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ISSN 2177-3548

O lugar da terapia analítico-comportamental no cenário internacional


das terapias comportamentais: um panorama histórico
The place of behavioral-analytic therapy in the international scenario of
behavioral therapies: a historical overview
El lugar de la terapia analítica-conductual en el escenario internacional de las
terapias conductuales: una visión histórica
Jan Luiz Leonardi1

[1] Paradigma – Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento e Universidade de São Paulo| Título abreviado: Terapia analítico-comportamental no cenário
internacional | Endereço para correspondência: Rua Cardoso de Almeida, 977 - Apto 151 CEP: 05013-001. São Paulo - SP | Email: janleonardi@gmail.com |
DOI: 10.18761/pac.2015.027

Resumo: Ao longo do século XX, o termo terapia comportamental foi utilizado para se re-
ferir a diferentes modalidades de prática clínica, sem que houvesse, muitas vezes, qualquer
afinidade filosófica, conceitual ou metodológica entre elas. Com o intuito de distinguir a
prática psicoterápica exercida por analistas do comportamento dessa eclética terapia com-
portamental, o termo análise do comportamento clínica (clinical behavior analysis, no original)
foi criado, mas diferentes modelos surgiram dentro desse movimento, tais como psicoterapia
analítica funcional, terapia de aceitação e compromisso, terapia de ativação comportamental,
terapia comportamental dialética, entre outros. Paralelamente, no Brasil, o termo terapia
analítico-comportamental foi cunhado no início do século XXI para uniformizar o nome da
prática clínica fundamentada na filosofia do behaviorismo radical e na ciência da análise do
comportamento que vinha sendo praticada nesse país desde o início da década de 1970. Essa
grande diversidade de nomes, modelos e práticas de terapia comportamental somente pode
ser compreendida com algum conhecimento das origens e momentos de transformação da
terapia comportamental. Em vista disso, o presente artigo tem por objetivo apresentar, de
modo introdutório e didático, a história das terapias comportamentais e analisar de que modo
a terapia analítico-comportamental se insere nesse cenário.
Palavras-chave: análise do comportamento clínica; terapia analítico-comportamental; te-
rapia comportamental; história

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Abstract: Throughout the 20th century, the term behavior therapy was used to refer to dif-
ferent types of clinical practice, often without there being any philosophical, conceptual or
methodological affinity between them. In order to distinguish the psychotherapeutic practice
exercised by behavior analysts from this eclectic behavior therapy, the term clinical behavior
analysis was created, but different models emerged within this movement, such as functional
analytic psychotherapy, acceptance and commitment therapy, behavioral activation, dialectical
behavior therapy, among others. In parallel, in Brazil, the term behavioral-analytic therapy was
coined in the early 21st century to standardize the name of the clinical practice based on the
philosophy of radical behaviorism and on the science of behavior analysis that had been prac-
ticed in this country since the beginning of the 1970s.. This great diversity of names, models
and practices of behavior therapy can only be understood with some knowledge of the origins
and moments of transformation of behavior therapy. Thus, this paper aims to present, in an
introductory and didactic way, the history of the behavioral therapies and analyze how the
behavioral-analytic therapy participates in this scenario.
Keywords: clinical behavior analysis; behavioral-analytic therapy; behavior therapy; history
Resumen: A lo largo del siglo XX, se utilizó el término terapia conductual para referirse a
diferentes tipos de práctica clínica, a menudo sin que haya alguna afinidad filosófica, con-
ceptual o metodológica entre ellos. Para distinguir la práctica psicoterapéutica ejercida por
los analistas del comportamiento de esta terapia conductual ecléctica, el término análisis de
conducta clínico (clinical behavior analysis en el original) fue creado, pero diferentes modelos
surgieron dentro de este movimiento, como la psicoterapia analítico-funcional, terapia de acep-
tación y compromiso, la activación conductual, la terapia dialéctica conductual, entre otros. En
paralelo, en Brasil, el término terapia analítica-conductual fue acuñado a principios del siglo
XXI para estandarizar el nombre de la práctica clínica basada en la filosofía del conductismo
radical y la ciencia del análisis de la conducta que se había sido practicada en este país desde
el comienzo de la década de 1970. Esta gran diversidad de nombres, modelos y prácticas de
terapia conductual sólo se puede entender con un poco de conocimiento de los orígenes y
momentos de transformación de la terapia conductual. Por lo tanto, el presente trabajo tiene
como objetivo presentar, de manera introductoria y didáctica, la historia de las terapias con-
ductuales y analizar cómo se incluye la terapia analítica-conductual en este escenario.
Palabras-clave: análisis clínico de comportamiento; terapia analítica-conductual; terapia
conductual; historia

