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Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS


TERRITÓRIOS

Órgão 6ª Turma Cível

Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0700530-56.2021.8.07.0001

APELANTE(S) JOSE EDMAR DE CASTRO CORDEIRO

APELADO(S) SUL AMERICA SEGURO SAUDE S.A.


Relator Desembargador ALFEU MACHADO

Acórdão Nº 1379238

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. IMPUGNAÇÃO.


EFEITO DEVOLUTIVO. NÃO OCORRÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. COLETIVO POR
ADESÃO. INCIDÊNCIA DO CDC. SÚMULA 608/STJ. FALECIMENTO DO PARTICIPANTE
TITULAR. PERMANÊNCIA DO BENEFICIÁRIO DEPENDENTE APÓS O PERÍODO DE
REMISSÃO. POSSIBILIDADE. CONSUMIDOR. IDOSO SEPTUAGENÁRIO.
HIPERVULNERABILIDADE. PACTO INTERGERACIONAL. PRECEDENTES DO STJ.
APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.

1. Não se conhece da rediscussão acerca da gratuidade de justiça formulada em contrarrazões ao apelo


exclusivo do beneficiário, visto que tal questão constituiu capítulo da sentença que não foi impugnado
pelo interessado e, consequentemente, operou-se a preclusão temporal.

2. A Lei nº 9.656/98, bem assim da RN/ANS nº 195/09, evidenciam, em diversas passagens a


necessidade de se conferir um tratamento diferenciado e mais cuidadoso ao idoso beneficiário do
serviço de assistência privada à saúde, em acentuado dirigismo contratual, inclusive quanto ao pacto de
solidariedade intergeracional inerente a essa espécie contratual, para proteger os consumidores
participantes de plano de saúde na velhice, considerada a sua peculiar situação de pessoa em situação
de hipervulnerabilidade.

3. E diante da omissão legislativa acerca dos contratos coletivos por adesão, a orientação emanada da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da possibilidade da manutenção da
cobertura contratual a consumidor idoso que ostenta a qualidade de beneficiário dependente após o
período de remissão decorrente do falecimento do participante titular, preservadas as condições
anteriormente contratadas, desde que assumindo as obrigações dele decorrentes.

4. Julgado de referência: Polêmica acerca da exclusão de beneficiária idosa de plano de saúde coletivo
por adesão em virtude da morte do titular. (...) Inexistência de norma da ANS sobre o direito de
permanência do dependente em planos "coletivos" após o período de remissão. (...)
Hipervulnerabilidade do consumidor idoso no mercado de planos de saúde. (...) Necessidade de se
assegurar ao dependente idoso o direito de assumir a titularidade do plano de saúde, em respeito aos
princípios da confiança e da dignidade da pessoa humana. (AgInt no REsp 1780206/DF, Rel. Ministro
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe
24/09/2020).

5. Precedentes do STJ: AgInt no AgInt no AREsp 1781617/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/08/2021, DJe 13/08/2021; AgInt no REsp
1923124/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/04/2021, DJe
22/04/2021; AgInt no AREsp n. 1.428.473/SP, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 25/6/2019, DJe 28/6/2019.

6. Apelação cível provida. Sentença reformada. Pedidos julgados procedentes.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito


Federal e dos Territórios, ALFEU MACHADO - Relator, LEONARDO ROSCOE BESSA - 1º Vogal e
ARQUIBALDO CARNEIRO - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ESDRAS
NEVES, em proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata
do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 20 de Outubro de 2021

Desembargador ALFEU MACHADO


Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo JOSÉ EDMAR DE CASTRO CORDEIRO contra sentença
proferida pelo Juízo da 16ª Vara Cível de Brasília, que julgou improcedentes os pedidos formulados na
ação que move em desfavor de SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, objetivando
sua permanência no plano de saúde coletivo por adesão vigente desde 20/04/2012, o qual fora
contratado por sua esposa, a qual faleceu em 28/12/2017, e no qual o apelante manteve-se como
dependente durante o período de remissão.

O juízo de origem proferiu sentença nos seguintes termos (ID 25300479):

Como se vê, os dependentes têm assegurado o direito de permanência. É de se ponderar, todavia, que
assim como ocorre com o titular, cujo direito é assegurado pelo § 1º do artigo, a norma estabelece
prazo mínimo de 6 meses e máximo de 24 meses.

