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FARMACOLOGIA

APLICADA A
FARMÁCIA

Mariana Colombo
Antivirais
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar as diferentes classes de fármacos antivirais.


 Explicar os mecanismos de ação e os efeitos adversos de agentes
anti-herpesvírus.
 Descrever o mecanismo de ação e os efeitos adversos de agentes
anti-influenza.

Introdução
Os vírus são microrganismos simples e pequenos (medem de 20 a 30
nanômetro [nm]) que possuem DNA ou RNA de filamento único ou
duplo. A partícula viral de vida livre (fora de seu hospedeiro) é denomi-
nada virion, e consiste em segmentos de ácido nucleico (RNA ou DNA)
encerrados em uma capa proteica composta de unidades estruturais
simétricas repetitivas, denominada capsídeo. A capa viral, em composição
com o núcleo de ácido nucleico, recebe o nome de nucleocapsídeo.
Alguns vírus possuem um envelope lipoproteico externo adicional que
pode ser composto de glicoproteínas ou fosfolipídeos antigênicos virais
adquiridos de seu hospedeiro, quando o nucleocapsídeo brota através
das membranas da célula infectada.
Certos vírus também contêm enzimas que iniciam sua replicação
na célula do hospedeiro. Eles são desprovidos tanto de parede celular
quanto de membrana celular e não realizam processos metabólicos. Não
são células e, por não contarem com maquinaria metabólica própria, são
parasitas intracelulares obrigatórios e utilizam os processos metabólicos
da célula do hospedeiro que infectam para se replicar.
Os agentes antivirais eficazes inibem eventos específicos da replicação
do vírus ou inibem de forma preferencial a síntese de ácidos nucleicos
ou de proteínas dirigidas pelo vírus, e não pela célula hospedeira. Esses
fármacos antivirais podem ser agrupados de acordo com o tipo de infec-
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ção atingida e o mecanismo de ação (RANG et al., 2016; WHALEN; FINKEL;


PANAVELLI, 2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Fármacos antivirais
Como os vírus usam muitos dos processos metabólicos da célula do hos-
pedeiro, poucos fármacos evitam a multiplicação viral de forma suficiente
sem lesar as células hospedeiras. Todavia, existem algumas enzimas que são
específicas do vírus e que se tornaram alvos úteis para os fármacos. Como as
fases iniciais da infecção viral são normalmente assintomáticas, o tratamento
é frequentemente retardado até que a doença esteja bem estabelecida (RANG
et al., 2016; WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016).
Existem terapias antivirais para:

 herpes-vírus;
 vírus da hepatite B (HBV);
 vírus da hepatite C (HCV);
 papiloma vírus;
 vírus influenza;
 vírus da imunodeficiência humana (HIV);
 vírus sincicial respiratório (VSR) (KATZUNG; TREVOR, 2017).

Algumas infecções exigem apenas monoterapia por um breve período


de tempo, como no caso de herpes-vírus simples (HSV), enquanto outras
necessitam terapia dupla durante longos períodos de tempo, como no caso de
hepatite C. Ainda, existem infecções que necessitam de terapia com múltiplos
fármacos por períodos de tempo indefinidos, como a infecção pelo HIV
(KATZUNG; TREVOR, 2017).
Os agentes antivirais são virostáticos e a maioria dos agentes antivirais
disponível é efetiva apenas enquanto o vírus está se replicando, não afeta os
vírus latentes. A replicação viral consiste em várias etapas. Após a ligação, o
complexo vírus-receptor entra na célula do hospedeiro (com frequência, por
endocitose mediada por receptor), período durante o qual a capa do vírus pode
ser removida pelas enzimas da célula do hospedeiro. Uma vez na célula do
hospedeiro, o ácido nucleico viral usa, então, o sistema da própria célula do
hospedeiro para a síntese dos ácidos nucleicos e das proteínas, que são montados
como novas partículas virais. A forma efetiva desse processo difere entre os
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vírus de DNA e de RNA. Os agentes antivirais podem atuar em qualquer uma


dessas etapas (Figura 1) (RANG et al., 2016; KATZUNG; TREVOR, 2017).

