Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Conteúdos essenciais
Vídeo
a. Contextualização histórico-literária
João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett nasce a 4 de fevereiro de 1799, no Porto, mas cedo
A primeira metade do século XIX, em A publicação do poema narrativo de Garrett, Camões (1825),
Portugal, é caracterizada por acontecimentos corresponde à introdução e difusão do Romantismo em Portugal,
marcantes, dos quais se destacam: indissociavelmente ligadas à vitória do liberalismo e à ascensão de
• as Invasões Francesas (1807 a 1810), que uma nova classe dominante – a burguesia.
determinam a fuga da família real para o No decurso das lutas liberais, intelectuais portugueses como Garrett
Brasil, em 1807; e Herculano exilaram-se, por motivos políticos, em Inglaterra e
• a crise da sucessão dinástica, após a morte França, onde tomaram contacto com as novas ideias.
do rei D. João VI; O Romantismo opõe-se ao Neoclassicismo do século XVIII,
• a guerra civil e a consequente ruína caracterizando-se pelos seguintes aspetos:
económica (1828-1834); • valorização do "eu" face ao coletivo e ao social;
• a sequência de violentas reações políticas – • exaltação do sentimento face ao convencionalismo;
o setembrismo (1836); o golpe de Estado • defesa dos ideais de liberdade individual e política;
desencadeado por Costa Cabral, no Porto,
• valorização da pátria e das características nacionais;
em 1840, que leva à instauração de uma
ditadura; a revolta da Maria da Fonte (1846);
• preferência pelos ambientes noturnos;
a guerra civil da Patuleia (barões do • crença no progresso;
cabralismo vs. liberais). • carácter didático dos textos, devido ao nascimento de um novo
público de origem burguesa e pouco letrado;
Apesar da turbulência política, assiste-se a
um desenvolvimento industrial, que se • reinvenção da História;
concretizaria com a Regeneração, a partir de • libertação da rigidez das normas clássicas, entre as quais o
1850, com a figura de Fontes Pereira de Melo, abandono das fronteiras entre os géneros literários;
cuja ação promove a ascensão política e • valorização da prosa enquanto discurso literário;
cultural da burguesia, bem como o • adoção de uma linguagem com um carácter coloquial e mais
crescimento da classe média. oralizante.
158
2 · Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa
Nota
• De acordo com as Aprendizagens Essenciais, a obra Frei Luís de Sousa deve ser lida na íntegra.
• Todas as citações da obra Frei Luís de Sousa seguem a edição da Coleção Educação Literária, da Porto Editora,
2015.
Nota
• Como as características do texto dramático já foram analisadas aquando do estudo da obra vicentina, sugere-se
a consulta da página 78 para revisão dos conteúdos.
chave para a leitura e compreensão da obra, pois nele o dramaturgo aponta as características específicas
de Frei Luís de Sousa, o que revela a dificuldade que Almeida Garrett sentiu em integrar a sua obra num
determinado género. Assim, convém explicitar as características gerais da tragédia clássica e do drama ro-
mântico.
159
Capítulo III · Educação Literária · 11.º ano
Tendo em conta as características enunciadas, Frei Luís de Sousa apresenta, de facto, características
da tragédia clássica, tal como Garrett afirma no texto teorizador Memória ao Conservatório Real:
• índole (assunto) trágica – “pela índole há de ficar pertencendo sempre ao antigo género trágico”;
• ação simples – “há toda a simplicidade de uma fábula trágica antiga”;
• inexistência de cenas excessivas – “sem uma dança macabra de assassínios, de adultérios e de inces-
tos, tripudiada ao som das blasfémias e das maldições”;
• existência de poucas personagens – “uma ação que se passa entre pai, mãe e filha, um frade, um
escudeiro velho e um peregrino que apenas entra em duas ou três cenas”;
• possibilidade de comparação entre as personagens de Frei Luís de Sousa e algumas personagens
célebres de tragédias clássicas: Manuel de Sousa Coutinho e Édipo1, Madalena e Jocasta2 – as per-
sonagens de Frei Luís de Sousa “revolvem mais profundamente no coração todas as piedades”.
1 Édipo – Segundo a mitologia grega, mata seu pai, Laio, e casa com a própria mãe, Jocasta. Após ter descoberto que esta era
sua mãe, Édipo furou os próprios olhos.
