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Capítulo

Metabolismo Ácido-Básico

11 Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly

INTRODUÇÃO Manifestações clínicas e efeitos sistêmicos


CONCEITOS E PRINCÍPIOS QUÍMICOS Achados laboratoriais
Ácido Tratamento
Base Alcalose metabólica
Sistema tampão Causas de alcalose metabólica
pH Geração da alcalose metabólica
Lei de ação das massas Manutenção da alcalose metabólica
Equação de Henderson-Hasselbalch Mecanismos de defesa do pH na alcalose
Eletroneutralidade metabólica
METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO Manifestações clínicas
SISTEMAS TAMPÃO Dados laboratoriais
Sistema tampão ácido carbônico-bicarbonato Tratamento
Proteínas plasmáticas Acidose respiratória
Hemoglobina Causas
Tamponamento nos ossos Conseqüências clínicas
CONTROLE RESPIRATÓRIO DA PCO2 Conseqüências fisiológicas
CONTROLE RENAL DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BÁSICO Tratamento
Reabsorção tubular do bicarbonato filtrado Alcalose respiratória
Secreção tubular de H Causas
Fatores que influenciam na reabsorção do bicarbonato Conseqüências clínicas
filtrado Conseqüências fisiológicas
Excreção de acidez titulável (AT) Tratamento

Excreção de amônio (NH ) 4 Distúrbios ácido-básicos mistos
Produção proximal e secreção de NH4 Diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos

Gradiente intersticial corticopapilar para NH /NH3
4 Roteiro para interpretação dos distúrbios
Secreção de amônia nos ductos coletores (NH3) ácido-básicos
Difusão não-iônica Alguns exemplos
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO EXERCÍCIOS
ÁCIDO-BÁSICO REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Acidose metabólica ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Causas RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
capítulo 11 163

INTRODUÇÃO Sistema Tampão


É o sistema formado por um ácido e uma base a ele con-
Para que seja mantida a estabilidade do meio interno, jugada, cuja finalidade é a de minimizar alterações na con-
deve haver equilíbrio entre a produção e a remoção de íons centração hidrogeniônica [H] de uma solução. Em outras
hidrogênio (H) em nosso organismo. Os rins são funda- palavras, uma base fraca se liga aos H dissociados de um
mentais na eliminação do H, mas o controle da concen- ácido forte para formar um ácido fraco pouco dissociável,
tração deste íon envolve ainda outros mecanismos, como tamponando e, portanto, minimizando as alterações na
o tamponamento realizado pelo sangue, células e pul- concentração de H. Além disso, um sistema tampão tam-
mões.1 bém pode doar H.5
A quantidade de íon hidrogênio é mantida dentro de
limites estreitos, num processo extremamente sensível,
uma vez que a quantidade de hidrogênio no extracelular pH
(40 nanoequivalentes/litro  0,00004 mEq/litro) é cerca Como a concentração hidrogeniônica [H] é muito
de 1 milionésimo das concentrações do sódio, potássio ou baixa, torna-se mais simples expressar esta concentração
cloro.2 em escala logarítmica, utilizando as unidades de pH. O
A manutenção desta baixa concentração hidrogeniôni- pH é inversamente proporcional à concentração hidro-
ca é essencial para a função celular normal. Os íons hidro- geniônica. Um baixo pH corresponde a uma alta concen-
gênio são altamente reativos, particularmente com porções tração de íons hidrogênio, enquanto um pH alto corres-
de moléculas protéicas com carga negativa.2 Assim, varia- ponde a uma concentração hidrogeniônica baixa. Portan-
ções na concentração de hidrogênio produzem grande to, a atividade dos íons H em uma solução determina
impacto sobre as funções celulares, pois quase todos os a sua acidez.1,6
sistemas enzimáticos de nosso organismo e proteínas en-
volvidas na coagulação e contração muscular são influen- pH  log 1/H   log [H]
ciados pela concentração de íons hidrogênio.2,3 Para a [H] normal de 40 mEq/litro, o pH é:
pH   log [0,00000004]  7,4
Nos líquidos corporais e diferentes tecidos existe uma
CONCEITOS E PRINCÍPIOS ampla variação de pH. O pH arterial normal é 7,40, sen-
QUÍMICOS do um pouco menor no sangue venoso e interstício
(7,35), devido à quantidade de CO2 que se difunde dos
Ácido tecidos. O pH urinário pode variar de 4,5 a 8,0, depen-
dendo do estado ácido-básico do fluido extracelular. No
Substância capaz de doar íons H (prótons). Exemplos: estômago, a produção de HCl pode reduzir o pH para
H2CO3, NH4, HCl. Um ácido forte como o HCl se dissocia 0,8.1
rapidamente e libera grandes quantidades de H. Os áci- Considera-se o pH como normal se estiver entre 7,35 e
dos fracos têm uma menor tendência à dissociação, libe- 7,45. Os limites de pH sanguíneo compatível com a vida
rando H com menor intensidade. O acúmulo excessivo de são 6,8 e 8,0.1
íons H é chamado de acidose.1,4

Lei de Ação das Massas


Base
A lei de ação das massas estabelece que a velocidade de
Substância (íon ou molécula) capaz de receber íons H. uma determinada reação química é proporcional à concen-
Exemplos: HCO3, NH3, HPO4. Uma base forte (p.ex., o tração dos reagentes. Por exemplo, na reação abaixo, a ve-
OH) reage de maneira rápida e intensa com o H, remo- locidade com que a reação ocorre para a direita ou para a
vendo-o de uma solução. Uma base fraca reage de manei- esquerda é uma constante que depende da concentração
ra pouco intensa. O termo base é usado como sinônimo de dos substratos.
álcali. Álcali é uma molécula formada pela combinação de
HPO4  H ↔ H2PO4
um metal alcalino (p. ex., sódio, potássio) com um íon for-
temente básico, como o íon hidroxila (OH). Os íons hidro- Em equilíbrio, são iguais as constantes para cada lado
xila reagem rapidamente com os íons hidrogênio, portan- da equação. Porém, se houver maior quantidade de subs-
to são bases típicas. A remoção excessiva de íons H dos trato em um lado, a reação se dirige para o lado oposto. A
líquidos corporais é chamada de alcalose. No equilíbrio lei de ação das massas é útil para descrever a dissociação
ácido-básico normal, a maior parte dos ácidos e bases exis- de todos os ácidos e bases do organismo. Por exemplo, para
tentes no espaço extracelular é fraca.1 a dissociação de um ácido HA em H  A: 7
164 Metabolismo Ácido-Básico

[H]  [A] A produção endógena de ácidos é um processo normal,


Ka  mas pode estar aumentada na presença de certas influên-
[HA]
cias hormonais, substratos exógenos ou interrupção das
Onde: vias de controle. Alguns estados patológicos se caracteri-
Ka  constante de dissociação para este ácido (há um va- zam por um aumento significativo na produção de ácidos
lor para cada ácido). orgânicos, como os cetoácidos formados no diabetes meli-
to descompensado, alcoolismo ou jejum prolongado. Dro-
gas e toxinas podem acelerar a produção de ácidos orgâ-
Equação de Henderson-Hasselbalch nicos, como o ácido fórmico a partir do metanol; ácido
A equação que acabamos de ver pode ser reorganiza- oxálico a partir do etilenoglicol, e ácido salicílico a partir
da, originando a equação de Henderson-Hasselbalch, que da aspirina. Outro mecanismo para acúmulo de ácido ocor-
quando aplicada ao sistema tampão ácido carbônico-bicar- re quando seu metabolismo e excreção estiverem compro-
bonato, um dos mais importantes de nosso organismo, metidos. Exemplo disso é o acúmulo de ácido láctico, caso
define a relação entre pH, PCO2 e HCO3. Neste caso, pK é sua conversão para glicose (ciclo de Cori) seja interrompi-
a constante de dissociação do ácido carbônico. Fica assim da por algum motivo; como o tecido muscular produz
demonstrado que o pH do sangue é determinado pela con- imensas quantidades deste ácido todos os dias, ele rapida-
centração de bicarbonato e tensão de CO2.6,7 mente se acumularia.9 Ao contrário do CO2, que pode ser
eliminado pelos pulmões, os demais ácidos são denomi-
log [HCO3] nados ácidos não-voláteis ou fixos e devem ser eliminados
pH  pK  pelo rim.
log [H2CO3]
Além do ganho diário de ácidos voláteis e não-voláteis,
nosso organismo também deve compensar as perdas fisi-
Eletroneutralidade ológicas de substâncias alcalinas, de cerca de 20-30 mEq de
bicarbonato por dia. Em algumas doenças diarréicas, esta
É o princípio segundo o qual não pode haver acúmulo perda pode aumentar dez vezes.1
de quantidades significativas de cargas elétricas em siste- Frente a todos estes dados, percebemos que existe em
mas biológicos, pois isto geraria diferenças muito altas de nosso organismo uma predominância de mecanismos que
potencial elétrico nos tecidos. Então, ao ser absorvido um levam a um excesso de ácidos. A manutenção de um pH
cátion, é necessário que seja reabsorvido um ânion, ou eli- normal nos fluidos corporais frente a uma carga ácida re-
minado outro cátion, de forma que resulte o mesmo nú- quer a integração de mecanismos fisiológicos que impedem
mero de cargas positivas e negativas.8 que haja variações muito intensas na concentração de hi-
drogênio.
A primeira linha de defesa que atua na manutenção de
METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO um pH fisiológico frente à adição de ácidos são os tampões
(bicarbonato e outros tampões extracelulares), que agem
O metabolismo de gorduras e carboidratos origina CO2 instantaneamente. Já a segunda linha de defesa envolve o
e H2O. Aproximadamente 20.000 mEq de CO2 são produzi- sistema respiratório e consiste na variação da PCO2 de acor-
dos diariamente. Ao observar a reação abaixo, percebe-se do com a [H] em minutos a horas. Por último, há a tercei-
que se o CO2 não fosse eliminado, a reação se dirigiria no ra linha de defesa, que envolve o sistema renal através do
sentido de produção do H2CO3, que se dissociaria e aumen- controle da concentração de bicarbonato. A eficácia máxi-
taria a quantidade de hidrogênio no organismo, resultando ma deste último sistema é atingida 24 a 48 horas após o
início do desequilíbrio.2,10
em acidose. A eliminação do CO2 é realizada pelos pulmões;
Desta maneira, e voltando à equação de Henderson-
por este motivo o CO2 é chamado de ácido volátil.2
Hasselbalch, podemos compreender que o organismo atua
CO2  H2O ↔ H2CO3 ↔ H  HCO3 na normalização do pH atuando nas variáveis que deter-
Além da produção de ácido volátil, são produzidos minam o pH: PCO2 e HCO3.
outros ácidos em nosso metabolismo. A dieta ocidental O desvio do pH arterial abaixo de 7,35 ou acima de 7,45
contém aminoácidos e outras substâncias ácidas. Por exem- é referido como acidemia e alcalemia, respectivamente. Os
plo, o cloreto de lisina é metabolizado em ácido clorídrico processos que tendem a reduzir ou elevar o pH são cha-
e uréia; a hidrólise de proteínas e ácidos nucléicos forma mados acidose e alcalose. Desta maneira, poderemos ter
ácido fosfórico, e a oxidação de aminoácidos que contêm quatro alterações primárias do estado ácido-básico:
enxofre gera ácido sulfúrico. Desta forma, produz-se uma 1. acidose metabólica: quando o HCO3 diminuir, ou quan-
carga ácida diária da ordem de 1 mEq/kg/dia. Além dis- do a concentração de H aumentar;
so, a oxidação incompleta da glicose pode originar 20-30 2. alcalose metabólica: quando o HCO3 estiver elevado ou
mEq de ácidos orgânicos por dia.9 quando ocorrer uma perda de H;
capítulo 11 165

3. acidose respiratória: quando ocorrer um aumento na


PCO2;
4. alcalose respiratória: quando a PCO2 for reduzida.
Porém, há situações em que duas ou mais anormalida-
des estão presentes, caracterizando os distúrbios ácido-
básicos mistos.2

Pontos-chave:
• Os ácidos voláteis e não-voláteis,
produzidos diariamente, são eliminados
pelos pulmões e rins, respectivamente
• pH normal  7,35-7,45. Para preservar as
funções celulares, variações de pH devem
ser corrigidas, através das seguintes linhas
de defesa: Fig. 11.1 Alteração no pH de uma solução tampão, à medida que
um ácido é adicionado à solução. Observem que, quando o tam-
1.ª (instantânea): Sistemas tampão pão estiver 50% livre e 50% combinado com H (pK do tampão),
2.ª (minutos): Componente respiratório haverá pouca alteração do pH. Portanto, o tampão será mais efi-
3.ª (horas a dias): Componente renal (lento) ciente em soluções com um pH nesta faixa. (Obtido de Makoff,
D.L.49)

SISTEMAS TAMPÃO difunde-se para dentro das células (Fig. 11.2). Aproxima-
damente 60% são tamponados nas células e nos ossos, num
A manutenção de um pH relativamente constante no
processo que envolve troca de H por Na ou K. Os 40%
organismo se deve à integração renal-respiratória, já men-
restantes são tamponados no líquido extracelular pelos
cionada, e à atuação de sistemas tampão (componente
tampões existentes. Quando se adiciona uma substância
químico), que minimizam as variações de pH conseqüen-
alcalina, aproximadamente 70% são tamponados em líqui-
tes a uma carga ácida ou alcalina. do extracelular e o restante nas células.12 O movimento de
Os sistemas tampão são de modo geral formados por áci- H, OH ou HCO3 através da membrana celular é impor-
dos fracos (e o sal correspondente ou base), que não se disso- tante para o tamponamento de variações de pH que ocor-
ciam completamente e, portanto, têm a capacidade de rece- rem no extracelular ou intracelular.10
ber ou doar H quando a concentração de H se altera. Por No organismo, os seguintes sistemas tampão são impor-
exemplo, quando um ácido forte é introduzido no sangue, ele tantes: bicarbonato, proteínas plasmáticas (extracelulares)
se dissocia completamente e aumenta a concentração de H. Ao e hemoglobina, fosfato, complexos organofosfatados, amô-
entrar em contato com o sistema tampão, o hidrogênio nio, proteínas intracelulares e cristais de apatita do osso.
dissociado do ácido forte liga-se ao sal do sistema tampão, De acordo com o princípio iso-hídrico, todos os tampões em
reduzindo a atividade de H. Assim, o ácido forte é substitu- uma solução estão em equilíbrio com a mesma concentra-
ído por um ácido fraco, de dissociação menos intensa.1,11 ção de hidrogênio. Estes vários sistemas tampão não agem
Ácido forte  base fraca ↔ sal neutro  ácido fraco isoladamente; eles atuam ao mesmo tempo, cada qual com
Exemplo: HCl  Na2HPO4 ↔ NaCl  NaH2PO4 seu pK e concentração. Quando ocorre uma variação na
concentração de hidrogênio, ocorrem modificações em
Ao acrescentar uma base forte a um sistema tampão, ela todos os sistemas tampão. Qualquer condição que modifi-
é substituída por seu sal de base e um ácido fraco.1,11 que o equilíbrio de um sistema tampão altera o equilíbrio
Base forte  ácido fraco ↔ base fraca  água de todos os outros.1,8
Exemplo: NaOH  NaH2PO4 ↔ Na2HPO4  H2O
A capacidade do sistema tampão em resistir às altera- Sistema Tampão Ácido Carbônico-
ções do pH é dependente da concentração e do pK do sis-
Bicarbonato
tema tampão (Fig. 11.1). Quanto mais próximo do pK do
sangue estiver o pK do tampão, maior será a sua capaci- É o principal sistema tampão do organismo. Observe que
dade de tamponamento. as reações químicas deste sistema tampão obedecem à quan-
Quando se adiciona ácido (H) ao organismo, parte dele tidade existente de substrato e acontecem ao mesmo tempo
é tamponada quimicamente no líquido extracelular, e parte no sangue e nos túbulos renais. Quando íons H são adici-
166 Metabolismo Ácido-Básico