Figura 1. Principais locais de ação dos fármacos antivirais.


Fonte: Katzung e Trevor (2017, p. 862).

Para facilitar o entendimento das classes de fármacos antivirais, a seguir,


eles serão apresentados de acordo com o mecanismo de ação.

Inibidores nucleosídicos e nucleotídicos da


transcriptase reversa
A DNA-polimerase RNA-dependente codificada pelo HIV, também denomi-
nada transcriptase reversa, converte o RNA viral em DNA pró-viral, que é,
então, incorporado em um cromossomo da célula hospedeira. Os inibidores
disponíveis dessa enzima são análogos nucleosídicos/nucleotídicos ou ini-
bidores não nucleosídicos. Os inibidores nucleosídicos e nucleotídicos da
transcriptase reversa (INNTRs) impedem a infecção de células suscetíveis, mas
não erradicam o vírus de células que já abrigam o DNA pró-viral integrado.
Todos os fármacos dessa classe, com exceção de um, são nucleosídeos que
devem ser trifosforilados no grupo 5-hidroxila para exercer a sua atividade.
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O tenofovir, a única exceção, é um análogo de monofosfato de nucleotídeo


que necessita de dois fosfatos adicionais para adquirir toda a sua atividade.
A principal utilidade dessa classe é o tratamento do HIV; porém vários
fármacos também oferecem atividade útil contra outros vírus, como para o
HBV, que, embora não seja um retrovírus, utiliza uma transcriptase reversa
para sua replicação. A zidovudina (AZT), análogo sintético da timidina, foi
o primeiro fármaco introduzido para o tratamento de infecções por HIV e,
ainda hoje, é importante. Outros exemplos dessa classe são:

 abacavir;
 adefovir dipivoxil;
 didanosina;
 entricitabina;
 entecavir;
 lamivudina;
 estavudina;
 telbivudina;
 tenofovir.

Múltiplos efeitos adversos são relatados, incluindo: alterações gastrintes-


tinais; alterações no sistema nervoso central (SNC), como insônia, tontura,
cefaleia; impactos na musculatura esquelética e efeitos dermatológicos; altera-
ções sanguíneas, como anemia ou neutropenia; efeitos metabólicos, incluindo
pancreatite, lesão hepática, acidose lática e lipodistrofia (RANG et al., 2016;
HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Inibidores não nucleosídicos da transcriptase reversa


Os inibidores não nucleosídicos da transcriptase reversa são compostos quimi-
camente diversos, que se ligam à enzima transcriptase reversa nas proximidades
do local catalítico, inativando-a. Atualmente, os fármacos disponíveis incluem
efavirenz e nevirapina, além de compostos relacionados, como etravirina e
rilpivarina.
As reações adversas incluem efeitos dermatológicos; alterações gastrintes-
tinais; impactos no SNC, como cefaleia, sonolência e náuseas; alterações na
musculatura esquelética e efeitos hematológicos; efeitos metabólicos, como
pancreatite, lesão hepática, acidose lática e lipodistrofia. O efavirenz é tera-
togênico (RANG et al., 2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).
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Inibidores da protease
Durante os últimos estágios do crescimento viral do HIV, os produtos gênicos
são traduzidos em poliproteínas. As proteases virais fazem a clivagem dessas
moléculas, produzindo as proteínas estruturais finais do virion maduro. Os
inibidores da protease (IPs) do HIV são substâncias químicas semelhantes
a peptídeos, que inibem de forma competitiva a ação da aspartil protease
viral. Como essa protease não ocorre no hospedeiro, é alvo útil à intervenção
quimioterápica. Os IPs específica do HIV ligam-se ao local em que a clivagem
ocorre, e seu uso, em combinação com os INNTRs, transformou o tratamento
da aids.
Um exemplo típico dessa classe de fármacos é o ritonavir, que inativa as
proteases do HIV-1 ou do HIV-2. Em geral, é empregado em combinação com
outro IP (lopinavir). Outros exemplos dessa classe são saquinavir, fosampre-
navir, atazanavir, darunavir, nelfinavir e indinavir.
Múltiplos efeitos adversos são relatados com o uso de IPs, como altera-
ções gastrintestinais; impactos sobre o SNC, como insônia, tontura, cefaleia;
alterações na musculatura esquelética e efeitos dermatológicos; alterações
sanguíneas (anemia ou neutropenia); efeitos metabólicos, como pancreatite,
lesão hepática e lipodistrofia (KATZUNG; TREVOR, 2017; RANG et al.,
2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Graças ao aumento da disponibilização de terapêutica farmacológica efetiva, a situação


