união estável
putativa. Penso que esse instituto existe para casamentos, os quais são atos formais.
Nos casamentos, ambos os cônjuges sabem que estão casados e, por alguma
circunstância desconhecida de ambos ou de algum deles, o ato formal não teve
validade. Por isso, a figura do casamento putativo.
O escopo que leva a proteger a boa-fé de quem praticou ato jurídico
formal, sem validade por motivo desconhecido do contraente, não pode ser meramente
transportado para o âmbito da união estável.
Ao se admitir o reconhecimento da figura da "união estável putativa", a
pretexto de proteção das várias espécies de relações familiares em tese possíveis no
âmbito dos fatos - e a variedade possível de fatos é infinita -, a rigor, estar-se-á
enfraquecendo ou mesmo eliminando a proteção de qualquer das espécies, casamento
ou união estável.
Isso porque quando se pretende proteger qualquer tipo de relacionamento,
na verdade todas as relações ficam sem proteção especial no ordenamento jurídico.
Mas essa questão haverá de ser melhor examinada em outro caso, cujo quadro fático
mais favoreça a construção dessa doutrina do que este, em que o minucioso voto do
eminente Relator mostra que os fatos tais como trazidos da origem, ainda que
merecesse amparo em nosso sistema jurídico a criativa teoria da união estável putativa,
não se adequariam, pois não haveria boa-fé. Portanto, acompanho o voto do eminente
Relator.

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RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. M. da F. ajuizou, em 8.8.2013, ação em face de H. F., postulando o


reconhecimento de união estável a partir de fevereiro de 1996 e a declaração de sua
dissolução em maio de 2013, juntamente com pedido de arrolamento e partilha dos bens
"construídos ou hauridos durante toda a convivência more uxorio, no percentual de 50%
(cinquenta por cento), conforme o regime legal adotado de separação parcial de bens ou
comunhão parcial de bens" (fl. 10).
Na inicial, a autora narrou que o casal se conhecera no Departamento de
Estradas de Rodagem do Estado do Rio de Janeiro no ano de 1995. Afirmou que, em
fevereiro de 1996, passaram a constituir uma relação more uxorio, "conforme se constata no
cartão comemorativo de 10 anos de 'casamento' da lavra do demandado que declara o início
da relação em 23/02/1996" (fl. 3). Alegou que seus filhos (de 14, 9 e 8 anos) tiveram total
ajuda material do "padrasto", considerando-o como verdadeiro pai socioafetivo, já que o pai
biológico era ausente. Assinalou que a ruptura da união estável ocorreu de forma unilateral,
em razão de o réu ter abandonado o lar conjugal.
Afirmou que, à época da propositura da ação, o demandado continuava a ajudar
no sustento da família, transferindo-lhe a quantia de R$ 70,00 (setenta reais) diariamente, de
R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais) toda sexta-feira e de R$ 6.800,00 (seis mil e
oitocentos reais) todo dia 5 de cada mês. Enfatizou que a união estável iniciou em 23.2.1996
(quando contava com 37 anos e o réu com 58) e findou em maio de 2013, após 17 anos de
convivência. Consignou que o casal não teve filhos em comum.
Asseverou que "em todos os grupos sociais os companheiros se
apresentavam de forma pública e notória se tratando por 'minha esposa', 'minha mulher',
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'meu marido', 'meu companheiro', 'minha companheira', 'meu amor'" (fl. 4). Expôs que,
durante os 17 anos de relação de fato, o réu construíra um sólido patrimônio, tendo sido,
inclusive, ganhador de um dos concursos da Mega Sena. Aduziu o fundado receio de extravio
e dissipação dos bens, pois, sendo o réu solteiro, não haveria óbice legal para a transferência
do patrimônio.
Em 22.8.2013, sobreveio decisão que deferiu parcialmente pedido de
antecipação de tutela, determinando: (a) o bloqueio de 50% (cinquenta por cento) dos saldos
das contas correntes e das aplicações financeiras do réu; e (b) a expedição de ofício à
Receita Federal para envio de cópia parcial da última declaração de renda apresentada pelo
demandado no tocante ao seu patrimônio (fl. 110). Em 15.8.2014, o juiz singular,
reconhecendo hipótese de litisconsórcio passivo necessário (por ser o réu casado),
determinou a inclusão de A. M. B. F. no polo passivo da demanda.
O magistrado de piso julgou procedente a pretensão autoral, por considerar
"demonstrada a união estável putativa com termo inicial em 23 de fevereiro de 1996 e termo
final em maio de 2013", determinando a partilha de 50% (cinquenta por cento) "de todos os
bens adquiridos durante a convivência da autora e de H. F., os quais deverão ser apurados
em fase de liquidação de sentença, respeitada a meação da viúva e esposa de H. F." (fl.
723).
Interpostas apelações pelo Espólio de H. F. (falecido em 17.8.2014) e por sua
viúva, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro negou provimento aos reclamos, nos
termos da seguinte ementa:
Família. União estável. Convivência more uxorio. Vínculo afetivo que não
era clandestino. Pessoas identificadas no meio social como um par. Mulher
com trato, nome e fama de esposa. Caracterizado o intuito familiae. Teoria
da primazia da realidade. Prova dos autos convincente e reiterada no
sentido de que a apelada e o de cujus mantiveram convivência pública,
contínua, duradoura e com a intenção de constituir família. Atendidas as
características da união estável, mencionadas no art. 1.723, caput, do NCC,
que reproduziu o art. 1º da Lei Federal 9278. Coabitação que não é
requisito essencial para a caracterização da união estável. Súmula 382 do
STF. Companheiro casado. Família constituída em afronta aos
impedimentos legais do art. 1.723, § 1º, do CC-02. Convivente mulher de
boa-fé. Possibilidade de ser reconhecida a união estável putativa. Se o
casamento pode ser putativo, não há razão para impedir a caracterização
da união estável como tal. Incidência da metodologia de integração (artigo
4º da LINDB), pois quando há a mesma razão, há o mesmo direito ("ubi
eadem ratio, ibi jus idem esse debet"). Aplicação do art. 1.561 do NCC, com
fundamento nos artigos 226 da CRFB e 4º da LINDB. Doutrina e
precedentes de diversos Tribunais de Justiça brasileiros no mesmo sentido.
Repercussão geral admitida pelo STF Tema 529. Pedidos subsidiários.
Incomunicabilidade do fundo da previdência privada complementar
determinada na sentença. Ausência de interesse recursal. Prêmio do

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concurso da Mega-Sena. Comunicabilidade prevista no art. 1.660, inciso II,
do CC-02. Sentença mantida. Honorários advocatícios majorados (art. 85, §
11, do NCPC). Apelações do espólio do falecido e de sua viúva
desprovidas.

No bojo do especial manejado pelo espólio, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do
permissivo constitucional, aponta-se, além de divergência jurisprudencial, violação dos
artigos 1.521, inciso VI, 1.723, caput e § 1º, e 1.727 do Código Civil. Em síntese, o recorrente
sustenta ser inviável conferir status de entidade familiar a uma relação meramente
concubinária, concomitante ao casamento, quando inexistente separação de fato. Pugna pela
impossibilidade de ser reconhecida união estável putativa à luz do ordenamento jurídico
brasileiro.
O recurso especial de A. M. B. F., também fundado nas alíneas "a" e "c" do
permissivo constitucional, traz arestos para confronto e indica ofensa aos artigos 1.521,
1.723, caput e § 1º, e 1.727 do Código Civil. Aduz, em resumo, que a relação eventual
mantida simultaneamente ao casamento não pode ser reconhecida como união estável.
Apresentadas contrarrazões aos apelos extremos, que receberam crivo
positivo de admissibilidade na origem.
É o relatório.

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DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE ARROLAMENTO
E PARTILHA DE BENS. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE A
CASAMENTO SEM SEPARAÇÃO DE FATO.
1. À luz do disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, a
pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não está na
inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência
de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende
proteção jurídica. Nesse viés, apesar de a dicção da referida norma
também fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que,
normalmente, precede a separação de direito e continua após tal ato
formal) que viabiliza a caracterização da união estável de pessoa casada.
2. Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou
seja, inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união
estável de pessoa casada. Nesse contexto normativo, a jurisprudência do
STJ não admite o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou de
união estável concomitante a casamento em que não configurada
separação de fato.
3. No caso dos autos, procedendo-se à revaloração do quadro fático
delineado no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de
cujus) mantiveram relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o
demandado era casado quando iniciou tal convívio, não tendo se separado
de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora sobre a
preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal)
não foi devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos
em sentido contrário.
4. Desse modo, não se revela possível reconhecer a união estável
alegada pela autora, uma vez que não foi atendido o requisito objetivo para
sua configuração, consistente na inexistência de relacionamento de fato
duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica.
5. Uma vez não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável,
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não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação
analógica da norma do casamento putativo à espécie.
6. Recursos especiais do espólio e da viúva providos para julgar
improcedente a pretensão deduzida pela autora.