Fig. 11.2 Mecanismos de defesa frente a um excesso de ácido. Quando ocorre alcalose, as reações se processam em sentido inverso.
(Obtido de Makoff, D.L.49)

onados ao organismo, combinam-se com o HCO3 do plas- carboxila (COOH), que podem perder um próton e for-
ma, formando H2CO3, que se dissocia em água e CO2, o qual mar COO. Também apresentam grupos amino (NH2),
pode ser removido pelos pulmões. Neste sistema, o pH do que podem receber um próton e formar NH3.10 A ação
líquido extracelular é controlado pela eliminação ou recupe- tamponante de uma proteína pode ser vista na Fig. 11.3.
ração de HCO3 pelos rins e remoção de CO2 pelos pulmões. A carga elétrica das proteínas varia com o pH do extra-
celular. Para uma determinada proteína, a carga é deter-
H  HCO3 ↔ H2CO3 ↔ CO2  H2O
minada pelo equilíbrio entre seus grupos de carga negati-
Devido à sua importância no equilíbrio ácido-básico, o va e positiva. Uma proteína pode ser caracterizada pelo seu
sistema tampão ácido carbônico-bicarbonato será aborda- ponto isoelétrico, isto é, o pH em que não apresenta car-
do em mais detalhe ao longo deste capítulo. gas negativas. Para as proteínas plasmáticas, o ponto isoe-
létrico está em torno de 5,1-5,7, ou seja, bem abaixo do pH
normal de nosso organismo. Por isso, de modo geral as
Proteínas Plasmáticas proteínas plasmáticas se comportam como poliânions.10
As proteínas e aminoácidos do sangue e intracelulares A albumina realiza uma parte significativa da ação
são tampões importantes, pois possuem grupos químicos tamponante do plasma que não é executada pelo bicarbo-
capazes de receber ou liberar H, comportando-se como nato, pois há vários grupos imidazol em sua molécula. Sua
ácidos ou bases. As proteínas possuem numerosos grupos capacidade tamponante é superior à da globulina.10

Fig. 11.3 Representação esquemática da ação tamponante de uma proteína.


capítulo 11 167

As proteínas localizadas no espaço intracelular também No sangue que transita pelos pulmões, a reação quími-
contribuem para o tamponamento do H. Por exemplo, as ca anterior sofre uma inversão, e o CO2 é eliminado.10
proteínas intracelulares do músculo esquelético colaboram
com 60% do tamponamento não realizado por bicarbona-
to, sendo os 40% restantes realizados por fosfatos orgâni- Tamponamento nos Ossos
cos e inorgânicos.10 Os ossos contêm cerca de 60% do CO2 do organismo,
sendo a maior parte sob a forma de carbonato, formando
complexos com cálcio, sódio e outros cátions. O restante
Hemoglobina
existe sob a forma de bicarbonato, associado à hidroxiapa-
A hemoglobina é responsável pela maior parte do tam- tita. Existem evidências demonstrando que na acidose crô-
ponamento plasmático não realizado pelo bicarbonato, nica (como na insuficiência renal crônica) a necessidade de
devido à sua alta concentração nas hemácias e sua grande tamponamento leva à dissolução óssea, com liberação de
capacidade de tamponamento, por possuir vários grupos tampões fosfato e carbonato, num mecanismo possivel-
ácidos ou básicos em sua molécula: carboxila (COOH), mente mediado pelo paratormônio.10
amino (NH2), amônia (NH3).
O CO2 proveniente do metabolismo tissular difunde-se
para dentro das hemácias. A hemoglobina reduzida, pre- CONTROLE RESPIRATÓRIO
sente ao nível tecidual, tem máxima afinidade por radicais
ácidos, favorecendo a captação e o transporte de CO2. Den-
DA PCO2
tro das hemácias, apenas uma pequena parte do CO2 per-
A segunda linha de proteção contra distúrbios ácido-
manece dissolvida. A maior parte do CO2 que adentra a
básicos é o controle da concentração de CO2 pelos pulmões.
célula sofre hidratação, por ação da anidrase carbônica
A equação de Henderson-Hasselbalch demonstra que a
(presente em grandes quantidades nas hemácias), forman-
variação da PCO2 através da respiração é uma importante
do H2CO3, que se dissocia em H e HCO3. O hidrogênio
maneira de normalizar o pH. Assim, quando há aumento
assim liberado é tamponado por grupos amino da hemo-
da concentração de H, este se combina com o bicarbona-
globina, a qual se transforma em H-Hb. 10
to, formando ácido carbônico (H2CO3), que se dissocia em
CO2  H2O ↔ H2CO3 ↔ H  HCO3 H2O e CO2. O CO2 continuamente produzido pelo meta-
앖 bolismo e resultante das reações dos sistemas tampão é
anidrase carbônica (AC) rapidamente eliminado pelos pulmões.
Com o aumento da concentração intra-eritrocitária de H  HCO3 ↔ H2CO3 ↔ H2O  CO2 씮 respiração
bicarbonato, este se difunde para o plasma devido ao gra- 앖
diente de concentração. Portanto, é nas hemácias que se metabolismo
forma parte do bicarbonato plasmático. Com a saída de Além disso, a ventilação alveolar é estimulada ou inibi-
HCO3, o Cl adentra a célula, a fim de manter a eletroneu- da por variações na [H]. Quando a concentração hidro-
tralidade.10 geniônica está elevada, o centro respiratório é estimulado,
aumentando a amplitude dos movimentos respiratórios
(hiperventilação alveolar), eliminando mais CO2. Uma ini-
Pontos-chave: bição do centro respiratório (hipoventilação alveolar) ocor-
re se a concentração de hidrogênio está baixa, por um
• Tampões são substâncias capazes de doar mecanismo de feedback.1
ou receber íons hidrogênio, atenuando
variações de pH
• Os principais tampões existentes em nosso CONTROLE RENAL DO
organismo são:
Bicarbonato
EQUILÍBRIO ÁCIDO-BÁSICO
Proteínas plasmáticas e intracelulares Apesar da eficiência dos sistemas tampão e do controle
Hemoglobina respiratório, estes mecanismos proporcionam proteção
Ossos temporária, minimizando alterações do pH quando ácidos
• Cerca de 95% dos ácidos voláteis são fortes ou bases são adicionados ao organismo, ou quando
tamponados no intracelular. Dos ácidos a concentração de CO2 se altera.
fixos, 50% são tamponados no intracelular e Um mecanismo mais duradouro é realizado pelos rins,
50% no extracelular através da reabsorção de quase todo o bicarbonato filtra-
do e recuperação do HCO3 que foi consumido no proces-
168 Metabolismo Ácido-Básico

Fig. 11.4 Filtração, reabsorção e excreção de bicarbonato de acordo com a concentração plasmática. Observem que todo o bicarbona-
to será reabsorvido quando a concentração plasmática for inferior a 25-26 mM/L. (Modificado de Pitts, R.F.50)

so de tamponamento de ácidos fixos. Este último proces- mos na secreção de H varia nos diferentes segmentos tu-
so é obtido através da excreção de uma quantidade equi- bulares. Nos ductos coletores há um terceiro mecanismo,
valente de H na urina.3 Para cada molécula de bicarbona- por meio de uma bomba H-K-ATPase.3
to consumida, o rim reabsorve ou regenera uma nova A maior capacidade secretora de H ocorre no túbulo
molécula de bicarbonato.8 A urina torna-se ácida pela reab- proximal (80-90%), alça de Henle e túbulo contornado dis-
sorção das substâncias alcalinas ou pela adição de ácido ao tal (10-20%), e apenas uma pequena fração no túbulo cole-
fluido tubular.13 tor. No entanto, os segmentos proximais conseguem pe-
quenas alterações de pH urinário; as maiores alterações são
obtidas no ducto coletor.
Reabsorção Tubular do Vários fatores interferem com a secreção de hidrogênio
Bicarbonato Filtrado na luz tubular, como a PCO2, níveis de potássio e hormô-
nios adrenais. A secreção de hidrogênio aumenta quando
Como o sódio e outros solutos, o bicarbonato é filtrado há retenção de CO2. Se a PCO2 cair, aumenta o pH intrace-
livremente pelo glomérulo. Em adultos, cerca de 4.500 mEq lular e diminui a secreção de H.
de bicarbonato são filtrados por dia. Se houvesse perdas O potássio também interfere na secreção de H. Quan-
de bicarbonato, mesmo que pequenas em relação ao total, do existe depleção de potássio, ocorre aumento na concen-
os estoques seriam rapidamente esgotados. Isto é evitado tração intracelular de H, com aumento de sua secreção e
pela existência de uma grande avidez tubular pela reab- da reabsorção de bicarbonato. Quando existe excesso de
sorção de bicarbonato, que ultrapassa 99,9% do bicarbona- potássio, diminuem a concentração intracelular e a secre-
to filtrado, ou seja, apenas 2 mEq de bicarbonato são ex- ção de hidrogênio, diminuindo também a reabsorção de
cretados por dia.3 bicarbonato.
A elevação dos níveis circulantes de hormônios adrenais
leva a um aumento na reabsorção de HCO3 principalmen-
Secreção Tubular de H te em presença de deficiência de potássio. Quando não há
Os estudos de Pitts e colaboradores na década de 1940 déficit de potássio, a aldosterona parece atuar apenas nas
demonstraram que grande parte do ácido excretado che- porções mais distais do nefro, aumentando sua capacida-
ga até a urina não por filtração glomerular, e sim por se- de de secretar H. Aldosterona causa expansão do extra-
creção tubular. Dentro das células tubulares, a água está celular, diminuindo sua capacidade de reabsorção proxi-
em equilíbrio com o H e OH. O hidrogênio é secretado mal de HCO3 e contrabalançando o aumento que causa
para a luz tubular principalmente por dois mecanismos: na secreção distal de H. Então, em presença de potássio
1) Através de um processo ligado à entrada passiva de normal, não há nem alcalose nem acidose. Porém, quando
sódio filtrado para a célula (troca Na / H)13,14 e 2) Atra- há hipocalemia, o déficit de potássio aumenta a reabsor-
vés de um processo ativo por uma bomba iônica (H-ATPa- ção proximal de bicarbonato, suplantando o efeito supres-
se). A presença e importância de cada um desses mecanis- sor da expansão do extracelular sobre a reabsorção do
capítulo 11 169

mesmo, e ainda secretando mais hidrogênio. Como resul- formado dentro dos túbulos pelo H secretado retorna à
tado, estabelece-se uma alcalose metabólica. célula, formando mais H por hidroxilação. Até aqui, não
Outro fator que interfere com a secreção do H é a pre- houve secreção verdadeira de hidrogênio.3
sença de ânions não-reabsorvíveis em alta concentração no Como se observa na Fig. 11.5, a maior parte da reabsor-
túbulo distal, como carbenicilina e penicilina. Isto aumen- ção de bicarbonato (70-85%) ocorre nos segmentos iniciais
ta o fluxo e a eletronegatividade intraluminal, favorecen- do túbulo proximal e proporções variáveis na alça de Hen-
do a secreção de hidrogênio e potássio, resultando em al- le, túbulo distal e ducto coletor. 3
calose metabólica.15,16
Uma vez na luz tubular, o hidrogênio secretado se com-
bina com HCO3 filtrado, formando H2CO3, que é conver- Fatores que Influenciam na Reabsorção
tido em CO2 e H2O. No túbulo proximal e ramo ascenden- do Bicarbonato Filtrado
te espesso da alça de Henle (mas não em segmentos mais
distais), esta reação ocorre em milissegundos, sob influên- A proporção de bicarbonato que retorna ao sangue é
cia da anidrase carbônica, que é uma enzima presente na afetada por fatores que interagem entre si, como: a) quan-
membrana luminal das células e que não existe no fluido tidade de bicarbonato apresentada aos túbulos; b) estado
tubular. A anidrase carbônica é encontrada na porção con- do espaço extracelular; e c) PCO2 arterial. É possível que
tornada do túbulo proximal, porção ascendente espessa da estes fatores alterem a reabsorção de bicarbonato princi-
alça de Henle e túbulo contornado distal. A inibição desta palmente através de modificações na ativação ou no nú-
enzima (p.ex., pela acetazolamida) bloqueia a reabsorção mero de trocadores Na/K e H-ATPases. Alguns hormôni-
de bicarbonato e acidificação urinária. os e substâncias vasoativas (paratormônio, hormônios
O CO2 assim formado dentro do lúmen se difunde para adrenais, angiotensina II, catecolaminas e dopamina) afe-
dentro da célula, onde se combina com o OH que resulta tam a reabsorção de bicarbonato, através de mecanismos
da dissociação da água, e novamente, sob ação da anidra- ainda não muito compreendidos. Outros fatores, como a
se carbônica, forma-se HCO3. O HCO3 então se difunde deficiência de potássio e cloro, exercem influência impor-
passivamente para o fluido peritubular e sangue. Em mui- tante apenas em presença de doença.3
tos segmentos do nefro o HCO3 atravessa a membrana 1) A quantidade de bicarbonato filtrado e apresentado
basolateral por difusão facilitada, acompanhando o Na aos túbulos varia de acordo com a concentração plas-
(por um co-transportador), ou em troca por Cl. Apesar de mática de bicarbonato e a taxa de filtração glomeru-
que algum Na que acompanha o HCO3 então atravesse lar. Se as outras variáveis estiverem constantes (p.ex.,
a célula passivamente, a maior parte é transportada ativa- o volume do extracelular), a quantidade de bicarbo-
mente para o fluido peritubular e sangue, pela bomba Na- nato reabsorvido é quase igual à quantidade filtrada.
K-ATPase. Assim, para cada H secretado um HCO3 re- O mecanismo deste efeito ainda não está esclarecido,
torna ao fluido peritubular e sangue, e praticamente todo mas a taxa de reabsorção parece estar ligada à reab-
o bicarbonato filtrado é recuperado. Note que este não é sorção de sódio, principalmente no túbulo proximal.
um mecanismo puro de secreção de hidrogênio, pois o CO2 Isto pode ser em parte decorrente da necessidade de
conservar sódio e manter o espaço extracelular.3,13
2) Efeito do volume do extracelular: quando o volume
está bastante expandido, ocorre diminuição da reab-
sorção de bicarbonato filtrado; o oposto ocorre quan-
do o extracelular está contraído. Novamente, o me-
canismo parece estar ligado a modificações na reab-
sorção de sódio impostas pelas variações no volume
extracelular.3
3) Influência de modificações prolongadas na PCO2:
quando ocorre diminuição da PCO2 (como, por exem-
plo, por hiperventilação crônica), a reabsorção do
bicarbonato diminui; quando há elevação da PCO2,
aumenta a reabsorção de bicarbonato. Dois mecanis-
mos parecem estar envolvidos nesta variação de re-
absorção: a) mudança na quantidade de bicarbonato
filtrado e apresentado aos túbulos (isto só ocorre em
distúrbios crônicos, pois, nos agudos, a concentração
plasmática de bicarbonato muda muito pouco); e b)
Fig. 11.5 Mecanismo de reabsorção do bicarbonato filtrado. Ver efeito direto da PCO2 sobre a atividade da H-ATPa-
o texto. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3) se e H-K-ATPase.3
170 Metabolismo Ácido-Básico