global tem melhorado e o número de mortes relacionadas à aids está diminuindo.
Mesmo assim, a Organização Mundial da Saúde (OMS) (relatório de 2013) estimou que
34 milhões de pessoas viviam com a doença e que, aproximadamente, 1,7 milhão de
pessoas por ano morreu em decorrência disso. A epidemia avassaladora é centrada
na África Subsaariana e representa cerca de dois terços do número global de pessoas
infectadas. Nessa região, a prevalência de aids nos adultos é cerca de dez vezes maior
do que na Europa (RANG et al., 2016).
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Inibidores da DNA-polimerase
O aciclovir é um típico fármaco desse grupo e trata-se de um derivado da
guanosina convertido em monofosfato pela timidina quinase viral — enzima
muito mais efetiva em realizar a fosforilação do que as enzimas da célula hos-
pedeira —, desse modo, é ativado apenas nas células infectadas. As quinases
das células do hospedeiro convertem, então, o monofosfato em trisfosfato, a
forma ativa que inibe a DNA-polimerase viral e interrompe a cadeia nucleo-
tídica. Além do aciclovir, são exemplos dessa classe:

 fanciclovir;
 idoxuridina;
 penciclovir;
 valaciclovir;
 cidofovir;
 foscarnete;
 ganciclovir;
 valganciclovir.

Os fármacos anti-hespesvírus e seus efeitos adversos serão aprofundados


no decorrer deste capítulo (RANG et al., 2016; HILAL-DANDAN; BRUN-
TON, 2015).

Inibidores de neuraminidase e inibidores de


desmontagem do capsídeo viral
A neuraminidase viral é uma das três proteínas transmembrana codificadas
pelo genoma do vírus influenza. A infecção por esse vírus de RNA começa
com a ligação da hemaglutinina viral aos resíduos do ácido neuramínico
(siálico) nas células do hospedeiro. A partícula viral, então, entra na célula por
endocitose. O endossomo é acidificado após o influxo de H+ por meio de outra
proteína viral, o canal iônico M2. Isso facilita a desmontagem da estrutura
viral e permite que o RNA viral entre no núcleo do hospedeiro, iniciando,
assim, a etapa de replicação viral. Os virions recém-replicados escapam da
célula do hospedeiro por brotamento da membrana celular. Isso é promovido
pela neuraminidase viral por intermédio da ruptura das ligações entre a capa
de partículas e o ácido siálico do hospedeiro. A neuraminidase viral faz isso
pela alteração das ligações entre a capa viral e o ácido siálico do hospedeiro.
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Os inibidores de neuraminidase zanamivir e oseltamivir são ativos contra


os vírus influenza A e B (que serão aprofundados no decorrer deste capítulo,
bem como seus efeitos adversos (RANG et al., 2016; HILAL-DANDAN;
BRUNTON, 2015).

Fármacos que atuam por meio de outros mecanismos


A enfuvirtida inibe a fusão do HIV com a célula hospedeira. Em geral, o
fármaco é administrado por injeção subcutânea, em combinação com outros
fármacos, para o tratamento de infecções causadas pelo HIV quando a re-
sistência se torna um problema ou quando o paciente se mostra intolerante a
algum outro fármaco antirretroviral.
O ratelgravir atua inibindo a integrase do HIV, a enzima que integra o
DNA viral ao genoma do hospedeiro durante a formação do provírus. É em-
pregado no tratamento de infecções causadas por HIV, como parte da terapia
combinada, e costuma ser reservado aos casos cujo vírus se mostra resistente
aos outros agentes antirretrovirais (RANG et al., 2016).

