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DIREITO FINANCEIRO (02.02.

18)

INTRODUÇÃO

Receita pública

Endividamento – crédito público

Obter Orçamento
Necessidade pública

Ciências das finanças e direito financeiro Exploração patrimonial

Atividade financeira do Estado Gerir - planejar


Despesa pública
Controle

Direito financeiro é um ramo da ciência do direito que estuda um fenômeno, sob a ótima do dever
ser, o fenômeno da atividade financeira do Estado. Mas o Estado exerce atividade financeira? Todo mundo
exerce atividade financeira. Todos os seres que tem possibilidade de autodeterminação exercem atividade
financeira. Um mendigo que acumula moedinhas para comprar 1l de cachaça exerce atividade financeira;
um monge que recolhe esmolas para construir um templo, ou para distribuir para os mais pobres, exerce
atividade financeira; você quando recebe sua bolsa ou a sua mesada está exercendo atividade financeira.

O Estado exerce atividade financeira, a diferença primordial da atividade financeira do Estado é que
ela vai ser voltada para a realização de fins que não são próprios daquelas pessoas que representam, que
atuam em nome da sociedade, dos representantes políticos, e sim fins que são de toda a sociedade. Fins
públicos.

A atuação, a atividade financeira do Estado vai ser feita em prol do bem de toda a coletividade, e não
de um grupo determinado nem muito menos daqueles que detêm o poder político dentro da sociedade, os
representantes do povo. Essa é a grande diferença entre a atividade financeira do Estado e a atividade
financeira dos particulares.

Na disciplina de direito financeiro, não vamos estudar a atividade financeira do particular, esse
estudo deve ser feito em empresarial, na atividade financeira exercida pela empresa privada, que trabalham
visando o lucro, em prol dos seus acionistas, diferente da atividade financeira do Estado, que será feita em
prol dos bens públicos.
 Obter

A atividade financeira do Estado é um conjunto de ações, aproximam-se um pouco do negócio


jurídico, não é um ato isolado, sendo assim é importante frisar que: Essa atividade é voltada para obter. O
Estado precisa de meios, recursos econômicos para poder realizar os fins públicos, para satisfazer as
necessidades públicas, que é o fim da atividade financeira do Estado.

Embora partes autônomas do Estado possam exercer atividade empresarial, o Estado não é uma
empresa, ele nem sequer pode viver apenas daquelas partes autônomas que praticam atividade empresarial.
Então, como ele vai alcançar esses recursos que são necessários para satisfazer as necessidades públicas? Ou
seja, recursos para prestar os serviços públicos; manter a sua própria estrutura; pagar os servidores públicos;
cuidar da segurança interna e externa, ou seja, mantendo a polícia e o exército; pacificar a sociedade através
do judiciário, que envolve naturalmente juízes remunerados pelo Estado; prestar serviços públicos essenciais
para o transporte, iluminação pública; assistir os mais carentes, aqueles que não tem condição de se manter
com sua própria conta, através da assistência social, criar e contribuir para a previdência social, etc. Como o
Estado pode satisfazer todas essas necessidades públicas? Através da tributação.

Existem três formas de o Estado obter recursos para satisfazer as necessidades públicas:

 O primeiro meio que o Estado obtém recursos é através da tributação. Esse é o grande meio pelo
qual o Estado financia as suas atividades, tributando os cidadãos.

Sem a tributação dos cidadãos, sem que o Estado obrigue de forma coercitiva que o cidadão
contribua com o sustento da máquina estatal, não tem como o Estado satisfazer essas necessidades, e por
isso todo o Estado moderno é dotado de poder de retirar coercitivamente do bolso dos cidadãos aquilo que
for necessário para a satisfação das necessidades públicas.

Os limites ao poder de tributar, ou seja, até quando o Estado pode avançar sob o bolso do cidadão é
estudado na cadeira de direito tributário. Enquanto que a disciplina de direito tributário cuida apenas de uma
faceta, de um estudo mais aprofundado de uma faceta específica da atividade financeira do Estado, na
disciplina de direito financeiro analisamos a atividade financeira do Estado como um todo.

