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TCC COMO TRATAR DEPENDÊNCIA QUÍMICA EM TCC 

Dependência química
Ernani Luz júnior
A  terapia cognitivo-comportamental, da qual Aaron Beck é um dos pioneiros com seus
trabalhos sobre depressão, teve seu uso rapidamente estendido para diversas outras
patologias, entre elas a dependência química. Mas foi só a partir de 1993, com a
publicação de Cognitive Therapy of Substance Abuse, por Beck e colaboradores, que a
utilização da terapia cognitiva das dependências químicas se expandiu.
   Marlatt e Gordon, com a publicação de Relapse Prevention  em 1985, aportaram
importante contribuição para a abordagem dos usuários de drogas, com os conceitos
de lapso e de situação de risco  e com as novas técnicas para prevenção de recaídas.
Também Miller e Rollnick, em 1992, com a publicação de seu livro Motivational
Interviewing: preparing people to change addictive behavior, examinando
profundamente a ambivalência  dos pacientes e suas dificuldades de fazer e de aceitar
mudanças e desenvolvendo novas técnicas motivacionais, enriqueceram
significativamente o arsenal terapêutico para o tratamento das dependências.
 Com dependentes químicos, a TCC vem sendo aplicada como psicoterapia individual,
psicoterapia de grupo, terapia familiar e, também, por ambientes cognitivamente
orientados (unidades hospitalares, escolas terapêuticas, hospitais-dia, comunidades
terapêuticas).
 Sendo uma forma de tratamento complementar, pode e vem sendo utilizada em
associação com outros métodos terapêuticos, tais como: a terapia dos doze passos, os
grupos de auto-ajuda, as terapias psicodinâmicas o tratlamento farmacológico das
dependências químicas e o tratamento das co-morbidades psiquiátricas.
   Este capítulo tratará o tema exclusivamente com base nos conceitos de Beck, embora
a contribuição de Marlatt e de Miller esteja implícita em muitos momentos. Os
conceitos de dependência química e adicção serão utilizados, aqui, como sinônimos, e a
palavra fissura será usada para a tradução de craving  (o apetite patológico por uma
droga, com manifestações fisiológicas e psicológicas).
Na continuação, o capítulo abordará:
O modelo cognitivo da adicção a drogas e das recaídas. A formulação cognitiva. As
intervenções voltadas para cada uma das sete fases do modelo cognitivo As técnicas
cognitivas e comportarmentais utilizadas. Uma breve ilustração clínica. Alguns
instrumentos padronizados em anexo.
O MODELO COGNITIVO
Em 1993, Beck apresenta seu modelo cognitivo do uso de substâncias, também
denominado Modelo Cognitivo de Recaída (Figura 17.1)
1 – Situação – ou situações – atuam como estímulos de alto risco.
2. Estímulos (internos ou externos) ativam crenças centrais sobre o indivíduo, o mundo
e o futuro e as crenças sobre o uso de drogas.
3. As crenças ativadas, geralmente não-conscientes, levam ao surgimento de
pensamentos automáticos.
4. Os pensamentos automáticos desencadeiam o surgimento de sinais e sintomas
fisiológicos interpretados ou reconhecidos como fissura (craving).
5. Surgem crenças permissivas, facilitadoras.
6. Regido pelo craving e autorizado pelas crenças facilitadoras, o indivíduo planeja e
providencia o acesso à droga e inicia seu uso.
7. O uso da substância desencadeia uma situação contraditória: desejo de continuar o
uso por um lado, e sentimentos de culpa e fracasso, por outro (classicamente
denominado efeito de violação da abstinência  – EVA).
8. O desconforto psicológico ativa mais crenças disfuncionais e o uso da droga tem
continuidade.
Este não é um modelo etiológico, pois não explica a origem e o desenvolvimento das
dependências químicas, mas permite compreender o que contribui para a manutenção do
uso de substâncias psicoativas e para a tendência a recaídas,  assim como identificar e
definir as áreas às quais dirigir as intervenções terapêuticas.
MODELO COGNITIVO DO USO DE SUBSTÂNCIAS (Beck e al., 19933B)
A FORMULAÇÃO COGNITIVA 
Para o efetivo tratamento de um caso, é necessária uma formulação cognitiva
abrangente, isto é, a coleta, integração e síntese de dados sobre o paciente, que permita
fazer hipóteses sobre a etiologia de suas crenças disfuncionais e de seus principais
sintomas, bem como planejar o tratamento dessas crenças disfuncionais e sintomas do
paciente.
Os dados coletados incluem: identidade, informações relevantes de sua história pessoal,
o problema atual, sua lista de problemas, seu diagnóstico psiquiátrico (utilizando C1D-
10 ou DSM-IV), seu desenvolvimento e o “perfil cognitivo”.
No início do atendimento é feita uma formulação cognitiva inicial, que permite as pri-
meiras intervenções terapêuticas, mas essa formulação vai sendo corrigida e completada
até o final do tratamento.