Nada obstante o § 3º do artigo não fazer referência a limitação de prazo, não é lógico que os
dependentes tenham direito que não foi assegurado ao próprio titular do plano. A esse, ao ser
demitido, é conferido prazo máximo de permanência de 24 meses. Intepretação diversa implicaria
conferir aos dependentes manutenção no plano por prazo indeterminado, com extrema vantagem em
relação ao próprio titular do plano.

De modos que, ultrapassado esse prazo, tem a operadora do plano direito de cancelar o plano
oferecido.

Como o autor encontra-se assistido desde o ano de 2017, verifica-se que o prazo legal foi respeitado,
devendo o pedido ser julgado improcedente.

(...)

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial e extingo o processo com resolução de
mérito na forma do art. 487, inciso I, CPC.

O autor JOSÉ EDMAR DE CASTRO CORDEIRO interpôs recurso de apelação, objetivando a


reforma da sentença para obter o julgamento procedente de seus pedidos iniciais (ID 25300489).

Em suas razões, sustentou que a relação entre as partes é consumerista, razão pela qual as cláusulas e
normas devem ser interpretadas de forma mais favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do
Código de Defesa do Consumidor.

Além disso, sustentou que, considerando que vem pagando integral e pontualmente a respectiva
contribuição, a manutenção do contrato de plano de saúde não ocasionaria qualquer dano patrimonial à
operadora apelada, o que autorizaria sua manutenção no plano.

Sem preparo, em decorrência da gratuidade concedida na origem (ID 25299986).

Contrarrazões da apelada elencando impugnação à gratuidade de justiça concedido ao autor, e, no


mérito, sustenta pela inelegibilidade do beneficiário para se manter no plano de saúde coletivo por
adesão ante a ausência de vínculo com a entidade classista com a qual o contrato foi celebrado
(FECOMERCIO), pugnando, assim, pelo não provimento do recurso, com a manutenção da sentença
(ID 25300495).

Tentou-se a realização de acordo entre as partes (ID 26048047), restando, todavia, infrutífera (ID
27663340).

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador ALFEU MACHADO - Relator


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto pela parte autora. É
tempestivo, dispensado de preparo e foi subscrito por advogado devidamente constituído.

Conforme relatado, trata-se de apelação interposta pelo autor JOSÉ EDMAR DE CASTRO
CORDEIRO contra sentença proferida pelo Juízo da 16ª Vara Cível de Brasília, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na ação que move em desfavor de SUL AMÉRICA
COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, objetivando sua permanência no plano de saúde coletivo por
adesão contratado por sua falecida esposa, vigente desde 20/04/2012 e no qual o apelante figurou
como dependente, mantendo-se os mesmos direitos então vigentes e sem precisar cumprir novo
período de carência.

1. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA DO AUTOR EM SEDE DE


CONTRARRAZÕES. NÃO CONHECIMENTO.

A questão acerca da gratuidade de justiça não surgiu neste grau recursal, tendo sido impugnada na
contestação lançada na origem (ID 25300001), e, por conseguinte, constituído capítulo da sentença
proferida na origem, que julgou improcedente a impugnação suscitada alhures.

Com efeito, diante do provimento jurisdicional desfavorável, incumbia à parte apelar desse capítulo da
sentença para devolver essa questão a este colegiado.

Contudo, tendo a parte quedado inerte, operou-se a preclusão quanto à matéria, impossibilitando a sua
rediscussão por esta instância recursal através de contrarrazões, porquanto consubstancia-se em via
processualmente inadequada para tanto.

Nesse sentido:

Descabido conhecer de pedido de reforma de decisão contido em contrarrazões, visto que formulado
em inobservância à forma adequada, não sedo a petição de resposta a via adequada para
manifestação de inconformismo em face da decisão.

(Acórdão 1372181, 07208884520218070000, Relator: ANA CANTARINO, 5ª Turma Cível, data de


julgamento: 22/9/2021, publicado no DJE: 27/9/2021.)

Diante disto, não conheço do pleito relativo à gratuidade de justiça formulado pela apelada nas
contrarrazões de ID 25300495.