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Desde que Lindsley, Skinner e Solomon (1953) uti- nharia em física e química, a tese defendida pelos
lizaram a expressão terapia comportamental pela pioneiros da terapia comportamental era a de que
primeira vez, uma miríade de práticas foram agru- qualquer intervenção deveria partir do entendi-
padas sob esse rótulo sem que houvesse, muitas mento científico dos processos comportamentais
vezes, qualquer afinidade filosófica, conceitual oubásicos, o que representou uma forte oposição à
metodológica entre elas (Kazdin, 1978; Nolasco, psicologia clínica vigente na época (O’Donohue,
2002; O’Donohue, 1998). 1998).
É possível encontrar na literatura, tanto nacio- No início do século XX, os fisiólogos russos
nal quanto internacional, nomes como modifica- Vladimir Bechterev e Ivan Pavlov investigaram ex-
ção do comportamento, análise do comportamento perimentalmente o processo de condicionamento
aplicada, terapia cognitivo-comportamental, tera- respondente em cães, e corroboraram a proposição
pia comportamental-cognitiva, psicoterapia analí- que Ivan Sechenov havia feito no século anterior de
tica funcional, terapia de aceitação e compromisso,que o conceito de reflexo e os métodos da fisiologia
terapia de ativação comportamental, terapia com- conferiam objetividade para o estudo da psicolo-
portamental dialética, entre outros (cf. Barcellos &
gia, outrora marcado pelo subjetivismo do método
Haydu, 1995; Nolasco, 2002; Pérez-Álvarez, 2006, introspectivo. Nessa época, portanto, todo e qual-
2012). Além disso, o último quarto do século XX quer comportamento – voluntário ou involuntário,
testemunhou a criação e o desenvolvimento de uma inato ou aprendido, humano ou não – era explicado
prática clínica exclusivamente brasileira, chamada pelo conceito de reflexo. As primeiras tentativas de
(atualmente) de terapia analítico-comportamental transposição do conhecimento acerca dos reflexos
(TAC) (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008). condicionados para a análise de fenômenos clínicos
Essa grande diversidade de nomes, modelos e apareceram rapidamente (Kazdin, 1978).
práticas de terapia comportamental costuma gerar Em 1920, em um experimento que ficou co-
confusão quanto à identidade da prática clínica nhecido na história da psicologia como “o caso do
dos analistas do comportamento (se é que exis- Pequeno Albert”, Watson e Rayner demonstraram
te uma) e somente pode ser compreendida com como a reação de medo a determinado estímulo
algum conhecimento das origens e momentos de pode ser construída por meio de condicionamento
transformação da história da terapia comporta- respondente. Albert, um bebê de 11 meses de vida,
mental, isto é, a partir do passado do qual essa foi exposto inicialmente a uma série de animais e
multiplicidade é fruto. Em vista disso, o presente objetos (coelho, rato branco, cachorro, macaco, al-
artigo tem por objetivo apresentar, de modo intro- godão, folhas de jornal em chamas, casaco de pele,
dutório e didático, a história das terapias compor-entre outros), não demonstrando qualquer reação
tamentais, explicitando o modo pelo qual a TAC de medo frente a esses itens. Posteriormente, o rato
se insere nesse cenário. branco foi colocado próximo a Albert e, toda vez
que ele tentava tocá-lo, um som alto e estridente era
produzido, ocasionando uma forte resposta de so-
Uma Breve História das Terapias bressalto e choro. No total, sete pareamentos entre
Comportamentais esses estímulos (rato branco e som) foram realiza-
dos ao longo de aproximadamente duas semanas.
A criação do modelo comportamental de inter- Após um intervalo de cinco dias, Albert foi nova-
venção clínica seguiu a mesma estratégia que ha- mente exposto ao rato banco, agora sem a apre-
via se mostrado bem-sucedida em outras ciências: sentação do ruído, e sua reação foi chorar, cobrir
extrapolar princípios validados empiricamente os olhos para não ver o animal e engatinhar para
na pesquisa básica para a resolução de problemas longe, comprovando o condicionamento de medo.
aplicados. Assim, da mesma forma que a medicina Duas semanas depois, Albert foi exposto a estímu-
se baseava em fisiologia e microbiologia e a enge-