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VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. A controvérsia dos autos está em definir se ocorreu na espécie o chamado


"concubinato de boa-fé", a desafiar ou não a aplicação analógica da norma do casamento
putativo (artigo 1.561 do Código Civil).
O Tribunal de origem manteve a sentença que julgou procedente a pretensão
autoral, considerando demonstrada a união estável putativa e determinando a partilha de 50%
dos bens adquiridos durante a convivência, ressalvada a meação da viúva, pelos seguintes
fundamentos:
(...)
8. Recursos dos réus (Espólio e viúva) contra sentença, proferida em
13.05.2016, que, em ação de reconhecimento de união estável cumulada
com partilha de bens e medida cautelar de arrolamento de bens, declarou a
existência do convívio entre a autora (Marta) e o 1º réu (Hélio), no período
entre 23.02.1996 a 05.2013 e determinou "que sejam partilhados 50% de
todos os bens adquiridos durante a convivência ..., os quais deverão ser
apurados em fase de liquidação de sentença, observando as regras
estampadas nos artigos 1.659 e 1.660 do Código Civil, respeitada a meação
da viúva [Ana Maria]".
(...)
11. Os recorrentes pretendem afastar o reconhecimento da união estável,
sob a alegação de que a convivência entre a apelada e o falecido não tinha
o intuito de formar família. Contudo, eles não têm razão. Senão vejamos:
12. A autora-apelada (Marta), na inicial, alegou que viveu em união estável
com Hélio Farah, autor do espólio e marido da 2ª ré, no período entre
02.1996 e 05.2013, ou seja, por quase 17 anos. Diz que o relacionamento
se iniciou quando ela "tinha 38 anos e o demandado 58 anos". Assim, a
união entre eles terminou quando a demandante tinha 54 anos de idade.
13. O 1º réu-apelante (Espólio), por sua vez, negou a união estável com a
autora. Reconheceu, apenas, que mantiveram relacionamento adulterino,
na medida em que ele era casado com a 2ª ré (Ana Maria).
14. A 2ª ré-apelante (Ana Maria) confirmou que era casada, pelo regime da
comunhão universal de bens, com o alegado companheiro da autora.
Afirmou, ainda, que mantiveram íntegros os laços matrimoniais desde o
esponsal, em 10.05.1965, até a morte de Hélio Farah.
15. Nesse contexto, verifica-se ser incontroverso (art. 334, III, CPC-73,
repetido no art. 374, III, do CPC-15) que a autora e Hélio mantiveram
relacionamento amoroso no período entre 02.1996 e 05.2013.
16. A primeira questão a ser enfrentada está em verificar se o
relacionamento entre a autora (Marta) e Hélio Farah tinha as características
da união estável, mencionadas no art. 1.723, caput, do NCC, que
reproduziu o art. 1º da Lei Federal 9278: convivência pública, contínua e
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duradoura estabelecida com a intenção de constituir família.
17. Neste ponto, se aplica, in casu, o Código Civil de 2002. Isso porque,
apesar de a convivência entre a autora e o morto ter se iniciado
anteriormente, ela se prorrogou após vigência daquela norma (11.01.2003).
(...)
19. Estabelecida a norma aplicável, cabe mencionar que a prova dos autos
é firme no sentido de que a apelada e o de cujus mantiveram convivência
pública, contínua, duradoura e com a intenção de constituir família.
Vejamos:
20. Os documentos que instruem a inicial demonstram que a autora e Hélio
Farah convivam como se casados fossem. Neste ponto, vale transcrever
trecho da sentença proferida pelo juiz de Direito Carlos Ferreira Antunes:
"As cópias de documentos e fotografias revelam que HELIO FARAH
mantinha relacionamento amoroso com a autora e convivia com ela e
os filhos dela, participando com estes e amigos de eventos sociais e no
âmbito familiar da autora (fls. 18120, 25127, 72 e 3881412); efetuava
depósitos regulares na conta da autora; declarava residir no mesmo
endereço dela conforme se vê no contrato particular de cessão de
direitos de posse celebrado por ambos em 31 de março de 2004 (fls.
40141); recebia faturas de cartão da CEF e da TELEMAR (fls. 42 e
54).
Há documentos com registros de viagens aéreas feitas por HÉLIO
FARAH e a autora e fotografias de ambos nestes eventos (fls. 43145 e
47153).
A cópia do contrato de locação do imóvel localizado na Rua Quintino
Bocaiúva, 233, bloco II, apartamento 304, São Francisco - Niterói - RJ
revela que HÉLIO FARAH alugou o imóvel em 18 de novembro de 2004
e nesta oportunidade se declarou 'solteiro', sendo que a autora
assinou o contrato de locação na qualidade de testemunha,
observando-se que para este endereço eram remetidas
correspondências endereçadas ao HÉLIO FARAH (fls. 57165, 69170).
A cópia da procuração outorgada por instrumento público em 09 de
janeiro de 2008 por HÉLIO FARAH à autora revela que também nesta
oportunidade ele se declarou 'solteiro' e residente na Avenida Quintino
Bocaiúva; nesta oportunidade HELIO FARAH afirmou que a autora era
a "sua companheira" e a ela conferiu poderes para representá-lo junto
ao Condomínio Residencial Bella Vitta, situado na Rua Santa Rosa, n°
91, Santa Rosa, Niterói, imóvel que por ele foi adquirido (fls. 71 e
3641377); e neste condomínio HELIO FARAH residia, conforme se
infere da advertência por ele recebida pela conduta de seu filho (na
verdade, filho da autora) (fl. 75)."
21. A prova oral ratifica tal assertiva. Observemos:
22. A autora Marta Fonseca, em seu depoimento pessoal (TJe 625/627),
declarou que:
"... conheceu Hélio Farah em seu ambiente de trabalho por volta de mil
novecentos e oitenta e três ou oitenta e quatro; que o Hélio trabalhava
em outro setor, mas na mesma repartição em que a depoente
trabalhava; que em mil novecentos e noventa e cinco a depoente
auxiliou a secretariar o gabinete do Hélio Farah porque a secretária
dele estava de férias; que o relacionamento afetivo da depoente com
Hélio Farah começou no carnaval do ano de mil novecentos e noventa
e seis; que a depoente ouvia dizer que o Hélio Farah era casado; que
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Hélio Farah dizia que o pessoal da repartição inventava histórias e que
não era casado; que a depoente namorou com Hélio Farah uns oito ou
nove meses e depois iniciou um relacionamento sério de dormir em
casa e de frequentar a casa da depoente; que Hélio Farah passou a
dormir direto na casa da depoente a partir do momento em que passou
a frequentar a casa da depoente; que Hélio Farah viajava muito a
trabalho e participava de congressos e nessas oportunidades o Hélio
Farah passava uma semana ou duas semanas fora da casa da
depoente; que as viagens do Hélio Farah ocorriam uma vez por ano,
por ai, pelo que esta lembrando a depoente; que a depoente soube
que Hélio Farah tinha uma filha chamada Heliana; que Heliana já era
uma moça quando a depoente começou a se relacionar com Hélio
Farah; que a primeira vez que a depoente falou com Heliana pelo
celular do Hélio Farah a depoente já convivia com ele uns quatro anos;
que a depoente falou somente duas vezes com Heliana; que a
depoente não conversou com Heliana a respeito de conviver com o pai
dela; que Hélio Farah dizia que Heliana tinha conhecimento; que a
primeira vez que a depoente viu a esposa do Hélio Farah foi na
primeira audiência que teve aqui no fórum; que não conversou com a
esposa do Hélio Farah; que Hélio Farah dizia para a depoente que
Heliana era filha de um relacionamento dele com uma pessoa com a
qual ele não era casado; que por volta de julho de dois mil e treze a
depoente se separou de Hélio Farah porque descobriu que ele estava
tendo um caso com uma secretária da repartição dele; que Hélio Farah
falou para a depoente que tinha acabado o sentimento e saiu da casa
da depoente; que durante a convivência com Hélio Farah a depoente
ia a festas na casa de parentes da depoente, tias, primas, foram
pouquíssimas vezes; que a depoente não visitava parentes do Hélio
Farah porque ele dizia que não se dava bem com os parentes dele, os
irmãos dele, e que ele evitava contato com esses parentes, porque
sempre que se encontravam eram brigas e cobranças; que a depoente
frequentava restaurantes, teatros, shows, barzinhos e boates; que a
depoente e Hélio Farah tinham amigos que participavam destes
momentos; que o filho mais velho da depoente tinha onze anos de
idade quando a depoente começou a conviver com Hélio Farah e trinta
e dois anos de idade quando a depoente deixou de conviver com Hélio
Farah, a depoente acha que é isso; que o apoio total aos filhos da
depoente foi dado pelo Hélio Farah; que Hélio Farah pagou as
faculdades dos três filhos da depoente; que o filho caçula da depoente
Felipe parou a faculdade no último período de veterinária porque o
Hélio Farah parou de pagar a faculdade e a depoente não tem
condição de pagar; que a depoente morava em casa alugada e era o
Hélio Farah quem pagava; que Hélio Farah era o locatário nos vários
contratos de locação dos imóveis onde a depoente morou com ele; que
a depoente mudou de endereço com o Hélio Farah umas sete ou oito
vezes durante a convivência; que as despesas com aluguel,
condomínio, IPTU, empregada doméstica eram pagas pelo Hélio
Farah; que a depoente usava o salário da depoente para pagar as
despesas da depoente e o vestuário dos filhos; que a depoente
perguntou várias vezes ao Hélio Farah se ele era casado e ele sempre
negou, que era mentira; que a depoente só ficou sabendo que o Hélio
Farah era casado depois que entrou com o processo contra ele; que a
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depoente e o Hélio Farah não adquiriram imóveis ou veículos durante