Como já foi mencionado, a dieta ocidental rica em pro-


teínas produz vários ácidos não-voláteis (fixos), como o
ácido sulfúrico, fosfórico e ácidos orgânicos. Estes ácidos
são tamponados nos seguintes tipos de reação:
2 H  SO4  2 Na  2 HCO3
↔ 2 Na  SO4  2 H2O  2 CO2
2 H  HPO4  2 Na  2 HCO3
↔ 2 Na  HPO4  2 H2O  2 CO2
Nestes exemplos, o CO2 assim produzido é eliminado
pelos pulmões, e os dois sais neutros, Na2SO4 e Na2PO4, são
filtrados pelo glomérulo. Se estes sais fossem excretados
pela urina, o organismo ficaria em déficit de bicarbonato
de sódio (NaHCO3), o principal tampão extracelular utili-
zado na neutralização dos ácidos fixos. Os rins evitam este
déficit de bicarbonato de sódio através da excreção de NH4 Fig. 11.6 Mecanismo de formação de acidez titulável. Ver o tex-
e de acidez titulável. Em ambas as operações, o bicarbona- to. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
to recém-formado nas células tubulares renais é absorvi-
do para o sangue peritubular, juntamente com o sódio que
foi filtrado.3
Excreção de Amônio (NH4)
Excreção de Acidez Titulável (AT) Se a formação de acidez titulável fosse o único mecanis-
Se considerarmos uma urina com pH de 5,2, podemos mo para excretar H, a quantidade de hidrogênio elimina-
adicionar a ela uma substância alcalina até que seu pH se do na urina seria muito limitada pela quantidade de fos-
iguale ao pH do sangue, ou seja, 7,4. A quantidade de fato e outros tampões que são filtrados. A observação de
substância alcalina (em ml) necessária para titular a uri- que na acidose existe um aumento não só da AT mas tam-
na até se igualar ao pH do sangue é equivalente à quan- bém do NH4 na urina gerou a hipótese de que o NH4
tidade de H ligada aos tampões filtrados. Esta quanti- pudesse constituir um mecanismo adicional. Note que o
dade de ácido assim excretada é calculada e denomina- amônio aparece na urina sob forma de sais neutros (p.ex.,
da acidez titulável. cloreto de amônio — NH4Cl), o que serve para excretar H
Com a reabsorção de bicarbonato, a urina nos túbulos sem uma maior diminuição no pH urinário.3
renais se torna ácida. O hidrogênio secretado para a luz O provável mecanismo para a excreção de NH4 é de-
tubular se combina com outros tampões que foram filtra- monstrado nas Figs. 11.7 e 11.8. Este processo consta de três
dos. Como parte deste último processo, o sal neutro etapas: 1) produção e secreção de NH4 nos túbulos proxi-
Na2HPO4 é convertido no sal ácido NaH2PO4, principal mais; 2) mecanismo de contracorrente multiplicador de
maneira de excreção de acidez titulável. Outros tampões NH4 nas alças de Henle, resultando no desenvolvimento
filtrados, como ânions orgânicos, citrato, acetato e 3-hidro- de um gradiente corticopapilar para NH4/ NH3 dentro do
xibutirato, são também titulados, mas de modo geral con- interstício medular; e c) difusão não-iônica de NH3 para
tribuem pouco para a AT, devido à sua baixa concentra- dentro dos ductos coletores.3
ção e baixo pK.3
O esquema de formação da AT urinária é mostrado na PRODUÇÃO PROXIMAL E SECREÇÃO DE NH4ⴙ
Fig. 11.6 (note as semelhanças com a Fig. 11.5). A principal Esta primeira etapa ocorre predominantemente nas cé-
reação que gera o hidrogênio secretado parece ser a disso- lulas tubulares proximais, onde a deaminação da glutami-
ciação da água; o OH que é simultaneamente liberado se na produz dois íons NH4 e um íon de alfa-cetoglutarato.
combina com o CO2 intracelular, sob ação da anidrase car- O metabolismo do último para glicose, ou para CO2 e água,
bônica. Forma-se HCO3, que é adicionado ao fluido peri- produz dois novos íons HCO3. Assim como na excreção
tubular e sangue. No lúmen tubular, o H secretado se de AT, esta reação adiciona um HCO3 para cada H que
combina com Na e HPO4, formando NaH2PO4, que é é excretado — neste caso, como parte do NH4. O sódio que
excretado como ácido titulável na urina. Estas reações ocor- acompanha o HCO3 pode adentrar o fluido peritubular
rem no túbulo proximal, túbulo distal e ductos coletores. através da Na-K-ATPase ou via co-transportador HCO3.
O efeito aqui obtido é reabastecer o sangue com um bicar- Em muitas circunstâncias, o NH4 produzido no túbulo
bonato para cada bicarbonato consumido no processo de proximal é responsável por quase todo o NH4 excretado
tamponamento de um ácido fixo.3 na urina.3 É importante lembrar que nos quadros de aci-
capítulo 11 171

Nos segmentos ascendentes delgados a reabsorção de


NH4 pode ser passiva. A secreção de NH4 nos ramos
descendentes pode ocorrer mais por secreção paralela de
H e NH3 do que por secreção de NH4. O efeito final é o
mesmo, e a conseqüência importante é que a concentração
intersticial de amônia total (isto é, NH4 e NH3) se eleva
com a proximidade da papila.3

SECREÇÃO DE AMÔNIA NOS


DUCTOS COLETORES (NH3)
O segmento distal dos túbulos coletores e o ducto cole-
tor são constituídos por pelo menos dois tipos principais de
células, uma das quais, a célula intercalada alfa, secreta H
mas não reabsorve Na. Nesta célula, o H que é derivado
da dissociação da água é secretado na luz tubular por dois
Fig. 11.7 Produção de amônio (NH4) nos túbulos proximais, a co-transportadores, H-ATPase e H-K-ATPase. O H se-
partir da glutamina. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
cretado se combina com o NH3 para formar NH4, que é
então excretado sob a forma de sais neutros, como o NH4Cl
ou (NH4)2SO4. O NH3 pode difundir-se passivamente do
dose metabólica há um aumento significativo na produ- interstício onde é gerado pelo mecanismo de contracorren-
ção de NH3 a partir da glutamina, tornando-se a molécu- te multiplicador, através da célula, para a luz tubular.3
la de NH4 o principal meio de excreção dos íons H na O HCO3 formado pela dissociação da água cruza a mem-
urina. Além disso, a hipocalemia aumenta a produção de brana basolateral para o fluido peritubular por difusão fa-
NH4, levando a uma maior secreção de H para o lúmen cilitada, através de um trocador HCO3/Cl. Então, como
tubular. na excreção de AT e com o mecanismo do NH4 dos túbu-
los proximais, o resultado da reação nos ductos coletores é
GRADIENTE INTERSTICIAL CORTICOPAPILAR a recuperação de um HCO3 para cada H que é excretado,
PARA NH4ⴙ/NH3 ou seja, exatamente o que é preciso após um HCO3 ter sido
Nas alças de Henle, há um mecanismo contracorrente consumido no tamponamento de um H adicionado. O só-
multiplicador de NH4 que produz um gradiente para dio filtrado é reabsorvido pelas células principais.3
NH4/NH3 no interstício medular. Nos segmentos ascen-
dentes espessos, o NH4 é reabsorvido principalmente por DIFUSÃO NÃO-IÔNICA
transporte ativo secundário, substituindo o K no co-trans- A amônia (NH3) é um gás que atravessa a membrana
portador Na:K:2Cl que se localiza na membrana apical. celular com grande facilidade, por ser lipossolúvel, e pode

Fig. 11.8 Produção de amônio nas células intercaladas alfa dos ductos coletores. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
172 Metabolismo Ácido-Básico

difundir-se do interstício para o lúmen tubular. Pratica- Acidose Metabólica


mente todo o NH3 que se difunde é transformado em NH4,
pois o fluido tubular é ácido. Quanto mais ácida for a uri- A acidose metabólica é um distúrbio em que há eleva-
na, maior é esta transformação. Devido à impermeabili- ção na concentração de hidrogênio, gerando pH baixo no
dade do segmento, o NH4 formado não pode difundir- fluido extracelular. O bicarbonato encontra-se diminuído,
se novamente através do epitélio, e então tem que ser ex- por estar sendo consumido no tamponamento do excesso
cretado. Mais de 98% da amônia total (NH3  NH4) es- de ácido (H). O hidrogênio em excesso estimula o centro
tão sob a forma de NH4, pois o pH urinário está na faixa respiratório, provocando hiperventilação como mecanis-
de 4,4-7,4.3 mo compensatório, eliminando mais CO2.19
A excreção ácida total corresponde à soma da acidez
titulável e amônio urinário, menos o bicarbonato restante CAUSAS
na urina (AT  NH4  HCO3 urinário).17 A acidose metabólica pode ser resultado de um aumento
na produção ou diminuição na excreção renal de ácido, ou
ainda, perda de bicarbonato (v. Quadro 11.1).
Ponto-chave:
• O controle renal do equilíbrio ácido-básico é Produção Aumentada de Ácido
realizado através dos seguintes Quando existe aumento na produção de ácidos, pode ocor-
mecanismos: rer acidose grave, causando significativa diminuição no bi-
Reabsorção do HCO3 filtrado carbonato plasmático. São exemplos disso a acidose láctica, a
cetoacidose diabética ou alcoólica e a intoxicação por algumas
Regeneração de HCO3 através da excreção
drogas (como, por exemplo, o ácido acetilsalicílico).19
de H ligado a tampões (AT) e na forma de ACIDOSE LÁCTICA. O ácido láctico é normalmente
amônio (NH4) produzido em nosso organismo, sendo quase todo conver-
tido em glicose ou piruvato, no fígado e nos rins. O lactato
acumula-se quando sua produção está aumentada ou sua
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO utilização diminuída.19

METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO
O estado ácido-básico é avaliado através da gasometria, Quadro 11.1 Causas de acidose metabólica
e não há diferenças significativas entre uma amostra arte-
Produção ácida aumentada
rial ou venosa com relação ao pH, bicarbonato e PCO2. No a) Acidose láctica
sangue arterial, porém, é possível avaliar também as vari- • Hipoperfusão tecidual
áveis de oxigenação, como a PO2 e a saturação arterial de • Metformin
oxigênio, que permitem considerações sobre a ventilação • Etilismo
• Doenças malignas
do paciente. Tomar o cuidado de não utilizar garrote e
• Infecção por HIV
heparinizar a seringa adequadamente. Após a coleta do • Acidose D-láctica
sangue, homogeneizar o conteúdo, eliminar as bolhas de b) Cetoacidose
ar e vedar a seringa, encaminhando a amostra imediata- • Diabetes melito
mente para laboratório ou mantendo-a refrigerada até o • Etilismo
c) Toxinas ingeridas
momento da análise. A demora em processar a amostra • Aspirina
promove o consumo de oxigênio e a produção de CO2, • Etilenoglicol
modificando os resultados.18,19 • Metanol
Como mencionamos há pouco, a observação da equação Perda de bicarbonato pela urina ou fezes
de Henderson-Hasselbalch indica que quatro distúrbios a) Diarréia
primários do metabolismo ácido-básico podem ocorrer: aci- b) Fístulas pancreáticas, biliares
dose metabólica, acidose respiratória, alcalose metabólica e c) Acidose tubular renal proximal (tipo 2)
alcalose respiratória. Em princípio, pode parecer que o diag- Redução na excreção renal de ácido
nóstico de anormalidade metabólica ou respiratória pode ser a) Insuficiência renal
feito apenas conhecendo-se o bicarbonato plasmático e a b) Acidose tubular renal tipo 1
c) Acidose tubular renal tipo 4
PCO2, respectivamente. Em realidade, isto não é possível,
(hipoaldosteronismo)
pois cada distúrbio ácido-básico primário produz uma rea-
ção compensatória secundária. Além das reações compen- Outras
• Dilucional
satórias normais, podem surgir distúrbios ácido-básicos
mistos, como veremos nas próximas seções. Adaptado de Rose, B.D.19
capítulo 11 173