Judith Beck lista as sete questões que essa formulação deve procurar responder:
Qual é o diagnóstico do paciente? Quais são seus problemas atuais, como esses
problemas se desenvolveram e como são mantidos? Que pensamentos e crenças
disfuncionais estão associados aos problemas? Quais reações (emocionais, fisiológicas e
comportamentais) estão associadas ao seu pensamento? Que aprendizagens e
experiências antigas (e talvez predisposições genéticas) contribuem hoje para seus
problemas? Quais são suas crenças subjacentes (incluindo atitudes, expectativas e
regras) e pensamentos? Como ele enfrentou suas crenças disfuncionais? Que
mecanismos cognitivos, afetivos e comportamentais, positivos e negativos, ele
desenvolveu para enfrentar suas crenças disfuncionais? Como ele via (e vê) a si mesmo,
os outros, seu mundo pessoal, seu futuro? Que estressores contribuíram para seus
problemas psicológicos ou interferiram em sua habilidade para resolver esses
problemas?
AS INTERVENÇÕES 
Em grupo ou isoladamente, a recaída será sempre um processo solitário de repetidas
tomadas de decisão. O que a TCC procura é, modificando as situações e a interpretação
do indivíduo de situações e estímulos, ou atenuando suas crenças disfuncionais mais
importantes sobre o uso de drogas, treinar o paciente a desafiar seus pensamentos
automáticos, a elaborar pensamentos e crenças alternativas no manejo de suas fissuras e
no desafio das crenças permissivas a que mais frequentemente costuma recorrer, para
habilitá-lo a desenvolver um estilo de vida sem drogas e a tomar, repetidamente,
decisões que modifiquem o funcionamento do processo adictivo.
Uma forma didática de apresentarmos a TCC do dependente químico é, considerando as
sete fases do modelo cognitivo, examinar as intervenções voltadas para cada uma delas.
Fase 1 – Os estímulos de alto risco 
Estímulos externos e internos podem ativar crenças disfuncionais sobre o uso de drogas.
Pessoas, lugares e objetos relacionados com o uso da droga funcionam como estímulos
externos. Por exemplo: ex-companheiros de uso, fornecedores, locais onde usava,
objetos que utilizava para se drogar, objetos semelhantes à droga (pós, líquidos,
cigarros), comerciais de rádio e TV, músicas que descrevem ou exaltam o uso de
drogas, filmes que mostram rituais de drogas, etc.
Como estímulos internos podem funcionar: as lembranças e os estados psicológicos de
desconforto (depressão, ansiedade, irritacão, frustração) ou de bem-estar (euforia,
experiências sexuais, experiências místicas) que  tenham sido alterados ou produzidos
pelo uso de drogas e que estimulem crenças antecipatórias ou crenças de alívio.
Esses estímulos internos e externos que podem ativar o processo de recaída são também
chamados de situações de alto risco. A identificação das situações de risco que sejam
relevantes para determinado paciente, é sem dúvida, indispensável no processo de sua
TCC.  Tal identificação pode ser feita pelo trabalho clínico: estudo detalhado de
recaídas anteriors, dos momentos em que apresentou fissura nas fases de abstinência,
estudo de seu dia-a-dia. Outro recurso para essa identificação é o uso de inventários e
questionários. Técnicas de dramatização também são utilizadas nesta fase.
Fase 2 – As crenças ativadas sobre o uso de drogas 
As crenças que facilitam o uso de drogas são as chamadas crenças adictivas e são
descritas em três categorias:
Crenças antecipatórias: expectativa de que o uso da droga produzirá recompensa,
gratificação ou prazer.
Crenças de alívio: expectativa de que o uso da droga aliviará ou afastará algum
desconforto ou sofrimento.
Crenças permissivas ou facilitadoras: consideram o  uso da droga aceitável, apesar das
consequências.
Beck preconiza que as crenças adictivas giram em torno da busca de prazer, da  solução
de problemas e do alívio do desconforto e variam de pessoa para pessoa e com o tipo de
droga preferida. Entre as crenças adictivas, cita:
• a droga é necessária para manter o equilíbrio psicológico ou emocional;
• a droga melhorará o funcionamento social e intelectual;
• a droga trará prazer e excitação;
• a droga fornecerá força e poder;
• a droga terá efeito calmante;
• a droga trará alívio para a monotonia, ansiedade, tensão e depressão;
• sem o uso da droga, o craving – fissura – continuará, indefinidamente e cada vez  mais
forte.
Em oposição às crenças adictivas, os pacientes apresentam crenças de controle, aquelas
que diminuem a possibilidade do uso e abuso de substâncias
Os dependentes lidam com situações mistas, ou seja, convivem com a coexistência de
crenças adictivas e crenças de controle.
Cabe à TCC modificar e atenuar as crenças adictivas, fortalecendo as crenças de
controle do paciente e auxiliando-o a desenvolver  novas. Para tanto, é importante a
identificação  das crenças adictivas mais influentes no comportamento de cada paciente.
Essa identificação pode ser feita pelo contato clínico com o paciente durante as sessões
e também por inventários. Desses inventários, destacam- se o inventário de  crenças
sobre o uso substâncias e o Inventário de crenças sobre fissuras, ambos desenvolvidos
por Fred Wright (em anexo).
Identificadas as crenças adictivas mais relevantes no comportamento do paciente, o
campo dos esforços terapêuticos está balizado. No entanto as crenças adictivas –
desenvolvidas e superapreendidas ao longo do tempo – foram reforçadas por inúmeras
experiências de uso da droga. Além disso, todos os frustrados esforçosi anteriores de
abandonar o uso da droga reforçaram as crenças adictivas e desenvolvera a crença de
que é inútil tentar  contolar a adicção. Modificar crenças adictivas, portanto, é tarefa
bastante difícil, porque elas são profundas e extremamente resistentes à mudança.