Não é só através de tributo que o Estado pode obter esses recursos, existem outras formas que o
Estado também pode utilizar para obter recursos e satisfazer as necessidades públicas.

 A segunda forma do Estado de obter recursos é através das empresas. O Estado pode ter empresas
lucrativas, exercer atividade econômica, e obter eventualmente lucro. Pode vender parte do seu
patrimônio, como quando uma prefeitura vende um terreno através de licitação, um terreno que ela
possua e que não seja utilizado para nada, que não pretende utilizar para nenhuma finalidade especifica;
essa venda pode ser com o objetivo de privatização de uma empresa estatal.

Pode também o Estado exercer atividade econômica através de concessões minerárias; concessões
para a exploração do petróleo, ou a venda de radiofrequências para a televisão e telefonia. Há inúmeras
maneiras do Estado obter recursos que não sejam necessariamente através de um ato de coação, como
acontece com o tributo, pode ser através de um contrato, contrato próprio do direito administrativo, mas um
contrato que depende da participação da vontade daquele interessado. Por exemplo, você é um grande
empresário e quer entrar na área de telefonia, você precisa de uma concessão de radiofrequência. Para que
você possa utilizar essa radiofrequência, precisa participar de um processo licitatório, precisa oferecer um
preço para utilizar essa radiofrequência, e esse preço que vai ser cobrado pelo Estado para lhe conceder esse
direito é o que vai entrar nos cofres públicos como forma de arrecadação.

Então o Estado pode obter recursos através da exploração do seu próprio patrimônio, através da
exploração da sua propriedade, daqueles bens que o Estado possua e que não estejam utilizando para uma
atividade pública específica.

 A terceira forma que o Estado pode obter recursos é através do endividamento, contraindo dívidas.
Isso é, comprometendo os recursos futuros para obter disponibilidade no momento presente, uma vez
que as dívidas devem ser pagas no futuro.

Nenhum Estado hoje, a não ser que esteja em uma situação crítica, situação em que nenhum
investidor confia um centavo para emprestar para aquele país, tal como aconteceu com a Argentina no início
do século e com a Grécia recentemente, e como com países que estão em conflito, como a Síria. Salvo esses
casos excepcionais, em que o país não consegue empréstimos, nenhum país vive somente com aquilo que
arrecada dos tributos e da exploração do seu patrimônio, precisa também recorrer ao crédito público.

Quando se diz, por exemplo, que o déficit público esse ano vai ser de 124 bilhões de reais, quer dizer
que o Estado gasta mais do que ele arrecada. Evidentemente que se você é um trabalhador, e ganha 2 mil
reais por mês, mas gasta 2.500 reais, de onde você vai tirar esses 500 reais para pagar seus gastos? Se você
for a um banco e pedir um empréstimo, eles não vão te dar porque você tem uma renda muito pequena, a
não ser que você tenha uma grande propriedade, o que no caso é melhor vender essa propriedade do que
hipotecar ela para obter um empréstimo de 500, é melhor vender do que você arcar com os juros extorsivos
do banco.

Mas o que o Estado vai fazer? Ele vai se endividar. Se o Estado não está em uma situação crítica ele
não tem dificuldade nenhuma de obter, no mercado, pessoas que emprestem para ele para que ele possa
fechar essa conta que de outro modo não fecharia.
Então, quando o governo diz “a meta de déficit esse ano era de 134 bilhões”, mas ele obteve 10
bilhões com a privatização, e agora o déficit real é de 124 bilhões, o que isso significa? Significa que 124
bilhões foram tomados no mercado de empréstimos públicos, pessoas que entregaram seu dinheiro
voluntariamente ao Estado em troca de uma remuneração. Evidentemente essa remuneração vai ser tanto
maior quanto menor for a credibilidade que você tiver e que aquele Estado vai definitivamente lhe pagar.