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los com propriedades físicas em comum com o rato introduzidas por Wolpe (1954, 1958) na África do
branco (e.g., coelho, casaco de pele), o que demons- Sul e por Eysenck (1960, 1964) na Inglaterra.
trou generalização de sua reação emocional1. Entre as décadas de 1930 e 1950, período em
Poucos anos depois, Jones (1924a, 1924b), alu- que procedimentos terapêuticos baseados no para-
na de Watson à época, investigou o efeito isolado e digma respondente estavam sendo desenvolvidos
combinado de sete procedimentos na diminuição e utilizados, Skinner (e.g., 1938/1991) dedicava-se
da resposta de medo de crianças, a saber: (1) desu- ao estudo do comportamento operante. Após rea-
so (não exposição ao estímulo temido por semanas lizar diversos experimentos com ratos e pombos,
ou meses); (2) apelo verbal (relato de histórias pra- Skinner descobriu processos comportamentais bá-
zerosas envolvendo o estímulo temido); (3) adapta- sicos, como reforçamento, discriminação, etc.
ção negativa (apresentação repetida ao estímulo te- Nas décadas seguintes, o estudo do condicio-
mido); (4) repressão (ridicularização do medo); (5) namento operante com animais de laboratório foi
distração (exposição ao estímulo temido enquanto estendido de forma direta e sistemática para o com-
se envolve em outras atividades); (6) condiciona- portamento humano. Nesse momento, os pesqui-
mento direto (pareamento entre o estímulo temido sadores tinham como único objetivo avaliar se os
e um estímulo prazeroso); (7) imitação social (ex- processos básicos descobertos na pesquisa animal
posição ao estímulo temido em parceria com uma serviriam também para explicar e alterar o com-
criança que não tem medo daquele estímulo). Entre portamento humano e, por conseguinte, tinham
eles, apenas o condicionamento direto e a imita- a caixa de Skinner como protótipo de observação,
ção social foram eficazes, que tinham em comum mensuração e intervenção. Sendo assim, a maior
a exposição gradual ao estímulo temido de acordo parte das primeiras investigações com seres hu-
com o nível de tolerância apresentado pela criança. manos examinava a frequência de respostas de
Os estudos de Jones foram o ponto de partida para pressão à barra (Kazdin, 1978). Por exemplo, em
o desenvolvimento da técnica de dessensibilização 1953, Lindsley iniciou uma série de pesquisas so-
sistemática, o que lhe conferiu o título de “mãe da bre condicionamento operante tendo como partici-
terapia comportamental” (Rutherford, 2010). pantes indivíduos “normais” e pacientes psicóticos
Os estudos de Watson, Rayner e Jones citados residentes em um hospital psiquiátrico. Seguindo
acima incentivaram a extensão dos princípios de a mesma lógica da pesquisa animal, a instalação,
condicionamento descobertos em laboratório para manutenção e extinção de respostas de empurrar
explicar e modificar o comportamento humano um êmbolo foram estudadas utilizando cigarros,
(Kazdin, 1978). Ao longo da primeira metade do doces ou dinheiro como estímulos reforçadores
século XX, tratamentos fundamentados no para- e luzes coloridas como estímulos discriminativos
digma respondente foram elaborados para alcoolis- (e.g., Lindsley, 1956; Lindsley, Skinner & Solomon,
mo (Voegtlin, 1940), enurese (Mowrer & Mowrer, 1953; Skinner, Solomon & Lindsley, 1954).
1938), paralisia histérica (Sears & Cohen, 1933), Ao longo das décadas de 1950 e 1960, diver-
dependência de morfina (Rubenstein, 1931), entre sas universidades e hospitais psiquiátricos torna-
outros. Posteriormente, a aplicação do conhecimen- ram-se centros de pesquisa do condicionamento
to sobre condicionamento respondente culminou operante, tais como Metropolitan State Hospital,
no desenvolvimento das técnicas de exposição e de Harvard University, University of Washington,
dessensibilização para o tratamento de ansiedade, Indiana University School of Medicine, entre ou-
tros. Distribuídos nessas instituições, pesquisado-
1  Embora seja considerada a primeira demonstração experi- res como Azrin, Baer, Bijou, Ferster, Goldiamond,
mental de como o medo pode ser aprendido por meio de con- Lindsley, Lovaas, Staats e Skinner investigaram o
dicionamento respondente, a pesquisa de Watson e Rayner efeito de diferentes condições de controle antece-
(1920) apresenta diversos problemas metodológicos relativos dente e consequente sobre diversas respostas ope-
aos procedimentos utilizados, testes de generalização, impre-
cisões na coleta de dados, etc., envolvendo, inclusive, rela-
rantes em crianças e adultos com e sem psicopa-
ções operantes (para uma análise detalhada, ver Bisaccioni & tologias, comprovando que a explicação, previsão
Carvalho Neto, 2010). e controle do comportamento dos seres humanos