Para modificar as crenças adictivas é necessário:
identificar crenças adictivas e avaliar sua real importância na vida do paciente;
familiarizar o paciente com o modelo cognitivo de recaída; examinar e testar as crenças
adictivas; desenvolver crenças de controle; 5.               testar e praticar crenças de
controle. 
Fase 3 – Os pensamentos automáticos (PA) 
A interpretação de uma situação (mais que a situação em si) influencia a resposta do
indivíduo. Essa interpretação é muitas vezes expressa por um pensamento automático.
Os pensamentos automáticos são pensamentos, idéias ou imagens que coexistem com o
fluxo mais manifesto do pensamento; são pouco conscientes, não são questionados, pa-
recem surgir automaticamente e geralmente são tomados como verdadeiros. Costumam
preceder e determinar alterações importantes no humor, no comportamento e no estado
psi-cofisiológico do indivíduo.
O treinamento do paciente em identificar seus pensamentos automáticos – testando sua
realidade e utilidade – é uma das ferramentas mais utilizadas na TCC. A investigação
dos pensamentos automáticos pela técnica da seta descendente é o caminho mais usado
para a identificação das crenças centrais. Evidentemente, no tratamento da dependência
química, o foco são os pensamentos automáticos (idéias, pensamentos, imagens) que
precedem o surgimento da vontade de usar drogas e da fissura. Freqüentemente esses
pensamentos são muito simples e repetitivos.
Na TCC dos dependentes químicos, os pacientes necessitam se tornar experts em mo-
nitorar esses pensamentos. Devem, imediatamente após o surgimento da fissura, iniciar
a investigação, procurando identificar o(s) pensamento(s) automático(s), desafiá-lo(s),
examinar sua validade e utilidade e trabalhar em
sua modificação, reconhecendo os efeitos desses PA em suas sensações físicas e na
vontade de usar a droga.
   Para facilitar essa tarefa, o paciente em tratamento, seja em consultório ou em regime
de internação, deve ser treinado a fazer um registro do pensamento disfuncional – RPD
-e de suas fissuras.
   Nesta fase, as técnicas mais utilizadas são: l) identificação, avaliação e
questionamento de PA;
 2) RPD;
3) seta descendente.
Fase 4 – A fissura (craving)
O desejo muito intenso de utilizar a droga e as sensações fisiológicas concomitantes
constituem o conjunto que os pacientes costumam identificar como “fissura”, e que
torna tão difícil evitar o uso da droga. É importante que o paciente aprenda como lidar
com suas fissuras, sendo essa uma das metas mais importantes no tratamento da
dependência química. Geralmente o paciente ignora fatos e mantém uma série de
crenças disfuncionais a respeito da fissura.
A TCC no manejo da fissura volta-se para:
aumentar o conhecimento do paciente sobre fissuras; identificar e corrigir crenças
disfuncionais sobre fissuras; identificar e reforçar as técnicas que o paciente utiliza
espontaneamente e com êxito para o manejo das fissuras; treinar o paciente em técnicas
cognitivas e comportamentais para o enfrentamento das fissuras.
   A fissura pode ser provocada, inadvertidamente, mesmo por atividade que tenha
objetivo terapêutico. O simples relato de fatos relacionados com o uso da substância
pode “fissurar” o paciente ou outro componente de um grupo, por exemplo. Mas
também é possível provocar a fissura intencionalmente, para treinar atividades de
tratamento. Assim, é importante que no programa de tratamento as últimas atividades do
dia ou da sessão não sejam potencialmente acionadoras de fissura, mas sim atividades
de relaxamento ou técnicas de distração.
   É fundamental que o paciente seja esclarecido sobre a fissura: quando e por que
ocorre, quanto tempo dura, quais são seus sintomas, seus desencadeantes, os tipos, etc.
A identificação das crenças disfuncionais sobre fissura, relevantes para o paciente, pode
ser feita no trabalho clínico e também por meio de inventários. Fred Wright, já citado
anteriormente, elaborou um inventário para esse objetivo (em anexo).
 O trabalho com as crenças identificadas requer os mesmos passos citados na Fase 2:
identificar as crenças disfuncionais sobre fissura e avaliar sua importância para o
paciente; familiarizar o paciente com o modelo cognitivo; examinar e testar a crença
disfuncional, sua veracidade, sua utilidade, as evidências pró e contra; desenvolver
crenças alternativas – de controle; testar e praticar as crenças de controle desenvolvidas.
  Para o enfrentamento das fissuras concomitante ao trabalho voltado para as crenças
disfuncionais, o paciente tem que ser treinado em diversas técnicas cognitivas e
comportamentais. Partindo de manejos que o dependente já utilizava – com algum êxito
-, as diversas técnicas podem ser apreendidas (por meio de dramatizações), cabendo ao
paciente eleger duas ou três que pareçam mais úteis para sí, treinando-as e reforçando-
as. As técnicas mais utilizadas são: distração, cartões de enfrentamento, assertividade,
técnicas de visualização, refocalização, relaxamento e dramatização (descritas mais
adiante).
Fase 5 – As crenças  permissivas ativadas
Os pacientes, quando não estão experimentando a fissura, geralmente são capazes de
reconhecer as consequências prejudiciais do uso da droga e a necessidade de evitá-la.