O Brasil no momento, apesar de todo panorama adverso que foi mostrado, não se encontra numa
situação que não possa obter esses recursos. Embora o déficit tenha sido elevado e os juros sejam elevados
também, não há dificuldade em Temer conseguir 10 milhões, 20 milhões, lançando títulos públicos, que é
uma forma do Estado se endividar, que são cotas de empréstimos que distribui para a sociedade, as pessoas
compram para obterem a valorização, ou seja, os juros. Então o Brasil não tem dificuldades em obter esse
tipo de crédito. A situação é crítica quando o Estado precisa de empréstimo, mas ninguém o empresta,
situação idêntica a da Argentina, Venezuela, Grécia há alguns anos atrás.

 Gerir – planejar

Depois que o Estado obtém os recursos, ele precisa gerir os recursos. Evidentemente que esses
recursos públicos não podem ser geridos de forma indiscriminada, como fazem algumas prefeituras e
começam a gastar sem nenhum tipo de controle. A gestão do dinheiro público tem que ser feita através
de um planejamento, gerir e planejar, e isso é feito através do orçamento.

Uma grande diferença que existe entre o gasto público e o gasto dos particulares é que você, quando
recebe sua bolsa, por exemplo, pode gastar aquilo como você quiser, “ah hoje vou comprar um livro, 100
reais vou comprar um livro de direito financeiro, 100 reais vou pro fest verão, etc”, pode gastar da forma
como você achar mais necessário, mais conveniente. Mas com o dinheiro público não pode ser assim, todo o
gasto público já está planejado com antecedência, e ele tem que se enquadrar em uma das formas de gastos
que foram autorizadas por uma lei, que é a lei do orçamento.

A lei do orçamento é aprovada pelos representantes do povo, isto é, os representantes do povo que
vão dizer como o Estado vai gastar o orçamento, como o Estado vai gastar o dinheiro arrecadado, e isso eles
fazem aprovando uma lei chamada orçamento, que é outro tópico da nossa disciplina, a gestão e o
planejamento do dispêndio dos recursos que foram obtidos pelo Estado, que é feita através do orçamento.

 Despesa pública

A despesa pública deve ser feita de acordo com o orçamento . Existe uma série de restrições sobre
o que pode ser gasto, e a forma como isso pode ser gasto, as formalidades que tem que ser feita para que os
recurso públicos possam ser gastos.
Por exemplo, tenho uma cota de um milhão de reais para serviços de manutenção, mas eu não posso
toda vez que precisar de serviço de manutenção ir lá e pegar o dinheiro, tem que ser feito através de um
procedimento próprio que é o empenho (?) que vai ser estudado no capítulo da despesa pública.

Nós vamos ver também as formas de controle das despesas pública. Nos últimos anos, desde a lei de
responsabilidade fiscal, com a emenda constitucional 85, do teto dos gastos públicos, tem sido feito um
esforço, aqui no Brasil, para controlar o gasto público, a despesa pública. Porque muitas vezes acontecia que
a despesa pública excedia os créditos orçamentários, gastava-se mais do que efetivamente se arrecadou, e
isso ficava em restos a pagar no ano seguinte, e acontecia também de não ser pago no ano seguinte,
passando para o próximo governo, e o próximo governo não tem interesse nenhum em quitar débitos dos
governos anteriores, criando assim uma bola de neve, resultando no descontrole total na despesa pública.

Em outros casos a despesa com o pessoal, ou seja, com a admissão de servidores públicos crescia
tanto que não sobrava recurso para gastar com nenhuma outra finalidade pública, todo os recursos,
praticamente, eram gastos com despesas de pessoas. Então por isso surgiram, ao longo do tempo, formas de
controle de certos tipos de despesa, começando com a despesa de pessoa na lei de responsabilidade fiscal, e
culminando agora com o teto dos gastos públicos.

Então esse é o ciclo da atividade financeira do Estado, obter, gerir, planejar a realização da despesa
pública. Evidentemente falta para fechar esse ciclo um capítulo importante, que é o controle.