2 Jocasta – Mãe de Édipo, suicida-se após ter sido confrontada com a verdade: ter casado com Édipo e ser mãe dele.
160
2 · Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa
Tendo em conta as características enunciadas, Frei Luís de Sousa apresenta também características
do drama romântico:
Vídeo
• preferência pela liberdade poética em detrimento do rigor histórico – “Eu sacrifico às musas de
Homero, não às de Heródoto: e quem sabe, por fim, em qual dos dois altares arde o fogo de melhor
verdade!”;
• justificação do uso da prosa em vez do verso, pois não acredita no verso como linguagem dramá-
tica para assuntos recentes e porque lhe desagrada “pôr na boca de Frei Luís de Sousa outro ritmo que
não fosse o da elegante prosa portuguesa que ele, mais do que ninguém, deduziu com tanta harmonia
e suavidade”;
• o patriotismo e o nacionalismo consubstanciados na escolha de um momento da História de
Portugal.
Garrett refere também outros aspetos que justificam e contextualizam a sua obra dramática, tais como:
• a missão social da literatura – o romance e o drama devem fornecer a verdade ao povo:
› “é povo, quer verdade. Dai-lhe a verdade do passado no romance e no drama histórico […] e o povo há
de aplaudir, porque entende: é preciso entender para apreciar e gostar”
• o contributo do literato, do poeta – revestir os factos do homem das formas mais populares, de modo a:
› “derramar assim pelas nações um ensino fácil, uma instrução intelectual e moral”
• a afirmação das suas convicções político-sociais:
› “Este é um século democrático; tudo o que se fizer há de ser pelo povo e com o povo… ou não se faz.”
• a oferta de Frei Luís de Sousa ao Conservatório Real de Lisboa:
› “Ofereço esta obra ao Conservatório Real de Lisboa” e “[…] que eu venha entregar como oferenda ao
Conservatório Real de Lisboa este meu trabalho dramático.”
Pelo hibridismo do texto dramático (característica tipicamente romântica) atrás constatado e referen-
ciado, poder-se-á concluir que a obra sintetiza, de forma notável, aspetos da tragédia clássica e do drama
romântico.
d. A estrutura da obra
A obra Frei Luís de Sousa apresenta o drama que se abate sobre a família de Manuel de Sousa Coutinho
e D. Madalena de Vilhena. As apreensões e os pressentimentos de D. Madalena de que a paz e a felicidade
familiar poderiam estar em perigo tornam-se, gradualmente, numa realidade. O incêndio, no final do Ato I
da obra, permite uma mutação dos acontecimentos e precipita a tensão dramática. É no palácio que fora
de D. João de Portugal que a ação atinge o seu clímax, quer pelas recordações de imagens e de vivências,
quer pela possibilidade que dá ao Romeiro de reconhecer a sua antiga casa e de se identificar a Frei Jorge.
Espaço
O espaço constitui um elemento fundamental para o desenrolar da ação dramática, não só no que diz
respeito à construção da cor epocal, como no que se relaciona com a criação do efeito de verosimilhança.
O espaço físico
CPEN-P12 © Porto Editora
A construção do espaço físico em Frei Luís de Sousa parte das indicações presentes nas didascálias que
iniciam cada um dos atos. O espaço não constitui, neste texto garrettiano, apenas um simples enquadra-
mento da ação, desempenhando igualmente um papel simbólico importante.
161
CPEN-P12-11
Capítulo III · Educação Literária · 11.º ano
Tempo
A ação dramática de Frei Luís de Sousa reporta-se ao final do século XVI, mais concretamente 1599, em-
bora a didascália inicial do Ato I se refira à “elegância” portuguesa dos princípios do século XVII. Assim, a
ação decorre durante o domínio filipino, 21 anos após a batalha de Alcácer Quibir, que aconteceu a 4 de
agosto de 1578. A cena 2 do Ato I assume especial importância para a definição dos limites da ação dramá-
tica, em especial as seguintes réplicas de Madalena:
• “[…] D. João ficou naquela batalha […]. Sabeis […] como durante sete anos […] o fiz procurar”
(1578 + 7 = 1585);
• “[…] a que se apega esta vossa credulidade de sete… e hoje mais catorze… vinte e um anos?”