Com a intensificação do craving,  são ativadas crenças de que não há razões fortes o
suficiente para não usar ou de que há razões que justificam o uso, apesar das
consequências: são as crenças permissivas.
   Pelo estudo das fissuras e das recaídas  vivenciadas pelo paciente e por meio de
dramatizações, pode-se auxiliá-lo a identificar os pensamentos automáticos e as crenças
permissivas a que mais freqüentemente recorre. Ele necessita ser treinado a monitorar o
surgimento de suas crenças permissivas, questionando-as, testando-as e modificando-as.
As dramatizações em ambiente protegido, sem acesso a drogas são indicadas para esse
trabalho.
   O trabalho cognitivo a ser feito com as crenças permissivas segue os mesmos passos
citados nas crenças adictivas e nas crenças sobre fissura. Além disso, convém lembrar
que as crenças de controle desenvolvidas podem utilizadas como conteúdo de cartões de
enfrentamento.

Fase 6 – O plano de ação e a implementação


Esta fase inclui o planejamento e a execução de passos e providências necessários para
o uso da substância: como conseguir dinheiro, como adquirir a droga, como ultrapassar
os obstáculos, etc.
O estudo de fissuras e de recaídas prévias e a utilização de dramatizações permitem
identificar – com o paciente – quais os caminhos, quais as características, quais os
passos que costuma percorrer nesta fase. Isso pode facilitar o reagendamento das
atividades do paciente e a reorganização de seu estilo de vida, afastando elementos e
tornando menos provável a recaída.
Planos de ação alternativos podem e devem ser elaborados e testados. Assim, para
preparar o paciente para enfrentar esta fase, ele deve ser treinado em:
– identificar os planos de ação e os métodos padronizados que utiliza em suas recaídas;
– elaborar planos de ação e comportamentos alternativos;
– afastar fatores que facilitem a recaída.
Fase 7 – O uso continuado
O reinicio do uso da substância, além de reativar os mecanismos bioquímicos da
dependência (mais ou menos intensos de acordo com a droga envolvida, as
características do paciente e a severidade e fase de sua adicção), costuma desencadear
sentimentos importantes de culpa, fracasso, auto-recriminação. Nesta fase, reativam-se
inúmeras crenças adictivas (Fase 2) que levam ao surgimento de pensamentos
automáticos (Fase 3) e à perpetuação do processo de adicção.
   Na continuação do uso, menor vai ficando a possibilidade de o paciente deter o
processo, mais fortalecidas vão se tornando as crenças adictivas e mais débeis as
crenças de controle. Muitas vezes o tratamento do dependente químico tem início nesta
fase. Além disso, a recaída é intercorrência frequente no curso do tratamento. Portanto,
é útil – e fundamental – não encarar o uso da substância como um fenômeno sem meios-
termos.
   O reinicio do uso da droga pode e deve ser encarado como um “lapso”, um
“escorregão”, momento no qual alguma coisa ainda pode ser feita para impedir o
desenvolvimento completo da recaída. Mesmo o uso dependente pode ser encarado
como um processo no qual o uso da dose seguinte, ou o uso do dia seguinte, é visto
como a tomada de uma nova decisão, que pode ser abordada cognitivamente.
   Nesta fase é importante avaliar a motivação do paciente. Para isso, além da avaliação
clínica, existem questionários específicos. Um dos mais utilizados é o
URICA (University of Rhode Island Change Assesment), que avalia a motivação do
paciente, classificando-o de acordo com os “estágios de motivação para a mudança”
estabelecidos por Prochaska e Di Clemente. Essa classificação localiza o paciente como
predominantemente em pré-contemplação (nem pensa em interromper o uso, fazer
qualquer mudança), em contemplação (está ambivalente, pensa em modificar seu hábito
mas também em conservá-lo), em determinação(está decidido a modificar seus hábitos),
em preparação (elabora estratégias de mudança), em ação (está engajado em ações
específicas para chegar a uma mudança), em manutenção  (está engajado em manter a
modificação conseguida) ou em recaída (retorno ao uso dependente da droga) (Figura
17.2).
   Visando a preparar o paciente para enfrentar esta fase, pode-se utilizar dramatizações
(de lapsos, recaídas, situações passadas) com os pacientes que estejam em abstinência.
Com os que estão em fase de uso continuado da droga, para reforçar sua motivação,
utiliza-se a análise de vantagens e desvantagens (do uso e da abstinência) e o exame da
congruência ante os objetivos a longo prazo e o uso da droga.
ESQUEMA DOS ESTÁGIOS MOTIVACIONAIS
AS TÉCNICAS UTILIZADAS
As técnicas mais usadas na TCC do dependente químico, embora sejam de uso comum
nas terapias cognitivas em geral, serão sucintamente descritas a seguir:
Identificação de pensamentos automáticos (PA) Avaliação e questionamento de PA
Registro diário de pensamentos automáticos disfuncionais (RPD) Identificação de
crenças Avaliação e modificação de crenças Seta descendente Solução de problemas
Exame das vantagens e desvantagens Distração
Agendamento e monitorização Exposição gradual e dificuldade crescente Experimentos
comportamentais Cartões de enfrentamento Relaxamento Exercício físico Dramatização
Treinamento de assertividade
Identificação de pensamentos automáticos (PA)
Logo após uma importante modificação de humor ou o surgimento de forte vontade de
usar a droga, o terapeuta, ou o próprio paciente, deve investigar: o que você estava
pensando naquele momento, naquela situação? Que pensamento você acha que lhe
passou pela cabeça?