o tempo em que conviveram; que a depoente e o Hélio Farah tinham
contas correntes separadas. Dada a palavra ao patrono do espólio
de Hélio Farah, às perguntas formuladas, respondeu: que Hélio
Farah não usava aliança; que Hélio Farah durante a convivência da
depoente com ele passou algumas festividades de Natal com a
depoente; que algumas festividades de Natal o Hélio Farah passava
com a mãe dele que era doente e a depoente passava com a mãe
dela; que toda vez que o Hélio Farah tinha contato com os irmãos ele
se aborrecia porque eles se queixavam porque o Hélio Farah estava
bem de situação e achavam que ele tinha obrigação de ajudá-los; que
a depoente é solteira; que a depoente nunca conversou com Hélio
Farah sobre casamento, porque vivia muito bem com ele e não seria
um papel que iria mudar; que a depoente tem o segundo grau, ensino
médio; que Hélio Farah ficou doente depois que a depoente e ele
estavam separados; que a depoente não visitou o Hélio Farah quando
ele estava doente porque ele se afastou completamente da depoente;
que Hélio Farah virou a cara para os filhos da depoente quanto eles
tiveram neste local na última audiência; que a depoente e os filhos não
foram ao enterro do Hélio Farah pelo mesmo motivo; que Hélio Farah
passava com a depoente as festividades de carnaval, páscoa, ano
novo, a não ser que estivesse visitando a mãe dele, pelo que ele dizia
a depoente; que normalmente o Hélio Farah passava os finais de
semana na casa da depoente. Dada a palavra ao patrono da ré Ana
Maria Balaguer Farah, as perguntas formuladas, respondeu: que a
secretária do Hélio Farah se chama Sônia Shilling; que a depoente
não chegou a substituir a Sônia, mas anotava os recados que eram
recebidos por telefone na sala da depoente; que a depoente tinha bom
relacionamento com a Sônia e com todos dentro do departamento
onde a depoente trabalhava; que a depoente nunca trabalhou
diretamente com Hélio Farah; que Hélio Farah só tinha dificuldade de
relacionamento com os irmãos; que a mãe do Hélio Farah já não
estava praticamente falando ou andando e nem reconhecia mais as
pessoas; que a depoente convivia com Hélio Farah quando a mãe dele
morreu; que a depoente visitou a mãe do Hélio Farah, mas ela já não
reconhecia as pessoas nesta época; que a depoente não foi ao
enterro da mãe do Hélio Farah; que a mãe do Hélio Farah se chamava
Adélia; que a depoente não sabe para onde o Hélio Farah se mudou
depois que se separou da depoente; que os filhos da depoente têm
adoração pelo Hélio Farah, que é o pai que eles conheceram; que a
primeira vez que a depoente viu a filha do Hélio Farah foi aqui na
audiência anterior; que várias vezes a depoente fez festas de
aniversário do Hélio Farah na casa da depoente; que muita gente do
DER ia nesses aniversários; que a depoente acreditava que Hélio
Farah era solteiro porque todos os documentos dele constava como
solteiro; que a depoente fazia declaração de renda separada da
declaração do Hélio Farah; que a depoente reconhece que a
depoente e o Hélio Farah estão nas fotos de fls. 28, 34 e 35." (grifos
do relator).
23. A filha do falecido, Heliana Fara, por sua vez, declarou (TJe 630/1 -
631/1) que:
"...ficou sabendo da existência da Marta da Fonseca um pouco antes
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deste processo porque seu pai achava que ela de algum meio ilícito
havia descoberto quanto ele possuía na conta; que quem falou sobre
Marta da Fonseca foi o pai da depoente; que a depoente nunca tinha
visto Marta da Fonseca e a primeira vez que a viu foi na audiência
anterior; que a depoente já havia ouvido falar o nome da Marta da
Fonseca, mas o pai da depoente disse que ela era uma sócia de um
amigo dele Celso Ramos; que uma vez a depoente ligou para o
telefone celular do pai da depoente e quem atendeu foi a Marta da
Fonseca; que a depoente ligou em maio ou junho de dois mil e treze
quando a Marta atendeu ao telefone celular do pai da depoente; que
Marta passou o telefone para o pai da depoente; que a depoente não
conversou com Marta; que o pai da depoente falou que tinha ido à
casa da Marta em Niterói para descobrir qual a forma que ela tinha
usado para descobrir o que ele tinha na conta; que a depoente não
teve nenhum outro contato com Marta; que a depoente foi somente
umas cinco ou seis vezes no local de trabalho de seu pai na sede do
DER-RJ; que a depoente chegou a ir ao laboratório onde o pai da
depoente trabalhava quando a depoente ainda era criança; que o pai
da depoente falou para a depoente que a Marta era amante dele; que
o pai da depoente falou que tinha várias amantes além da Marta; que
o o pai da depoente falou que fazia tempo que a Marta era amante
dele, mas não especificou quanto tempo; que o pai da depoente e
falou que conheceu a Marta no próprio DER; que a depoente morou
com seus pais até o ano de dois mil e sete; que a depoente nunca viu
o pai da depoente chegar fora de hora e nem dormir fora; que o pai da
depoente saía diariamente entre sete e meia e oito horas e voltava do
trabalho no máximo às seis horas da tarde; que todos os sábados e
domingos o pai da depoente ia jogar tênis no Tijuca Tênis Clube entre
sete da manhã e meio dia; que a depoente jogou tênis com seu pai até
mil novecentos e oitenta e sete e se ele fazia alguma coisa foi depois
disso; que a depoente acha que seu pai ganhou na Mega-Sena no
ano de dois mil e nove; que as vezes o pai da depoente ia em
congresso e ficava fora de casa cinco ou seis dias; que tinha ano que
tinha dois congressos e ano que não tinha congressos; que a
depoente passou todas as festas de Natal com seu pai e com sua
mãe; que a véspera de Natal era na casa da avó materna e o dia de
Natal era na casa da avó paterna até o ano de dois mil e dois ou dois
mil e três; que depois disso as festas eram na casa da depoente e dos
pais da depoente; que a avó paterna da depoente faleceu por volta de
dois mil e cinco ou dois mil e seis; que a avó paterna da depoente
faleceu com noventa e seis anos de idade; que quando fez noventa
ano a avó paterna da depoente já não reconhecia ninguém; que a
depoente tinha dois tios e um primo que trabalhavam na mesma
repartição do pai da depoente e eles nunca comentaram nada com a
depoente sobre os relacionamentos do pai da depoente, sempre foram
muito discretos; que um dos tios se chama Marcos Balaguer e o primo
se chama Jorge Henrique Farah; que o tio da depoente Marcos
Balaguer falou para a depoente que sabia de tudo; que Marcos
Balaguer falou para a depoente que todo mundo sempre soube do
relacionamento do pai da depoente com a Marta e com outras
mulheres; que o pai da depoente sempre deixou as coisas a margem
da família e todo mundo tratava como uma coisa boba; que todo
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mundo tratava como coisa boba o fato do pai da depoente ser
mulherengo; que o pai da depoente saía do trabalho por volta do meio
dia e voltava por volta de três e meia da tarde; que o pai da depoente
trabalhava na Presidente Vargas no Rio de Janeiro e vinha para
Niterói; que não era diariamente que o pai da depoente vinha para
Niterói; que o tio da depoente comentou com a depoente que o pai da
depoente vinha para Niterói para visitar a Marta; que a depoente sabe
que a Marta e seu pai trabalhavam no DER e na mesma repartição;
que a depoente não sabe se seu pai se encontrava com Marta além do
horário do almoço dele; que o tio da depoente não falou quanto tempo
durou o relacionamento do pai da depoente com a Marta (...)" (grifos
do relator).
24. A 1ª testemunha Jocélia Regina Forbrig arrolada pela autora relatou
(TJe 632/1-633/1) que:
"... que a depoente conheceu Hélio Farah em dois mil e dois quando
mudou para o prédio na avenida Quintino Bocaiúva, número duzentos
e trinta e três; que Marta apresentou o Hélio Farah para a depoente e
o marido da depoente; que Marta apresentou Hélio Farah como sendo
o marido dela e ele mesmo se intitulava assim; que a autora morava no
mesmo prédio que a depoente morava; que a depoente foi
apresentada ao Hélio Farah na área de lazer do prédio; que a
depoente encontrava o Hélio Farah no apartamento da Marta; que o
Hélio Farah levava livros para os filhos da Marta; que a depoente
encontrava com Hélio Farah no prédio onde a depoente e a Marta
morava com frequência, muitas vezes após as dezoito horas; que a
depoente conversava com Hélio Farah muitas vezes, nas reuniões de
condomínio no prédio ou na garagem do prédio (...)" (grifos do relator).
25. No mesmo sentido, foram as declarações da 2ª testemunha arrolada
pela autora, Heloan Barbara da Silva (TJe 634/1), que, na qualidade de
informante, disse:
"... que a depoente encontrou Hélio Farah muitas vezes na casa da
autora; que a depoente viu Hélio Farah na casa da autora em festas
de aniversários dela e dos filhos dela;
que a depoente ia à casa da autora em dias de festas; que a depoente
sempre morou em São Gonçalo e a depoente sempre morou em
Niterói;
que a depoente era colega de trabalho da Marta e do Hélio Farah; que
a depoente nunca conversou com Hélio Farah sobre o relacionamento
dele com a Marta; que a depoente encontrou com Marta e Hélio Farah
em festas de confraternização do DER; que Hélio Farah e Marta
ficavam de mãos dadas nas festas do DER, em várias festas de
confraternização, como se fossem um casal;
que todos da repartição sabiam que Marta e Hélio Farah eram um
casal; que nunca soube que Hélio Farah era casado; (...)" (grifos do
relator).
26. A 3ª testemunha arrolada pela demandante, Márcia Regina Barroso
Pereira disse (TJe 635/1-636/1) que:
"...viu os três filhos da Marta na casa dela nas vezes em que esteve lá,
em festividades; no aniversário da Amanda, da Marta e acha que
também chegou a ir ao aniversário do Felipe, filhos da Marta; que a
depoente só foi na casa da Marta em festividades; que algumas vezes
a depoente encontrou Hélio Farah nestas festividades; que a depoente
Documento: 1784964 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/03/2019 Página 14 de 6
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trabalhava na mesma repartição do Dr. Hélio Farah e da Marta; que no
início a Marta e o Hélio Farah se tratavam como colegas de trabalho;
que depois a depoente ficou sabendo que eles tinham alguma coisa e
depois veio a confirmação que os dois estavam morando juntos; que
ficou sabendo através do Hélio Farah e da Marta que eles tinham
resolvido morar juntos; que Hélio Farah e Marta e a depoente
saíram para comemorar numa churrascaria; que também foram a
comemoração vários colegas de trabalho da repartição onde a
depoente trabalhava com Hélio Farah e Marta; que a depoente entrou
no DER em março de mil novecentos e oitenta e dois e tinha mais de
dez anos de trabalho quando o Hélio Farah e a Marta falaram que iam
morar juntos; que não ficou sabendo se Hélio Farah tinha
relacionamento com outras mulheres na época em que a depoente
trabalhou com ele; que nunca chegou ao conhecimento da
depoente que o Hélio Farah era casado. Dada a palavra ao patrono
da autora, foi perguntado e respondido: que a depoente participou
de vários eventos da repartição junto com Hélio Farah e Marta e outros
amigos da repartição. Dada a palavra ao patrono / espólio de Hélio
Farah, nada foi perguntado. Dada a palavra ao patrono da ré Ana
Maria Balaguer Farah, foi perguntado e respondido: que no dia que
Hélio Farah e Marta comunicaram que iam morar juntos só houve o
almoço; que a depoente tinha contato frequente na repartição com
Hélio Farah; que Hélio Farah não usava aliança." (grifos do relator).
27. Verifiquem-se, ainda, que as declarações das testemunhas arroladas
pelos réus não são capazes de infirmar as afirmações das testemunhas da
autora. Aquelas apenas confirmam que Hélio Farah manteve seu matrimônio
com a 2ª ré. Vejamos:
"(...) que foi uma surpresa para a depoente quando falaram deste
processo; que pelo que sabe a depoente o Hélio Farah sempre
coabitou com a esposa; que Hélio Farah e a esposa nunca se
separaram e sempre conviveram e se apresentaram como marido e
mulher; que a depoente nunca soube que Hélio Farah tivesse
relacionamento com outra mulher além da esposa." (in depoimento da
informante Nanci Mahfuz, TJe 637, grifos do relator).
"(...) que nunca ouviu falar que Hélio Farah tivesse relacionamento
com outra mulher além da esposa dele. (...)" (in depoimento do
informante José Antonio Moreira, TJe 639, grifos do relator).
"(...) que o depoente começou a trabalhar como porteiro no prédio
onde morava o Hélio Farah em vinte de dezembro de mil novecentos e
oitenta e nove; que trabalha até hoje no mesmo prédio; que Hélio
Farah morava com a esposa e com a filha Heliana; que depois a
Heliana se mudou há alguns anos; que desde mil novecentos e
noventa e cinco o depoente trabalha durante o dia como porteiro; que
o depoente via o Hélio Farah todos os dias no prédio; que Hélio Farah
saía para trabalhar por volta de oito e oito e trinta e voltava por volta de
seis e meia da noite; que o depoente mora no prédio onde trabalha
como porteiro; que todos os dias, de manhã cedo, o Hélio Farah
descia para apanhar o jornal na portaria; que Hélio Farah toda a vida
morou no prédio com a esposa dele, que inclusive era síndico do
prédio quando faleceu." (in depoimento da testemunha Antônio
Severo Lobo, TJe 641, grifos do relator).
28. Nessa mesma linha, foram as declarações da 2ª ré (Ana Maria), verbi:
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"... Hélio Farah morou com a depoente até morrer; que Hélio Farah só
passava fora de casa da depoente quando tinha algum congresso em
que a depoente não pudesse ir; que a depoente costumava ir aos
congressos com Hélio Farah; que Hélio Farah nunca se afastou da
casa da depoente, sempre saia na mesma hora e sempre chegava na
mesma hora; que Hélio Farah saía de casa às oito ou oito e trinta
horas e retornava às cinco meia ou seis horas da tarde; que a
depoente nunca soube que o Hélio Farah tivesse relacionamento com
outra pessoa durante o casamento; que a depoente trabalhou como
auditora fiscal da Receita Federal do Brasil e foi treinada para ser
desconfiada; que a depoente recebeu um telefonema da gerente do
Banco do Brasil no dia primeiro de outubro de dois mil e treze quando
ela falou para a depoente que as contas estavam todas bloqueadas
por ordem da justiça; que a depoente ligou para a sua filha Heliana e
ela disse para a depoente que já tinha conversado com o pai e levado
para um advogado; que Heliana falou para a depoente que o pai tinha
tido um caso e ela e ele queriam preservar a depoente porque a
depoente tinha uma cirurgia marcada para uma semana depois; que
Heliana nunca comentou com a depoente que sabia de qualquer
envolvimento do pai com outra pessoa; que nunca soube que Hélio
Farah tivesse comentado alguma coisa com a filha; que Hélio Farah
tinha bom relacionamento com os cinco irmãos dele e com a mãe dele
e com as cunhadas dele; que a mãe do Hélio Farah não reconhecia
mais as pessoas uns dois anos antes de morrer porque teve Mal de
Parkinson; que Hélio Farah passava as festas de Natal na casa da
mãe dele, junto com todos os familiares; que as outras festas de
carnaval, pascoa e Ano Novo o Hélio Farah passava com a família dele
ou da depoente; que Hélio Farah tinha vários amigos engenheiros no
trabalho dele no DER-RJ; que a depoente e Hélio Farah frequentavam
festas nas casas destes amigos do Hélio ...; que a depoente nunca foi
ao local de trabalho do Hélio Farah da mesma forma que ele nunca foi
ao local de trabalho da depoente; que a depoente frequentava uma
vez por ano as festas da SEAPJ com o Hélio Farah (...)” (TJe 628/629,
grifos do relator).
29. Diante de tudo isso, ficou provado de forma convincente e reiterada que
Hélio e a autora eram reconhecidos no meio social como marido e mulher,
ficando, portanto, caracterizado o affectio maritalis, também chamado de
intuito familiae.
30. Isso porque o vínculo afetivo entre eles não era clandestino. Na
verdade, transbordava o limite do privado, na medida em que eram "duas
pessoas ... identificadas no meio social como um par" (in Maria Berenice
Dias, Manual de Direito das Famílias – 5ª ed. - São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009, p.165, grifei).
31. Adota-se, aqui, a teoria da primazia da realidade como parâmetro para a
aferir o intuito familiae, uma vez que este elemento subjetivo é identificado,
não a partir das declarações expressas dos conviventes, mas do
"tratamento real e concreto dispensado entre as partes. Se elas se tratam
como marido e mulher, mesmo que a relação seja denominada de um
simples namoro, será enquadrada nas latitudes e longitudes da união
estável" (in FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de direito civil: famílias,
volume 6 / Cristiano Chaves de Farias; Nelson Rosenvald. – 7. ed. rev.
ampl. e atual. – São Paulo: Atlas, 2015, p. 451).
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32. Desse modo, não deve ser acolhida a tentativa do ex-companheiro de
desqualificar a entidade familiar formada com a autora-apelada. Portanto,
conclui-se que ficaram caracterizados todos os requisitos da união estável
estabelecidos no artigo 1.723, caput, do NCC, que reproduziu o art. 1º da
Lei Federal 9278.
33. Cabe destacar, ainda, que a coabitação não é requisito essencial para a
caracterização da união estável. Aliás, a "Súmula 382 do STF dispensou a
vida more uxório dos concubinos. Ainda que tenha sido editada para
interpretar a palavra 'concubinato', para fins de investigação de
paternidade, restou cunhado novo conceito de concubinato, que cabe ser
estendido à união estável" (in Maria Berenice Dias, ibidem, p. 168).
34. A segunda questão a ser enfrentada se relaciona ao impedimento para
o de cujus constituir união estável, uma vez que ele ainda era casado com a
2ª ré. Sobre esse ponto, devem ser feitas algumas considerações. Vejamos:
35. O art. 1.723, § 1º, do CC-02 exige como requisito negativo para a
constituição da união estável que não haja impedimento absoluto para o
matrimônio, dentre eles, está a impossibilidade de o convivente ser casado.
36. Contudo, há doutrina acirrada na defesa de que "a negativa de extrair
efeitos jurídicos de situação existente não é a solução mais adequada para
atender aos elementares princípios da justiça e da ética" (ibidem, p. 168).
Sobre o tema, a professora Maria Berenice Dias (ibidem, p. 167) leciona
que:
"Com referência à união estável, contudo, não há como fazê-la
desaparecer. Dispõe a lei (CC 1.723 § 1º): a união estável não se
constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521. Ou seja, nas
mesmas hipóteses em que é vedado o casamento, é proibida a união
estável. No entanto, em que pese a proibição legal, se ainda assim a
relação se constitui, não é possível dizer que ela não existe. ... Tais
relações estão sujeitas à reprovação legal, mas nem por isso há algum
meio capaz de coibir sua formação. Como existem, não há como
simplesmente ignorá-las." (grifos do relator)
37. A doutrinadora gaúcha, ao discorrer sobre a importância dessa
controvérsia, explica que:
"Cabe questionar o que fazer diante de vínculo de convivência
