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Sentença da 1ª Instância proferida pelo Tribunal da Comarca da Grande Lisboa –

Noroeste, Sintra:

a) Intentou A um acção declarativa de condenação contra R, assumindo o processo


forma comum ou ordinária,;
b) Para tal alegou que, no horizonte da sua actividade comercial e por encomenda de R,
fabricou 3 máquinas de lavagem a alta pressão, ascendendo a mesma ao preço de 776
euros, que R não prestou;
c) O pedido consistiu na condenação de R no pagamento do preço acordado, acrescido
de juros de mora;
d) R contestou, alegando, por sua vez, que não encomendou as máquinas, nem, tão-
pouco, as mesmas lhe foram entregues;
e) A replicou, acrescentando que apenas não entregou as máquinas a R porque esta não
pagou as facturas já vencidas a estas correspondentes;
f) Perante a factualidade provada em sede de 1ª instância, ficou qualificado o contrato
celebrado entre A e R como sendo um contrato de prestação de serviços, mais
especificamente um contrato de empreitada;
g) Conclui-se, no decurso da lide, que R incumpriu culposamente o estabelecido
contratualmente (pagamento das prestações), sem ter logrado provar qualquer causa
exculpatória;
h) Percorrendo os pressupostos da responsabilidade civil contratual – atendível à luz da
interpretação do julgador como consequência do pretenso incumprimento contratual
definitivo –, não foi encontrado dano indemnizável (pois os equipamentos fabricados
não chegaram a ser expedidos), donde se decidiu pela improcedência da acção;
i) A sentença final, prolatada em 1ª instância, julgou a acção improcedente, absolvendo
o réu da instância;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa:

a) Em virtude da inconformação com a decisão jurisdicional, recorreu A;


b) O Tribunal da Relação, por seu turno, qualificou o contrato como sendo de compra e
venda de bens futuros;
c) Dado o fraccionamento do preço em várias parcelas e havendo sido estipulados
momentos diferentes para o pagamento das mesmas, conclui-se que R se constituiu
na obrigação de pagar as parcelas vencidas, mas já não as que tão-somente se
venceriam com o embarque das máquinas e subsequente consumação do protocolo de
entrega, situações não ocorridas;
d) Posto isto, condenou o acórdão recorrido R a pagar a A o montante de 430,800 euros,
absolvendo-a quanto ao remanescente;

Recurso de revista principal de R:

Em traços largos, R, parte Ré nesta lide, pretende, em conformidade com a solução


encontrada em 1ª instância, a absolvição total do pedido.

Para tal, insiste na absolvição do pagamento dos equipamentos enquanto corolário


de os não ter encomendado e de os mesmos lhe não terem sido entregues. Refere,
outrossim, a não invocação nem comprovação de qualquer prejuízo por parte de A como
factos evidenciadores da inexistência de um seu direito às quantias reclamadas.

Recurso de revista subordinada de A:

Salientando a, na sua óptica, correcta qualificação jurídica do contrato por parte do


acórdão recorrido (contrato de compra e venda de bens futuros), pretende a condenação
de R por incumprimento contratual.

Partindo do pressuposto que estamos diante de uma situação de incumprimento


contratual definitivo, pretende A que lhe seja arbitrada uma indemnização de 776 euros,
acrescida de juros a contar das datas de vencimento das diversas parcelas de preço não
pago, por aplicação do art. 483º do CC; contrariamente à quantia fixada pela Relação, em
que se atendeu exclusivamente ao montante das parcelas do pagamento já vencidas.

Parece laborar num erro ao pedir uma indemnização no valor de 776 euros a título de
danos emergentes e lucros cessantes, uma vez que, conforme se verificou, esse valor será
devido mas como forma de adimplemento contratual de R contra a entrega das máquinas,
sendo que, por estarmos diante de uma situação de mora (e não incumprimento
definitivo), a indemnização apenas se resumirá ao montante de juros moratórios, sempre
devidos sem necessidade de se provar prejuízo
Decisão do Supremo Tribunal de Justiça:

a. Perfilhação da qualificação jurídica do contrato e respectiva fundamentação aduzidas


pela Relação;
b. Estando perante um contrato de compra e venda de bens futuros, mormente de bens
absolutamente futuros, sabe-se que o efeito translativo só se opera com a existência
actual, física ou empírica do bem, objecto do contrato. Ignorando-se exactamente
quando tal ocorreu, sabe-se que, pelo menos aquando da propositura da acção, já a
transferência do direito de propriedade havia ocorrido;
c. Ao inadimplir – não pagando as parcelas convencionadas –, constituiu-se R em mora,
não tendo esta sido convertida em incumprimento definitivo;
d. Encontrando-nos ante um contrato sinalagmático e havendo R de cumprir, ainda que
parcialmente, prestações pecuniárias antes de A, admite-se que esta, pelo facto de R
o não ter feito, invoque a excepção de não cumprimento (art. 428º e ss.), ou seja, que
licitamente se oponha à entrega das máquinas (efeito obrigacional a que ficou A
adstrita);
e. No que concerne aos juros moratórios, por não haver propriamente um pagamento a
prestações típico de uma venda a crédito, dado que o propósito não foi consumar uma
transacção de bens entregues ao devedor antes do pagamento integral, não se aplicará
o art. 781º do CC, pelo que só as prestações vencidas, nomeadamente as parcelas de
pagamento anteriores embarque e respectivo protocolo de entrega, serão tidas em
conta no cálculo dos juros moratórios devidos;
f. Só pedindo A juros moratórios a partir das datas de vencimento apostas às facturas,
serão essas as que marcarão o início da mora;
g. Conclui este acórdão pela improcedência da revista de R, ao passo que se considera
procedente a revista subordinada de A, revogando-se, por conseguinte, o acórdão
recorrido;
h. Condenação de R no pagamento do preço dos equipamentos (776 euros), tendo,
correspectivamente, A de os entregar;
i. Acréscimo de juros de mora à taxa legal supletiva aplicável aos créditos das empresas
comerciais, incidentes somente sobre as parcelas de pagamento vencidas (e não sobre
as que seriam devidas com o embarque e efectiva entrega das máquinas, o que não
sucedeu), até que R ofereça o preço a A;

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