A produção deste ácido aumenta em situações em que vômitos, podendo evoluir com pancreatite. As alterações
a oferta de oxigênio para os tecidos é inferior às necessi- oculares, como hiperemia conjuntival, diplopia e amauro-
dades, como, por exemplo, na hipoperfusão presente no se, acompanham-se de alteração da fundoscopia, que de-
choque hipovolêmico, cardiogênico ou séptico. Nestas cir- monstra neurite óptica. O metabolismo do metanol produz
cunstâncias, além de o piruvato ser preferencialmente con- ácido fórmico, responsável pela acidose.24,25
vertido a lactato, sua utilização está diminuída, devido às O etilenoglicol está presente em produtos anticongelantes
alterações na perfusão do fígado e rins.19 Menos freqüen- e fluido de radiador, e é também utilizado em algumas eta-
temente, a produção de ácido láctico pode aumentar ou seu pas na indústria de bebidas. O etilenoglicol ingerido é meta-
metabolismo diminuir, por doenças hepáticas ou deficiên- bolizado em compostos tóxicos, como o ácido oxálico, pela
cias enzimáticas hereditárias.20 ação da desidrogenase alcoólica. Estes compostos tóxicos
O uso de metformin no diabetes melito pode produzir provocam disfunção neurológica aguda, com ataxia, confu-
acidose láctica, principalmente em presença de disfunção são, convulsões e coma. Nos rins, determinam a deposição
renal, hepática, ou etilismo. Eventualmente, pacientes eti- de cristais de oxalato de cálcio e insuficiência renal aguda.25
listas apresentam acidose láctica, causada por hipoperfu-
são ou diminuição da utilização hepática de lactato.21 Perda de Bicarbonato
Nas doenças malignas, o metabolismo anaeróbio que Para cada molécula de base que é perdida, um próton deixa
ocorre dentro de massas celulares mal vascularizadas pode de ser tamponado, resultando em acúmulo de ácido fixo.20 A
ocasionar acidose láctica. Em pacientes com SIDA, a aci- perda de secreções alcalinas do pâncreas e árvore biliar e as
dose láctica está relacionada à doença hepática ou miopa- diarréias induzidas ou não por laxantes podem causar aci-
tia induzidas pela zidovudina, ou à presença de deficiên- dose metabólica.19 Na acidose tubular renal proximal ocor-
cia de riboflavina.21 re perda de grandes quantidades de bicarbonato.
A acidose D-láctica ocorre em pacientes submetidos a
bypass jejuno-ileal, ressecção de intestino delgado ou ou-
Redução na Excreção Renal de Ácido
tras causas de síndrome do intestino curto. Nestas situa-
Para que o equilíbrio ácido-básico seja mantido na in-
ções, na presença de crescimento exagerado de bactérias
suficiência renal, é necessário que ocorram adaptações nos
anaeróbicas, o cólon converte glicose e amido em ácido D-
nefros restantes. Inicialmente, há aumento da excreção de
láctico, que é absorvido pela circulação. A desidrogenase
amônio (NH4) por nefro. Porém, quando a taxa de filtra-
L-láctica, que metaboliza o L-lactato fisiológico em piru-
vato, não atua sobre o ácido D-láctico. Os pacientes apre- ção glomerular cai para menos de 30-40% do normal, co-
sentam anormalidades neurológicas após sobrecarga de meça a haver retenção da carga ácida diária; acidose ocor-
carboidratos.22 re quando a massa renal remanescente estiver em torno de
CETOACIDOSE. A cetoacidose diabética é uma desor- 20%. A diminuição da excreção ácida na falência renal é
dem em que a deficiência de insulina e o excesso de gluca- causada principalmente pela pequena quantidade de
gon produzem aumento da síntese hepática de cetoácidos, nefros funcionantes. Aumento de PTH, expansão volêmi-
principalmente ácido beta-hidroxibutírico e ácido acetoa- ca e diurese de solutos, observados na insuficiência renal,
cético.19 inibem a reabsorção de bicarbonato. Também ocorre dimi-
O jejum prolongado também pode produzir cetoacido- nuição da produção de amônia (NH3). Como o bicarbona-
se, mas de modo geral os ácidos gerados não consomem to está sendo consumido, outros tampões acabam sendo
mais do que 3-4 mEq de bicarbonato/litro. Em etilistas, a acumulados (sulfato e fosfato).24 Os tampões plasmáticos
associação de um aporte deficiente de carboidratos com os são utilizados para neutralizar parte do ácido retido, mas
efeitos do álcool inibindo a gliconeogênese e estimulando a principal forma de tamponamento nesta situação é feita
a lipólise também pode produzir cetoacidose. A presença dentro das células e nos ossos.19
de diabetes agrava esta condição.23 As acidoses tubulares do tipo 1 (distal) e 4 (hipoaldos-
INGESTÃO DE TOXINAS. Em nosso organismo, o teronismo) são raras. Na ATR tipo 1, o acúmulo de ácido
ácido acetilsalicílico é convertido em ácido salicílico. A resulta de uma incapacidade de diminuir o pH urinário
intoxicação por altas doses deste ácido produz acidose para menos que 5,5-6. O pH urinário alcalino que resulta
metabólica devido à interferência com o metabolismo oxi- impede os mecanismos de produção de acidez titulável e
dativo, levando ao acúmulo de ácidos orgânicos, como o aprisionamento da amônia no lúmen tubular sob forma de
lactato e cetoácidos. Em doses menores, o ácido acetilsali- amônio.19 Na acidose distal tipo 4, a deficiência de aldos-
cílico pode induzir alcalose respiratória, por estimulação terona impede a secreção distal de hidrogênio e potássio,
direta do centro respiratório.19,24 resultando em acidose metabólica e hipercalemia.18
A intoxicação pelo metanol produz um quadro caracte-
rístico de sintomatologia do sistema nervoso central, ocu- Outras
lar e abdominal. Agudamente os pacientes apresentam sin- Cabe aqui um comentário sobre a acidose dilucional.
tomas de embriaguez, confusão mental, dor abdominal e Esta acidose, de modo geral discreta, resulta da diluição
174 Metabolismo Ácido-Básico

do bicarbonato plasmático pela infusão rápida de grandes esta saída do potássio da célula se deva a uma inibição da
quantidades de fluido que não contém bicarbonato ou seus bomba Na-K-ATPase celular pela acidose. Ao se corrigir a
precursores (p.ex., o lactato). Habitualmente a queda no acidose, o potássio retorna para dentro das células, pois não
bicarbonato não ultrapassa 10% e é rapidamente corrigi- existe mais necessidade de tamponamento intracelular.
da pelos rins.18,25 Além dos dados da história clínica, uma medida que
auxilia no diagnóstico causal da acidose metabólica é o
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E cálculo do anion gap (hiato-iônico).28 A necessidade de
EFEITOS SISTÊMICOS manter a eletroneutralidade faz com que o número de cá-
As manifestações clínicas da acidose metabólica depen- tions no plasma seja igual ao número de ânions. Os cáti-
dem da doença primária que está produzindo a acidose e ons são representados principalmente pelo sódio (o potás-
da velocidade de instalação do distúrbio. Porém, em cir- sio não é habitualmente incluído no cálculo, pois sua in-
cunstâncias graves, pode haver sintomas decorrentes da terferência é pequena), e os ânions, pelo cloro e bicarbona-
própria acidose metabólica. to. Porém, há outros ânions, que não são dosados habitu-
Como já foi mencionado, a acidose metabólica produz almente, mas que contribuem para a fração aniônica do
uma hiperventilação, com movimentos respiratórios pro- plasma: proteínas, lactato fosfato e sulfato. Esta fração de
fundos (respiração de Kussmaul), observada ao exame fí- ânions é identificada ao se verificar que a soma dos ânions
sico, principalmente quando o pH é menor que 7,20. medidos não é igual à dosagem do sódio.24
Observam-se vômitos, dores pelo corpo e fadiga. Com o Anion gap  Na  (Cl  HCO3)
aumento da gravidade da acidose, geralmente com bicar-
bonato inferior a 10 mEq/litro, observa-se diminuição da Utilizando as concentrações normais dos eletrólitos na
contratilidade miocárdica, dilatação arteriolar, venoconstri- fórmula acima (Na  140, HCO3  24, e Cl  105), veri-
ção periférica e arteriolar pulmonar. Conseqüentemente há ficamos que entre cátions e ânions existe uma diferença de
diminuição do débito cardíaco, hipotensão arterial, diminui- 8-16 mEq/litro, e que corresponde aos ânions que não fo-
ção do fluxo sanguíneo para os rins e fígado, maior sensibi- ram medidos (ânions “não mensuráveis”), mas que estão
lidade a arritmias cardíacas e diminuição da responsivida- presentes no plasma e contribuem para contrabalançar as
de cardiovascular às catecolaminas. A associação destas cargas catiônicas.20,24 Possivelmente os ânions que consti-
manifestações gera um ambiente propício para o desenvol- tuem o hiato iônico sejam os tampões aniônicos do espaço
vimento de insuficiência cardíaca congestiva. extracelular. 20
Há também manifestações neurológicas, com progres- Observe a fórmula do hiato iônico. Se a concentração de
siva diminuição do nível de consciência e até coma. Obser- cloro se mantém constante na acidose metabólica, mesmo
va-se também maior degradação protéica e redução da havendo queda no bicarbonato (usado no tamponamento
densidade óssea, principalmente nas acidoses crônicas.26 do hidrogênio dissociado), a manutenção da eletroneutra-
lidade se faz à custa do aumento de algum ânion que não
ACHADOS LABORATORIAIS o cloreto.20 Os fosfatos e as proteínas não sofrem variações
A acidose metabólica caracteristicamente causa uma rápidas, de forma que existe pequena possibilidade de que
diminuição do pH, diminuição do bicarbonato e diminui- sejam os responsáveis pelo aumento. Então, a eletroneu-
ção da PCO2. A compensação respiratória se inicia na primeira tralidade deve estar sendo mantida pelo aumento de algum
hora e se completa em até 24 horas. Esta compensação cau- ânion que em condições normais não está presente no plas-
sa a queda de 1,2 mmHg na PCO2 para cada redução de 1 ma. Exemplos disso são: a) lactato, que se acumula na aci-
mEq/litro na concentração de bicarbonato. dose láctica; b) beta-hidroxibutirato na cetoacidose; c) au-
mento dos ânions sulfato, fosfato e ácidos orgânicos, na
 [HCO3]  1,2   [CO2] insuficiência renal crônica; d) ácido fórmico na intoxicação
(podem ser aceitas diferenças de 2 mEq/litro)27 pelo metanol; oxalato e glicolato na intoxicação por etile-
Por exemplo, para um bicarbonato de 18 (redução de 6 noglicol, e lactato e cetonas na intoxicação pelo ácido ace-
em relação ao normal), a hiperventilação deverá trazer a tilsalicílico.27 Esse tipo de acidose metabólica, em que o
PCO2 para cerca de 32,8 (PCO2 normal de 40  7,2). Se a cloro permanece normal, é chamada de acidose normoclorê-
PCO2 estiver maior ou menor que este valor, o paciente tem mica, ou com anion gap (hiato iônico) aumentado.20,27
um distúrbio misto: além da acidose metabólica, acidose Ao contrário, nas acidoses causadas por perda de bicar-
ou alcalose respiratória, respectivamente.25,27 bonato, como as diarréias, não há retenção de ânions anô-
Pode haver hipercalemia, causada pelo desvio iônico con- malos, e o hiato iônico praticamente não se altera, já que à
seqüente à necessidade de tamponamento do excesso de medida que diminui o bicarbonato, pela perda intestinal,
hidrogênio dentro das células.26 Um íon hidrogênio entra aumenta a reabsorção de cloro, para manter a eletroneu-
na célula, mas ao mesmo tempo, para manter a eletroneu- tralidade. Este tipo de acidose, em que há perda de bicar-
tralidade, deve sair da célula um outro íon de carga posi- bonato, com aumento do cloro, é chamada de acidose hiper-
tiva — o potássio, principal cátion do intracelular. Talvez clorêmica, ou com anion gap normal (v. Fig. 11.10).20
capítulo 11 175

qüência de hipocalcemia, hipomagnesemia ou hiperalbu-


minemia na contração de volume, e o AG diminuído em
presença de hipercalemia ou hipoalbuminemia.27 Porém,
rotineiramente, a interpretação tradicional do anion gap é
suficiente. No Quadro 11.2 são observadas as concentra-
ções normais dos cátions e ânions não determinados.
As acidoses metabólicas podem ser classificadas de acor-
do com o anion gap (v. Quadro 11.3). Esta classificação pode
auxiliar principalmente quando há dificuldade em definir
a causa da acidose metabólica, por exemplo, num pacien-
te comatoso, cuja história clínica se desconhece; o cálculo
do anion gap permite situar entre as causas mais prová-
veis, possibilitando uma abordagem apropriada para cada
caso.
Além do desvio de potássio originado pela necessida-
de de manter a eletroneutralidade, os níveis de potássio no
sangue podem fornecer pistas quanto à etiologia da acidose
metabólica. No Quadro 11.4 observa-se a correlação entre
os níveis de potássio e causas de acidose metabólica.
Em algumas situações pode haver sobreposição de cau-
sas de anion gap normal ou aumentado. Por exemplo, de
modo geral, a cólera causa acidose com anion gap normal,
como as outras diarréias. Porém, quando esta doença cursa
com hipoperfusão (acidose láctica) e contração de volume
Fig. 11.9 Relação entre o pH urinário e a excreção de NH3. Ob- (hiperalbuminemia), o anion gap pode estar aumentado.27
servem que, quando o pH urinário diminui, a produção de NH3 Além destas alterações laboratoriais, a acidose metabó-
aumenta. (Obtido de Pitts, R.F.50) lica ocasiona leucocitose, hiperfosfatemia, hiperglicemia e
hiperuricemia. A leucocitose, muitas vezes superior a
25.000 leucócitos, é conseqüente a uma diminuição da
Alguns autores têm ressaltado o fato de que outros âni- marginação leucocitária, devendo ser excluídos processos
ons e cátions, medidos rotineiramente ou não, podem al- infecciosos subjacentes.24
terar o cálculo do hiato iônico, e que, na verdade, o termo A acidose láctica hipóxica pode provocar degradação
anion gap não é correto. Na verdade, o hiato iônico seria a muscular e hiperfosfatemia. A acidose inibe a ação perifé-
diferença entre os ânions e os cátions não mensuráveis (âni- rica da insulina, gerando hiperglicemia. A competição de
ons não mensuráveis  cátions não mensuráveis). Assim, ânions orgânicos e uratos pela secreção leva a um aumen-
fica mais simples compreender o AG aumentado em conse- to dos níveis de ácido úrico no sangue.24,26