constituído independente da proibição legal, e que persistiu por muitos
anos, de forma pública, continua, duradoura e, muitas vezes, com
filhos. Negar-lhe a existência, sob o fundamento de ausência do
objetivo de constituir família em face do impedimento é atitude
meramente punitiva a quem mantém relacionamentos afastados do
referendo estatal.
Rejeitar qualquer efeito a esses vínculos e condená-los à invisibilidade
gera irresponsabilidades e enseja enriquecimento ilícito de um em
desfavor do outro. O resultado é mais do que desastroso, é perverso.
... Com ou sem impedimentos à sua constituição, entidades familiares
que se constituem desfocadas do modelo oficial merecem proteção
como núcleo integrante da sociedade." (grifos do relator)
38. É nesse contexto que Maria Berenice Dias defende, também, que,
diante da possibilidade de atribuir efeitos ao casamento, embora nulo, mas
realizado de boa-fé, "em se tratando de união estável constituída em afronta
aos impedimentos legais, há que se invocar o mesmo princípio e reconhecer
a existência de uma união estável putativa. Estando um ou ambos os
conviventes de boa-fé, é mister atribuir efeitos à união, tal como ocorre no
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casamento putativo" (ibidem, p. 168, grifos do relator).
39. Assim, diante da excepcionalidade do caso, o fato de o falecido Hélio ter
o estado civil de casado, não impede o reconhecimento dos efeitos da união
estável. Isso porque foi provado que a companheira acreditava que ele era
desimpedido, uma vez que ele se apresentava e qualificava como solteiro
em diversos momentos, assinando, até, contratos. Portanto, aplica-se, aqui,
o art. 1.561 do NCC, por analogia, verbi:
"Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé
por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos
filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
§ 1o Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento,
os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.
§ 2o Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o
casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão." (grifos do
relator)
40. Note-se que não se está defendendo, neste julgado, a possibilidade de
famílias paralelas, tal como sustentam os apelantes. Mas a aplicação à
união estável de norma prevista para o casamento, em razão do método de
integração das normas (art. 4º da LINDB), pois quando há a mesma razão
(causa), há o mesmo direito (“ubi eadem ratio, ibi jus idem esse debet”).
41. Não se justifica atribuir efeitos jurídicos diferentes às diversas formas de
família. Isso porque "à união estável como entidade familiar, aplicam-se, em
conjunto, todos os efeitos jurídicos próprios da família, não diferenciando o
constituinte, para efeitos de proteção do Estado (...), a entidade familiar
constituída pelo casamento daquela constituída pela conduta espontânea e
continuada dos companheiros, não fundada em matrimônio" (in TEPEDINO,
Gustavo. Novas formas de Entidades Familiares: efeitos do casamento e da
família não fundada no matrimônio. In Temas de Direito Civil, 4. ed. Rio de
Janeiro: renovar, 2008, p. 408).
42. Aliás, podem ser citados, a título de exemplo, diversos direitos e deveres
que foram previstos expressamente na legislação de forma igualitária para
os cônjuges e companheiros: artigos 1.694 e 1.618; 1.566 e 1.724, todos do
CC-02, bem como os artigos 73, § 3º; 144; 145; 244, inciso II; 388, inciso III;
391, parágrafo único; 616, inciso I; 617, inciso I; dentre outros.
43. Partindo da mesma premissa, no julgamento do RE n. 878.694 (tema
809 da repercussão geral), sete Ministros do Supremo Tribunal Federal já
se manifestaram pela inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil,
por considerarem que a Constituição Federal garante a equiparação entre
os regimes da união estável e do casamento também no tocante ao regime
sucessório (ut
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo= 324282).
44. A inexistência de hierarquia entre as famílias constitucionalizadas
também foi o fundamento adotado pelo STF, ao julgar a ADI 4.277 (DJe
14.10.2011), para permitir o reconhecimento de união estável entre
pessoas do mesmo sexo, apesar de a lei civil mencionar expressamente
que, aquela família, é formada pela união entre homem e mulher. (...)
(...)
45. Diante de tudo isso e considerando que (i) não há dúvidas de que os
conviventes (Hélio e Marta) se comportavam como um casal, no período
entre 1996 a 2013, (ii) a companheira acreditava que Hélio era desimpedido
e (iii) não é possível tratamento diferenciado entre cônjuges e
companheiros, devem ser reconhecidos os efeitos da união estável em prol
Documento: 1784964 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/03/2019 Página 18 de 6
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da autora.
46. Neste ponto, oportuno esclarecer, ainda, que não se está declarando a
inconstitucionalidade do art. 1.723, § 1º, do NCC. O que se propõe é
aplicação à união estável da ressalva do art. 1.561 do NCC prevista para o
casamento, com fundamento no art. 226 da Constituição Federal e
autorizado pelo art. 4º da LINDB.
47. Nessa mesma linha, lecionam Cristiano Chaves de Farias e Nelson
Rosenvald (ibidem, p. 459/460), verbi:
"É certo que a histórica posição encontrada no direito brasileiro é no
sentido de negar todo e qualquer efeito às uniões paralelas,
buscando-se conferir prestígio ao princípio da monogamia. (...)
Todavia, não nos parece a melhor solução.
É que, apesar de ser inegável que a monogamia possui uma relevante
função ordenadora do sistema jurídico, não se pode ignorar a
existência de outros valores que, igualmente, norteiam as relações
familiares, como a dignidade da pessoa humana e a boa-fé.
Vislumbra-se, no ponto, uma colisão entre a monogamia e outros
valores como a dignidade e a confiança (boa-fé), reclamando uma
solução casuística. ...
Outrossim, considerando que o casamento pode ser putativo (veja-se,
a respeito, o art. 1.561 do Código Civil), quando apesar de nulo ou
anulável, um (ou mesmo ambos) cônjuge estiver de boa-fé (incorrendo
em erro desculpável), não se vê motivo para impedir a caracterização
da união estável como tal. Aliás, considerando o silêncio da normal
legal, trata-se de mero emprego da analogia como fonte do Direito,
como reza o art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro.
É importante pensar no caso concreto. Se uma pessoa já casada
resolve casar de novo ... e não esclarece para a segunda noiva sobre
o seu estado civil, induzindo a mesma a erro, provada a boa-fé, ela
poderá requerer ao juiz o reconhecimento da putatividade e, assim,
obter efeitos concretos do casamento... Ora qual seria o motivo para
tratar diferente a união estável? É claro que não existe qualquer
fundamentação para justificar que alguém que foi enganado em um
casamento obtenha efeitos que não seriam reconhecidos àquele que,
também enganado, vivia em união estável". (grifos do relator)
48. Sobre o tema, vale citar, também, as lições de Euclides de Oliveira (in
União estável: do concubinato ao casamento, 6. ed. São Paulo: Método,
2003, p. 139-140), verbi:
"Cumpre lembrar a possibilidade de união estável putativa, à
semelhança do casamento putativo, mesmo em casos de nulidade ou
anulação da segunda união, quando haja boa-fé por parte de um ou
de ambos os cônjuges, com reconhecimento de direitos. A segunda, a
terceira ou múltipla união de boa-fé pode ocorrer em hipótese de
desconhecimento, pelo companheiro inocente, da existência de
casamento ou de anterior paralela união estável por parte do outro."
(grifos do relator)
50. O Des. Matos Peres, quando da sessão de julgamento, lembrou que a
"possibilidade de reconhecimento jurídico de uniões estáveis concomitantes"
é objeto de repercussão geral (Tema nº 529 do STF) no Supremo Tribunal
Federal (in ARE 656.298- Rg/SE, Plenário, DJe 02.05.2012).
51. Ante ao exposto, rejeita-se a pretensão recursal dos apelantes,
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mantendo-se o reconhecimento da união estável putativa e de seus efeitos,
bem como a medida cautelar deferida. Dito isso, passe-se à análise dos
pedidos subsidiários.
- Pedidos recursais subsidiários
(...)
57. Em relação ao prêmio do concurso da Mega-Sena, a sentença foi
expressa ao determinar que "são excluídos da partilha os bens descritos no
art. 1.659 do Código Civil e entram na comunhão os bens elencados no art.
1.660 do Código Civil." (TJe 708/15).
58. O art. 1.660, inciso II, do CC-02, por sua vez, prevê que se comunicam
"os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho
ou despesa anterior".
59. Portanto, está evidente que o decisum recorrido reconheceu a
comunicabilidade de tais valores, tendo o apelante interesse recursal neste
ponto.
60. Contudo, apesar de ser admitido o recurso, ele deve ser desprovido, na
medida em que a norma reconhece expressamente o direito à meação
sobre o prêmio recebido durante a vida em comum, em razão de fato
eventual, que se caracteriza pela total sorte, tal como ocorre com a loteria.
(...)
- Verba de sucumbência
63. Por fim, majoram-se os honorários advocatícios a serem pagos pelos
sucumbentes para 15% sobre o valor da meação da autora, nos termos do
art. 85, parágrafo 11, do CPC-15. Isso porque a sentença foi proferida em
13.05.2016, ou seja, na vigência da lei nova. (...)
(...)
64. Assim sendo, NEGA-SE PROVIMENTO aos apelos do réus e, em
consequência, majora-se o percentual da verba honorária a ser paga aos
advogados da autora para 15%.