   Outras perguntas podem auxiliar a i certificação do pensamento automático:
O que você acha que estava pensando naquela situação? Que pensamento lhe passou
pela cabeça? Poderia estar pensando…….. ? Ou………… ? O que essa situação
significou para você? Será que você pensou………… ? (O terapeuta propõe um
pensamento neutro ou oposto ao esperado.)
Avaliação e questionamento de PA
Após a identificação de um ou mais pensamentos automáticos, o terapeuta vai auxiliar o
paciente a avaliar sua veracidade, utilidade e consequências. Usa, para isso, o método
do questionamento socrático, guiando o paciente para chegar às suas próprias
conclusões, mas também treinando-o para realizar esse exercício sózinho.
   O paciente deve avaliar, de O a 10, o quanto acredita em seu pensamento – e depois
questioná-lo
   As perguntas básicas do questionamento socrático são:
Quais as evidências reais a favor deste pensamento? Quais as evidências
reais contra este pensamento? Poderia haver outra explicação? Outra hipótese? Se o PA
for verdadeiro, o que de pior poderia acontecer? Você conseguiria superar isto? O que
de melhor poderia acontecer? Qual o resultado mais provável? O que você deveria fazer
a esse respeito? Qual a consequência de você acreditar neste pensamento? O que
poderia fazer para modificar este pensamento? O que você diria para um amigo ou
parente que estivesse nessa situação?
É óbvio que nem sempre todas as perguntas serão formuladas e, muitas vezes, terão que
ser adaptadas. Após o questionamento e ser reavaliado o quanto o paciente ainda
acredita no PA.
Registro Diário de Pensamentos Disfuncionais (RPD)
Treinar o paciente e solicitar que ele registre seus pensamentos disfuncionais, no final
do dia, de preferência, ainda na vigência do desconforto psicológico, é técnica muito
utilizada na TCC. No tratamento dos dependentes químicos, o mesmo é feito em relação
às fissuras. Os usuários tendem a seguir usando drogas em função de seus pensamentos
automáticos e crenças disfuncionais e das emoções negativas resultantes. O
preenchimento do RPD ainda durante a fissura ocupa um tempo no qual pode ocorrer a
diminuição da mesma. Além disso, o exame da adequação e da veracidade dos PA pode
levar à redução da intensidade da fissura.
   O preenchimento do RPD como tarefa de casa, no intervalo das sessões, oportuniza ao
paciente seguir identificando, avaliando e questionando seus pensamentos automáticos.
E permite ao terapeuta ter uma ideia do que realmente ocorre com seu paciente entre as
sessões.
Identificação de crenças
As crenças sobre drogas, sobre fissuras e as crenças intermediárias e centrais do
paciente podem ser identificadas pelo uso das mesmas técnicas:
observando quando um pensamento automático expressa uma crença; usando a técnica
da seta descendente a partir de um PA; examinando diversos PA e encontrando uma
temática comum; pinçando uma suposição do paciente e explorando-a; aplicando
inventários de crenças sobre uso de drogas e sobre fissuras.
Avaliação e modificação de crenças
A avaliação e a modificação de crenças é uma atividade central na terapia cognitiva em
geral. Na TCC dos dependentes químicos, isso se repete.
   Crenças centrais e crenças intermediárias identificadas, muitas vezes relacionadas
com a co-morbidade apresentada pelo paciente (frequentemente transtorno depressivo,
transtorno de ansiedade e da personalidade), precisam ser modificadas, para que seja
obtida melhora mais duradoura.
   As crenças adictivas identificadas, sejam antecipatórias, de alívio ou permissivas,
devem ser modificadas, e crenças de controle devem ser reforçadas, elaboradas e
testadas. Para isso, podem ser usados:
o questionamento socrático (técnica 2); o exame das vantagens e desvantagens de
acreditar na crença (técnica 8); o experimento comportamental (técnica 12); a
dramatização (técnica 16).
Seta descendente
É uma técnica usada, com frequência, para atingirmos uma crença a partir da
identificação de um PA. Parte-se do PA questionando: se isto é verdadeiro, significa o
quê? E se isto é verdadeiro, significa o quê? de maneira repetitiva, até que muitas vezes
chega-se a uma crença central. Exemplo:
Pensamento automático: “Não dá para ir a uma festa e não beber”.
Se isto é verdade, significa o quê?: “Que eu não consigo me divertir se não beber”.
E não se divertir na festa, significa o quê?: “Não vou poder falar com ninguém, dançar”.
E se for assim, significa o quê?: “Que eu sou uma porcaria, não sou de nada”.
Ser uma porcaria, não ser de nada, significa o quê?: “Que eu sou um incapaz, um
fracasso” – a crença central subjacente.
Solução de problemas
É técnica básica na TCC e pode ser treinada e utilizada desde o início da terapia. Ela
visa a auxiliar o paciente a:
identificar e delimitar o problema; pensar nas diversas soluções possíveis (tempestade
de idéias); examinar os prós e os contras para cada solução pensada; escolher a melhor
solução disponível; colocá-la em prática; avaliar a efetividade e a adequação da solução
escolhida.