Fármacos antivirais biofarmacológicos


Os biofarmacos que foram usados na luta contra as infecções virais incluem
as preparações com imunoglobulina, interferons e anticorpos monoclonais.
As imunoglobulinas contêm anticorpos contra vários vírus. Os anticorpos
são direcionados contra o envelope viral e podem “neutralizar” alguns vírus,
evitando sua ligação com as células do hospedeiro. Se usadas no início dos
sinais, podem atenuar ou evitar sarampo, hepatite infecciosa, rubéola, raiva e
poliomielite. Os interferons são uma família de proteínas indutíveis, sintetiza-
das pelas células dos mamíferos e já comercialmente produzidas por meio da
adoção da tecnologia do DNA recombinante. O interferon-α-2a é empregado
no tratamento das infecções por HBV e nos sarcomas de Kaposi relacionados
à aids; o IFN-α-2b é usado na HCV.
O palivisumabe é um anticorpo monoclonal direcionado contra uma glico-
proteína na superfície do vírus sincicial respiratório (RSV) (RANG et al., 2016).

Agentes anti-herpesvírus
Os herpes-vírus estão associados a um amplo espectro de doenças, como
aftas bucais, encefalite viral e infecções genitais. A infecção pelo herpes-
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-vírus simples tipo 1 (HSV-1) causa doenças na boca, na face, no esôfago ou


no cérebro. O herpes-vírus simples tipo 2 (HSV-2), de forma geral, provoca
infecções na genitália, no reto, na pele, nas mãos ou nas meninges. Ambos
causam infecções graves em recém-nascidos. Os fármacos eficazes contra
esses vírus exercem suas ações durante a fase aguda da infecção viral e não
têm efeito durante a fase latente (RANG et al., 2016; HILAL-DANDAN;
BRUNTON, 2015).

Aciclovir
O aciclovir (acicloguanosina) é o protótipo dos anti-herpéticos. Análogo da
guanosina, é monofosforilado na célula por uma enzima codificada pelo
herpes-vírus, a timidinacinase. Dessa forma, células infectadas pelo vírus
são mais suscetíveis. O análogo monofosfatado é convertido às formas di-
fosfato e trifosfato, pelas cinases das células do hospedeiro. O trifosfato de
aciclovir compete com o trifosfato de desoxiguanosina como substrato da
DNA-polimerase viral e é incorporado ao DNA viral, causando finalização
prematura da cadeia de DNA.
Os HSV 1 e 2, o vírus varicela-zóster (VVZ) e algumas infecções mediadas
pelo vírus Epstein-Barr (VEB) são sensíveis ao aciclovir. Ele é o tratamento de
escolha para encefalite causada pelo HSV. O uso mais comum é no tratamento
contra infecções por herpes genitais. O fármaco também é administrado de
forma profilática a pacientes soropositivos antes de transplantes de medula
óssea e após transplante cardíaco, para protegê-los de possíveis infecções
herpéticas.
Em geral, esse fármaco é bem tolerado. Os efeitos adversos dependem da
via de administração. Por exemplo, pode ocorrer irritação local na aplicação
tópica, e cefaleia, diarreia, náuseas e êmese após administração oral. Pode
ocorrer disfunção renal transitória em casos de doses altas ou em pacientes
desidratados que recebem o fármaco por via intravenosa (IV) (RANG et
al., 2016; WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-DANDAN;
BRUNTON, 2015).
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A resistência do HSV ao aciclovir pode ocorrer em razão do comprometimento da


produção de timidinacinase viral, da alteração da especificidade do substrato da
timidinacinase ou da alteração da DNA-polimerase viral. As alterações nas enzimas
virais são causadas por mutações pontuais e por inserções ou supressões de bases nos
genes correspondentes. Existem variantes resistentes em populações nativas de vírus
e em isolados obtidos de pacientes tratados. O mecanismo mais comum de resistência
em isolados clínicos de HSV consiste na ausência ou na deficiência de atividade da
timidinacinase viral; os mutantes de DNA-polimerase viral são raros (HILAL-DANDAN;
BRUNTON, 2015).

