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Prova de Ética IV

Por Sílvia de Lourdes Lemes Aguiar

4. Analise o argumento de Singer contra a criminalização do aborto

Através de um ponto de vista utilitarista, Singer estabelece alguns critérios para


analisar a discussão tão complexa que se tem em torno da prática do aborto, dentre eles
estão: o nascimento, os primeiros sinais de vida a viabilidade e a consciência. Ele inicia
seu argumento trazendo os argumentos conservadores dos que condenam o aborto e as
pesquisas liberais dos que defendem o aborto. Em suas palavras:

Início a abordagem da questão do aborto apresentando a posição


daqueles que se: lhe opõem, a que chamarei "posição conservadora".
Examinarei em seguida algumas das respostas progressistas típicas e
mostrarei por que razão são inadequadas. Por fim, recorrerei à nossa
discussão anterior sobre o valor da vida para abordar a questão de uma
perspectiva mais abrangente. Ao contrário da opinião comum de que a
questão moral acerca do aborto é um dilema sem solução, mostrarei
que, pelo menos nos limites da ética não religiosa, existe uma resposta
clara e que quem adopta uma perspectiva diferente está, pura e
simplesmente, enganado (SINGER, 2002, p. 147).

Em seguida, Singer lançará mão de três premissas a fim de colocar o problema


em forma de argumento formal. A primeira premissa é: “É errado matar um ser
inocente. A segunda premissa: “Um feto humano é um ser humano inocente” e a
terceira premissa, sendo a conclusiva: “Logo, é errado matar um feto humano”. A
segunda premissa Singer considera ser o ponto de vista conservador, enquanto que os
pensadores liberais dão início a discussão com o argumento de que um feto não é
efetivamente um ser humano. Nesse sentido, Singer apresenta a discussão tradicional
em relação a prática do aborto, que se trata da delimitação do início da vida humana, ou
seja, quando o feto se torna uma pessoa?

Na visão de Singer ambos os argumentos apresentam pontos que devem ser


analisados para então chegar a conclusão se há ou não uma fundamentação. Em sua
visão, enquanto o argumento liberal utiliza o nascimento como ponto de divisão para se
distinguir vida e não vida, o argumento conservador interpreta o momento da
fecundação como o momento formador de vida. Sobre isso, Singer acredita ser uma
discussão difícil já que a ciência ainda não conseguiu delimitar um espaço de tempo em
que se torna moralmente aceitável a interrupção da “vida”. Em suas palavras:

No que diz respeito ao aborto, a discussão mostrou até agora que a


procura dos progressistas, no sentido de encontrar uma linha divisória
moralmente crucial entre o bebé recém-nascido e o feto, não
conseguiu pôr em evidência qualquer acontecimento ou estádio de
desenvolvimento que possa ter o peso necessário para separar quem
tem direito à vida de quem não o tem, de uma forma que mostre
claramente que o feto se encontra na última categoria quando está no
estádio de desenvolvimento em que a maioria dos abortos se pratica.
Os conservadores encontram-se em terreno sólido quando insistem em
que o desenvolvimento do embrião ao bebé constitui um processo
gradual (SINGER, 2002, p. 152).

Contudo, Singer reconhece o direito da mulher de reivindicar sua autonomia


sexual e reprodutiva, apontando que a proibição do aborto só fez aumentar o número da
prática, de forma clandestina, se tornando um problema de saúde pública. Ademais, ao
analisar as questões centrais que rondam o debate sobre o aborto, Singer chama a
atenção para a cultura de sacralização da vida humana, ou seja, um certo status especial
que recebemos por sermos da espécie homo sapiens. Segundo ele:

Podemos agora olhar para o feto tal como ele realmente é -- vendo as
características reais que possui -- e podemos avaliar a sua vida
colocando-a no mesmo escalão em que colocamos as vidas dos seres
com características semelhantes que não são membros da nossa
espécie. Torna-se agora claro que o nome do movimento Pró- _Vida
ou Direito à Vida é enganador (...) Porque, em qualquer comparação
justa de características moralmente relevantes -- como a racionalidade,
a autoconsciência, a consciência, a autonomia, o prazer e o
sofrimento, etc. --, a vaca, o porco e a tão ridicularizada galinha ficam
muito à frente do feto em qualquer estádio da gravidez -- e, se
fizermos a comparação com o feto de menos de 3 meses, um peixe
mostra maiores sinais de consciência (SINGER, 2002, p. 160).

Podemos perceber que a questão central para Singer não é a discussão sobre o que seria
ou não moralmente aceitável, mas se a defesa da criminalização do aborto estaria de acordo com
as práticas que realizamos todos os dias com os animais não humanos. A questão não seria
cometer ou não o aborto, mas sim se questionar em qual nível de senciência estou projetando
dor a outro ser.

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