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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE VÁRZEA GRANDE – MT

FACULDADE DE DIREITO

O LOCAL DO PRINCIPAL ESTABELECIMENTO DO DEVEDOR: ARTIGO 3°


DA LEI 11.101/2005

Várzea Grande – MT
2021
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE VÁRZEA GRANDE – MT
FACULDADE DE DIREITO

CARLOS HENRIQUE CARVALHO DE ALMEIDA


EMILLY LUISA ALVES E SILVA ALBUQUERQUE
JAMES NASSARDEN DE ABREU FILHO
PEDRO ALVES COSTA NETO

O LOCAL DO PRINCIPAL ESTABELECIMENTO DO DEVEDOR: ARTIGO 3°


DA LEI 11.101/2005

Atividade parcial para composição de nota


da disciplina de Direito Empresarial III, do
Curso de Direito da UNIVAG – Centro
Universitário de Várzea Grande-MT,
ministrada pelo Professor João Victor.

Várzea Grande – MT
2021
O LOCAL DO PRINCIPAL ESTABELECIMENTO DO DEVEDOR: ARTIGO 3°
DA LEI 11.101/2005

No momento em que a empresa ou empresário devedor(a) faz o protocolo do


pedido de recuperação judicial ou falência, é de suma importância que seja observado a
competência do juízo a que se pretende direcionar. Isto, pois, garantirá a distribuição da
ação para o juízo correto, evitando o não recebimento por alegada incompetência.

A Lei 11.101/2005, que regula a recuperação judicial e falência, estabelece, por


sua vez, em seu artigo 3°1, que a competência para deferir a recuperação judicial ou
decretar a falência é do juízo em que estiver o principal estabelecimento do devedor ou
da filial de empresa que tenha sede estrangeira.

Segundo entendimento do juiz e doutrinador Daniel Carnio Costa2 (2019, pg. 59):

“(...) quando o devedor possuir somente um estabelecimento,


logicamente o juízo deste local será o competente. Mas quando o
devedor possuir mais de um estabelecimento, em diferentes
circunscrições judiciárias, a definição de principal
estabelecimento torna-se necessária, já que a Lei não estabeleceu
critérios objetivos para essa definição, utilizando-se de termo
abstrato”.
Neste ponto, João Bosco Gouvêa3 (2009, pg. 18) leciona que o estabelecimento
“principal será aquele onde verdadeiramente se encontrar o comando da empresa, nada
importando o fato de a declaração de firma ou, então, de o contrato social apontar outro”.

Complementa, ainda, Carvalho de Mendonça4 (1954, pg. 273) pontuando que o


principal estabelecimento “é, em resumo, o lugar da sede da vida ativa, o lugar onde reside
o governo dos negócios do devedor”.

Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça entende que a expressão “principal


estabelecimento” significa o centro vital das principais atividades do devedor, o local

1
Lei 11.101/2005, Art. 3° - É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a
recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da
filial de empresa que tenha sede fora do Brasil.
2
COSTA, Daniel Carnio. Comentários à lei de recuperação de empresa e falências: Lei 11.101, de 09 de
fevereiro de 2005. Curitiba: Juruá, 2021.
3
GOUVÊA, João Bosto Cascardo de. Recuperação e falência: Lei 11.101/2005: comentários artigo por
artigo. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
4
MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 5° ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1954, vol. VII, Livro V, Parte I, n. 204, p. 273.
onde o devedor mantém suas atividades e seu principal estabelecimento ou, até mesmo,
o local onde a atividade se mantém centralizada, in verbis:

“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE


RECUPERAÇÃO JUDICIAL AJUIZADO NA COMARCA DE CATALÃO/GO
POR GRUPO DE DIFERENTES EMPRESAS. ALEGAÇÃO DA EXISTÊNCIA
DE GRUPO ECONÔMICO. DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA PARA A
COMARCA DE MONTE CARMELO/MG. FORO DO LOCAL DO
PRINCIPAL ESTABELECIMENTO DO DEVEDOR. ARTIGO 3º DA LEI
11.101/05.
PRECEDENTES.
1. Trata-se de conflito de competência suscitado pelo JUÍZO DE DIREITO DA
2A VARA DE MONTE CARMELO - MG em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE GOIÁS, nos autos de pedido de recuperação judicial
formulado por quatro empresas, em litisconsórcio ativo, com a
particularidade de que cada uma delas explora atividade empresária diversa
e de forma autônoma, inclusive com estabelecimentos próprios.
2. A circunstância de as recuperandas não terem impugnado a decisão
declinatória proferida pelo relator do agravo de instrumento (n.º 348379-
48.2015.8.09.0000) no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás não interfere
no conhecimento do incidente, pois a norma constante do artigo 3º da Lei
11.101/05 encerra regra de competência absoluta, afastando eventual
alegação da existência de preclusão quanto à suscitação do conflito.
3. O art. 3º da Lei n. 11.101/05, ao repetir com pequenas modificações o
revogado artigo 7º do Decreto-Lei 7.661/45, estabelece que o Juízo do local
do principal estabelecimento do devedor é o competente para processar e
julgar pedido de recuperação judicial.
4. A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, respaldada em
entendimento firmado há muito anos no Supremo Tribunal Federal e na
própria Corte, assentou clássica lição acerca da interpretação da expressão
"principal estabelecimento do devedor" constante da mencionada norma,
afirmando ser "o local onde a 'atividade se mantém centralizada', não sendo,
de outra parte, 'aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o
que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do
devedor'." (CC 32.988/RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de
04/02/2002).
5. Precedentes do STJ no mesmo sentido (REsp 1.006.093/DF, Rel. Ministro
ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, DJe de 16/10/2014; CC
37.736/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, DJ de
16/08/2004; e CC 1.930/SP, Rel. Min. ATHOS CARNEIRO, SEGUNDA
SEÇÃO, DJ de 25/11/1991).
6. Todavia, a partir das informações apresentadas pelas autoridades
envolvidas e também das alegações das partes interessadas, a controvérsia
estabelecida não está relacionada propriamente ao critério escolhido pelo
legislador, mas na sua aplicação à específica hipótese dos autos.
7. Considerando o variado cenário de informações que constam dos autos,
notadamente a de que a ELETROSOM S/A é a maior sociedade do grupo, e
que sua atividade é pulverizada pelo país, deve ser definido como competente
o juízo onde está localizada a sede da empresa, ou seja, o juízo da Comarca
de Monte Carmelo/MG.
8. Conflito conhecido para declarar a competência do juízo da 2ª Vara da
Comarca de Monte Carmelo/MG.” (STJ - CC 146.579/MG, Rel. Ministro
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
09/11/2016, DJe 11/11/2016)
Embora verificado que a Lei 11.101/2005 é omissa quanto a uma definição
objetiva de como deverá ser analisado qual principal estabelecimento da devedora, o
entendimento doutrinário e jurisprudencial é uníssono quanto a presunção de que o
principal estabelecimento será onde tiver a maior movimentação econômica, maior parte
do patrimônio e o maior volume de relações comerciais (e, consequentemente, de
credores) (COSTA, Daniel. 2019, pg. 59).

Nessa linha, a Segunda Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Privado do


Tribunal de Mato Grosso já decidiu:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – RECUPERAÇÃO


JUDICIAL – COMPETÊNCIA PARA O PROCESSAMENTO DO PEDIDO
- PRINCIPAL ESTABELECIMENTO – ARTIGO 3º DA LEI 11.101/2005
– CONFLITO PROCEDENTE.
Para efeito de aferição de onde se localiza o principal estabelecimento do
grupo econômico que pleiteou a recuperação, nos termos do Art. 3º da Lei n.º
11.101/05, necessário aferir em qual juízo emanam
suas principais decisões estratégicas, financeiras e operacionais do grupo
em Recuperação Judicial.
Caso específico que, apesar da exploração da atividade agrícola dos
empresários estar vinculada às Fazendas situadas no Município de Novo São
Joaquim, o centro operacional das principais atividades do negócio do grupo
está vinculado à sede administrativa no Município de Primavera do Leste no
qual, inclusive, atuam os principais credores dos devedores.
(N.U 1006591-80.2020.8.11.0000, CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE
DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Segunda Turma de
Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Privado, Julgado em 04/06/2020,
Publicado no DJE 09/06/2020)

Ainda acerca da discussão de qual é o principal estabelecimento, surge-se uma


peculiaridade quando, por exemplo, a entidade possuir um estabelecimento móvel, como
o do circo, que tem sua infraestrutura levada a diversas cidades e estados. Neste caso
Gouvêa entende que o juízo competente é aquele onde se encontrar na data de distribuição
do pedido, mesmo que logo depois seja levado para outra cidade, noutra comarca. Finaliza
que, se do contrário, o processo nunca atingiria a indispensável estabilidade.

Portanto, em algumas situações, cabe ao Poder Judiciário – auxiliado pelo


Administrador Judicial – analisar as provas documentais, a estrutura da empresa e a
atividade empresarial de cada uma das sedes da sociedade, para determinar qual desses
estabelecimentos será considerado o principal, para fins de aplicação do disposto no art.
3° da Lei 11.101/2005 (STJ, Ag. Reg. no REsp. 1.310.075).