2. MÉRITO

Sem preliminares ou prejudiciais de mérito, passo à análise do mérito da apelação de JOSÉ EDMAR
DE CASTRO CORDEIRO.

2.1- HISTÓRICO:

De plano, cumpre assentar premissa fática no sentido de que o plano de saúde em tela fora contratado
pela falecida esposa do apelante, PERPÉTUA LÚCIA NEVES CORDEIRO, e se qualifica como
coletivo por adesão, firmado entre a consumidora e a operadora ré SUL AMÉRICA SEGURO
SAÚDE S.A. por intermédio de convênio da administradora e estipulante QUALICORP
ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A. em parceria com a entidade FECOMERCIO/DF (ID
25299980 e 25299979).

2.2-APLICAÇÃO DO CDC. SÚMULA 608 DO STJ:

A propósito, inexorável que a relação telada nos autos se qualifica como sendo de consumo, sujeita à
Lei nº 8.078/90, na forma do entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ - no
enunciado nº 608: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde,
salvo os administrados por entidades de autogestão”.

No que concerne à recusa da operadora do plano de saúde verificada na espécie em manter o apelante
como beneficiário após o período de remissão, tem-se que esta se sustenta na compreensão de que isso
implicaria o descumprimento das Resoluções Normativas nº 195 e 196 da Agência Nacional de Saúde
Suplementar – ANS, visto que quem integrava a entidade profissional, classista ou setorial vinculada
ao plano de saúde coletivo por adesão em questão era a esposa falecida.

2.3- DO CONTRATO ESTABULADO ENTRE A APELADA E A FECOMÉRCIO:

No caso em comento, há previsão em contrato (Cláusula 10.1 do ID 25299980) de período de


remissão, o qual alcança o prazo de 3 (três) anos após a invalidez total permanente ou morte do
beneficiário titular, período durante o qual há isenção total do pagamento de contribuições, mantidas
para os dependentes as coberturas e modalidades de plano contratadas.

Após o aludido interregno de remissão, ainda segundo previsão contratual, haverá o cancelamento das
coberturas contratuais. E justamente para evitar o escoamento deste prazo – na hipótese, o termo final
seria o dia 19/01/2021 – o autor propôs a presente ação, postulando sua manutenção do plano de saúde
mediante o pagamento integral das contribuições.

2.4-VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE:

E como salientado, a operadora requerida, ora apelada, alega que o autor apelante não ostentaria
elegibilidade para figurar como beneficiário do plano de saúde depois de encerrado o período
contratual de remissão, porquanto não possui vínculo com a entidade parceira.

No entanto, a prevalecer esta interpretação, vislumbra-se flagrante violação ao princípio da legalidade,


visto que não é possível extrair que as referidas normas administrativas alcançam a situação de morte
do titular de plano coletivo para retirar de seus beneficiários justamente a proteção que a Lei nº
9.656/98 buscou lhes assegurar.

2.5-RECENTE JULGADO DO STJ SOBRE O CASO CONCRETO:

Ocorre, igualmente, que, “em se tratando de contratos coletivos por adesão, no entanto, não há
qualquer norma – legal ou administrativa – que regulamente a situação dos dependentes na
hipótese de falecimento do titular”. (REsp 1871326/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
TERCEIRA TURMA, julgado em 01/09/2020, DJe 09/09/2020, trecho do voto condutor. Grifo nosso)

Ora, o art. 9º da RN ANS nº 195, elenca as entidades de classe com as quais o titular do plano de
saúde por adesão deve manter vínculo. Porém, é inegável que tal qualidade não é exigida dos
beneficiários, durante a execução do contrato.

2.6- NÃO HÁ JUSTIFICATIVAPARA DISTINÇÃO:

Assim, não faz sentido pretender diferenciar o beneficiário do titular do plano de saúde. Com grande
percuciência, Luiz Antônio Rizzatto Nunes leciona que “os dependentes de um contrato familiar ou
coletivo de plano privado de assistência à saúde são, à luz do art. 2º do CDC, tão consumidores
quanto o titular, de modo que àqueles deve ser reservado igual tratamento ao dispensado a este”,
ressaltando ainda “que os dependentes também geram receita, pois, assim como o titular, fazem parte
do preço, sejam cobrados diretamente, sejam embutidos no valor pago por aquele” e concluindo, a
partir dessa premissa, que “não teria cabimento a lei proteger o titular e abandonar seus dependentes
” (NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários à lei de plano e seguro-saúde. 2ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2000. p. 53).