Fig. 11.10 Classificação da acidose metabólica de acordo com o anion gap. (Adaptado de Adrogué, H.J.; Madias, N.E. In: Schrier, R.
Atlas of Kidney Diseases on line — www.HDCN.com)
176 Metabolismo Ácido-Básico

Quadro 11.2 Concentrações normais dos cátions e Quadro 11.4 Correlação entre os níveis de
ânions não mensurados rotineiramente potássio, anion gap e causas de acidose metabólica

Cátions não Ânions não Anion gap normal Anion gap aumentado
determinados mEq/L determinados mEq/L
Potássio sérico Potássio sérico normal
K 4,5 Proteína 15 reduzido ou elevado

Ca 5 PO4 2 Diarréia Cetoacidose


diabética
Mg 1,5 SO4 1
Inibição da anidrase Cetoacidose
Ácidos orgânicos 5 carbônica alcoólica

Total 11 23 Acidose tubular Acidose láctica


renal
Intoxicação por
salicilato
TRATAMENTO Potássio sérico Metanol
O tratamento é dirigido à doença básica e, em algumas elevado
situações, à própria acidose metabólica, como veremos a Administração de Ingestão de
seguir. NH4Cl paraldeído
Pielonefrite crônica Etilenoglicol
Tratamento da Doença de Base Uropatia obstrutiva Insuficiência renal
A acidose metabólica é manifestação de uma doença
primária, e o tratamento deve ser dirigido à correção des-
ta doença.
Na cetoacidose diabética, o ponto fundamental no tra- retidos resulta em rápida regeneração do bicarbonato, com
tamento é a administração de insulina e a correção dos resolução parcial ou completa da acidemia. O álcali pode
distúrbios da água, sódio e potássio. Não se deve adminis- até mesmo retardar a recuperação, por aumentar a cetogê-
trar álcali de rotina, pois o metabolismo dos cetoácidos nese hepática. Em pacientes com cetoacidose diabética e pH
inferior a 7,10, pequenas doses de bicarbonato podem ser
administradas com o objetivo de minimizar a depressão
miocárdica e hipoperfusão tecidual.29
Quadro 11.3 Causas de acidose metabólica de A cetoacidose alcoólica é corrigida com a apropriada
acordo com o hiato iônico reposição de nutrientes e interrupção da ingestão de eta-
nol. A infusão de glicose estimula a secreção de insulina
Hiato iônico normal (hiperclorêmica)
Perdas de bicarbonato
mas inibe a secreção de glucagon, promovendo a regene-
a) Gastrointestinal ração dos estoques de bicarbonato a partir do metabolis-
• Diarréia mo dos cetoácidos retidos.29
• Fístulas pancreáticas, biliares Nos casos de acidose láctica causada por oxigenação
b) Renal tecidual inadequada, o ponto essencial no tratamento é a
• Inibidores da anidrase carbônica
correção da mesma, com repleção do volume circulante
• Acidose tubular renal
Outras efetivo, suporte ventilatório, agentes inotrópicos e trata-
• Acidose dilucional mento da septicemia. Na acidose láctica resultante de in-
• Nutrição parenteral toxicação por metanol ou etilenoglicol, está indicada a di-
álise para remoção das toxinas, além da administração de
Hiato iônico aumentado (normoclorêmica)
Produção ácida aumentada grandes quantidades de álcali. Etanol é o antagonista do
• Cetoacidose diabética ou alcoólica metanol. 29
• Acidose láctica
• Erros inatos do metabolismo
Ingestão de substâncias tóxicas
Tratamento da Acidose Metabólica
• Intoxicação por salicilato Para pacientes com acidemia leve ou moderada (pH

• Ingestão de metanol 7,20), ou quando o processo subjacente possa ser rapidamente


• Ingestão de etilenoglicol controlado, muitas vezes a administração de álcali não é ne-
Falha na excreção ácida cessária. Porém, em pacientes com acidose grave (pH menor
• Insuficiência renal aguda ou crônica
que 7,20; bicarbonato inferior a 8), já existem depressão mio-
Adaptado de Shapiro, J.I.18 cárdica e disfunções enzimáticas significativas, e a adminis-
capítulo 11 177

tração de bicarbonato de sódio pode ser benéfica. A acidose e, se necessário, diálise. Outro aspecto desfavorável é a
deve ser tratada se estiver causando disfunções orgânicas possibilidade de alcalose muito abrupta, quando a corre-
graves.18 Para calcular a quantidade necessária de bicarbona- ção da acidose for muito agressiva.29
to a ser administrada, utilizamos a fórmula a seguir: O tamponamento de prótons pelo bicarbonato libera
CO2 (HCO3  H ↔ H2CO3 ↔ H2O  CO2), elevando a
Bic necessário  (Bicdesejado  Bicatual)  espaço do Bic18
PCO2 nos líquidos corporais. Este efeito pode ser prejudi-
Onde: cial em pacientes com reserva ventilatória limitada, falên-
Bicnecessário  quantidade de bicarbonato de sódio a admi- cia circulatória ou que estão sendo submetidos a ressusci-
nistrar (em mEq) tação cardiopulmonar. Nestas circunstâncias, paradoxal-
Bicdesejado  nível desejado de bicarbonato mente pode ocorrer piora da acidose intracelular e extra-
Bicatual  bicarbonato dosado no sangue celular, se a PCO2 exceder a fração de HCO3. No sistema
Espaço do Bic  50% do peso corporal nervoso central isto traz conseqüências graves, pois o CO2
em maior quantidade atravessa rapidamente a barreira li-
O espaço de bicarbonato é uma estimativa da capacida- quórica, elevando a PCO2 do líquor e piorando a acidose
de total de tamponamento do organismo, que inclui o bi- do sistema nervoso central.29,32
carbonato do extracelular, proteínas intracelulares e carbo- De acordo com os consensos mais recentes da Sociedade
nato do osso. Com bicarbonato normal ou pouco reduzi- Americana de Cardiologia sobre parada cardiorrespiratória,
do, o excesso de hidrogênio é tamponado proporcional- o uso de bicarbonato de sódio na parada cardiorrespirató-
mente na água corporal total, e o espaço aparente de bi- ria é considerado Classe 3 (tratamento inadequado, sem
carbonato é de 50% do peso magro do indivíduo.18,30 Este evidência científica de validade, e que pode ser prejudici-
espaço aumenta na acidose metabólica grave, pois as cé- al). Porém, em situações especiais, e sob monitorização ade-
lulas e o osso passam a contribuir cada vez mais para o quada, o bicarbonato de sódio pode vir a ser utilizado: a)
tamponamento, podendo chegar a 70% do peso corporal Quando houver acidose e hipercalemia comprovada (Clas-
quando a concentração de bicarbonato cai abaixo de 10 se 1 — considerado tratamento útil e efetivo); b) No trata-
mEq/litro; com bicarbonato menor que 5 mEq/litro, o es- mento de acidose metabólica responsiva a bicarbonato (Clas-
paço pode ser de 100%.29-31 se 2a — existência de evidências favoráveis ao seu uso); e c)
Por exemplo, um paciente de 70 kg tem um bicarbona- Para controle de acidose pós-circulação espontânea em pa-
to de 9 mEq/litro, que se deseja elevar para 15 mEq/litro. rada cardiorrespiratória de longa duração e como coadju-
O espaço de bicarbonato é de 70% e 50% para estas con- vante na parada cardiorrespiratória desencadeada por an-
centrações, respectivamente. Considere então como espa- tidepressivos tricíclicos (Classe 2b — tratamento não vali-
ço de bicarbonato a média entre 70% e 50%, ou seja, 60%. dado em estudos clínicos, podendo ser útil em alguns do-
Bicnecessário  (Bicdesejado  Bicatual)  espaço do Bic entes e provavelmente sem reações adversas).33
Nas acidoses metabólicas crônicas, o bicarbonato de
Bicnecessário  (15  9)  (0,7  70 kg)  6  49  294 mEq sódio pode ser administrado por via oral.18 No Brasil está
Então, de acordo com este cálculo, cerca de 290 mEq de disponível o bicarbonato de sódio em pó, contendo 12 mEq
álcali (geralmente bicarbonato de sódio intravenoso) po- de bicarbonato e 12 mEq de bicarbonato por grama.
dem ser administrados nas primeiras 4-6 horas. Alguns
autores sugerem que sempre se utilize o valor de 50% para Pontos-chave:
o espaço de bicarbonato, independente do valor do bicar-
bonato plasmático.29 Deve ser assinalado que esta estima- • A acidose metabólica é classificada de
tiva não é exata, e são necessárias avaliações do pH extra- acordo com o hiato iônico, que indica qual a
celular pelo menos 30 minutos após o término da infusão. causa mais provável: hiato iônico  Na 
Com o pH em nível mais seguro, não é mais necessária (HCO3  Cl)
reposição intravenosa, pois os rins serão capazes de rege- Hiato iônico aumentado: acréscimo de ácido
nerar o bicarbonato necessário.30 Hiato iônico normal: perda de bicarbonato
O tratamento da acidose metabólica é controverso, em
• O mecanismo esperado de compensação é a
função dos potenciais efeitos deletérios do bicarbonato
administrado.18 A infusão de grandes quantidades de bi- eliminação de CO2, através de
carbonato de sódio a 8,4% (1 mEq/ml) pode ocasionar hi- hiperventilação
pernatremia, hiperosmolalidade, diminuição da fração • A administração de bicarbonato tem
ionizada do cálcio, hipocalemia e aumento da produção de indicações precisas, e a quantidade é
ácidos orgânicos.26 Outra complicação que ocorre principal- calculada pela fórmula:
mente em pacientes cardiopatas ou nefropatas é a sobre- Bicnecessário  (Bicdesejado  Bicatual)  espaço do
carga de volume ocasionada pelo sódio da solução, que Bic
pode ser evitada ou tratada com o uso de diuréticos de alça,
178 Metabolismo Ácido-Básico

Como alternativa à administração de bicarbonato, que aumentada. Isto ocorre em situações em que existe aporte
tem como inconveniente a produção de CO2, poderia ser adequado de sódio e água aos sítios tubulares distais e
utilizada uma mistura de bicarbonato de sódio com car- aumento dos níveis de aldosterona. Além de estimular a
bonato de sódio (Carbicarb® — ainda não disponível para bomba H-ATPase, a aldosterona estimula a reabsorção de
uso clínico), que gera mais bicarbonato do que CO2; além sódio, tornando a luz tubular mais eletronegativa e mini-
disso, o carbonato de sódio reage com o ácido carbônico, mizando a retrodifusão dos íons hidrogênio para fora da
consumindo o CO2. Esta solução não evita hipervolemia e luz tubular. A secreção distal de potássio também está
hipertonicidade.29 aumentada, resultando em hipocalemia.35
O excesso primário de mineralocorticóides cursa com
alcalose metabólica e freqüentemente com hipertensão
Alcalose Metabólica arterial. Porém, os pacientes com hiperaldosteronismo se-
É a situação clínica em que há pH elevado (alcalino), cundário (p.ex., na cirrose ou insuficiência cardíaca) de
baixa concentração hidrogeniônica, aumento na concentra- modo geral não apresentam alcalose metabólica ou hipo-
ção de bicarbonato e PCO2 elevada. calemia, pois o efeito estimulatório da aldosterona é con-
A alcalose é um distúrbio ácido-básico relativamente trabalançado pelo menor aporte distal de sódio e menor
comum, e sua importância pode ser melhor avaliada quan- volume urinário. Estes fatores reduzem a quantidade de
do se correlacionam mortalidade e grau de alcalose. Em um hidrogênio e potássio na urina final. Se um ânion não
grupo de 177 pacientes cirúrgicos intensamente alcalóticos, reabsorvível (p.ex., penicilina) for administrado na vigên-
verificou-se que, num pH de 7,54 a 7,56, a mortalidade foi cia de depleção de volume, a excreção deste ânion obriga
de 40%, e num pH de 7,65 a 7,7, ela atingiu 80%.34 a perda de H ou K para manter a eletroneutralidade,
levando então a hipocalemia e alcalose metabólica.35
O uso de diuréticos de alça ou tiazídicos produz aumen-
CAUSAS DE ALCALOSE METABÓLICA
to do aporte distal de sódio e água, possibilitando a indu-
Ao se avaliar um paciente com alcalose metabólica, é
ção de excreção aumentada de hidrogênio. Uma diurese
necessário esclarecer dois pontos fundamentais: o motivo
volumosa pode produzir algum grau de depleção, contri-
que levou ao aumento do bicarbonato (fase de geração da
buindo para o desenvolvimento de alcalose metabólica.35
alcalose metabólica) e os fatores que evitaram a excreção
A acidose respiratória crônica leva a um aumento na
de bicarbonato pelos rins, permitindo a persistência da
secreção de hidrogênio, ao mesmo tempo em que o bicar-
alcalose (fase de manutenção)2,35 (v. Quadros 11.4 e 11.5).
bonato do plasma aumenta, para normalizar o pH (meca-
nismo de compensação). Mas quando se reduz abrupta-
GERAÇÃO DA ALCALOSE METABÓLICA mente a PCO2 (p.ex., em ventilação mecânica), desenvol-
Perda de Hidrogênio ve-se alcalose metabólica, por não ter havido tempo para
O íon H pode ser perdido do líquido extracelular atra- os rins eliminarem o excesso de bicarbonato. Nesta situa-
vés do trato gastrintestinal, dos rins ou por um desvio para ção, podem desenvolver-se graves anormalidades neuro-
o interior das células. Se a perda for maior que o ganho de lógicas, pois o pH no cérebro aumenta rapidamente com a
ácido proveniente da dieta e catabolismo, ocorrerá um diminuição da PCO2. Estas complicações justificam a ne-
aumento da concentração plasmática de bicarbonato. O cessidade de redução gradual da PCO2 em pacientes com
Quadro 11.4 mostra as diversas situações clínicas em que acidose respiratória crônica.35
esta perda de H pode ocorrer. DESVIO DO HIDROGÊNIO PARA O INTRACELU-
PERDA GASTROINTESTINAL DE Hⴙ. Em indivídu- LAR. O desvio do íon hidrogênio para o espaço intracelu-
os normais, a secreção de ácido pelo estômago não leva a lar pode ocorrer na hipocalemia (v. Cap. 12). Com o obje-
alcalose metabólica, pois esta perda de hidrogênio equili- tivo de repor o potássio do espaço extracelular, a hipoca-
bra-se com uma perda de bicarbonato nas secreções pan- lemia induz a saída do potássio do intracelular; para man-
creáticas. Porém, quando o suco gástrico é eliminado atra- ter a eletroneutralidade, o hidrogênio entra nas células,
vés de vômitos ou drenagem gástrica por sondas, há ten- diminuindo os níveis plasmáticos e aumentando o pH.
dência para alcalose metabólica por dois motivos: perda
pura do hidrogênio e ausência de estímulo para a secre- Adição de Bicarbonato ao Líquido Extracelular
ção de bicarbonato. Quando se perde hidrogênio, a reação A administração de bicarbonato ou seus precursores,
do sistema ácido carbônico-bicarbonato gera HCO3, de tais como lactato, citrato ou acetato, num ritmo maior que
forma que para cada mEq de hidrogênio perdido é gerado a produção diária de ácido elevará os níveis plasmáticos
1 mEq de bicarbonato.2 de bicarbonato. Se a função renal for normal, uma carga
de bicarbonato é quase toda excretada, causando pequena
CO2  H2O ↔ H2CO3 ↔ H  HCO3
variação no pH (v. Quadro 11.5). Porém, se a capacidade
PERDA RENAL DE Hⴙ. É possível haver perda renal de excreção renal for ultrapassada, a alcalose metabólica
de hidrogênio quando a secreção distal deste íon estiver se estabelece.
capítulo 11 179