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eram muito similares aos observados em ratos e ser observado e medido em suas propriedades; (3)
pombos. Esse foi o ponto de partida para o desen- analítica: deve-se identificar as relações de depen-
volvimento de procedimentos de modificação de dência entre as respostas do indivíduo, os contextos
comportamentos com relevância clínica, conforme em que ocorrem (eventos antecedentes) e seus efei-
explica Kazdin (1978): tos no mundo (eventos consequentes), isto é, deve-
-se identificar as variáveis que controlam determi-
Embora esses relatos iniciais fossem principal- nado responder; (4) tecnológica: a aplicação deve
mente de valor demonstrativo, as aplicações ser operacionalizada, implementada e descrita de
posteriores tornaram-se explicitamente tera- forma clara e detalhada, permitindo que qualquer
pêuticas. No fim da década de 1950 e começo da pesquisador da área consiga replicá-la; (5) conceitu-
década de 1960, tentativas preliminares foram al: o procedimento de coleta e análise de dados de-
feitas para aplicar técnicas de condicionamento vem estar embasados nos pressupostos filosóficos
operante para produzir mudanças de compor- do behaviorismo radical e nos princípios teóricos
tamento em populações clínicas. Em meados e metodológicos da análise do comportamento; (6)
da década de 1960, diversas aplicações foram eficaz: a aplicação deve alterar o comportamento
descritas e, à medida que proliferaram, essas para melhor, sendo que são os participantes da in-
extensões do condicionamento operante e da tervenção e os membros da sociedade que avaliam
análise experimental do comportamento foram a mudança, e não o pesquisador; (7) generalizável:
reconhecidos formalmente como uma nova a mudança comportamental deve persistir ao lon-
área de pesquisa: a Análise do Comportamento go do tempo e em diversos ambientes, além de se
Aplicada. (p. 233-234) estender para outras respostas da mesma classe (a
generalização não deve ser meramente esperada,
A expressão análise do comportamento aplicada mas sim planejada).
(do inglês, applied behavior analysis) é empregada Um exemplo de pesquisa aplicada, ilustrativo
para referir dois campos distintos de atuação do do lugar intermediário que ela ocupa entre a pes-
analista do comportamento: (1) a pesquisa aplica- quisa básica e a intervenção, é o estudo de Ayllon,
da, que consiste no uso dos princípios comporta- Layman e Kandel (1975). Após registrarem a frequ-
mentais básicos para produzir conhecimento sobre ência de comportamentos hiperativos (correr, pu-
procedimentos de modificação de comportamentos lar, gritar, sacudir objetos, virar excessivamente as
humanos socialmente relevantes; (2) a prestação de folhas do caderno, destruir objetos, movimentar-se
serviços, que consiste na aplicação do conhecimen- em excesso) e a quantidade de acertos em matemá-
to científico oriundo das pesquisas experimental tica e em leitura de crianças que utilizavam metil-
e aplicada com o intuito de prevenir e remediar fenidato como tratamento para hiperatividade, os
problemas comportamentais humanos nas áreas pesquisadores suspenderam o uso da droga durante
da saúde mental, educação, trabalho, entre outras três dias e notaram que os comportamentos hipera-
(Carvalho Neto, 2002; Tourinho & Sério, 2010). tivos aumentaram abruptamente de frequência (re-
Em um artigo publicado no primeiro volume velando o papel da droga como variável de contro-
do Journal of Applied Behavior Analysis (JABA), le) e que as habilidades acadêmicas permaneceram
Baer, Wolf e Risley (1968) demarcaram os critérios inalteradas. Em seguida, ainda na ausência do me-
que uma pesquisa aplicada em análise do compor- tilfenidato, os pesquisadores introduziram na sala
tamento deveria atender. São eles: (1) aplicada: os de aula um procedimento em que cada resposta
comportamentos envolvidos devem ser socialmen- correta em matemática era recompensada por uma
te relevantes e a análise deve levar em consideração ficha que, posteriormente, poderia ser trocada por
as mudanças a curto e longo prazos, tanto para o diferentes reforçadores, como tempo livre, doces,
indivíduo quanto para o grupo social; (2) compor- materiais escolares, entre outros. Depois de aplicar
tamental: a pesquisa deve estar comprometida com esse procedimento por seis dias, os pesquisadores
aquilo que o indivíduo faz e não apenas com o que passaram a dar uma ficha também para cada res-
ele relata fazer; portanto, o comportamento deve posta correta de leitura. Ao fim dos 12 dias de in-

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tervenção, a frequência de respostas corretas nessas mais comprovada, e um desinteresse ou insa-