 Controle

Efetivamente não basta existirem leis que estabeleçam regras para a receita pública, a própria lei do
orçamentos e regras constitucionais e legais sobre o orçamento, as restrições a despesa pública, nada disso
valeria se não houvesse a possibilidade de controle, isto é, a responsabilidade do gestor do cumprimento
dessas normas seja aferida de e eventualmente responsabilizado aquele que descumprir com essas normas de
direito financeiro.

Então para isso temos o controle. Existem duas formas de controle, o controle interno, que é aquele
que é feito dentro da própria administração; e o controle externo, que é um controle feito fora da
administração, que visa justamente chamar a responsabilidade, efetivamente punir os administradores e
gestores do dinheiro público que desobedecem essas normas, que realizam gestões fiscais irresponsáveis.

Então esse na verdade é o conceito de direito financeiro, e também é o conceito da atividade


financeira do Estado. Qual é o objeto do direito financeiro? É a atividade financeira do Estado. E a atividade
financeira do Estado, o direito financeiro estuda sob a ótima jurídica, sob a ótica do dever ser da atividade
financeira do Estado, as relações entre os órgãos do Estado no exercício da atividade financeira, e as
relações entre os órgãos do Estado, particulares no desempenho dessa mesma atividade. Atividade que é
preordenada para um fim especifico, que é isso que caracteriza e distingue a atividade financeira do Estado
perante atividade financeira de qualquer particular, preordenada para realização das necessidades públicas.

E o que é atividade financeira do Estado? É o processo, é a atividade do Estado


através do qual ele obtém, cria, gerencia, realiza a despesa pública e, tudo isso,
submetido ao controle.

Como vimos, a atividade financeira do Estado consiste em obter, criar, gerir e despender os recursos
públicos necessários para a realização das necessidades públicas, cuja satisfação o Estado assumiu ou
atribuiu a outras pessoas de direito financeiro. Mais tarde vamos estudar as necessidades públicas e vamos
ver que elas variam ao longo do tempo.

Quem define quais são as necessidades públicas? Bem, começa com a Constituição. Quem diz o que
o Estado deve prover ou não é a constituição. Nem sempre, por exemplo, a previdência social foi uma
obrigação do Estado, no passado, cabia ao próprio cidadão formar o seu patrimônio para assegurar a sua
aposentadoria, a sua velhice descansada, sem a necessidade de trabalhar até o fim dos dias, se ele não tivesse
recursos para isso trabalhava até o fim dos dias, ou então recorria à caridade pública.

Outro exemplo é a saúde, que nem sempre foi considerada necessidade pública, no passado não
havia obrigação do Estado de fornecer saúde para população, oferecer tratamentos, medicamentos,
consultas. O cidadão buscava por sua conta própria, ou então mais uma vez socorria-as aos hospitais de
caridade, a obras assistenciais da igreja por exemplo. Hoje a saúde é considerada um dever do Estado.

Então quem define quais são as necessidades públicas é a Constituição Federal, e com base na
constituição outas leis que vão sempre guiando novas necessidades públicas. E o que significa criar uma
necessidade pública? Significa aumentar os gastos públicos.

CARACTERÍSTICAS DA ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

 Instrumental: A atividade financeira é instrumental porque não é um fim em si mesmo, o Estado não
quer apenas acumular dinheiro, apenas para ter o gosto de ir lá e contemplar, mergulhar no seu dinheiro,
em todo caso, essa não é a finalidade da atividade financeira do Estado.

O Estado não tem recursos para acumular ou para usar esses recursos em proveito de obter lucro, em
proveito dos próprios detentores do poder político. A atividade financeira é instrumental porque ela não é
um fim em si mesmo, mas um meio para a satisfação da necessidade pública.
Eventualmente um bilionário pode constituir um truste e uma fundação dedicada as artes, e que
exista por si só, e cuja finalidade seja somente manter-se como empresa até o fim dos tempos, então isso é
possível, que a finalidade privada seja apenas existir. Uma fundação que carregue o nome de um bilionário,
que tenha um conselho profissional segundo critérios que o bilionário colocou no seu testamento, e tem
como única finalidade da empresa existir até o final dos tempos. Mas o Estado não é assim, a existência da
atividade financeira do Estado não é só, é claro que o Estado subexistir, porque sem ele, se não houver
dinheiro para pagar os servidores públicos, para pagar o judiciário, para pagar o exército, a polícia, as
finalidades públicas não podem ser satisfeitas, mas a finalidade não é essa.