A síndrome de Bartter é uma desordem rara, diagnosti-


Quadro 11.5 Etiologia e classificação da alcalose
cada principalmente em crianças, e que causa hipocalemia
metabólica
e alcalose metabólica resistente ao cloreto (v. próximas
Responsiva ao cloreto (cloro urinário menor que seções). Os pacientes apresentam cloro urinário elevado,
10 mEq/L) alcalose metabólica, hiperplasia do aparelho justaglome-
a) Distúrbios gastrointestinais rular (inespecífica), gradiente transtubular de potássio ina-
• Vômitos propriadamente alto e hiperaldosteronismo hiper-
• Drenagem gástrica
• Adenoma viloso do cólon reninêmico, sem hipertensão arterial. É causada por uma
• Cloridorréia congênita alteração na função do co-transportador potássio/cloreto.37
b) Uso de diuréticos A síndrome de Gitelman tem características semelhan-
c) Correção de hipercapnia crônica tes à síndrome de Bartter, porém com hipomagnesemia e
d) Fibrose cística
hipocalciúria. É causada por alteração na função do co-
Resistente ao cloreto (cloro urinário maior que transportador sódio/cloreto no túbulo contornado distal.37
20 mEq/L)
a) Excesso de mineralocorticóide
• Hiperaldosteronismo MANUTENÇÃO DA ALCALOSE METABÓLICA
• Síndrome de Cushing Como já foi mencionado, normalmente os rins são ca-
• Síndrome de Bartter pazes de excretar os excessos de bicarbonato. Portanto,
• Alcaçuz para que uma alcalose metabólica persista, é necessária a
b) Hipocalemia
presença de dois grupos de anormalidades: 1) Perda con-
Adaptado de Shapiro, J.I.18 tinuada de hidrogênio, desvio transcelular de hidrogênio,
administração de bicarbonato ou alcalose de contração; e
2) Aumento na reabsorção renal de bicarbonato ou dimi-
Outro fato a ser considerado é que o lactato (na acidose nuição na secreção distal de bicarbonato.35
láctica) e o beta-hidroxibutirato (na cetoacidose diabética) Em presença de função renal normal, o aumento ou
regeneram bicarbonato quando são metabolizados. Nestas manutenção da reabsorção de bicarbonato pelos rins se
duas circunstâncias, a administração de bicarbonato exó- deve a pelo menos um dos seguintes fatores: a) Depleção
geno representaria um excesso de álcali, resultando em do volume circulante efetivo; b) Depleção de cloro; c) Hi-
alcalose metabólica. pocalemia, e d) Hipoventilação e hipercapnia.35
O citrato utilizado em anticoagulação para hemodiáli- Estes fatores acima mencionados são responsáveis pela
se em pacientes com risco de sangramento, ou na anticoa- manutenção da alcalose metabólica, pois impedem a atu-
gulação de hemoderivados, pode também ser convertido ação dos mecanismos renais fisiológicos de eliminação de
a bicarbonato. A administração de mais de oito unidades maiores quantidades de bicarbonato que levariam à nor-
de sangue estocado ou plasma fresco congelado produz malização do bicarbonato no plasma. O esclarecimento de
este efeito.35 qual o fator envolvido auxilia na classificação das alcaloses
metabólicas e no planejamento terapêutico posterior.
Perda de Líquido Contendo Grandes
Quantidades de Cloro Volume Extracelular
Quando se perde sódio, cloro e pouco bicarbonato, como A depleção de volume aumenta a reabsorção de sódio
ocorre na administração de diurético de alça, há contração e o resgate de bicarbonato no túbulo proximal. No túbulo
do extracelular com aumento relativo na concentração do distal, também ocorre um aumento na reabsorção de só-
bicarbonato. dio (mediada por mineralocorticóide) em troca da secre-
Em certas situações, porém, há perda de fluidos mui- ção de H ou K. Com um aumento da secreção de H,
to ricos em cloro. São exemplos disso a perda de secreções ocorre regeneração de bicarbonato.
gástricas em pacientes com acloridria, a diarréia no ade- Um aumento na reabsorção distal de sódio também
noma viloso do cólon e cloridorréia congênita (esta última pode ocorrer na ausência de depleção de volume extrace-
um defeito raro na reabsorção intestinal de cloro e secre- lular, devido a um excesso de mineralocorticóide, como no
ção de bicarbonato, com diarréia crônica). Note que gran- hiperaldosteronismo primário. A elevada reabsorção dis-
de parte dos adenomas vilosos do cólon, que constituem tal de sódio pode gerar e manter uma concentração eleva-
5% dos pólipos intestinais e que têm potencial de malig- da de bicarbonato se os hormônios mineralocorticóides
nidade, produzem acidose metabólica hiperclorêmica, estimularem a secreção de H.18
pela perda de grandes volumes de fluido contendo po-
tássio e bicarbonato. Cerca de 10-20% destes tumores têm Deficiência de Cloro
um padrão secretor diverso, com secreção preferencial de Para que seja mantida a eletroneutralidade, quando a
cloro.36 concentração plasmática de bicarbonato se eleva, a con-
180 Metabolismo Ácido-Básico

centração de cloro deve reduzir-se. Porém, com a perda de de elevação até 60-75 mmHg em indivíduos normais. De-
sódio, e conseqüente contração do volume extracelular, o vido a estes fatores, a compensação respiratória na alcalo-
estímulo para restaurar o volume extracelular supera o se metabólica é menos intensa que na acidose metabólica.
estímulo para aumentar a excreção de bicarbonato. O pa-
pel do cloro é crucial nesta situação, pois é o único outro Correção Renal
ânion, além do bicarbonato, que pode acompanhar a rea- O rim é responsável pela terceira fase do mecanismo de
bsorção de sódio. Portanto, para se elevar ou manter a reab- defesa do pH. O rim tem a capacidade de eliminar o ex-
sorção de sódio enquanto simultaneamente se eleva a ex- cesso de bicarbonato, a não ser que outros fatores compro-
creção de bicarbonato, um ânion reabsorvível (cloro) pre- metam esta capacidade renal (v. a seguir). Esta eliminação
cisa estar presente para acompanhar a reabsorção de só- de base é bem mais rápida que a capacidade renal de ex-
dio. Se há deficiência de cloro, os rins reabsorvem outro cretar H.
ânion, o bicarbonato, perpetuando a alcalose metabólica.18
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Depleção de Potássio Na maioria das vezes, os sinais e sintomas da enfermi-
É um fator importante na origem e manutenção da al- dade básica dominam o quadro clínico e dificilmente po-
calose metabólica. Com a saída de potássio das células, derão ser separados. Não há sintomas ou sinais patogno-
aumenta a concentração de H intracelular, inclusive nas mônicos. A avaliação do espaço extracelular fornece dados
células tubulares renais. Havendo mais H para secreção,
muito importantes. Num paciente depletado, com defici-
maior será o resgate de bicarbonato. Além disso, em pre-
ência de potássio, a causa provável da alcalose metabólica
sença de hipocalemia, as bombas H-K-ATPase (que pro-
é a perda renal (diuréticos) ou gastrintestinal (vômitos).
movem reabsorção de potássio e secreção de hidrogênio)
Além destes sintomas, há os referentes à hipocalemia, como
e a síntese de NH3 são estimuladas, resultando em elimi-
fraqueza ou paralisia muscular, distensão abdominal, íleo
nação de maiores quantidades de H, na forma de NH4.18,35
e arritmias cardíacas, poliúria e aumento da produção de
amônia (que aumenta o risco de encefalopatia em hepa-
Hipoventilação e Hipercapnia topatas).38 Um extracelular expandido, com hipertensão
Da mesma forma que a depleção de potássio, a hipercap- arterial e hipocalemia, leva à suspeita de hiperaldostero-
nia aumenta a concentração intracelular de H disponível nismo.37
para secreção e, portanto, para resgate de bicarbonato. O elevado risco de intoxicação digitálica, intervalo QT
prolongado e ondas U são complicações conhecidas da
MECANISMOS DE DEFESA DO pH NA alcalose. A resistência vascular cerebral é sensível à PCO2
ALCALOSE METABÓLICA e a hipocapnia é uma potente força vasoconstritora cere-
Com a elevação do bicarbonato plasmático por um dos bral. Um fluxo sanguíneo cerebral reduzido pode justifi-
três mecanismos básicos já mencionados, os mecanismos car muitos sinais e sintomas neurológicos observados,
de defesa do organismo entram em ação, na tentativa de como cefaléia, convulsões, letargia, delirium e estupor.38
normalizar o pH.
DADOS LABORATORIAIS
Sistema Tampão O padrão diagnóstico no sangue arterial é elevação do
A fase de tamponamento é controlada pelo imediato pH, da concentração de bicarbonato e PCO2. O padrão ele-
tamponamento químico. Aproximadamente 1/3 do exces- trolítico é de hipocloremia e hipocalemia. A hipocalemia é
so de bicarbonato é tamponado pelo H intracelular, que basicamente conseqüente à perda urinária de potássio que
sai das células para o líquido extracelular. Exemplo disto se deve a uma elevada secreção distal.
é a saída de lactato das células musculares, para tamponar Como o mecanismo de compensação da alcalose é a re-
o espaço extracelular. tenção de CO2 através de hipoventilação, em alguns casos
observa-se hipóxia, dependendo da função pulmonar pré-
Compensação Respiratória via do paciente.
A segunda fase do mecanismo de defesa do pH é con- A concentração urinária de cloro é muito útil na avalia-
trolada pelo sistema respiratório. Para que o pH retorne ao ção inicial da alcalose metabólica. Concentração de cloro
normal, em face de uma elevação na concentração de bi- numa amostra de urina inferior a 10 mEq/litro indica que
carbonato, a PCO2 deve ser elevada. Isto ocorre através da o rim está reabsorvendo sódio avidamente, compatível
hipoventilação alveolar, com retenção de CO2 e elevação com situações associadas à depleção de volume e que res-
da PCO2. O grau de compensação é limitado pelas neces- pondem à infusão de cloreto de sódio (“sensíveis” ao clo-
sidades de O2, já que a pO2 será reduzida com a hipoventi- reto de sódio) (v. a seguir).
lação. O limite superior de elevação compensatória da Concentração urinária de cloro superior a 20 mEq/litro
PCO2 é geralmente aceito como 55 mmHg, mas há relatos demonstra que não há depleção de volume e que o cloro
capítulo 11 181