3. De início, importante assinalar que toda a moldura fática que vincula o


deslinde da presente controvérsia está transcrita no acórdão estadual, inclusive com a
reprodução de depoimentos e testemunhos, o que possibilita a sua revaloração pelo STJ a
fim de lhe atribuir qualificação jurídica diversa, sem a necessidade do revolvimento do acervo
probatório vedado pela Súmula 7/STJ.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA INDIVIDUAL.
CLÁUSULA DE NÃO RENOVAÇÃO. CONTRATAÇÃO RENOVADA POR
CURTO PERÍODO. NÃO ABUSIVIDADE. REVALORAÇÃO DAS PROVAS.
SUMULA N. 5 E 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA. DECISÃO MANTIDA.
(...)
3. O reenquadramento jurídico da moldura fática exposta na sentença e no
acórdão regional imprescindem do reexame de fatos ou provas dos autos,
não esbarrando no óbice das Súmulas n. 5 e 7/STJ.
4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt nos EDcl no REsp
1.548.219/SC, Rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado
em 09.10.2018, DJe 17.10.2018)
--------------------------------------------------------------------
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Superior Tribunal de Justiça

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DO
IMÓVEL. CLÁUSULAS PENAL MORATÓRIA. POSSIBILIDADE DE
REVERSÃO. REVALORAÇÃO DE PROVAS. POSSIBILIDADE. NÃO
INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N.º 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(...)
3. Não há se falar em violação ao enunciado da Súmula 7/STJ quando a
decisão agravada, ao dar provimento ao recurso especial, realiza mera
valoração probatória dos fatos sobejamente delineados no acórdão
recorrido.
4 . Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1.183.767/SP, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 08.05.2018, DJe
14.05.2018)
--------------------------------------------------------------------

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. PLANO DE
SAÚDE. BENEFICIÁRIO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO
OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO QUANTO ÀS
PRELIMINARES E PREJUDICADO QUANTO AO MÉRITO. UNIMED PALMAS.
LIMITAÇÃO GEOGRÁFICA DA ÁREA DE ATENDIMENTO. REALIZAÇÃO DE
TRATAMENTO ONCOLÓGICO EM HOSPITAL NÃO CONVENIADO. FALTA
DOS REQUISITOS PARA CABIMENTO DO CUSTEIO. EXISTÊNCIA DE
ESTABELECIMENTO ADEQUADO NA ÁREA DE ABRANGÊNCIA DA
OPERADORA CONTRATADA. ART. 12, VI, DA LEI Nº 9.656/98.
REEMBOLSO. NÃO CABIMENTO. RECURSO MANIFESTAMENTE
INADMISSÍVEL. INCIDÊNCIA DA MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO NCPC.
AGRAVO NÃO PROVIDO.
(...)
6. A revaloração da prova ou de dados explicitamente admitidos e
delineados no decisório recorrido, quando suficientes para a solução da
lide, não implica reexame do conjunto fático-probatório, mas apenas seu
correto enquadramento jurídico.
(...)
9. Agravo interno não provido, com imposição de multa. (AgInt no AREsp
1.170.106/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em
24.04.2018, DJe 30.04.2018)
--------------------------------------------------------------------

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. OMISSÃO E NEGATIVA


DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. OBRIGAÇÃO
ALIMENTAR AVOENGA. RESPONSABILIDADE COMPLEMENTAR E
SUBSIDIÁRIA, SEMPRE CONDICIONADA A EXISTÊNCIA DE NECESSIDADE
DOS NETOS E DE POSSIBILIDADE DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
PELOS AVÓS. REQUISITOS NÃO OBSERVADOS. REQUALIFICAÇÃO
JURÍDICA DOS FATOS E REVALORAÇÃO DAS PROVAS. POSSIBILIDADE.
(...)
4- Em regra, é inadmissível o reexame das circunstâncias fáticas
relacionadas à existência de necessidade dos alimentos ou à possibilidade
de prestá-los, ressalvadas as hipóteses em que o acórdão impugnado
contém, em seu bojo, os elementos indispensáveis para que se promova a
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requalificação jurídica dos fatos ou a revaloração da prova. Precedentes.
(...)
6- Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1.698.643/SP, Rel. Ministra
Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 10.04.2018, DJe 13.04.2018)

Nessa perspectiva, analisando o quadro fático perfeitamente delineado pelo


Tribunal de origem, considero que não se revela possível extrair a premissa de que a autora
mantinha relação amorosa contínua e duradoura com o de cujus sem ter ciência de que ele
era casado e não se achava separado de fato da esposa.
Consoante incontroverso nos autos, a autora e o réu, na constância de seu
relacionamento, trabalharam na mesma repartição pública (Departamento de Estradas de
Rodagem do Estado do Rio de Janeiro), tendo chegado aos ouvidos da demandada (mulher
esclarecida e independente) comentários sobre o estado civil do de cujus, conforme se
constata de seu próprio depoimento:
(...) que a depoente ouvia dizer que o H. F. era casado; que H. F. dizia que
o pessoal da repartição inventava histórias e não era casado; (...) que a
depoente perguntou várias vezes ao H. F. se ele era casado e ele sempre
negou, que era mentira; (acórdão estadual - fls. 841 e 843)

De outro lado, o fato de o réu ter assinado documentos em que se


autodeclarava solteiro não pode, por si só, servir de base à afirmação de que a autora não
desconfiava da manutenção da sociedade conjugal prévia. Isso porque tal expediente,
conquanto reprovável, pode ter sido utilizado pelos amantes a fim de evitar constrangimento
no ambiente social em que conviviam de forma mais ostensiva, criando-se, assim, realidade
paralela conveniente a ambos.
Malgrado os termos da Súmula 382/STF (a vida em comum sob o mesmo teto
não é indispensável à caracterização da união estável), também merece destaque o fato de o
réu dormir apenas eventualmente na casa da autora, consoante se extrai, por exclusão, do
depoimento do porteiro do prédio dos cônjuges:
(...) que o depoente começou a trabalhar como porteiro no prédio onde
morava o H. F. em vinte de dezembro de mil novecentos e oitenta e nove;
que trabalha até hoje no mesmo prédio; que H. F. morava com a esposa e
com a filha H.; que depois a H. se mudou há alguns anos; que desde mil
novecentos e noventa e cinco o depoente trabalha durante o dia como
porteiro; que o depoente via o H. F. todos os dias no prédio; que H. F. saía
para trabalhar por volta de oito e oito e trinta e voltava por volta de seis e
meia da noite; que o depoente mora no prédio onde trabalha como porteiro;
que todos os dias, de manhã cedo, o H. F. descia para apanhar o jornal na
portaria; que H. F. toda a vida morou no prédio com a esposa dele, que
inclusive era síndico do prédio quando faleceu. (fl. 854)

Tal evidência, somada ao burburinho existente no local de trabalho sobre o

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estado civil do de cujus, ilide de forma incisiva a alegação da autora de que não tinha
conhecimento da concomitância entre as relações afetivas.
Ademais, como de sabença, o casamento constitui ato formal, solene, público,
que "principia com o processo de habilitação e publicação dos editais, desenvolve-se na
cerimônia em que é celebrado e prossegue no registro" (GONÇALVES, Carlos Roberto.
Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 4ª ed., 200, Vol. VI, p. 27).
Assim, não se revela crível, a meu ver, que, após mais de 17 anos de
relacionamento amoroso, a autora não soubesse que o réu, além de casado, mantinha o
convívio com sua esposa, de quem não se achava separado de fato.
Desse modo, penso não estar caracterizado na espécie o chamado
"concubinato de boa-fé", o qual, \segundo doutrina abalizada, poderia ensejar a aplicação
analógica da norma do casamento putativo.
O deslinde da controvérsia posta nos autos, portanto, reclama tão somente a
correta qualificação jurídica da convivência afetiva ostensiva, contínua e duradoura
estabelecida com pessoa casada que não se encontrava separada de fato: concubinato ou
união estável.
4. Nesse passo, é consabido que a matriz normativa da união estável reside no
artigo 226 da Constituição Federal, o qual, para melhor compreensão, transcrevo na íntegra:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo
a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada
por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de
instituições oficiais ou privadas.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos
que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de
suas relações. (grifei)

Percebe-se, com efeito, que a Carta Cidadã de 1988, em obséquio ao


pluralismo democrático, concebe como entidade familiar, exemplificadamente, o vínculo
afetivo decorrente do casamento - civil ou religioso -, da união estável e das relações

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monoparentais.
Nada obstante, é de se ressaltar que a Constituição Federal adotou uma
pluralidade apenas qualitativa no que concerne às diversas formas de família, mas não
quantitativa, como pretende demonstrar parte da doutrina e da jurisprudência, e, nesse
sentido, conferiu ao legislador ordinário o mister de dar densidade normativa aos conceitos e
valores em si fugidios, como é o caso do instituto da "união estável".
Nesse passo, extrai-se do Código Civil de 2002 (o qual, em essência, reproduz
os princípios das leis pretéritas sobre a união estável) a opção legislativa conceitual e
protetiva da união estável, a excluir desse âmbito, em outro passo, o concubinato, verbis:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição
de família.
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os
impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso
VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou
judicialmente.
(...)
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos
deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e
educação dos filhos.
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros,
aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão
parcial de bens.
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante
pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher,
impedidos de casar, constituem concubinato. (grifei)

Doutrina e jurisprudência, no mais das vezes, têm debatido sempre em torno


da existência ou inexistência de impedimentos para o casamento, tendo tal circunstância
como um dos pontos centrais para a determinação da união estável.
Assim, colhe-se do sistema criado pelo legislador, que, em se tratando de união
estável, a exclusividade de relacionamento sólido é condição de existência desse
vínculo - juridicamente e não faticamente -, sem a qual não se haverá falar nesse instituto
nobre, conformador mesmo da liberdade e da dignidade da pessoa humana.
Nesse viés, poder-se-ia dizer que o maior óbice ao reconhecimento de uma
união estável entre pessoas sem qualquer parentesco seria a existência de casamento.
Porém, não o é, porquanto a ausência de convivência duradoura (separação de
fato) é motivo suficiente para afastar tal óbice, razão pela qual é esta (a convivência de fato) o
maior impedimento ao reconhecimento da união estável, abstraindo-se, por óbvio, os