O Estado não existe para simplesmente manter servidores públicos. Como dito anteriormente, alguns
municípios viviam só para manter os servidores públicos, e até alguns Estados, e para fazer outras coisas,
como por exemplo a varrição das ruas, usavam recursos de outrem, da união federal, alguma forma ele fazia,
mas 100% da folha da arrecadação era gasto com a folha de pagamento.

Então, ora, o Estado não existe para manter a si mesmo, existe para satisfazer as necessidades
públicas. Se todo dinheiro do Estado é gasto só com pagamento de servidores públicos tem alguma coisa
muito errada no Estado. Não é uma coisa que exista por si só, a atividade financeira do Estado é
instrumental, tem que satisfazer as necessidades públicas, e as necessidades públicas não se resumem
somente a pagamento de funcionários públicos, o pagamento é importante para os funcionários públicos
porque eles que vão efetivamente desempenhar o trabalho da satisfação das necessidades públicas, o médico,
o juiz, o professor, mas essa não é a única finalidade do Estado, eles são remunerados para que essas pessoas
possam exercer atividades que satisfaçam as necessidades públicas.

 Poder-Dever: A atividade administrativa no geral é um poder-dever, existe a possibilidade de ação, mas


vem embutida uma obrigação junto a ela, e isso é latente na atividade financeira do Estado.

O prefeito, por exemplo, que recebe recursos e deixa parado comete uma improbidade administrava,
pode até chegar a ser processado por improbidade administrativa. Pegou os recursos, ficou com medo de
aplicar, tem muita corrupção, “não confio em ninguém, coloquei como secretário de finanças a minha
mulher, o secretário de educação o meu filho, mas eu não confio também neles, vou deixar os recursos
parado”, então ele comete um ato de gestão irresponsável, vai ser responsabilizado administrativamente e até
civilmente, porque essa não é a finalidade do Estado. A finalidade do Estado é aplicar os recursos em prol
do interesse comum, em prol da satisfação das necessidades públicas. O Estado tem o poder de agir, mas
também tem o dever de agir.

Em algumas ocasiões vai haver a discricionariedade, ou seja, o representante do Estado, o titular do


poder político, vai poder escolher dentre as possibilidades de ação aquela que é mais conveniente para a
satisfação das necessidades públicas, mas ele não pode se omitir e achar que age quando quiser. Por
exemplo, o fiscal não cobra tributo porque acha que a carga tributária é excessiva, o prefeito não gastar os
recursos recebidos porque tem medo de fazer alguma coisa errada e ser processado, isso não pode acontecer,
o Estado tem o poder de agir e o dever de agir sob pena até de responsabilidade funcional daqueles que se
omitirem.

 Extrafiscal: O que é extrafiscalidade? É um conceito que é muito usado quando você aplica isso a
arrecadação tributária, apesar de não se restringir a isso, mas vamos começar pela arrecadação tributária
para que se possa entender melhor a extrafiscalidade

Extrafiscalidade é a busca de objetivos que não sejam meramente fiscais na atividade financeira do
Estado, ou seja, o Estado busca recursos para a sua própria sobrevivência e para a prestação de serviços
públicos. Na medida que o Estado age buscando esses recursos, ele também pode, já nesse processo, ao
invés de esperar que os recursos venham para os cofres públicos e gastá-los, pode agir de forma a
condicionar a vida econômica e social da sociedade em direção a certos fins que ele considera desejáveis ou
que são considerados desejáveis segundo a Constituição e as leis.