não é um elemento crucial na manutenção da alcalose; este da no bicarbonato plasmático (mEq/L). O objetivo do tra-
perfil geralmente corresponde às alcaloses resistentes ao tamento com HCl é reverter uma alcalose grave, e inicial-
cloreto de sódio. O sódio urinário não é útil nestas circuns- mente deve-se calcular uma correção parcial do bicarbo-
tâncias porque pode estar elevado durante períodos de nato, e não total. Pode-se preparar uma solução isotônica
bicarbonatúria. de HCl adicionando-se 150 ml de ácido clorídrico 1 N em
Como a alcalemia estimula a glicólise anaeróbica e au- 1 litro de água destilada. A infusão de 1 a 2 litros desta
menta a produção de ácido láctico e cetoácidos, pode ha- solução, em 24 horas, corrige a alcalose na maioria dos
ver moderada elevação no anion gap. casos.36 (Obs: solução 0,1-0,2 N é a solução contendo 100-
A alcalemia aguda reduz a liberação de oxigênio para 200 mEq de hidrogênio por litro.)38
os tecidos, por aumentar a afinidade entre oxigênio e he- O HCl deve ser administrado em ambiente de terapia
moglobina. A alcalemia crônica anula este efeito, aumen- intensiva, por cateter em veia cava ou outra veia central de
tando a concentração de ácido 2,3 difosfoglicérico nas he- grande calibre, sendo a posição do cateter necessariamen-
mácias.38 te confirmada por RX, já que a administração de HCl fora
do vaso provocaria repercussões dramáticas.36 A velocida-
TRATAMENTO de de infusão pode chegar a 25 ml/hora. Recentemente
Pelo exposto, fica evidente a necessidade de serem cor- Knutsen mostrou a possibilidade de se administrar, atra-
rigidos os mecanismos que impedem os rins de excretarem vés de uma veia periférica, ácido clorídrico 0,15 N em uma
quantidades maiores de bicarbonato. Abordaremos o tra- solução de aminoácidos e emulsão lipídica.39
tamento da alcalose metabólica de acordo com sua classi- Alternativas ao HCl são: o cloreto de amônio (NH4Cl) e
ficação. a arginina mono-hidrocloreto. O cloreto de amônio (374
mEq de hidrogênio por litro) pode ser administrado por
Alcalose Metabólica Responsiva ao Cloreto veia periférica, em quantidade não superior a 300 mEq nas
Apesar de a correção do déficit de cloreto ser essencial, 24 horas; é contra-indicado na insuficiência renal ou hepá-
a seleção do cátion que o acompanha em solução (sódio, tica.36 A arginina mono-hidrocloreto (475 mEq de H por
potássio ou próton) depende do estado do espaço extrace- litro) pode causar hipercalemia grave em pacientes com
lular, da presença e do grau de depleção de potássio asso- insuficiência renal, principalmente se houver doença he-
ciada, e do grau e reversibilidade de qualquer diminuição pática concomitante.38
da taxa de filtração glomerular. Quando a função renal é Se a taxa de filtração glomerular for adequada, o uso de
normal, ao se repor cloreto o excesso de bicarbonato será acetazolamida, que é um diurético inibidor da anidrase
eliminado pelos rins.36 carbônica, na dose de 250-500 mg via oral ao dia aumenta
Se existe depleção de cloreto e do extracelular concomi- significativamente a excreção renal de bicarbonato e potás-
tantemente (que é a situação mais comum), a administra- sio. É benéfico para pacientes que tenham sobrecarga de
ção de solução salina isotônica (NaCl 0,9%) é adequada e volume e particularmente útil para os pacientes em que se
corrige os dois déficits. Em presença de sinais de depleção necessita manter eliminação de sódio ou quando o potássio
do extracelular, a quantidade a ser administrada está em estiver elevado. Se não houver hipocalemia, é aconselhável
torno de 3-5 litros de solução salina isotônica. Porém, se não a reposição de potássio, pela alta probabilidade de se desen-
há sinais de depleção do extracelular, o déficit de cloro volver hipocalemia na vigência de diurese alcalina.18,36
pode ser calculado pela fórmula: 0,2  peso (kg)  aumen- Caso não haja resposta renal após a repleção de cloro ou
to desejado no cloreto plasmático (mEq/litro). for necessária diálise para o controle da insuficiência re-
As perdas continuadas de cloro e potássio devem ser nal, a diálise corrigirá a alcalose metabólica. Porém, se só
calculadas e acrescentadas à reposição. Como se instala estiverem disponíveis os líquidos de diálise com altas con-
diurese alcalina com a correção do cloreto, recomenda-se centrações de bicarbonato ou seus precursores, pode ser
acrescentar 10-20 mEq de potássio por litro de solução realizada diálise peritoneal de emergência com solução
administrada, para evitar que se some uma hipocalemia.36 salina isotônica, sendo a manutenção de potássio, cálcio e
Na presença de sobrecarga de volume, está contra-in- magnésio feita pela via intravenosa.36
dicada a reposição de grandes quantidades de volume No caso de a alcalose ser conseqüência de perdas conti-
contendo sódio; então repor cloreto sob forma de cloreto nuadas de suco gástrico, são úteis os antieméticos. Na al-
de potássio, em doses de 10-20 mEq. calose da gastrocistoplastia, a administração de um inibi-
O HCl é indicado se o NaCl ou KCl não puderem ser dor da bomba de prótons, como o omeprazol, bloqueará a
usados, ou se houver necessidade de correção imediata, por secreção gástrica na neobexiga.
exemplo, se o pH for maior que 7,55, ou na presença de
encefalopatia hepática, arritmia cardíaca, intoxicação digi- Alcalose Metabólica Resistente ao Cloreto
tálica ou alteração do estado mental. A quantidade neces- Quando a hipocalemia estiver associada com uma alca-
sária de HCl, administrado como solução 0,1 ou 0,2 M, é lose discreta a moderada, a administração de 40-60 mEq
calculada pela fórmula: 0,5  peso (kg)  redução deseja- de KCl quatro vezes ao dia é de modo geral suficiente. No
182 Metabolismo Ácido-Básico

entanto, se estiver presente arritmia cardíaca ou situação patias) ou enfermidades pulmonares (asma, enfisema etc.).
de ameaça à vida, o KCl pode ser administrado na propor- O denominador comum é uma hipoventilação alveolar,
ção de 40 mEq/hora, em concentrações não superiores a que pode ser causada por uma simples obstrução das vias
60 mEq/litro, sob monitorização eletrocardiográfica. A aéreas superiores. V. Quadro 11.6.
glicose deve ser inicialmente omitida da solução de repo-
sição, pois a secreção de insulina pode diminuir ainda mais CONSEQÜÊNCIAS CLÍNICAS
a concentração de potássio. Uma vez iniciada a reposição Clinicamente, há uma diferença entre o estabelecimen-
de potássio, a presença de glicose na solução auxilia na to rápido e o gradual da retenção de CO2. Os pacientes se
repleção celular de potássio.36 adaptam melhor quando a elevação é gradual.
Quando a causa for um excesso de mineralocorticóide, A retenção de CO2 pode causar confusão mental, tremor
o tratamento é dirigido à remoção cirúrgica da fonte ou do tipo flapping e coma. O único sinal clínico fidedigno de
bloqueio da mesma. Os efeitos do mineralocorticóide so- hipercapnia é a demonstração de PCO2 elevada no sangue.
bre o sódio, o potássio e o bicarbonato podem ser reverti- A PCO2 venosa é geralmente 6 mmHg mais elevada que a
dos com a espironolactona, diurético poupador de potás- arterial.
sio. Além disso, podem ser úteis a restrição de sódio e o
acréscimo de potássio na dieta.36 CONSEQÜÊNCIAS FISIOLÓGICAS
Nas síndromes de Bartter e Gitelman, o principal obje- Observando-se a equação de Henderson-Hasselbalch,
tivo do tratamento é diminuir a perda urinária de potás- fica claro que, para o organismo manter o pH sanguíneo,
sio. Na síndrome de Bartter, os inibidores da enzima con- a concentração plasmática de bicarbonato deve variar.
versora reduzem a produção de angiotensina II e diminu- Os tampões celulares desempenham o papel principal
em a secreção de aldosterona. Como a síntese de prosta- na resposta a alterações agudas da concentração de CO2.
glandinas está elevada nesta síndrome, e pode contribuir Quando a PCO2 aumenta, aumenta também a concentra-
para as perdas de sódio, cloro e potássio, inibidores da ção de H2CO3, e, portanto, a concentração de H. O H
prostaglandina sintetase podem melhorar a alcalose me-
tabólica. Na síndrome de Gitelman, os diuréticos poupa-
dores de potássio e a suplementação dietética de potássio
Quadro 11.6 Causas de acidose respiratória
são necessários.36
(aguda e crônica)

Pontos-chave: Acidose respiratória aguda


a) Anormalidades neuromusculares
• A alcalose metabólica apresenta as fases de • Lesão neurológica (tronco, medula alta)
• Síndrome de Guillain-Barré, miastenia gravis
geração e manutenção. Na fase de • Drogas
manutenção a eliminação de bicarbonato b) Obstrução de vias aéreas
pelos rins está prejudicada • Corpo estranho
• Edema ou espasmo de laringe
• Classificação: responsiva ou resistente ao • Broncoespasmo grave
cloreto c) Desordens tóraco-pulmonares
• O tratamento se baseia na correção de: • Tórax instável
• Pneumotórax
Espaço extracelular • Pneumonia grave
Deficiência de potássio • Inalação de fumaça
Deficiência de cloro • Edema pulmonar
d) Doença vascular pulmonar
• Em casos graves, pode ser necessária a • Embolia pulmonar maciça
administração de ácido clorídrico e) Ventilação mecânica controlada
• Parâmetros inadequados (freqüência, volume
corrente)
Acidose Respiratória • Espaço morto aumentado

Ocorre quando há uma retenção de CO2 (hipercapnia) Acidose respiratória crônica


no organismo e traduz-se por uma elevação da PCO2 no a) Anormalidades neuromusculares
• Paralisia diafragmática
sangue. Isto ocorre quando a produção de CO2 nos tecidos • Síndrome de Pickwick
excede a capacidade de remoção pelos pulmões. b) Desordens tóraco-pulmonares
• Doença pulmonar obstrutiva crônica
CAUSAS • Cifoescoliose
• Doença pulmonar intersticial terminal
Mais comumente são distúrbios neuromusculares (le-
sões do sistema nervoso central, da parede torácica e mio- Baseado em Kaehny W.D.43
capítulo 11 183

entra na célula em troca por Na e K e é tamponado pelas etc.), estados infecciosos (septicemias), estados hipermeta-
proteínas celulares, deixando o bicarbonato no líquido bólicos (febre, delirium tremens), insuficiência hepática, es-
extracelular. Este tamponamento celular é responsável por tados conversivos, etc.43
aproximadamente 50% do aumento agudo na concentra-
ção plasmática de bicarbonato.40 CONSEQÜÊNCIAS CLÍNICAS
Ao mesmo tempo, parte do CO2 entra na hemácia, for- Clinicamente, a hiperventilação pulmonar, além das
mando H2CO3, o qual, dissociando-se, libera H e HCO3. manifestações clínicas da enfermidade básica, pode ser
O íon H é tamponado pela hemoglobina, e o bicarbonato acompanhada de outros sintomas e sinais, possivelmente
entra no líquido extracelular em troca de cloro. Este meca- relacionados com o pH do sangue, circulação cerebral e
nismo é responsável por aproximadamente 30% do aumen- nível de cálcio iônico: parestesias nas extremidades e re-
to agudo na concentração plasmática de bicarbonato. No gião perioral, alteração na consciência e espasmos
homem, a magnitude do aumento na concentração de bi- carpopedais.
carbonato plasmático é pequena, sendo inferior a 5 mEq
quando a PCO2 aumenta gradualmente de 40 para 80 mm CONSEQÜÊNCIAS FISIOLÓGICAS
Hg.40,41 Quando há redução da PCO2 (hipocapnia), ocorrem re-
Quando a hipercapnia continua, a capacidade de tam- ações em sentido inverso ao daquelas que mencionamos
ponamento se esgota rapidamente. A necessidade de com- durante retenção de CO2. Os tampões intracelulares libe-
pensação leva a um aumento na excreção de H e na reab- ram H e trocam cloro e bicarbonato na direção oposta.40
sorção e produção de bicarbonato. Estes processos causam redução do bicarbonato plasmáti-
Schwartz e cols. mostraram, em cães expostos a uma co. Geralmente, esta redução é da ordem de 7-8 mEq/L
atmosfera de CO2, que o rápido aumento que ocorria nas quando a PCO2 é reduzida de 40 para 15 mmHg. Há tam-
primeiras 24 horas no bicarbonato plasmático não se acom- bém redução do limiar de reabsorção renal de bicarbona-
panhava de um aumento na excreção urinária de H. Mas, to e retenção de cloro pelo rim.
entre três e seis dias, o bicarbonato plasmático continuava
aumentando, até atingir um platô. O autor, então, demons- TRATAMENTO
trou que este último aumento no bicarbonato estava asso- É dirigido ao distúrbio que originou a hiperventilação
ciado a um aumento na excreção urinária de H, sob a for- alveolar. No entanto, a PCO2 pode ser rapidamente eleva-
ma de NH4, e, durante esta fase, o rim restaurou os tam- da, fazendo-se o paciente respirar uma mistura de gás car-
pões celulares e extracelulares consumidos durante a fase bônico a 5%, ou aumentando o espaço morto e diminuin-
aguda, gerando novo bicarbonato (v. Fig. 11.9).42 Portanto, do o volume-minuto quando em uso de ventilador.
na retenção crônica de CO2, o limiar da reabsorção de bi-
carbonato está elevado, assim como há uma excreção ele-
vada de cloro. É preciso mencionar que, no homem com Distúrbios Ácido-básicos Mistos
retenção crônica de CO2, não há uma compensação com-
Chamamos distúrbio ácido-básico misto à ocorrência de
pleta.
dois ou mais distúrbios ácido-básicos simultaneamente no
mesmo paciente. Assim, as desordens combinadas podem
TRATAMENTO mascarar umas às outras, resultando em pH relativamen-
É dirigido à causa da hipoventilação alveolar. Exemplo: te normal. Distúrbios ácido-básicos graves podem passar
desobstrução das vias aéreas superiores, alívio do bronco- despercebidos, a menos que uma abordagem passo a pas-
espasmo do asmático, etc. so seja utilizada na avaliação das gasometrias.44

Alcalose Respiratória DIAGNÓSTICO DOS DISTÚRBIOS


ÁCIDO-BÁSICOS
Ocorre quando há uma redução de CO2 no organismo e História clínica e exame físico completos devem ser rea-
traduz-se por uma diminuição da PCO2 no sangue. Esta lizados, verificando antecedentes de perdas fluidas, uso de
situação é conhecida como hipocapnia e é o resultado de medicamentos e estado do espaço extracelular. Verifique
uma hiperventilação alveolar. os valores encontrados na gasometria (arterial ou venosa)
e compare com os valores normais (Quadro 11.7).
CAUSAS Alguns autores sugerem que, antes de iniciar a avalia-
Qualquer condição que estimule a ventilação pulmonar ção dos resultados da gasometria, seja verificada a valida-
poderá ocasionar uma redução da PCO2. Exemplos: dor, de interna dos dados obtidos, através da fórmula de
ansiedade, salicilatos, tumores cerebrais ou acidentes vas- Henderson: [H]  24  PCO2/[HCO3]. A concentração
culares encefálicos, estados de hipóxia (cardiopatias cianó- hidrogeniônica (em mEq/litro) para cada pH é encontra-
ticas, altitudes, insuficiência cardíaca congestiva, anemia da no Quadro 11.8. Os valores intermediários podem ser
184 Metabolismo Ácido-Básico

Quadro 11.7 Valores normais para a gasometria em sangue arterial e venoso

pH HCO3 PCO2 pO2

Sangue arterial 7,35-7,45 22-26 mEq/litro 35-45 mmHg 80-100 mmHg

Sangue venoso 0,05 unidade menor igual ao arterial 6 mmHg maior 50% menor

Obtido de Kratz, A.52

Quadro 11.8 pH e concentração hidrogeniônica correspondente

pH 6,80 6,90 7,00 7,10 7,20 7,30 7,40 7,50 7,60 7,70 7,80

[H] 160 125 100 80 63 50 40 32 26 20 16

calculados por interpolação. Caso não haja correspondên- Como o pH está normal neste caso, os diagnósticos pos-
cia entre a [H] e o pH, há erro na medida de uma das síveis seriam uma alcalose metabólica (bicarbonato ele-
variáveis, no registro dos dados, ou ainda, as amostras vado) ou acidose respiratória (PCO2 elevada).46
foram obtidas em momentos diferentes.45 2) Aplicar as fórmulas para verificar se a compensação
está adequada (Quadro 11.10).
ROTEIRO PARA INTERPRETAÇÃO DOS Uma vez identificado um distúrbio, a aplicação da fór-
DISTÚRBIOS ÁCIDO-BÁSICOS mula específica permite identificar se um segundo distúr-
bio está presente. A pergunta deve ser: a compensação está
1) Primeira etapa: através do pH, PCO2 e HCO3ⴚ, identi- adequada para o que era previsto? Por exemplo: para as
ficar a desordem mais aparente (Quadro 11.9). desordens metabólicas, qual deveria ser a PCO2 após a
a) Se pH menor que 7,35  acidemia = acidose metabólica compensação. Para as desordens respiratórias, qual deve-
ou acidose respiratória. ria ser a concentração de bicarbonato após a compensação?
Se o HCO3 estiver baixo, é uma acidose metabólica. Se As fórmulas mostram aproximadamente a compensação
a PCO2 estiver alta, é uma acidose respiratória. esperada. Se a compensação não foi consistente com o que
b) Se pH maior que 7,45  alcalemia  alcalose metabóli- se previa, então um segundo distúrbio está presente.46
ca ou alcalose respiratória. Uma medida auxiliar no diagnóstico dos distúrbios áci-
Se o HCO3 estiver alto, é uma alcalose metabólica. Se a do-básicos é o mapa ácido-básico idealizado por Arbus (v.
PCO2 estiver baixa, é uma alcalose respiratória. Fig. 11.11).47
c) Se o pH estiver normal (7,35-7,45), mas o HCO3 e/ou a 3) Calcular o anion gap.
PCO2 estiverem alterados, verificar qual deles está mais Isto permite classificar a acidose metabólica, como foi
anormal. Por exemplo, pH  7,40; PCO2  60; HCO3 discutido anteriormente. Anion gap entre 16 e 20 pode ser
 36. Tanto a PCO2 como o HCO3 estão alterados. causado por outras situações, além da acidose metabólica.