Exame das vantagens e desvantagens
É uma técnica utilizada para auxiliar os pacientes na tomada de decisões. O paciente é
estimulado a escrever as vantagens e desvantagens de determinada decisão ou
comportamento e examiná-las e, então, tomar sua decisão. Pode ser utilizada, também,
na análise sobre a conveniência de manter determinada crença ou de aceitar uma crença
nova.
   Na TCC das dependências químicas, ela pode ser usada para examinar as vantagens e
desvantagens do uso da droga e da abstinência na motivação do paciente, no trabalho de
modificação das crenças adictivas e na elaboração de novas crenças de controle.
   Os usuários de drogas, tipicamente, mantêm crenças que minimizam as desvantagens
do uso e maximizam suas vantagens. Os pacientes são orientados a preencher uma
matriz, com quatro áreas, nas quais listarão as vantagens de usar, as desvantagens do
uso, as vantagens e as desvantagens da abstinência (em anexo).
Distração 
Esta é uma técnica importante no manejo da ansiedade e da fissura. Nestas condições,
ansiosa e fissurada, a pessoa tende a concentrar sua atenção nas várias sensações
corporais e nos pensamentos automáticos concomitantes.
A “distração” consiste no esforço para mudar o foco da atenção do mundo interno para
o ambiente externo.
Como exemplos de distração:
retirar-se do ambiente, se nele está presente o desencadeante da ansiedade e da fissura;
descrever detalhes do meio ambiente (carros, cores, contagens de objetos); envolver-se
em diálogo sobre outro tema com pessoa disponível (amigo, familiar, consultor,
terapeuta); envolver-se em atividade prática, como tarefa doméstica, arrumação de
arquivo, organização de livros, banho; lembrar e executar poema, oração ou música de
seu agrado, silenciosamente ou em bom som; envolver-se em atividade lúdica e que
requeira atenção: jogos de carta, videogames,  palavras cruzadas, quebra-cabeças, jogos
de computador.
        Agendamento e monitorização
É um método simples e direto. O paciente, concordando em utilizá-lo, recebe uma grade
com os sete dias da semana, divididos em intervalos de meia ou uma hora, para registrar
– monitorar – as atividades realizadas, o grau de satisfação e de competência percebidos
em cada atividade e o estado de humor. Esta técnica visa a:
tornar claro o dia-a-dia do paciente, suas atividades reais durante a semana e como elas
relacionam com suas fissuras e com seu uso de drogas; Programar atividades futuras –
agendamento partindo do registro das atividades semanais (monitoração) e planejando
atividades que o afastem do uso de drogas; Acompanhar o cumprimento das atividades
agendadas.
Com a interrupção do uso de drogas, pode-se sobrar muito tempo livre na vida do
paciente,  e é possível que sua rede social esteja composta exclusivamente por usuários.
Esta monitoração  servirá como uma linha basal, inicial, para introduzir ou resgatar
atividades prazerosas ou gratificantes, assim como planejar, progressivamente,
atividades relacionadas com drogas, o que levará o paciente, a médio prazo, a criar uma
nova rede social e a organizar um novo estilo de vida.
Este é um método simples, mas pode ser de difícil implementação, pois exige uma série
de habilidades que o paciente talvez nunca tenha desenvolvido. Éprevisível o
surgimento de resistências, sabotagens, evitação passiva, além de sentimentos de
desesperança, baixa auto-estima, frustração. Cada obstáculo, e os PA com ele
relacionados, devem ser abordados à medida que novos passos forem programados.
Exposição gradual e dificuldade crescente
A busca da vida em abstinência obriga o paciente a algumas tarefas sentidas como
muito  grandes, muito difíceis e, por isso, desanimadoras. Esta técnica consiste em
auxiliar o paciente a dividir esta (grande) tarefa em diversas etapas e acompanhá-lo no
planejamento e na execução de cada passo.
   Exemplo: Paciente cocainômano, cujos amigos atuais todos usam a mesma droga,
pode decidir (e ser apoiado a) realizar uma tarefa simples, como ir ao cinema com um
vizinho ou colega de serviço que não use droga. Após o cumprimento da tarefa,
examinado seu sucesso (ou não) e os PA relacionados com sua execução, é decidida a
nova tarefa, de maior dificuldade e exposição.
Experimentos comportamentais
São usados para testar tanto a validade de pensamentos e crenças sobre o uso de drogas
como as crenças centrais do paciente. Este escolhe o pensamento ou a crença que quer
testar (por sua importância), planeja seu experimento cuidadosamente e o implementa.
Posteriormente, examina seus resultados e a possibilidade de modificar sua crença.
   Exemplo: Um paciente pode ter a crença de que jamais conseguirá se divertir em uma
festa sem álcool e cocaína. Programa cuidadosamente sua ida a uma festa de não-
usuários de cocaína, planeja abster-se de álcool na festa e, posteriormente, avalia os
resultados.
    Um outro paciente pode ter a crença de que perderia todos os seus amigos se parasse
de usar maconha. Poderia planejar uma reunião com seus amigos para lhes comunicar
que parou de usar a droga e convidá-los a continuarem companheiros em atividades sem
drogas. Após algum tempo, seriam examinados os resultados. Quanto aos amigos que
perdesse, ele seria estimulado a examinar o significado dessas amizades pré-abstinência.
Os amigos que conservasse estariam corrigindo sua crença de que perderia todos os
amigos se não usasse maconha.