Cidofovir
O cidofovir intravenoso é utilizado para o tratamento da retinite causada por
citomegalovírus (CMV), membro da família herpes-vírus, em pacientes com
aids. O cidofovir é um análogo nucleotídico da citosina, cuja fosforilação não
depende de enzimas virais ou celulares. Ele inibe a síntese de DNA viral. A
eliminação lenta do metabólito intracelular ativo permite longos intervalos
entre as doses de tratamento e elimina o acesso venoso permanente. O fármaco
também tem sido utilizado no tratamento da infecção mucocutânea por HSV
resistente ao aciclovir, da doença por adenovírus em receptores de transplante
e na doença do molusco contagioso, em pacientes infectados pelo HIV.
O gel de cidofovir tópico extemporâneo elimina a propagação do vírus e
as lesões em alguns pacientes soropositivos com infecções mucocutâneas por
HSV resistente ao aciclovir, e tem sido utilizado no tratamento de verrugas
anogenitais e do molusco contagioso em pacientes imunocomprometidos,
bem como no tratamento da neoplasia intraepitelial cervical em mulheres.
O cidofovir intralesional induz remissões em adultos e em crianças com
papilomatose respiratória. A injeção intravítrea (injeção no humor aquoso,
entre o cristalino e a retina) do cidofovir está associada ao risco de hipotonia
e uveíte, por isso é reservada para casos extraordinários.
O cidofovir produz toxicidade renal significativa e é contraindicado para
pacientes com insuficiência renal preexistente ou que estejam recebendo fár-
macos nefrotóxicos. Pode também ocorrer neutropenia e acidose metabólica.
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A probenecida, por via oral (VO), e a salina normal, por IV, são coadmi-
nistradas com o cidofovir para diminuir o risco de nefrotoxicidade. Desde a
introdução do tratamento antirretroviral altamente ativo (TARAA), a preva-
lência de infecções por CMV em pacientes imunocomprometidos diminuiu
de forma acentuada (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-
-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Foscarnete
Diferentemente da maioria dos antiviróticos, o foscarnete (fosfonoformato
trissódico) não é um análogo da purina ou da pirimidina. Ele é um fosfo-
noformato (um derivado do pirofosfato) e não requer a ativação por cinases
virais (ou celulares). O foscarnete está aprovado para retinite por CMV, em
hospedeiros imunocomprometidos, e para infecções por HSV resistentes ao
aciclovir. Esse fármaco inibe reversivelmente a DNA e a RNA-polimerase
viral, interferindo na síntese de DNA e RNA viral.
O foscarnete é pouco absorvido por VO, por isso deve ser administrado por
IV. Os efeitos adversos incluem nefrotoxicidade, anemia, náusea e febre. Em
razão da quelação de cátions bivalentes, pode-se observar também hipocalce-
mia e hipomagnesemia. Além disso, foram relatadas hipopotassemia, hipo e
hiperfosfatemia, convulsão e arritmia (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI,
2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Ganciclovir
O ganciclovir é um análogo nucleosídico acíclico da guanina com estrutura
semelhante ao aciclovir. Ele é um análogo do aciclovir com maior atividade
contra o CMV. O ganciclovir possui atividade inibitória contra todos os herpes-
-vírus; porém é particularmente ativo contra o CMV. É utilizado no tratamento
de retinite por CMV, em pacientes imunocomprometidos, e na profilaxia do
CMV, em pacientes transplantados.
Assim como o aciclovir, o ganciclovir é ativado pela conversão em nucle-
otídeo trifosfato pelas enzimas virais e celulares. O nucleotídeo inibe a DNA-
-polimerase viral e pode ser incorporado ao DNA, resultando no término da
cadeia. É administrado por via IV e se distribui pelo organismo, incluindo o
líquido cefalorraquidiano (LCR). Como o aciclovir, o ganciclovir se acumula
em pacientes com insuficiência renal.
O valganciclovir é um éster valílico do ganciclovir e tem seu uso por
VO. Como o valaciclovir, o valganciclovir tem elevada biodisponibilidade
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oral devido à rápida hidrólise no intestino e no fígado após a administração,