Poderá ainda o juiz, antes mesmo da decisão do pedido de recuperação judicial e


nomeação do Administrador Judicial, determinar a realização da constatação prévia,
estabelecida pelo art. 51-A da Lei 11.101/2005, em que o perito judicial nomeado poderá
constatar, principalmente na vistoria in loco das diversas unidades, em qual delas se
concentra o maior fluxo de atividades, confirmando, por fim, a competência para
processamento da recuperação judicial ou falência.

Tal medida é completamente cabível, tendo em vista que o perito judicial analisará
as reais condições de funcionamento da empresa, atestando se de fato as informações
constantes nos atos constitutivos e demonstrativos contábeis conferem com a realidade
da entidade. Verifica-se caso semelhante nos autos de recuperação judicial n.° 1001723-
96.2021.8.11.0041 em trâmite pela 1° Vara Especializada em Recuperação Judicial e
Falências de Cuiabá – MT, em que o perito nomeado, em seu laudo de constatação prévia
tratou acerca do tema em um tópico exclusivo, transcrito abaixo:

“A competência do juízo é estabelecida pelo art. 3° da Lei 11.101/2005, que


estabelece como competente para homologar o plano de recuperação
extrajudicial, deferir recuperação judicial ou decretar falência, o juízo do local
do principal estabelecimento do devedor.”

“O Grupo desenvolve suas atividades rurais em 05 (cinco) propriedades, sendo


03 (três) localizadas no município de Pato Branco/PR, e 02 (duas) no
município de São José do Rio Claro/MT. A soma da área das propriedades de
Pato Branco totaliza aproximadamente 293 hectares e das propriedades de São
José do Rio Claro totaliza aproximadamente 1.472 hectares, conforme consta
nas matrículas juntadas nos autos. Além de serem maiores quanto ao território,
as propriedades de São José do Rio Claro são as que possuem maior projeção
de resultados e onde está localizado o polo administrativo, caracterizando-se,
assim, como o principal estabelecimento do Grupo WG.”

“Ademais, considerando a regionalização de competência dada pela


RESOLUÇÃOTJ-MT/OE No 10 DE 30 DE JULHO DE 2020, que designou à
comarca de Cuiabá/MT o processamento de recuperação judicial das partes
que tenham o principal estabelecimento situado no município de São José do
Rio Claro/MT, verifica-se legitima a competência deste juízo para processar e
julgar a ação.”
No caso supracitado há uma peculiaridade quanto à comarca competente para o
processamento da recuperação judicial especialmente no Estado de Mato Grosso, tendo
em vista da regionalização de competência criada pela Resolução TJ-MT n.° 10 de 30 de
julho de 2020, a fim de concentrar em principais polos o recebimento de pedidos de
empresas que possuem o principal estabelecimento em municípios “periféricos” ou
afastados dos grandes polos.

O artigo 3° da Lei 11.101/2005 prevê, também, na situação em que a empresa for


sediada no estrangeiro – fora do Brasil – a competência será do foro em que estiver
localizada a sua filial brasileira, quando tiver apenas uma, ou a principal quando tiver
mais de uma, valendo-se dos mesmos critérios observados para definição de principal
estabelecimento, isso porque nossa lei terá aplicação restrita ao território brasileiro.
Em suma, a competência em termos de recuperação judicial, para homologação
de recuperação extrajudicial e processamento de falência, sempre será da Justiça
Estadual, de natureza absoluta, referente ao juízo em que estiver o principal
estabelecimento da empresa devedora, devendo ser apurado de fato as reais condições
que atestem o merecimento de ser reconhecida aquela unidade como principal, seja de
ofício pelo juízo ou com auxilio do Administrador Judicial ou perito judicial nomeado.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a


extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acesso em:
06 de mar. 2021.

COSTA, Daniel Carnio; FAZAN, Eliza. Constatação prévia em processos de


recuperação judicial de empresas: o modelo de suficiência recuperacional (MSR).
Curitiba: Juruá, 2019.

COSTA, Daniel Carnio; MELO, Alexandre Correa Nasser de. Comentários à lei de
recuperação de empresas e falências: lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Curitiba:
Juruá, 2021.

GOUVÊA, João Bosco Cascardo de. Recuperação e Falência: lei 11.101/2005:


comentários artigo por artigo. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 5°
ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1954, vol. VII, Livro V, Parte I, n. 204, p. 273.

Processo de recuperação judicial n.° 1001723-96.2021.8.11.0041 em trâmite pela 1°


Vara Especializada em Recuperação Judicial e Falências de Cuiabá – MT. Disponível no
PJE.

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