Por outro lado, deve-se ressaltar que a regra que estabelece período de remissão, situado entre 6 (seis)
meses e 24 (vinte e quatro) meses, prevista no art. 30, §1º, da Lei nº 9.656/98, aplica apenas aos
planos coletivos empresariais, diante da expressa ressalva da norma, abaixo transcrita:
Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o
desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato
de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas
mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de
trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.

§ 1º O período de manutenção da condição de beneficiário a que se refere o caput será de um terço


do tempo de permanência nos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o, ou sucessores,
com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte e quatro meses.(...)

§ 3º Em caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos


pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde, nos termos do disposto neste artigo.
(grifo nosso)

2.7-AFASTAMENTO E NÃO APLICAÇÃO DE SÚMULA DA ANS:

De igual maneira, aparamente inaplicável ao caso a Súmula Normativa nº 13/2010 da ANS, a qual
prevê que “o término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos
dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção
das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo” (grifo nosso).

2.8-DESTACO QUE ESTÁ É A POSIÇÃO DO STJ:

Em assim sendo, diante da omissão legislativa acerca dos contratos coletivos por adesão, a orientação
emanada da jurisprudência do STJ é no sentido de que nos planos de saúde coletivos por adesão “os
seus dependentes dispõem do direito de continuar no plano de saúde, preservadas as condições
anteriormente contratadas, desde que assumindo as obrigações dele decorrentes" (AgInt no AREsp
n. 1.428.473/SP, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
25/6/2019, DJe 28/6/2019).

Nesse mesmo sentido, também se manifestou a Terceira Turma daquele sodalício superior:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO POR


ADESÃO. MORTE DO TITULAR. EXCLUSÃO DE DEPENDENTE IDOSA, APÓS A REMISSÃO.
DESCABIMENTO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA CONFIANÇA E DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA. JULGADOS DESTA CORTE SUPERIOR.

1. Polêmica acerca da exclusão de beneficiária idosa de plano de saúde coletivo por adesão em
virtude da morte do titular.

2. Nos termos da Súmula Normativa 13/ANS: "o término da remissão não extingue o contrato de
plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas
condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a
qualquer tempo".

3. Inexistência de norma da ANS sobre o direito de permanência do dependente em planos


"coletivos" após o período de remissão.

4. Hipervulnerabilidade do consumidor idoso no mercado de planos de saúde. Doutrina sobre o


tema.

5. Necessidade de se assegurar ao dependente idoso o direito de assumir a titularidade do plano de


saúde, em respeito aos princípios da confiança e da dignidade da pessoa humana. Julgados desta
Corte Superior. (...)

(AgInt no REsp 1780206/DF, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA


TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020) (grifo nosso)

Dada a similitude dos casos analisados naquela assentada e na presente hipótese, destaca-se, por
oportuno, excerto das razões de decidir do voto condutor do Acórdão, de relatoria do Min. Paulo de
Tarso Sanseverino:

Entretanto, a dependente do plano já contava com 74 anos de idade na data do término da remissão,
e mais de uma década de contribuição para o plano de saúde.

Essa condição peculiar da ora recorrida justifica que lhe seja assegurado o direito de permanecer no
plano de saúde, assumido a condição de titular. (...)

Essa condição peculiar do idoso torna-o parte hipervulnerável no mercado de planos de saúde, uma
vez que apresenta grau vulnerabilidade bastante superior à do consumidor de planos de saúde em
geral.

Para compensar essa hipervulnerabilidade, a Lei 9.656/1998 (art. 15), secundada pela Resolução
Normativa ANS 195/2009, estatuíram normas de acentuado dirigismo contratual, que estabelecem
uma solidariedade entre gerações, para proteger os usuários de plano de saúde na velhice. (...)