determinando níveis elevados de ganciclovir.
A mielossupressão constitui a principal toxicidade do ganciclovir, limitando
o seu uso. Os efeitos adversos incluem grave neutropenia dose-dependente.
Esse fármaco é carcinogênico, bem como embriotóxico e teratogênico em
animais de laboratório (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-
-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Penciclovir e fanciclovir
O penciclovir é um derivado nucleosídico da guanosina acíclica, ativo contra
HSV1, HSV2 e VVZ. Ele é monofosforilado pela timidinacinase viral, e en-
zimas celulares formam o nucleosídeo trifosfato, que inibe a DNA-polimerase
do HSV. Tem administração tópica com pouca absorção, mas bem tolerado.
O fanciclovir, outro análogo acíclico da 2-desoxiguanosina, é um pró-
-fármaco biotransformado em penciclovir ativo. O espectro antiviral é similar
ao do ganciclovir e está aprovado para o tratamento de herpes-zóster agudo,
infecção genital por HSV e herpes labial recorrente. O fármaco é eficaz por VO.
O fanciclovir oral, o penciclovir tópico e o penciclovir intravenoso são
aprovados para o tratamento das infecções causadas por HSV e VVZ. O uso
do fanciclovir oral está associado à cefaleia, à diarreia e a náuseas. Foi relatada
a ocorrência de urticária, exantema e alucinações ou estados confusionais
(com predominância em idosos). O penciclovir tópico (~ 1%) está raramente
associado a reações no local de aplicação. O penciclovir é mutagênico em
altas concentrações; sua administração em longo prazo (1 ano) não afeta a
espermatogênese no homem. A segurança do fármaco durante a gravidez
ainda não foi estabelecida (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-
-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Trifluridina
A trifluridina é um análogo do nucleosídeo pirimidina fluorado, com estrutura
similar à timidina. Uma vez convertido em trifosfato, o fármaco parece inibir
a incorporação de trifosfato de timidina no DNA viral e, em menor extensão,
leva à síntese de DNA defeituoso, que torna o vírus incapaz de se multiplicar.
É um fármaco eficaz contra HSV1, HSV2 e contra o vírus vaccínia (VV).
O VV é uma espécie diferente, mas estreitamente relacionada ao vírus da
varíola (ambos pertencem à mesma família); foi utilizado na campanha de
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erradicação da varíola. Em seres humanos, o VV é causador de doença não


letal, pustular e localizada.
A trifluridina é indicada para o tratamento da ceratoconjuntivite HSV e da
ceratite epitelial recorrente. Como a forma trifosfato da trifluridina também
pode se incorporar em alguma extensão no DNA celular, o fármaco é conside-
rado muito tóxico para uso sistêmico. Por isso, seu uso é restrito à preparação
oftálmica tópica. A meia-vida muito curta requer aplicação frequente; as
reações adversas consistem em desconforto durante a instilação e o edema
palpebral (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-DANDAN;
BRUNTON, 2015).

A habilidade que muitos vírus têm de permanecerem adormecidos dentro do hospe-


deiro e de serem replicados com seu genoma é responsável pela natureza periódica
de algumas doenças virais, como, por exemplo, aquelas causadas pelos vírus Herpes
labialis (herpes labial) e Varicella zoster — outro tipo de herpes-vírus (causador da
VVZ e da herpes-zóster) que pode reincidir quando a replicação viral é reativada por
algum fator ou quando o sistema imunológico está, de alguma forma, comprometido
(RANG et al., 2016).