162 (1585 + 14 = 1599);
2 · Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa
Síntese de conteúdos
• Características da tragédia clássica:
› a simplicidade
› a estrutura da ação
› a nobreza das personagens
› o fatalismo
Hibridismo
de géneros › o valor dos presságios
• Características do drama romântico:
› a liberdade poética em detrimento do rigor histórico
› a utilização da prosa
› o nacionalismo
• Mudança de espaços
O espaço • Afunilamento e obscurecimento
• Dimensão simbólica: opressão, fatalidade, desgraça
• Concentração
O tempo
• Simbolismo de algumas referências temporais
• Número reduzido
• Características românticas: dualidade razão/paixão, nacionalismo, presença do mito
Personagens (sebastianismo), carácter excessivo, defesa da liberdade, “eu” vs. sociedade, obsessão
da morte
• Simbologia
• Os retratos
• A concentração espacial
Valor simbólico • As referências temporais
de alguns elementos
• A numerologia
• As papoilas
e universalidade
• Denúncia das arbitrariedades e da tirania
da obra
• Defesa da liberdade
177
CPEN-P12-12
Exercícios resolvidos
Exercício 1
Leia com atenção o texto que a seguir se apresenta e responda de forma clara e bem estruturada às questões.
Cena XV
Jorge e o Romeiro, que seguiu Madalena com os olhos e está alçado
20 no meio da casa, com aspeto severo e tremendo
Jorge – Romeiro, Romeiro, quem és tu?
Romeiro (apontando com o bordão para o retrato de D. João de Portugal)
– Ninguém!
178
Exercícios resolvidos
2.1
Tendo em conta o discurso das personagens, prove que há um crescendo de intensidade nestes excertos.
A partir desta fala, concluímos que este nobre já não tem lugar naquela casa, o saudosismo inviabiliza o presente.
naquela sociedade; daí a mensagem progressista (e até anti-sebastianista) que
Garrett pretende veicular – o saudosismo excessivo inviabiliza o presente e
o futuro e D. João, fazendo parte desse passado, é, por isso, “ninguém”.
179
Capítulo V · Exames
GRUPO I
Apresente as suas respostas de forma bem estruturada.
PARTE A
Ocidente
2.
Comente o significado dos versos: “Foi alma a Ciência e corpo a Ousadia / Da mão que desvendou.”
(vv. 7-8).
418
Exame-tipo 1
PARTE B
Leia o texto.
MANUEL
– Meu pai morreu desastrosamente caindo sobre a sua própria espada. Quem sabe se eu morrerei
nas chamas ateadas por minhas mãos? Seja. Mas fique-se aprendendo em Portugal como um homem
de honra e coração, por mais poderosa que seja a tirania, sempre lhe pode resistir, em perdendo o
amor a coisas tão vis e precárias como são esses haveres que duas faíscas destroem num momento…
5 como é esta vida miserável que um sopro pode apagar em menos tempo ainda! (Arrebata duas tochas
das mãos dos criados, corre à porta da esquerda, atira com uma para dentro; e vê-se atear logo uma
labareda imensa. Vai ao fundo, atira a outra tocha, e sucede o mesmo. Ouve-se alarido de fora.)
[…]
MADALENA
– Que fazes? que fizeste? Que é isto, oh meu Deus!
MANUEL
(tranquilamente)
10 – Ilumino a minha casa para receber os muito poderosos e excelentes senhores governadores
destes reinos. Suas Excelências podem vir, quando quiserem.
MADALENA
– Meu Deus, meu Deus!… Ai, e o retrato de meu marido!… Salvem-me aquele retrato! (Miranda e
outro criado vão para tirar o painel: uma coluna de fogo salta nas tapeçarias e os afugenta.)
MANUEL
– Parti! parti! As matérias inflamáveis que eu tinha disposto vão-se ateando com espantosa velo-
15 cidade. Fugi!
MADALENA
(cingindo-se ao braço do marido)
– Sim, sim, fujamos.
MARIA
(tomando-o do outro braço)
– Meu pai, nós não fugimos sem vós.
TODOS
20 – Fujamos! Fujamos!
(Redobram os gritos de fora, ouve-se rebate de sinos: cai o pano.)
Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa. Porto: Porto Editora, 2016
4.
Explique em que medida as afirmações “Quem sabe se eu morrerei nas chamas ateadas por mi-
nhas mãos? […] como é esta vida miserável que um sopro pode apagar em menos tempo ainda!”,
proferidas por Manuel, podem constituir presságio de tragédia.
CPEN-P12 © Porto Editora
5.