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impedimentos decorrentes de parentesco.
Sendo assim, para a existência jurídica da união estável, extrai-se o requisito
objetivo da exclusividade de relacionamento sólido da norma inserta no § 1º do artigo
1.723 do Código Civil de 2002, verbis:
Art. 1.723. (...)
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do
art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a
pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. (grifei)

Com efeito, nem mesmo a existência de casamento válido se apresenta como


impedimento suficiente ao reconhecimento da união estável, desde que haja separação de
fato, circunstância que erige a existência de outra relação afetiva factual ao degrau de óbice
proeminente à união estável, mais relevante que a própria existência do casamento.
Desse modo, a pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não
está na inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência de
relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que se pretende proteção
jurídica.
Nesse viés, apesar de a dicção do § 1º do artigo 1.723 do Código Civil também
fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que, normalmente, precede a
separação de direito e continua após tal ato formal) que viabiliza a caracterização da união
estável de pessoa casada.
Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou seja,
inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união estável de pessoa casada.
Nesse diapasão, impende transcrever trecho de doutrina de relevo que destaca
o "princípio" da monogamia como preceito básico e ordenador das relações jurídicas da
família brasileira, o que justifica a censura da lei à relação extraconjugal simultânea/paralela
ao casamento, ressalvada a hipótese de separação de fato:
O artigo 1.727 do Código Civil consagra a distinção estabelecida entre a
união estável e o concubinato, expressando, a primeira, a união entre um
homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e
duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família (CC, art.
1.723), tirante os impedimentos do artigo 1.521 do Código Civil; não
incidindo o inciso VI, no caso de a pessoa se achar separada de fato.
Portanto, ressalva expressamente o § 1º do artigo 1.723 do Código Civil o
reconhecimento de uma união estável entre pessoas que, embora casada
qualquer uma delas, se achem separadas de fato ou divorciadas.
A palavra concubinato no passado era utilizada como sinônimo de união
estável; contudo, desde o advento do artigo 1.727 do Código Civil, apenas
identifica uma relação adulterina, e que refoge ao modelo de união estável,
o qual só admite envolvimento afetivo quando for apto a gerar efeitos
jurídicos, podendo a pessoa ser casada, mas devendo estar separada de
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fato ou divorciada.
O mesmo raciocínio pode ser focalizado em uma união estável e
paralelamente existir um segundo relacionamento, ou seja, duas relações
estáveis plúrimas e simultâneas.
Concubinato é uma união impura, representando uma ligação constante,
duradoura e não eventual, na qual os partícipes guardam um impedimento
para o matrimônio, por serem casados, ou pelo menos um deles mantém
íntegra a vida conjugal e continua vivendo com seu cônjuge, enquanto, ao
mesmo tempo, mantém um outro relacionamento, este de adultério, ou de
amasiamento.
O Código Civil define o concubinato como sendo as "relações não eventuais
entre o homem e a mulher, impedidos de casar" (art. 1.727), mas,
logicamente, não inclui nesse conceito as pessoas casadas, mas separadas
de fato ou divorciadas, habilitadas, portanto, a constituir união estável. O
impedimento para uma nova união não se encontra no estado civil da
pessoa, a qual pode ser casada ou manter uma relação de união estável,
mas desde que esteja faticamente separada do cônjuge ou precedente
companheiro.
A censura da lei incide sobre o paralelismo dessas uniões, tendo em
conta o princípio da monogamia, não visto apenas como uma norma
moral, mas sim como um preceito básico e organizador das relações
jurídicas da família brasileira, como forma de organização,
representando um envolvimento afetivo paralelo, de curta ou longa
duração, uma indisfarçável infidelidade que continua trazendo
perturbação para dentro da sociedade conjugal ou convivencial de
orientação monogâmica.
O princípio da monogamia encontra eco no artigo 1.521, inciso VI, do
Código Civil, quando proíbe novo casamento de pessoa casada, sob
pena de nulidade das segundas núpcias (CC, art. 1.548, inc. II),
sendo inclusive a bigamia tipificada como crime pelo artigo 235 do
Código Penal. Conforme Carlos Dias Motta, a monogamia é
decorrência de valores culturais, econômicos e religiosos, não
sendo desconhecido se tratar de um princípio próprio da cultura
ocidental e de forte influência cristã, enquanto os povos do oriente,
de religião islâmica admitem a tetragamia.
Da leitura do artigo 1.724 do Código Civil, não remanescem dúvidas
acerca das relações pessoais entre os companheiros obedecerem
aos deveres da lealdade, entendendo-se como condições
elementares para a configuração da união estável a exclusividade
do relacionamento. Portanto, em sintonia com o § 1º do artigo 1.723
do Código Civil, o casamento antecedente, ou a união estável
precedente, ausente de uma separação de fato ou de corpos,
impede a constituição legal de outra união estável ou de um
segundo matrimônio.
(....)
Atualmente, a união estável é regulada pelo Direito de Família, enquanto o
concubinato de pessoa casada e não separada de fato constitui uma
sociedade de fato, surgida de um relacionamento adulterino estável,
rotineiro, duradouro. Sucedendo a aquisição de bens, por não se tratar de
uma entidade familiar constitucional, por afrontar o princípio da monogamia
das uniões afetivas, esta relação deve ser disciplinada pelo Direito das
Obrigações, com vistas a inibir o enriquecimento indevido (CC, art. 884). No
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entanto, não se trata de um ponto de vista pacífico, tampouco unânime,
havendo quem defenda e admita a dualidade de relacionamentos estáveis.
(...)
Não constitui outra família quem prossegue residindo com a esposa
e com os filhos conjugais, pois é pressuposto da vontade de formar
família estar desimpedido para formalizar pelo matrimônio, ou pela
via informal da união estável, uma entidade familiar. Aliás, querendo
constituir família com a amante, tudo o que o bígamo precisa fazer é
romper de fato ou de direito a sua relação com a outra pessoa,
ficando até dispensado do divórcio judicial ou extrajudicial, porque
com gesto simples de romper factualmente o passado lhe basta para
assentar no presente uma relação de fidelidade e de exclusividade
com o novo parceiro, e esta é a atitude suficiente para concluir pelo
fortalecimento dos laços da nova relação e de que concentrou seus
desejos e esforços em uma nova e única entidade familiar.
(MADALENO, Rolf. Direito de família. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017,
p. 1.179/1.184) (grifei)

5. A jurisprudência desta Casa, em multifários julgados, acolhe a exegese


anteriormente explicitada, não admitindo o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou
de união estável concomitante a casamento em que não configurada separação de fato.
A Terceira Turma, em caso líder, considerou, no ano de 2006, que, "mantendo
o autor da herança união estável com uma mulher, o posterior relacionamento com outra,
sem que se haja desvinculado da primeira, com quem continuou a viver como se fossem
marido e mulher, não há como configurar união estável concomitante" (REsp 789.293/RJ
Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 16.02.2006, DJ
20.03.2006).
No mesmo sentido, a Sexta Turma, ao apreciar demanda previdenciária,
assentou o entendimento de que "as situações de concomitância, isto é, em que há
simultânea relação matrimonial e de concubinato, por não se amoldarem ao modelo
estabelecido pela legislação previdenciária, não são capazes de ensejar união estável, razão
pela qual apenas a viúva tem direito à pensão por morte" (REsp 1.104.316/RS, Rel. Ministra
Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 28.04.2009, DJe 18.05.2009).
A Ministra Nancy Andrighi, quando do julgamento do Recurso Especial
1.157.273/RN, estabeleceu a tese de que emprestar os efeitos jurídicos inerentes à união
estável, de forma linear, às uniões afetivas plúrimas, simultâneas e paralelas implicaria julgar
contra o que dispõe a lei, pois "o art. 1.727 do CC/02 regulou, em sua esfera de abrangência,
as relações afetivas não eventuais em que se fazem presentes impedimentos para casar, de
forma que só podem constituir concubinato os relacionamentos paralelos a casamento ou
união estável pré e coexistente" (REsp 1.157.273/RN, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira
Turma, julgado em 18.05.2010, DJe 07.06.2010).

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Na sequência, esta Quarta Turma consagrou a mesma exegese por ocasião do
exame do Recurso Especial 912.926/RS, de minha relatoria, assim ementado:
DIREITO DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE UNIÕES ESTÁVEIS
SIMULTÂNEAS. IMPOSSIBILIDADE. EXCLUSIVIDADE DE
RELACIONAMENTO SÓLIDO. CONDIÇÃO DE EXISTÊNCIA JURÍDICA DA
UNIÃO ESTÁVEL. EXEGESE DO § 1º DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL DE
2002.
1. Para a existência jurídica da união estável, extrai-se, da exegese do § 1º
do art. 1.723 do Código Civil de 2002, fine, o requisito da exclusividade de
relacionamento sólido. Isso porque, nem mesmo a existência de
casamento válido se apresenta como impedimento suficiente ao
reconhecimento da união estável, desde que haja separação de
fato, circunstância que erige a existência de outra relação afetiva
factual ao degrau de óbice proeminente à nova união estável.
2. Com efeito, a pedra de toque para o aperfeiçoamento da união
estável não está na inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda
evidência, na inexistência de relacionamento de fato duradouro,
concorrentemente àquele que se pretende proteção jurídica, daí
por que se mostra inviável o reconhecimento de uniões estáveis
simultâneas.
3. Havendo sentença transitada em julgado a reconhecer a união estável
entre o falecido e sua companheira em determinado período, descabe o
reconhecimento de outra união estável, simultânea àquela, com pessoa
diversa.
4. Recurso especial provido. (REsp 912.926/RS, Rel. Ministro Luis Felipe
Salomão, Quarta Turma, julgado em 22.02.2011, DJe 07.06.2011)