Resulta desse pacto entre gerações que os usuários mais jovens contribuem para o plano de saúde
com um valor proporcionalmente maior do que o correspondente à sinistralidade de sua faixa etária,
para assim permitirem que os idosos contribuam com um valor proporcionalmente menor do que a
respectiva sinistralidade.

Sob esse prisma, constata-se que a exclusão do beneficiário idoso por fato que não lhe é imputável
rompe com esse pacto entre gerações (dentro do universo dos participantes do respectivo plano),
colocando o idoso em situação de extrema desvantagem no mercado de planos de saúde, uma vez que
não poderá usufruir da contribuição da geração posterior (mais jovem, portanto), embora tenha
contribuído para custear a geração anterior (mais idosa).

Assim, para preservar a confiança dos contratantes no que diz respeito a esse pacto entre gerações,
bem como em respeito à dignidade da pessoa idosa, é de rigor assegurar aos dependentes idosos o
direito de assumirem a titularidade do plano de saúde após a morte do titular, ainda que se trate de
plano coletivo por adesão. (grifo nosso)

Em consonância com esta percepção de complacência com a manutenção de participante dependente e


idoso após o período de remissão, desde que assumida a integralidade das contribuições, pode-se
elencar os seguintes julgados da Corte da Cidadania:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE POR ADESÃO. (...) 2. MORTE DO TITULAR.
EXCLUSÃO DE DEPENDENTE, APÓS A REMISSÃO. DESCABIMENTO. PRECEDENTES. (...)

Com efeito, verifica-se que o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do STJ, no
sentido de que, mesmo nos contratos de saúde por adesão, após o óbito do beneficiário titular, seus
dependentes possuem o direito de permanecer no plano de saúde coletivo, mantidas as condições
anteriormente contratadas, assumindo as obrigações dele decorrentes.

(AgInt no AgInt no AREsp 1781617/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA
TURMA, julgado em 09/08/2021, DJe 13/08/2021) (grifo nosso)

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. (...) AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. (...) CONTRATO COLETIVO POR ADESÃO.
ÓBITO DO TITULAR. MANUTENÇÃO DO DEPENDENTE APÓS O PRAZO DE REMISSÃO,
COM A ASSUNÇÃO DAS OBRIGAÇÕES JÁ ASSUMIDAS. POSSIBILIDADE. (...)

Segundo o entendimento do STJ, ante o falecimento do titular, os seus dependentes dispõem do direito
de continuar no plano de saúde, preservadas as condições anteriormente contratadas, desde que
assumam as obrigações dele decorrentes.

(AgInt no REsp 1923124/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em
19/04/2021, DJe 22/04/2021)

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO


MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. CONTRATO COLETIVO DE PLANO DE SAÚDE.
ÓBITO DO TITULAR. COBERTURA. DEPENDENTE. CONTINUIDADE DA VIGÊNCIA DO
CONTRATO, COM A ASSUNÇÃO DAS OBRIGAÇÕES JÁ ASSUMIDAS. PRECEDENTES DO
STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. (...) A jurisprudência
dominante do STJ orienta que, ante o falecimento do titular, os seus dependentes dispõem do direito
de continuar no plano de saúde, preservadas as condições anteriormente contratadas, desde que
assumam as obrigações dele decorrentes.

(AgInt no REsp 1861910/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em
10/08/2020, DJe 13/08/2020)

Igualmente esta Corte de Justiça já se manifestou ostentando a mesma conclusão, a conferir:

PLANO DE SAÚDE COLETIVO POR ADESÃO. FALECIMENTO DO TITULAR. LEI 9.656/98.


DEPENDENTE. (...) Admite-se a manutenção por prazo indeterminado do dependente no plano de
saúde após o falecimento do titular, mediante pagamento das obrigações e independentemente da
idade deste quando da contratação.

(Acórdão 1335541, 07016893820208070011, Relator: FERNANDO HABIBE, 4ª Turma Cível, data


de julgamento: 22/4/2021, publicado no DJE: 10/5/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DANO


MORAL. ILEGIMIDADE PASSIVA. ESTIPULANTE. REJEIÇÃO. CANCELAMENTO DE
CONTRATO COLETIVO DE PLANO DE SAÚDE. MORTE DO TITULAR. PERMANÊNCIA DO
DEPENDENTE. REMISSÃO. INCIDÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEI N.
9.656/98. SÚMULA 13/2010 DA ANS. INOBSERVÂNCIA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DANO
MORAL. OCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA.