Agentes anti-influenza
As infecções virais do trato respiratório, para as quais existem tratamentos,
incluem a gripe (ou influenza) tipos A e B e o RSV.
Recentemente, houve uma crescente preocupação acerca da possibilidade
de novas pandemias de influenza. Isso surgiu por ocasião de pequenos, porém
graves, surtos de influenza aviária causada pelo H5N1 e da recente influenza
A (H1N1), em 2009, considerada de origem suína.
São aprovados para tratamento e prevenção de infecção pelo vírus influenza
os seguintes fármacos:

 oseltamivir e zanamivir — inibidores da neuraminidase;


 amantadina e rimantadina — antivirais derivados da adamantina;
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 peramivir — um inibidor da neuraminidase em processo de investigação,


que foi disponibilizado para uso intravenoso mediante concessão para
uso de emergência (EUA) (WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016;
HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Oseltamivir e zanamivir
Os inibidores da neuraminidase oseltamivir e zanamivir são eficazes contra
os dois tipos de vírus iflluenza: A e B. Eles não interferem na resposta imune
à vacina da gripe. Administrados antes da exposição, os inibidores da neu-
raminidase previnem a infecção e, se forem administrados de 24 a 48 horas
após o início dos sintomas, diminuem de forma modesta a intensidade e a
duração dos sintomas.
O vírus iflluenza emprega uma neuraminidase específica, que é inserida
na membrana celular do hospedeiro para proporcionar a liberação de virions
formados há pouco tempo. Essa enzima é essencial para o ciclo vital do vírus.
O oseltamivir e o zanamivir inibem seletivamente a neuraminidase e previnem,
assim, a liberação de novos virions e sua disseminação de célula a célula.
O oseltamivir é um pró-fármaco ativo por VO, rapidamente biotransformado
pelo fígado em sua forma ativa. O zanamivir não é tão ativo por VO quanto
é por inalação.
Os efeitos adversos mais comuns do oseltamivir são desconforto gastrin-
testinal e náuseas, que podem ser aliviados pela ingestão do fármaco com
alimento. Ocorre irritação do trato respiratório com o zanamivir. Ele deve
ser usado com cautela em indivíduos com asma ou com doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC), pois pode ocorrer broncoespasmo (WHALEN;
FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015).

Antivirais adamantano
O espectro terapêutico dos derivados de adamantano, amantadina e riman-
tadina, é limitado a infecções por influenza A. Por causa da resistência ge-
neralizada, os adamantanos não são recomendados para o tratamento ou a
profilaxia da H1N1.
Esses fármacos interferem na função da proteína viral M2, pois é possível
que bloqueiem o descascamento da partícula viral e previnam a liberação
do vírus no interior da célula infectada. Ambos são bem absorvidos após a
administração oral.
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A amantadina se distribui por todo o organismo e penetra facilmente no


SNC. É associada, principalmente, a efeitos adversos no SNC, como insônia,
tontura e ataxia; os efeitos mais graves podem incluir alucinação e convulsão.
Deve ser usada de maneira cautelosa em pacientes com problemas psiquiátricos,
com aterosclerose cerebral, com alterações renais ou com epilepsia.
A rimantadina não atravessa a barreira hematencefálica na mesma extensão
e causa poucas reações no SNC. Ambos os fármacos causam intolerância
gastrintestinal e devem ser usados com cautela em gestantes e lactantes.
O vírus H1N1 pode desenvolver resistência de forma rápida, e linhagens
resistentes podem ser transmitidas facilmente para contatos próximos. Foi
demonstrado que a resistência ocorre em razão da alteração de um aminoácido
da matriz proteica M2. Ocorre resistência cruzada entre os dois fármacos
(WHALEN; FINKEL; PANAVELLI, 2016; HILAL-DANDAN; BRUNTON,
2015).

HILAL-DANDAN, R.; BRUNTON, L, L. Manual de farmacologia e terapêutica de Goodman


& Gilman. 2. ed. Porto Alegre: McGraw-Hill, 2015.
KATZUNG, B. G.; TREVOR, A. J. Farmacologia básica e clínica. 13. ed. Porto Alegre: AMGH,
2017. (Lange).
LÜLLMANN, H.; MOHR, K.; HEIN, L. Farmacologia: texto e atlas. 7. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2017.
RANG, H. P. et al. Rang & Dale: farmacologia. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.
WHALEN, K.; FINKEL, R.; PANAVELLI, T. A. Farmacologia ilustrada. 6. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2016.

Leitura recomendada
LEVINSON, W. Microbiologia médica e imunologia. 13. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016.
(Série Lange).
Conteúdo:

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