Tal orientação jurisprudencial tem se mantido estável, íntegra e coerente, nos


termos do artigo 926 do CPC de 2015, consoante se depreende da leitura das ementas de
julgados mais recentes:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO
DE FAMÍLIA. UNIÕES ESTÁVEIS PARALELAS. IMPOSSIBILIDADE.
RECONHECIMENTO DE RELACIONAMENTO EXCLUSIVO DO FALECIDO
COM A AUTORA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.
AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Esta Corte Superior entende ser inadmissível o reconhecimento de
uniões estáveis paralelas. Precedentes.
2. Na hipótese dos autos, o Tribunal estadual consignou a existência de
vários relacionamentos concomitantes entre o de cujus e outras mulheres,
inclusive de casamento. Infirmar as conclusões do julgado, para reconhecer
a existência de união estável exclusiva com a autora, demandaria o
revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que encontra óbice
no enunciado da Súmula 7 desta Corte Superior.
3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp
609.856/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em
28.04.2015, DJe 19.05.2015)
----------------------------------------------------------------------------------

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE

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Superior Tribunal de Justiça
RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. NÃO CONFIGURAÇÃO. UNIÕES
ESTÁVEIS SIMULTÂNEAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não admite o
reconhecimento de uniões estáveis simultâneas, pois a caracterização da
união estável pressupõe a inexistência de relacionamento de fato
duradouro, concorrentemente àquele ao qual se pretende proteção jurídica.
Precedentes.
2. Inviável o recurso especial se o acórdão recorrido se alinha com o
posicionamento sedimentado na jurisprudência do STJ, a teor do que
dispõe a Súmula 83 desta Corte Superior.
3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp
395.983/MS, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em
23.10.2014, DJe 07.11.2014)

Da mesma forma, são inúmeros os precedentes desta Corte que, por força do
disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil, pugnam pela impossibilidade de se
reconhecer união estável de pessoa casada não separada de fato, o que demonstra a
vedação à atribuição de efeitos jurídicos às relações afetivas paralelas. Confira-se:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE
RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO
CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO
AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DAS AUTORAS.
(...)
4. Na hipótese, o Tribunal local seguiu orientação desta Corte no sentido de
que a existência de casamento válido não obsta o reconhecimento
da união estável, quando há separação de fato ou judicial entre os
casados. Incidência da Súmula 83/STJ.
5. Alterar as conclusões firmadas pelo acórdão recorrido, no sentido de se
entender pela existência da união estável, demanda o reexame de fatos e
provas, prática vedada pela Súmula 7/STJ.
6. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 898.706/SC, Rel. Ministro
Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 02.10.2018, DJe 15.10.2018)
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PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO


RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. PENSÃO POR
MORTE. RATEIO ENTRE ESPOSA E CONCUBINA. REPERCUSSÃO GERAL
PENDENTE DE JULGAMENTO. TEMA 526/STF. SOBRESTAMENTO DO
FEITO. DESNECESSIDADE. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL NA
CONSTÂNCIA DE CASAMENTO DO DE CUJUS. AUSÊNCIA DE
SEPARAÇÃO DE FATO OU DE DIREITO. IMPOSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(...)
2. Quanto ao tema do recurso especial, no âmbito do STJ, a jurisprudência
se firmou no sentido de que a existência de casamento válido não obsta o
reconhecimento da união estável, desde que fique comprovada a
separação de fato ou de direito do parceiro casado, o que não ocorreu no
presente caso. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp
1.725.214/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma,
julgado em 25.09.2018, DJe 03.10.2018)
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Superior Tribunal de Justiça
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RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO E


CONCUBINATO IMPURO SIMULTÂNEOS. COMPETÊNCIA. ART. 1.727 DO
CÓDIGO CIVIL DE 2002. ART. 9º DA LEI 9.278/1996. JUÍZO DE FAMÍLIA.
SEPARAÇÃO DE FATO OU DE DIREITO. INEXISTÊNCIA. CASAMENTO
CONCOMITANTE. PARTILHA. PROVA. AUSÊNCIA. SÚMULAS Nº 380/STF E
Nº 7/STJ.
(...)
2. A relação concubinária mantida simultaneamente ao matrimônio não pode
ser reconhecida como união estável quando ausente separação de fato ou
de direito do cônjuge.
(...)
6 . A partilha decorrente de sociedade de fato entre pessoas impõe a prova
do esforço comum na construção patrimonial (Súmula nº 380/STF).
7. O recorrente não se desincumbiu de demonstrar que o patrimônio
adquirido pela recorrida teria decorrido do esforço comum de ambas as
partes, circunstância que não pode ser reanalisada nesse momento
processual ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.
8. Recurso especial não provido. (REsp 1.628.701/BA, Rel. Ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 07.11.2017, DJe
17.11.2017)
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CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL NÃO RECONHECIDA. HOMEM
CASADO. SEPARAÇÃO DE FATO NÃO COMPROVADA. REEXAME DO
CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA.
1. "A jurisprudência do STJ e do STF é sólida em não reconhecer como
união estável a relação concubinária não eventual, simultânea ao
casamento, quando não estiver provada a separação de fato ou de direito
do parceiro casado" (AgRg no AREsp 748.452, Relator Ministro RAUL
ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 23/2/2016, DJe 7/3/2016).
2. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem
revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ).
3. No caso concreto, o Tribunal de origem concluiu pela ausência de
comprovação da separação de fato. Alterar esse entendimento demandaria
o reexame das provas produzidas nos autos, o que é vedado em recurso
especial.
4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp
999.189/MS, Rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado
em 16.05.2017, DJe 23.05.2017)
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CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL.


DISSOLUÇÃO E PARTILHA. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO NÃO
IMPUGNADOS. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 283 DO STF. A
JURISPRUDÊNCIA DO STJ É PACÍFICA NO SENTIDO DE QUE, APÓS A
EDIÇÃO DA LEI Nº 9.278/1996, NA UNIÃO ESTÁVEL, VIGENTE O REGIME
DA COMUNHÃO PARCIAL, HÁ PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE QUE OS BENS
ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO SÃO
Documento: 1784964 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/03/2019 Página 30 de 6
Superior Tribunal de Justiça
RESULTADO DO ESFORÇO COMUM DOS CONVIVENTES. O STJ JÁ
DECIDIU QUE A EXISTÊNCIA DE CASAMENTO VÁLIDO NÃO CONSTITUÍ
ÓBICE AO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL QUANDO HAJA
SEPARAÇÃO DE FATOS DOS CÔNJUGES. PRECEDENTES. NÃO É
CABÍVEL RECURSO ESPECIAL COM BASE EM VIOLAÇÃO DE SÚMULA.
PRECEDENTES. NOVO CPC. INAPLICABILIDADE. DECISÃO MANTIDA.
(...)
3. O STJ também tem orientação de que a existência de casamento válido
não constitui impedimento ao reconhecimento da união estável quando haja
separação de fato dos cônjuges, hipótese, no caso, configurada.
(...)
6. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1.475.560/MA, Rel.
Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 24.05.2016, DJe
01.06.2016)

6. No caso dos autos, tendo em vista a revaloração do quadro fático delineado


no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de cujus) mantiveram
relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o demandado era casado quando iniciou tal
convívio, não tendo se separado de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora
sobre a preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal) não foi
devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos em sentido contrário.
De outro modo, seria simples ultrapassar a já consolidada jurisprudência da
Casa, pois bastaria que um dos conviventes alegasse boa-fé. Contudo, penso que esta deve
ser demonstrada estreme de dúvidas, o que não é o caso em apreço, a fim de que seja
apreciada, se for o caso, a alegada equiparação com o casamento putativo.
Portanto, afigura-se impositiva a reforma do acórdão estadual, que manteve a
sentença de procedência da pretensão autoral, uma vez que não foi atendido o requisito
objetivo para configuração da união estável, consistente na inexistência de relacionamento
de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica.
Ademais, importante assinalar que, uma vez não constatado o chamado
"concubinato de boa-fé", não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação
analógica da norma do casamento putativo à espécie.
7. Ante o exposto, dou provimento aos recursos especiais do espólio e da viúva
para julgar improcedente a pretensão deduzida pela autora, condenando-a ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 5.000,00 (cinco
mil reais), em razão da natureza inestimável da causa (§ 8º do artigo 85 do CPC de 2015).
É como voto.

Documento: 1784964 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/03/2019 Página 31 de 6
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA

Número Registro: 2018/0176652-5 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.754.008 / RJ

Números Origem: 00429202720138190002 201725109912 429202720138190002

PAUTA: 11/12/2018 JULGADO: 13/12/2018


SEGREDO DE JUSTIÇA
Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS
Secretária
Dra. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : H F - ESPÓLIO
REPR. POR : H F - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : LUIZ CLÁUDIO FÁBREGAS E OUTRO(S) - RJ030130
MARCELO FÁBREGAS - RJ144875
TAWNNI BARCELLOS RABELLO - RJ196797
RECORRENTE : A M BF
ADVOGADO : LUIZ CLAUDIO DE LIMA GUIMARAES COELHO E OUTRO(S) - RJ096724
RECORRIDO : M DA F
ADVOGADO : AFONSO FEITOSA E OUTRO(S) - RJ023409

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - União Estável ou Concubinato - Reconhecimento / Dissolução

SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr. LUIZ CLÁUDIO FÁBREGAS, pelas partes RECORRENTES: H F - ESPÓLIO e A M B F
Dr. AFONSO FEITOSA, pela parte RECORRIDA: M DA F

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento aos recursos especiais de H F -
ESPÓLIO e de A M B F, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente)
e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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