disciplinas quadriplicou e a frequência de compor- tisfação dos novos terapeutas comportamentais
tamentos hiperativos diminuiu para os mesmos ní- pela teoria behaviorista. Tal situação tornou-se,
veis do uso do medicamento, sugerindo que, para então, propícia para a inserção de outras teorias
aquelas crianças, a intervenção comportamental foi e técnicas no campo da terapia comportamental,
mais eficaz do que o tratamento farmacológico. gerando distintos modelos de análise, interven-
Em síntese, o cenário das terapias comportamen- ção e propostas para a adoção de um ecletismo
tais na primeira metade do século XX era marcado teórico como a melhor alternativa para aqueles
por dois tipos de atuação. Por um lado, terapeutas que desenvolviam uma prática clínica compor-
aplicavam o conhecimento acerca do condiciona- tamental. (Barbosa & Borba, 2010, p. 68-69)
mento respondente no ambiente de consultório para
tratar transtornos de ansiedade, prática denomina- Nesse contexto, influenciados pela ascensão da
da terapia comportamental, e, por outro, analistas do chamada “revolução cognitiva” e interessados na
comportamento aplicavam os princípios operantes maneira pela qual processos cognitivos poderiam
em ambientes institucionais manipulando direta- afetar comportamentos e sentimentos, terapeutas
mente as contingências para alterar a frequência de passaram a questionar a utilidade dos princípios
comportamentos específicos, prática que ficou co- de condicionamento para a prática da psicoterapia
nhecida como modificação do comportamento. Vale e desenvolveram novos modelos de psicoterapia,
observar que essa distinção terminológica nunca foi dentre os quais se destacam a terapia cognitiva de
bem aceita pela comunidade científica e que as ex- Aaron Beck e a terapia racional emotiva compor-
pressões terapia comportamental e modificação do tamental de Albert Ellis. Em geral, tais terapias
comportamento foram, muitas vezes, utilizadas como partem do pressuposto de que pensamentos dis-
sinônimos (Barcellos & Haydu, 1995). funcionais causam problemas emocionais e com-
No final da década de 1960, terapeutas insa- portamentais e, portanto, buscam corrigir crenças
tisfeitos com a psicanálise e entusiasmados tanto irracionais por meio da apreciação de evidências
pela objetividade quanto pelo embasamento em- favoráveis e desfavoráveis à interpretação que o in-
pírico do modelo comportamental começaram a divíduo faz de suas vivências (Beck, Rush, Shaw &
demonstrar interesse pelas questões que geralmen- Emery, 1979). Nesse movimento, as novas terapias
te levam alguém a procurar atendimento psicoló- comportamentais deixaram de se preocupar com
gico no consultório, como depressão, dificuldades as bases empíricas das técnicas empregadas, como
do dia-a-dia, problemas conjugais, sentimentos e explica O’Donohue (1998):
pensamentos desagradáveis, melhora da qualidade
de vida e autoconhecimento, fenômenos que rece- O argumento era que os modelos animais de
biam pouquíssima atenção por parte dos analistas condicionamento eram inadequados para o
do comportamento (Hayes, 2004; Pérez-Álvarez, estudo da aprendizagem humana porque negli-
2006). Segundo Barbosa e Borba (2010), esse de- genciavam as habilidades únicas dos seres hu-
sinteresse talvez possa ser explicado pelo embasa- manos, como as habilidades verbais. Dessa for-
mento da tecnologia analítico-comportamental em ma, esses modelos animais de condicionamento
dados empíricos oriundos da pesquisa animal de precisavam ser complementados ou substituídos
laboratório, que não requer o estudo de fenômenos por explicações cognitivas. . . . Os críticos fo-
subjetivos, e de sua ênfase na intervenção direta so- ram rápidos em apontar que as novas técnicas
bre as variáveis de controle dos comportamentos- cognitivas geralmente tinham, na melhor das
-alvo em ambientes controlados, onde era possível hipóteses, uma conexão bastante frouxa com
observá-los e mensurá-los. Dessa forma, a psicologia cognitiva experimental. Isso era
epistemologicamente sério porque, na medida
predominava uma avaliação paradoxal da tera- em que essa crítica era verdadeira, os terapeutas
pia comportamental, coexistindo um interesse comportamentais não estavam mais extrapolan-
geral pelas suas técnicas, de eficácia cada vez do princípios previamente testados (p. 9).

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Apesar de postularem que os processos de con- analistas do comportamento dos Estados Unidos
dicionamento eram insuficientes para o estudo do da América buscaram desenvolver um modelo de
comportamento humano, as novas modalidades de psicoterapia consistente com os pressupostos da
terapia comportamental que surgiram no final dos análise do comportamento e distingui-lo da eclética
anos 1960, cuja ênfase recaía sobre os processos terapia comportamental, o que culminou no surgi-
cognitivos, incorporaram muitos dos procedimen- mento da análise do comportamento clínica (CBA,
tos comportamentais (dessensibilização, exposição, do inglês clinical behavior analysis).
modelagem, etc.), culminando num ecletismo téc- A CBA foi definida como um ramo da análise
nico e teórico que viria a receber o nome de tera- do comportamento aplicada que se distingue pelos
pia cognitivo-comportamental (Barbosa & Borba, tipos de clientes atendidos, problemas clínicos abor-
2010; Pérez-Álvarez, 2006; O’Donohue, 1998), dados, procedimentos utilizados e ambiente no qual
ainda que as diferenças filosóficas entre os mode- a intervenção é conduzida (Guinther & Dougher,
los cognitivista e analítico-comportamental fossem 2013; Kohlenberg, Hayes & Tsai, 1993; Kohlenberg,
grandes demais para possibilitar uma integração. Tsai & Dougher, 1993). Porém, alguns autores
Como explica Costa (2002): “defender a compati- (Hayes, 2004; Pérez-Álvarez, 2006, 2012) explicam
bilidade, complementaridade e/ou integração entre que a CBA não indica ou é representada por uma
Behaviorismo Radical e Cognitivismo constitui em única terapia, mas abarca diversas modalidades te-
uma incoerência teórica que só pode ser explicada rapêuticas (às vezes referidas como terapias compor-
pela ausência de familiaridade com os pressupostos tamentais de terceira onda), a saber: terapia de acei-
de uma ou outra orientação” (p. 44). tação e compromisso (ACT, do original acceptance
As décadas de 1970 e 1980 testemunharam uma and commitment therapy; Hayes, Strosahl & Wilson,
gigantesca expansão das terapias comportamentais, 1999), psicoterapia analítica funcional (FAP, do origi-
com a publicação de inúmeros livros, surgimento nal functional analytic psychotherapy; Kohlenberg &
de periódicos científicos e fundação de associações Tsai, 1991), terapia comportamental dialética (DBT,
profissionais, mas, devido à mistura de teorias e do original dialectical behavioral therapy; Linehan,
técnicas, o campo ficou extremamente fragmenta- 1993a, 1993b), ativação comportamental (BA, do
do. Nesse cenário, os princípios teórico-conceituais original behavioral activation; Martell, Dimidjian
da análise do comportamento e sua filosofia sele- & Herman-Dunn, 2013), terapia comportamental
cionista foram abandonados quase completamente integrativa de casais (IBCT, do original integrative
na prática clínica de consultório, embora estives- behavioral couples therapy; Christensen, Jacobson &
sem acumulando cada vez mais evidências de efi- Babcock, 1995), e terapia cognitiva baseada em min-
cácia nas pesquisas em análise do comportamento dfulness (MBT, do original mindfulness-based cogni-
aplicada. Certamente, a pouca atenção dada pelos tive therapy; Segal, Teasdale & Williams, 2002).
analistas do comportamento às queixas clínicas tí- Assim, embora o movimento intitulado CBA
picas de indivíduos verbalmente competentes e o possa ter sugerido um avanço para aqueles que bus-
estabelecimento da eficácia da terapia cognitivo- cavam exercer uma prática psicoterápica embasada
-comportamental em ensaios clínicos randomi- na análise do comportamento (uma vez que seria
zados contribuíram para isso (Barbosa & Borba, um retorno da terapia comportamental às carac-
2010; Hayes, 2004; Kohlenberg, Hayes & Tsai, 1993; terísticas essenciais dessa abordagem), ele acabou
Pérez-Álvarez, 2006). culminando na criação de diferentes modalidades
No fim dos anos 1980, então, a prática das te- de prática clínica, repetindo, mais uma vez, a histó-
rapias comportamentais estava dividida: analistas ria de ecletismo da terapia comportamental.
do comportamento trabalhavam em ambientes Por fim, é importante observar que, quando se
institucionais com problemas severos de compor- postula que ACT, FAP, DBT, BA, IBCT e MBT fazem
tamento e terapeutas cognitivo-comportamentais parte de um movimento intitulado análise do com-
atuavam no consultório intervindo sobre as mais portamento clínica, sugere-se, à primeira vista, que to-
variadas queixas clínicas. Esse cenário começou a das essas modalidades de terapia são embasadas nos
mudar no início da década de 1990 quando alguns fundamentos filosóficos, conceituais, metodológicos e