Quadro 11.9 Roteiro de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos: identificação da desordem mais evidente,
através do pH, PCO2 e HCO3

Distúrbio pH PCO2 HCO3

Acidose metabólica Diminuído Diminuída (secundária) Diminuído (primário)

Alcalose metabólica Aumentado Aumentada (secundária) Aumentado (primário)

Acidose respiratória Diminuído Aumentada (primária) Aumentado (secundário)

Alcalose respiratória Aumentado Diminuída (primária) Diminuído (secundário)

Adaptado de Preston, R.A.46


capítulo 11 185

Quadro 11.10 Roteiro de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos: aplicar as fórmulas para verificar se a
compensação está adequada

Acidose metabólica PCO2  1,5  [HCO3]  8 ou


 [HCO3]  1,2   [CO2]
Variação aceita nos distúrbios simples: 2 mEq/litro

Alcalose metabólica PCO2  40  0,7  [HCO3 atual  HCO3 normal]


Variação aceita nos distúrbios simples: 5 mEq/litro

Acidose respiratória Aguda: [HCO3] aumenta 1 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2

Crônica: [HCO3] aumenta 3,5 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2

Alcalose respiratória Aguda: [HCO3] diminui 2 mEq para cada 10 mmHg de queda na PCO2

Crônica: [HCO3] diminui 5 mEq para cada 10 mmHg de queda na PCO2

Adaptado de Preston, R.A.46

Valores acima de 30 sempre significam acidose metabóli- Observação: Os elementos BE (base excess) e BD (base defi-
ca com anion gap aumentado. Para valores acima de 20, cit) da gasometria refletem o excesso de álcalis na alcalose
existe alta probabilidade de ser acidose metabólica com e a falta de bases na acidose metabólica. Valores normais:
anion gap aumentado.46 BE  2 mEq/L; BD  2mEq/L. Na alcalose metabóli-

BICARBONATO
mEq/l

PCO2 (mmHg)

Fig. 11.11 Mapa ácido-básico. A área central (N) representa a área de normalidade. Conhecendo-se pelo menos duas das variáveis
(PCO2, pH e HCO3), traça-se uma linha pelos respectivos valores, e o ponto de encontro de duas linhas indica o distúrbio ácido-
básico e a variação normal de compensação que pode ocorrer. Se o ponto de encontro das linhas cair fora das áreas sombreadas, as
chances são de que o paciente tenha um distúrbio ácido-básico misto. (Obtido de Arbus, G.S.47)
186 Metabolismo Ácido-Básico

ca encontramos valor positivo de BE e valor negativo de Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose me-
BD. Na acidose metabólica, valor negativo de BE e valor tabólica? PCO2  (1,5  10)  8  23
positivo de BD. Não julgamos aconselhável utilizar os con- Então, a PCO2 esperada seria de 23 mmHg, e está em 35,
ceitos de déficit ou excesso de base como ferramenta prin- ultrapassando em muito a variação aceitável. O pa-
cipal de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos. De fato, ciente deveria ter tido uma hiperventilação suficien-
entre 152 pacientes estudados por Fencl e colaboradores, te para que sua PCO2 caísse até 23 mmHg, mas ela
o BE deixou de diagnosticar distúrbio ácido-básico grave permaneceu em torno de 35. Podemos concluir que
em 1/6 dos pacientes.48 o paciente hipoventilou, e não eliminou CO2. Então,
o distúrbio que apresenta é uma acidose metabólica
ALGUNS EXEMPLOS com acidose respiratória.
Etapa 3: Anion gap 14. Portanto, o anion gap está nor-
Exemplo 1 mal.
Paciente com os seguintes valores na gasometria arteri- Diagnóstico final: Acidose mista, metabólica e respira-
al: tória, com anion gap normal.
pH  7,15; HCO3  6 mEq/litro; PCO2  18 mmHg
Na  135 mEq/litro; Cl  114 mEq/litro; K  4,5 Exemplo 3
Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo = acidose pH  7,15; HCO3  6 mEq/litro; PCO2  12 mmHg
metabólica (não é necessário calcular o AG neste exemplo)
Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose me- Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo  acidose
tabólica? PCO2  (1,5  6)  8  17 metabólica
Então, a PCO2 esperada seria de 17 mmHg, e está em 18. Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose me-
Como os valores estão muito próximos e a variação não é tabólica? PCO2 = (1,5  6)  8  17
superior a 2 mmHg, consideramos que se trata de uma Então, a PCO2 esperada seria de 17 mmHg, e está em
acidose metabólica pura (simples). 12. Este valor ultrapassa a variação aceitável. A hiper-
Etapa 3: Anion gap  [Na]  [Cl  HCO3] 135  ventilação estimulada pela acidose metabólica deveria
(114  6)  15. Portanto, o anion gap está normal. ter permitido que a PCO2 chegasse a 17, porém, o que
Diagnóstico final: Acidose metabólica simples, com ocorreu foi uma variação acima da esperada, por hiper-
anion gap normal. ventilação. Portanto, o distúrbio que o paciente apresen-
ta é misto: uma acidose metabólica com alcalose respi-
Exemplo 2 ratória.
pH  7,08; HCO3  10 mEq/litro; PCO2  35 mmHg. Diagnóstico final: Distúrbio misto (acidose metabólica
Anion gap  14 e alcalose respiratória).
Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo  acidose No Quadro 11.11, você encontra resumidos alguns
metabólica exemplos de distúrbios ácido-básicos.

Quadro 11.11 Quadro gasométrico resumido dos principais distúrbios ácido-básicos

Hiato
pH PCO2 [HCO3] [Cl] [Na] iônico

Normal 7,40 40 24 100 140 20

Acidose metabólica com hiato iônico normal 7,32 29 14 111 140 20

Acidose metabólica com hiato iônico aumentado 7,32 29 14 100 130 30

Alcalose metabólica 7,63 49 36

Acidose respiratória aguda 7,21 70 27

Acidose respiratória crônica 7,35 70 38

Alcalose respiratória aguda 7,63 20 20

Alcalose respiratória crônica 7,50 20 15

Adaptado de Zatz.20
capítulo 11 187

20. ZATZ, R.; MALNIC, G. Distúrbios do equilíbrio ácido-base. In: Zatz,


EXERCÍCIOS R. Fisiopatologia Renal, pp. 209-244, Atheneu, 2000.
21. ROSE, B.D.; POST, T.W.; NARINS, R.G. Causes of lactic acidosis. Up
Nos exercícios a seguir, avalie os dados clínicos e laboratoriais, e uti- To Date, v.9, n.3, 2001.
lizando o roteiro sugerido, responda: a) Qual o distúrbio ácido-básico? 22. ROSE, B.D. D-Lactic acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001.
b) Qual a compensação esperada? c) Qual o hiato iônico? 23. ROSE, B.D. Alcoholic and fasting ketoacidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001.
24. NARINS, R.G. Introduction to metabolic acidosis, Part 1, 2 and 3.
1) pH  7,54; PCO2  53; HCO3  42; Na  141; K  3,1; Cl  88. American Society of Nephrology Board Review Course, sep. 1998
2) pH  7,27; PCO2  26; HCO3  12; Na  142; K  3,6; Cl  100. (www.hdcn.com).
3) pH  7,10; PCO2  20; HCO3  11; Na  140; K  3,8; Cl  110. 25. PRESTON, R.A. Metabolic Acidosis. In: Acid-base, Fluids, and
4) pH  7,54; PCO2  32; HCO3  16; Na  141; K  3,1; Cl  Electrolytes Made Ridiculously Simple, pp. 97-115, MedMaster Inc., 1997.
88. Paciente ingeriu 6 g de ácido acetilsalicílico há 12 horas. Fre- 26. ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.J. Disorders of acid-base balance. In: Schrier,
qüência respiratória: 32 mrm. R.W. Atlas of Kidney Diseases (on line - http://www.kidneyatlas.org/),
5) pH  7,18; PCO2  65; HCO3  48; Na  137; K  4,3; Cl  Blackwell Science, 1999.
95. Paciente enfisematoso, internado com extensa broncopneumo- 27. POST, T.W.; ROSE, B.D. Approach to the patient with metabolic
nia. Creatinina  4,5 mg/dl. acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001.
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16. SCHWARTZ, W.B. e col. Effect of chronic hypercapnia on eletrolyte 48. FENCL, V.; JABOR, A.; KAZDA, A.; FIGGE, J. Diagnosis of metabolic
and acid-base equilibrium. II. Recovery with special reference to the acid-base disturbances in critically ill patients. Am. J. Respir. Crit. Care
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188 Metabolismo Ácido-Básico

ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato baixo, PCO2 baixa
씮 acidose metabólica.
http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1 – 06.pdf — b) Compensação esperada para a acidose metabólica é a hiperventi-
Excelente capítulo do Atlas de Doenças Renais on line de lação alveolar, com diminuição na PCO2, como se observa nesta
gasometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação
Robert Schrier. da alcalose metabólica é adequada: PCO2  1,5  [HCO3]  8 씮
http://www.biology.arizona.edu/biochemistry/ 32  (1,5  11)  8 씮 24,5 17. O mecanismo de compensação
problem – sets/medph/01q.html — Tutorial muito in- foi insuficiente e não reduziu a PCO2 aos níveis esperados. Por-
teressante com perguntas e respostas comentadas. tanto, trata-se de uma acidose mista (acidose metabólica  acido-
se respiratória).
http://perfline.com/cursos/cursos/acbas/acbas.htm — c) Anion gap  Na  (HCO3  Cl) 씮 AG  140 – (11  110) 씮
Revisão geral do equilíbrio ácido-básico e testes. AG  19. O anion gap está normal. Verifique as causas prováveis.
4) pH  7,54; PCO2  32; HCO3  16; Na  141; K  3,1; Cl  88.
Paciente ingeriu 6 g de ácido acetilsalicílico há 12 horas. Freqüência
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS respiratória: 32 mrm.
a) Distúrbio ácido-básico: pH alto, bicarbonato baixo, PCO2 baixa 씮
alcalose respiratória.
1) pH  7,54; PCO2  53; HCO3  42.
b) Compensação esperada para a alcalose respiratória é a eliminação
a) Distúrbio ácido-básico: pH alto, bicarbonato alto, PCO2 alta 씮 al- de bicarbonato e retenção de ácido pelo rim. Aplicando a fórmula
calose metabólica. de alcalose respiratória (aguda) para verificar se a compensação é
b) Compensação esperada para a alcalose metabólica é a hipoventi- adequada: [HCO3] deveria diminuir 2 mEq para cada 10 mmHg
lação alveolar, com aumento na PCO2, como se observa nesta ga- de queda na PCO2. Como a PCO2 caiu 8 mmHg, a concentração
sometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação da de bicarbonato deveria cair para cerca de 22,4 mEq/L. Porém, a
alcalose metabólica é adequada: queda no bicarbonato foi superior, chegando a 16 mEq/L. O me-
(PCO2  40  0,7  [HCO3 atual  HCO3 normal]) 씮 53  40  canismo de compensação foi inadequado, e conclui-se que este
0,7  (42  24) 씮 53  52,6. Portanto, a compensação está dentro paciente apresenta um distúrbio ácido-básico misto: alcalose res-
do que era esperado, e se trata de um distúrbio simples. piratória e acidose metabólica.
c) Anion gap  Na  (HCO3  Cl) 씮 AG  11. c) AG  Na  (HCO3  Cl) 씮 AG  37.
5) pH  7,18; PCO2  65; HCO3  28; Na  137; K  4,3; Cl  95.
2) pH  7,27; PCO2  26; HCO3  12; Na  142; K  3,6; Cl  100.
Paciente enfisematoso, internado com extensa broncopneumonia.
a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato baixo, PCO2 baixa Creatinina  4,5 mg/dl.
씮 acidose metabólica. a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato alto, PCO2 alta 씮
b) A compensação esperada para a acidose metabólica é a hiperventi-
acidose respiratória.
lação alveolar, com diminuição na PCO2, como se observa nesta b) Compensação esperada para a acidose respiratória é a retenção de
gasometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação bicarbonato pelo rim. Aplicando a fórmula de acidose respirató-
da acidose metabólica é adequada: PCO2  1,5  [HCO3]  8 씮
ria (crônica) para verificar se a compensação é adequada: [HCO3]
26  (1,5  12)  8 씮 26  26. Portanto, a compensação está ade- Deve aumentar 3,5 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2.
quada: a acidose estimulou a hiperventilação, reduzindo a PCO2 ao Como a PCO2 aumentou 25 mmHg, o bicarbonato deveria estar
nível que era esperado.
em torno de 32,75. Observe que o bicarbonato elevou-se pouco,
c) Anion gap  Na  (HCO3  Cl) 씮 AG  142 – (12  100) 씮 frente ao que era esperado, talvez devido ao comprometimento de
AG  30. O anion gap está aumentado. Verificar quais as causas função renal que este paciente apresenta. Então, o distúrbio apre-
prováveis.
sentado por ele é uma acidose mista (metabólica  respiratória).
3) pH  7,10; PCO2  32; HCO3  11; Na  140; K  3,8; Cl  110. c) AG  Na  (HCO3  Cl) 씮 AG  14.

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