Cartões de enfrentamento
São cartões com lembretes que o paciente pode carregar consigo ou afixar em locais
frequentemente visíveis (espelho do banheiro, porta da geladeira, agenda, painel do
carro).
Os lembretes podem ser elaborados na sessão ou pelo paciente, como tarefa de casa.
Normalmente constituem:
respostas funcionais a pensamentos automáticos disfuncionais ou a crenças sobre drogas
(crenças de controle); estratégias de enfrentamento da fissura; pensamentos ou crenças
que fortaleçam a motivação.
   Os cartões de enfrentamento são instrumentos importantes no enfrentamento das
fissuras.
Relaxamento
Nos usuários de drogas, com frequência, a ansiedade é um sintoma importante.
Alcoolistas e tabagistas muitas vezes relacionam o uso de drogas com sua necessidade
de relaxar. Como sintoma de abstinência e na fissura de diversas substâncias, a
ansiedade se destaca. Por isso, as técnicas de relaxamento, provendo aos pacientes
instrumentos de redução da ansiedade, são úteis no tratamento das dependências.
   As principais técnicas de relaxamento são de dois tipos: exercícios respiratórios e
relaxamento muscular progressivo. Ambas são técnicas nas quais há redução importante
da ansiedade, sendo, portanto, úteis nas dependências e no manejo da fissura. O
relaxamento, durante a fissura, além de reduzir a ansiedade, fornece ao paciente um
intervalo de tempo durante o qual a intensidade da fissura pode diminuir. Além disso, o
relaxamento pode permitir ao paciente a elaboração e confirmação de crenças de que ele
está no controle e de que é capaz de lidar com sua fissura.
Exercício físico
Geralmente os usuários de drogas estão afastados da prática de esportes e de atividades
físicas sadias. A introdução de exercícios físicos no tratamento desses pacientes é
importante por três aspectos:
• a prática de exercícios físicos é um importante passo no desenvolvimento de um estilo
de vida sem drogas;
• é  instrumento importante no manejo de emoções negativas como ansiedade,
insegurança e irritabilidade;
• contribui na formação de uma nova a imagem, mais sadia, confirmando crenças mais
positivas do paciente a respeito de si mesmo.
Dramatização
A dramatização (roleplay, encenação) é um recurso que pode ser utilizado nas
intervenções de tratamento das sete fases do modelo adictivo, porque se presta aos mais
diversos propósitos: obter um PA, provocar reações emocionais, provocar fissura e
treinar o seu manejo, questionar PA, avaliar crenças, modificá-las e testar novas
crenças, treinar habilidades, etc.
   O paciente deve ser estimulado e treinado a utilizar a dramatização, e isso é muito
facilitado pela participação ativa do terapeuta na sessão, assumindo o papel dos “outros”
(patrão, cônjuge, amigo, etc.), bem como o do próprio paciente, quando cabe a este
trocar de papel. As técnicas de dramatização podem, com mais facilidade, ser utilizadas
em tratamentos em grupo.
Treinamento de assertividade
Espera-se que o indivíduo seja capaz de expressar e defender com clareza e firmeza suas
decisões. A fim de capacitá-lo para isso, utilizam-se diversas técnicas: dramatização,
solução de problemas, exposição gradual, experimentos comportamentais.
   A assertividade deve ser dirigida não apenas à capacidade do paciente de “dizer não”
ás drogas, mas também às diversas da sua vida – familiar, afetiva, profissional – nas
quais o paciente necessita fazer reajustes que, em conjunto, vão configurar uma
modificação no seu estilo de vida.
BREVE ILUSTRAÇÃO CLINICA
A seguir são apresentados dados da história de uma paciente e fragmentos da
intervenção utilizada em sua TCC. Outros dados, psiquiátricos, de diagnóstico e
psicofarmacológicos, não serão considerados.
Identidade
Laura, 24 anos, estudante de Direito, casada.
Dados relevantes da história pessoal
Filha de casal de origem alemã, nascida e criada em uma cidade de forte influência
germânica localizada próxima da capital. Dos 2 anos em diante tomava a “espuma” da
cerveja do avô paterno, o que era incentivado e saudado por todos os familiares.
O pai, Lauro, industrial bem-sucedido, bebedor diário, queria um filho homem para
cuidar dos negócios, o que só ocorreu com o nascimento do segundo filho, Júnior,
quatro anos depois. A mãe,  Célia, dona de casa, ex-rainha das piscinas, muito submissa
ao marido, envolve-se em reuniões semanais para jogar cartas, jogar bolão e beber com
suas amigas. Os pais mantêm um bom relacionamento conjugal – apesar do uso
constante de álcool por parte dele – e as famílias de origem são muito agregadas e
unidas.
Apesar da dedicação e dos ótimos resultados obtidos por Laura na escola e nos esportes,
os pais sempre valorizaram sua “beleza” e a “inteligência e os dotes atléticos” do irmão.
A família paterna reúne-se mensalmente, na cidade de origem, para festejar, com muita
bebida.
A família materna, na capital, faz almoções dominicais regulares na casa da avó, com
grande ingestão de cerveja e “brincadeiras” sobre bebida e embriagues.
Durante o curso de Direito, já pertencendo e liderando um grupo de jovens que bebia e
não usava outras drogas, Laura começou a faltar às aulas e a perder cadeiras.