2. Segundo o § 3º do artigo 30 da Lei 9.956/98 e da Súmula Normativa nº 13/2010 da ANS é


assegurada ao dependente, a permanência em plano de saúde, ainda que tenha advindo a morte do
titular, nas mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes. Não há que
se falar em ausência de elegibilidade para a segurada permanecer vinculada na Apólice de Seguro
Saúde pretendida, uma vez que a legislação aplicável ao caso não faz qualquer distinção a respeito
da modalidade plano contratada para se aplicar o referido benefício.

3. Demonstrado o interesse da dependente do plano de saúde em permanecer na condição de


beneficiária, assumindo as parcelas das obrigações correspondentes, mostra-se ilegal o
cancelamento do benefício, devendo ser mantida no plano de saúde mesmo após o término do período
de remissão previsto no contrato, nos mesmos moldes de cobertura que usufruía enquanto o seu
cônjuge titular era vivo. (...)

(Acórdão 1034683, 20160111194065APC, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª


TURMA CÍVEL, data de julgamento: 19/7/2017, publicado no DJE: 2/8/2017. Pág.: 644-653)

2.9-DIÁLOGO DAS FONTES: CDC e ESTATUTO DO IDOSO:


Consoante apontado nos julgados acima, a Lei nº 9.656/98 evidencia, em diversas passagens (e.g. os
art. 14, 15, parágrafo único, 18, II, 35-E, I, § 1º, V) a necessidade de se conferir um tratamento
diferenciado e mais cuidadoso ao idoso beneficiário do serviço de assistência privada à saúde, em
acentuado dirigismo contratual, inclusive quanto ao pacto de solidariedade intergeracional inerente a
essa espécie contratual, para proteger os consumidores participantes de plano de saúde na velhice,
considerada a sua peculiar situação de pessoa em situação de hipervulnerabilidade.

Gize-se que no caso sub judice o apelante é IDOSO atualmente com quase 70 (setenta) anos de idade
(ID 25299976)portador de comorbidades diversas (Hipertensão/Diabetes/Trombose/Uso de
Marcapasso, etc.), consoante documentomédicoanexo(ID 25299983).

2.10-AUSÊNCIA DE DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO FINANCEIRO DO CONTRATO:

Por derradeiro, não há se alegar em infringência ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato, visto


que o beneficiário, após o período como beneficiário remido, e com lastro na determinação da medida
liminarmente concedida neste feito, passou a verter contribuições no montante de R$ 4.840,87 (quatro
mil oitocentos e quarenta reais e oitenta e sete centavos) por mês ao plano de saúde.

Dessa maneira, o pleito de manutenção do consumidor/beneficiário dependente/idoso no plano de


saúde após o período de remissão contratualmente previsto iniciado com a morte da ex-cônjuge e
beneficiária titular, assumindo integralmente os encargos decorrentes, encontra amparo
jurisprudencial, devendo ser, portanto, julgado procedente, com a consequente reforma integral da
sentença lançada na origem.

2.11-DESTACO MAIS:

Consigno que, inobstante ter a liminar de ID 25299985 sido revogada na oportunidade da prolação da
sentença, a eficácia desta fora suspensa pela decisão havida na no ID 24399958 da PET
0708683-81.2021.8.07.0000 de lavra desta relatoria, pelo que aquela medida liminarmente concedida
resta ora confirmada.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao apelo para, confirmando a decisão liminar (ID 25299985),
reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos formulados na inicial, CONDENANDO a ré
SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A a manter o autor JOSE EDMAR DE CASTRO
CORDEIRO como beneficiário do plano de saúde anteriormente contratado por sua falecida
esposa, nas mesmas condições daquele contrato, condicionado à assunção da integralidade das
contribuições pelo participante.

Redistribuo os ônus de sucumbência fixados na origem, que serão suportados exclusivamente pela
parte vencida/apelada.

É como voto.

O Senhor Desembargador LEONARDO ROSCOE BESSA - 1º Vogal


Com o relator
O Senhor Desembargador ARQUIBALDO CARNEIRO - 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO

CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME.

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