Analise os comportamentos manifestados por Madalena e por Manuel no excerto transcrito, funda-
mentando a sua resposta com elementos textuais pertinentes.
6. Analise um dos efeitos de sentido produzidos pela polissemia do vocábulo “Ilumino”. 419
Capítulo V · Exames
PARTE C
7.
À luz do estudo da poesia de Camões, redija uma breve exposição (entre cento e cinquenta a cento
GRUPO II
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, selecione a opção correta.
Escreva, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a opção escolhida.
Descobrimentos
30 políticos e comerciais), que permitiu um maior alargamento dos horizontes, abrindo o caminho à
influência e ao domínio portugueses num vasto mundo que ia da costa de Moçambique ao Japão.
Pouco depois do regresso de Vasco da Gama, uma armada acha ou descobre a costa do Brasil (Páscoa
de 1500), dando maior dimensão de grandeza a um império que a partir de então se espalha por três
continentes.
“Descobrimentos”, in Infopédia, https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$descobrimentos (consultado em 17-06-2019)
4.
No contexto em que ocorre, o vocábulo “consecução” (l. 13) pode ser substituído por
(A) determinação.
(B) glória.
(C) perda.
(D) conquista.
6.
A oração iniciada por “que” no segmento “num vasto mundo que ia da costa de Moçambique ao
Japão” (l. 31) é
(A) subordinada adjetiva relativa explicativa.
CPEN-P12 © Porto Editora
Grupo I – Parte B 7. U
ma das temáticas estruturantes da lírica camoniana é,
sem dúvida, a do Amor, dado que, para o poeta, este sen-
4. N
o momento em que estas reflexões são produzidas, Ma- timento superior norteava a sua existência, chegando a
nuel está prestes a levar a cabo uma ação que irá precipitar ser considerado o responsável máximo pela sua vida des-
a ação trágica. Sendo assim, e de modo a provar que ainda graçada, como é referido no poema “Erros meus, má for-
há patriotas em Portugal, que ainda há quem não esteja do tuna, amor ardente”.
lado dos Filipes, o marido de Madalena decide dar uma Assim, nos poemas referentes à experiência amorosa, Ca-
CPEN-P12 © Porto Editora
lição aos governadores que esqueceram o valor do nacio- mões dedica-se, fundamentalmente, à reflexão sobre o
nalismo. Deste modo, ao decidir incendiar a casa da famí- seu percurso de vida, em que o Amor é visto como fonte
lia, provando que os valores nobres estão bem acima dos de sofrimento e de mágoa, pois a forma “ardente” como
valores materiais, Manuel irá precipitar a ação trágica, ao sempre viveu trouxe-lhe dissabores. Apesar deste quadro
423
Capítulo V · Exames
negro, o poeta procurou o Amor, embora nem sempre merecem, como qualquer outro ser humano. Nesse célebre
Grupo II
1. (A).
2. (C).
3. (D).
4. (D).
5. (A).
6. (B).
7. (C).
8. Valor de posterioridade.
9. Complemento direto.
Grupo III
Se assumirmos como verdadeira a afirmação de Fer-
nando Pessoa, segundo a qual, quando Deus quer e o
Homem sonha, “a obra nasce”, então é naturalmente ver-
dade que “sempre que um homem sonha / O mundo pula e
avança”. Mais ainda: segundo o poema de António Gedeão,
o mundo não se limita só a pular e a avançar, mas consegue
fazê-lo com a leveza e a beleza de uma “bola colorida entre as
mãos de uma criança”.
De facto, sinónimo de desejo, de ideal, “o sonho comanda
a vida”, mantendo viva a esperança no futuro, ajudando-nos
a aguentar as adversidades que cada dia nos coloca. Cons-
cientes das dificuldades que nos esperam até atingirmos,
por exemplo, o curso universitário que queremos, se centrar-
mos a nossa atenção na concretização de um sonho, ou seja,
ao definirmos objetivos sólidos e alcançáveis, estaremos a
ganhar forças para realizar os nossos desejos, os nossos mais
profundos anseios.
Num outro patamar, o ativista político Martin Luther
King pronunciou, em 1963, em Washington, a frase “Eu tenho
um sonho” e lutou por ele, fazendo discursos, alertando ou
exigindo que aqueles que à época eram discriminados pas-
sassem a ser tratados com o respeito e a dignidade que
424