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empíricos da análise do comportamento. No entanto, o mais interessante é que nem pensávamos em


tal postulado requer uma análise aprofundada, mas, trabalhar em clínica no início de nossa carreira
ainda que de extrema relevância para o avanço da profissional. Estávamos todos interessados na
área, está fora do escopo do presente artigo. carreira acadêmica e na pesquisa em Análise
Experimental do Comportamento. Era fácil en-
tender porque ninguém planejava trabalhar na
Uma Breve História da Terapia área aplicada. Tudo que nós alunos conhecía-
Analítico-Comportamental mos, então, eram textos fundamentais da análi-
se do comportamento. (p. 1)
A análise do comportamento foi introduzida no
Brasil em 1961 com a vinda do professor norte-ame- De fato, em uma série de entrevistas com te-
ricano Fred Keller para ministrar uma disciplina de rapeutas brasileiros responsáveis pelo surgimento
psicologia experimental na Universidade de São da TAC, Bellodi (2011) constatou que esse mo-
Paulo. À época, a formação consistia na aprendi- delo de intervenção foi sendo gradualmente ela-
zagem dos processos comportamentais básicos por borado por eles, uma vez que, à época, os ana-
meio da leitura dos primeiros livros-texto em aná- listas do comportamento estrangeiros atuavam
lise do comportamento (e.g., Keller & Schoenfeld, com populações severamente incapacitadas em
1950/1995) e das pesquisas publicadas no Journal of instituições e a prática clínica em consultório era
the Experimental Analysis of Behavior, além da reali- dominada por terapeutas cognitivos. Assim, sem
zação de experimentos com ratos (Guilhardi, 2003; terem modelos de atuação ou experiência clíni-
Matos, 1998). Entretanto, as primeiras tentativas de ca, esses profissionais –Rachel Kerbauy, Diana
aplicação da pesquisa básica para problemas huma- Laloni, Hélio Guilhardi, Jaíde Regra, Vera Otero,
nos não demoraram a aparecer. Maly Delitti, Maria Luisa Guedes, Sonia Meyer,
Em 1969, a primeira turma de psicologia da Yara Ingberman, Miriam Marinotti, Fátima Conte,
Universidade Católica de Campinas, que cursava o Regina Wielenska, Roberto Banaco, entre outros –
último ano da graduação, manifestou interesse em transpuseram os princípios da análise do compor-
aplicar os princípios da análise experimental do com- tamento para o ambiente de consultório, criando
portamento à clínica, o que levou o professor Luiz uma modalidade de psicoterapia de base behavio-
Otávio de Seixas Queiroz a criar um estágio supervi- rista radical.
sionado intitulado Modificação do Comportamento. Pode-se observar, portanto, que a história das
No fim desse ano, Luiz Otávio de Seixas Queiroz e terapias comportamentais no Brasil seguiu um per-
seus alunos Hélio Guilhardi, Ana Teresa de Abreu curso diferente em relação ao desenvolvimento dos
Ramos, Maria Elisa Cardoso Guimarães, Erb Luís modelos terapêuticos de origem internacional. Os
Lente Cruz e Ilka da Veiga Moroni fundaram a pri- autores da CBA construíram suas propostas clínicas
meira clínica do Brasil com tratamentos embasados a partir de uma crítica ao internalismo das terapias
na análise do comportamento (Batista, Ferrari & cognitiva e cognitivo-comportamental, retoman-
Laloni, 2005; Guilhardi, 2003). do, em tese, as raízes externalistas e selecionistas
Na mesma época, em São Paulo, os alunos da análise do comportamento. Os analistas do com-
de análise experimental do comportamento da portamento brasileiros, por sua vez, transpuseram
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Sedes para o âmbito da psicoterapia seu conhecimento
Sapientiae (que mais tarde se tornaria PUC-SP) acerca dos processos básicos constitutivos dos fenô-
começaram a solicitar aulas sobre intervenção. menos comportamentais, incluindo a abordagem
Para atender a essa demanda, a professora Rachel Skinneriana ao comportamento verbal (Skinner,
Kerbauy convidou o norte-americano Michael 1957/1992) e à subjetividade (e.g., Skinner, 1945,
Mahoney para ministrar treinos em análise do 1953/1965, 1974/1976), muito antes de as terapias
comportamento aplicada, com aulas teóricas e su- cognitiva e cognitivo-comportamental se tornarem
pervisão (Rangé & Guilhardi, 1995). Ao comentar conhecidas ou praticadas neste país. Como explica
sobre esse período, Guilhardi (2003) lembra que Vandenberghe (2011):