Conheceu Pedro, seis anos mais velho, professor de educação física, que não fuma, não
bebe e nem usa outras drogas. Inicialmente, consegue esconder dele seu uso de álcool.
Porque vão morar juntos – e depois casam -, passa a prometer a Pedro que vai beber
menos (ou que vai parar). Não conseguindo cumprir suas promessas, aceita procurar
tratamento.
 As crenças de Laura
No atendimento dessa paciente – em tratamento há três meses -, pela investigação com
técnicas de dramatização e seta descendente, bem como com o preenchimento de
inventários, ressaltam-se até agora:
Crenças centrais: Eu sou inferior. Eu sou incapaz. Crenças sobre o álcool: A vida sem
álcool ficaria chata.
É a melhor maneira de eu conseguir bom entrosamento social e relaxamento. É
impossível divertir-se sem álcool. É o melhor remédio para a minha ansiedade e
timidez.
• Crenças intermediárias: Para ser amada preciso dar o máximo de mim e não contrariar
as pessoas.
Exemplo de intervenção com a técnica da seta descendente
Pensamento automático de Laura: sem bebidas não me divirto.
T: “Se isto é verdade, significa o quê?”
L: “Que vou ficar na festa quieta, calada, sem aproveitar.”
T: “Se isto é verdade, significa o quê?”
L “Que eu sou sem graça, sou apagada. Se não bebo não agrado, não descontraio.”
T: “E se isto é verdade, quer dizer o quê?”
L: “Ah, que eu sou um fracasso, que eu sou menos que os outros, que eu sou inferior.”
(A crença central.)
 Exemplo de questionamento socrático
Pensamento automático de Laura: não adianta estudar, eu não aprendo nada.
   T: “Quanto você acredita neste pensamento?”
L: “80%.”
T: “Quais evidências apoiam esta idéia?”
L: “As minhas notas dos últimos meses.”
Registro de pensamentos e de fissuras
SITUAÇÃO
PENSAMENTOS
REAÇÃO
RESPOSTA RACIONAL
1.Há duas semanas sem
    beber. Saí com as colegas,
    no fim da tarde, e vai
    para o bar
 Vou ficar pouco tempo. Elas estão
  se divertindo e eu me sinto por fora.
  Não falo nada, se não beber.
  Vou tomar só um chope
Fissura – 70%
 Não adianta, eu não tenho
   freios, não sei parar.
   Saí do bar antes das colegas
2. Estudando à tarde,.
    Em sua casa, sozinha,
    Para prova difícil
 Não adianta estudar, não vou passar
 Não vou aprender nada
 Eu não sei nada
 Podia beber uma cerveja. Pedro
  nem iria saber
Depressão –
   50%
Fissura – 60%
Parou de estudar e fez um RPD
Tomou banho enquanto aguardava Pedro
3.Recebe convite para
   a festa anual da
   academia de Pedro
  Melhor nem ir.
  Sem bebida nem me divirto
Tristeza – 50%
Ansiedade –
       60%
 Seta descendente na sessão
   T: “Que outras evidências apoiam esta idéia?”
   L: “É isto mesmo, as minhas notas horríveis nos últimos meses.”
   T: “Que evidências você vê que contrariam este pensamento (de que não adianta
estudar, que você não aprende nada)?”
   L: “Eu ter entrado, passado bem, no vestibular da Federal. Eu ter passado em todos os
semestres, até agora, sem reprovações.”
   T: “Há alguma outra explicação possível para as suas notas horríveis dos últimos
meses?”
   L: “Eu andei faltando a muitas aulas. Andei bebendo mais, estudando menos, sempre
pensando em festa.”
   T: “Isto sendo verdade, que mesmo estudando você não vai aprender nada, o que de
pior pode acontecer?”
   L: “Eu ir muito mal na prova, ser reprovada, perder a cadeira.”
T: “Poderia suportar isto?”
L: “Ah, ia ser horrível, mas eu suportaria.”
  L: “Ah, eu ter sorte e ir muito bem na prova, tirar um ‘notão’.”
   T: “Qual o resultado mais provável, nesta situação?”
   L: “Pensando bem, acho mais provável eu sair ‘mais ou menos’, mas sendo aprovada.
Não estou bebendo, posso estudar.”
T: “O que você deveria fazer nesta situação?”
   L: “Continuar o que estou fazendo. Não beber nesta semana, estudar.”
   T: “E sobre este pensamento ‘não adianta estudar, eu não aprendo nada’. Quais as
conseqüências dele na sua vida?”
   L: “Eu não acredito em mim. Fico com vontade de desistir, de voltar logo a beber.”
   T: “E se conseguisse alterar este pensamento?”
   L: “Seria bom, eu sofreria menos, ia me sentir mais segura.”
   T: “E depois deste debate, o que está pensando desta situação, como alteraria o
pensamento?”
   L: “Acho que eu posso pensar que as notas dos últimos meses mostram que eu não
estudei, e não que não adianta estuda. Estudando mais talvez possa recuperar a nota.””
   T: “Laura, agora, após este debate quanto você acredita no pensamento”
L: “Acho que 40%.”
 
Comentários sobre o material clínico apresentado
Os dados apresentados, embora ainda não configurem uma formulação cognitiva
completa, permitem fazer hipóteses para compreender a origem das crenças
disfuncionais de Laura, excessivamente positivas a respeito do álcool e negativas a
respeito de sua própria pessoa.
   
  
  
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