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Nos Estados Unidos, a aplicação plena de uma Por essa razão, Tourinho e Cavalcante propu-
visão externalista na prática de consultório seram, em 2001, o uso do termo terapia analítico-
ocorreu depois que a terapia cognitivo-compor- -comportamental, que se tornou consenso entre
tamental (internalista) já tinha sido estabelecidaterapeutas de diferentes regiões do Brasil como a
com firmeza. Foi uma contribuição inovadora melhor denominação para qualificar sua prática
[da CBA] propor uma prática clínica coerente- profissional, por especificar, já em seu nome, as
mente externalista. A situação brasileira foi bem bases filosóficas, conceituais e metodológicas que
diferente. No Brasil, a tradição comportamen- a sustentam2. Deve-se ressaltar que a criação do
tal aderiu desde cedo à análise Skinneriana e a termo não teve a intenção de propor uma nova
terapia comportamental se desenvolveu dentro modalidade de terapia, mas apenas uniformizar o
da comunidade verbal behaviorista radical. . . nome da prática clínica fundamentada na ciência
. Por isso, o externalismo não constituiu uma do comportamento Skinneriana que vinha sendo
inovação na terapia comportamental brasilei- praticada no Brasil desde o início da década de
ra. Os terapeutas comportamentais no país não 1970 (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008).
precisaram esperar a FAP e a ACT para assumir Enfim, como explica Vandenberghe (2011), a
uma visão externalista. . . . Observamos, então, TAC foi desenvolvida no Brasil por um grupo de
uma cronologia invertida. A terceira onda apa- terapeutas que estenderam os fundamentos filosófi-
receu no cenário internacional depois da terapia cos do behaviorismo radical e os princípios básicos
cognitivo-comportamental. O modelo cognitivo da análise experimental do comportamento para
e as técnicas da terapia cognitiva estavam ampla- o âmbito da psicoterapia. Dessa forma, quando a
mente aceitos como a forma ortodoxa de tratar CBA começou a aparecer no fim da década de 1980
transtornos de ansiedade e de humor. Os autores e começo da década de 1990 nos Estados Unidos
da terceira onda construíram sua abordagem a da América, uma terapia comportamental de base
Skinneriana já estava bem solidificada no Brasil.
partir de uma crítica externalista às práticas exis-
tentes. Eles continuaram atuando basicamente Por fim, deve-se destacar que o termo criado no
como o fizeram os clínicos da segunda onda, Brasil para identificar a terapia comportamental de
mas trocaram o modelo cognitivo por um mo- base behaviorista radical – terapia analítico-com-
delo contextualista, inspirado no behaviorismo portamental – é desconhecido no resto do mundo.
Por exemplo, em uma busca realizada no Google
radical. . . . No Brasil, a sequência foi diferente.
A terapia cognitivo-comportamental se tornou Acadêmico em setembro de 2015 com as expressões
uma força importante quando a terapia com- “behavior-analytic therapy”, “behavioral-analytic
portamental de cunho behaviorista radical já therapy” e “analytical-behavioral therapy” (algumas
estava bem desenvolvida. (pp. 35-36) traduções possíveis para terapia analítico-compor-
tamental), foram identificados quase que exclusiva-
Ao longo de seu desenvolvimento, diversas ter- mente artigos de autores brasileiros que utilizaram
minologias foram utilizadas para se referir à prática tais expressões no resumo ou nas palavras-chave. Em
clínica brasileira de base behaviorista radical, tais poucas palavras, o termo cunhado no Brasil não é
como psicoterapia comportamental (e.g., Barcellos conhecido e utilizado fora dele, o que, naturalmente,
& Haydu, 1995; Lettner & Rangé, 1988), terapia dificulta a inserção da produção de conhecimento
comportamental (e.g., Guedes, 1993; Meyer, 1995) sobre terapia dos analistas do comportamento deste
e psicologia clínica comportamental (e.g., Silvares,
2000/2012). Entretanto, nos anos 1990 e 2000, ana- 2  Outras denominações foram dadas à terapia comportamen-
listas do comportamento brasileiros questionavam se tal de base behaviorista radical no Brasil, como terapia por
essas denominações eram suficientes para represen- contingências de reforçamento, psicoterapia comportamental
tar sua atuação, uma vez que estavam muito associa- pragmática e terapia molar e de autoconhecimento, mas as
semelhanças entre elas (todas são fundamentadas na análi-
das às técnicas respondentes e eram frequentemente se do comportamento e utilizam a análise de contingências
confundidas com a terapia cognitivo-comportamen- como ferramenta de análise e intervenção) sugerem que o uso
tal (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008). de tais denominações é desnecessário (Costa, 2011).

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fundamentadas na filosofia do behaviorismo radi- Some current dimensions of applied behavior
cal e na ciência da análise do comportamento po- analysis. Journal of Applied Behavior Analysis,
deria sugerir, à primeira vista, que TAC, ACT, FAP, 1, 91-97. doi: 10.1901/jaba.1968.1-91
DBT, BA, IBCT e MBT são totalmente compatíveis Barbosa, J. I. C. & Borba, A. (2010). O surgimento
entre si ou, até mesmo, que são apenas nomes dife- das terapias cognitivo-comportamentais e suas
rentes para um mesmo tipo de prática. Entretanto, consequências para o desenvolvimento de uma
a relação entre elas não é tão simples assim. abordagem clínica analítico-comportamental
Por um lado, ambas defendem a transposição dos eventos privados. Revista Brasileira de
de princípios comportamentais empiricamente Terapia Comportamental e Cognitiva, 12, 60-
validados, mas, por outro, alguns modelos tera- 79. Retirado de: www.usp.br/rbtcc/index.php/
pêuticos encerrados sob a CBA apresentam des- RBTCC/article/download/416/310
prendimento com os princípios teórico-conceitu- Barcellos, A. & Haydu, V. B. (1995). História da
ais da análise do comportamento e fazem uso de psicoterapia comportamental. Em B. P. Rangé
um linguajar que soa mentalista para aqueles que (Org.), Psicoterapia comportamental e cogniti-
valorizam o jargão Skinneriano (Vandenberghe, va: Pesquisa, prática, aplicações e problemas (pp.
2011). Por exemplo, diversos autores (e.g. Foody, 43-53). Campinas: Editorial Psy.
Barnes-Holmes, Barnes-Holmes & Luciano, 2013; Batista, C. G., Ferrari, E. M. & Laloni, D. T. (2005).
Guilhardi, 2012; McEnteggart, Barnes-Holmes, Luiz Otávio de Seixas Queiroz: Um pioneiro da
Hussey & Barnes-Holmes, 2015) argumentam que análise do comportamento no Brasil. Revista
os termos utilizados pela ACT, como fusão cogni- Brasileira de Análise do comportamento, 1,
tiva, aceitação, mindfulness (atenção plena), self 269-273. Retirado de: http://periodicos.ufpa.
conceitualizado e self como contexto, entre outros, br/index.php/rebac/article/viewPDFIntersti-
não possuem qualquer relação com o vocabulário tial/794/1104
analítico-comportamental ou com os fundamentos Beck, A. T., Rush, A. J., Shaw, B. F. & Emery, G.
filosóficos, teóricos e empíricos dessa abordagem, o (1979). Cognitive therapy of depression. New
que dificulta compreensão recíproca. York: The Guilford Press.
A despeito de qual seja a relação entre TAC e Bellodi, A. C. (2011). Terapia comportamental no
as diferentes modalidades de terapia abarcadas sob Brasil: História de terapeutas (Dissertação de
o rótulo CBA, o cenário histórico descrito aqui mestrado). Pontifícia Universidade Católica de
permite constatar que, tanto no Brasil quanto no São Paulo, São Paulo, SP. Retirado de: http://
resto do mundo, ainda não existe consenso sobre www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.
o modelo analítico-comportamental de interven- php?codArquivo=13053
ção psicoterápica. Nesse sentido, pesquisas futu- Bisaccioni, P. & Carvalho Neto, M. B. (2010).
ras deveriam ocupar-se de analisar tanto o grau de Algumas considerações sobre o “pequeno
embasamento teórico, empírico e prático desses di- Albert”. Temas em Psicologia, 18, 491-498.
ferentes modelos de terapia na análise do compor- Retirado de: http://ufpa.br/ppgtpc/dmdo-
tamento, assim como as semelhanças e diferenças cuments/Bisaccioni%20&%20Carvalho%20
entre eles, de modo a buscar um modelo homogê- N e t o % 2 0 2 0 1 0 % 2 0 Te m a s % 2 0 e m % 2 0
neo de uma análise do comportamento clínica / te- Psicologia.pdf
rapia analítico-comportamental.

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Informações do Artigo

Histórico do artigo:
Submetido em: 27/08/2015
Primeira decisão editorial: 27/10/2015
Aceito em: 30/10/2015

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