Exemplo: pensando tributação do cigarro, se o objetivo do Estado fosse apenas arrecadar, ele
colocaria a tributação do cigarro naquele ponto máximo que a demanda importa, e assim arrecadaria mais.
Então, vamos supor que esse ponto ótimo da demanda fosse o cigarro custando dois reais, mais pessoas
comprariam, mais pessoas fumariam, o Estado arrecadaria mais e teria mais recursos, teria menos problemas
de contrabando, falsificação, etc, em resumo, ele teria mais recursos para gastar. Mas que se ele fizer isso, as
pessoas vão fumar, vai aumentar o número de fumantes, esses fumantes vão adoecer, e vão parar na rede
pública, no SUS, e vão dar despesas maiores para o Estado. Além, é claro, que o próprio fato que o cigarro é
um problema de saúde pública séria, desconsideração com a própria existência, a vida dos cidadãos. Se o
Estado quisesse arrecadar com o cigarro, ele tributaria, buscaria o ponto ótimo de demanda para poder fazer
a tributação e permitir que o consumo se mantivesse inalterado, porque o que as estatísticas provam é que
quanto mais alto é o preço, menos há mercado, então se tributar muito o cigarro, a arrecadação invés de
subir, vai cair. Portanto quando o Estado tributa o cigarro com taxas mais elevadas ele não quer arrecadar
mais, ele quer desestimular o uso do cigarro.

Então isso é extrafiscalidade, o Estado usa o tributo em si, ele não espera arrecadar para poder gastar
pra resolver o problema, no próprio momento da tributação ele vai já utilizando meio para condicionar, para
orientar a sociedade num determinado sentido. A mesma coisa acontece quando o Estado tributa menos, faz
uma tributação menor para as energias renováveis, por exemplo energia eólica ou solar, porque essa energia
ainda não tem ganho de escala, elas não podem competir com as energias que já se encontram instaladas,
como por exemplo a hidroelétrica, e por isso é muito mais barata, então ele tributa em valores menores para
estimular o uso desse tipo de energia. Essa é uma modalidade também para que o Estado obtenha recursos
para produzir um resultado favorável dentro da sociedade, estimular energia renovável em detrimento das
energias poluentes, que são mais baratas, mas não é apenas isso que o Estado pensa, tem preocupação
também com o bem estar dos cidadãos, com o meio ambiente, proteger a questão do aquecimento global,
etc. Então a tributação da energia renovável é menor do que a das energias não renováveis para estimular o
uso desse tipo de energia em detrimento dos combustíveis fósseis que causam poluição.

Então há diversas formas que o Estado pode agir, não só com subsídios, renuncias tributárias, há
inúmeros instrumentos pelos quais o Estado, durante o exercício da atividade financeira, pode utilizar para
condicionar a sociedade a certos objetivos, fazer com que a sociedade se oriente num determinado sentido,
que é considerado desejado, em detrimento de outro sentido que é considerado indesejado. Invés de buscar
sempre o mais barato, vai o Estado, através de incentivos, subsídios, reduções tributárias, incentivando a
agroecologia, os alimentos naturais, orgânicos. Há inúmeras formas que o Estado pode incentivar essas
economias que são desprivilegiadas frente ao grosso de outras atividades econômicas.

Se a atividade financeira do Estado fosse meramente fiscal, arrecadatória, ele não faria diferença
entre o cigarro, o uísque importado, o refrigerante e o suco natural, seria a mesma coisa, tributado do mesmo
jeito. Mas como o Estado diferencia isso, uísque importado do perfume francês, do cigarro com aditivo ou
não, e o suco natural, então ele vai orientando a atividade financeira para em prol daquilo que é mais
saudável, e muitas vezes isso implica numa redução da arrecadação, ou seja, a diminuição dos recursos
públicos, mas um benefício para a sociedade.

O objetivo extrafiscal se tornou mais acentuado no Estado moderno, ele vem acompanhando a
própria evolução da atividade financeira do Estado.

Existem dois tipos de respostas que o Estado pode dar diante de um problema econômico.
Basicamente, do século XIX para cá, a evolução das formas de lidar com um problema econômico tem
passado do Estado liberal para o Estado social.

No Estado liberal, a atividade financeira do Estado era mínima e o objetivo era meramente fiscal, era
arrecadar, a ideia da intervenção estatal era mínima, mas também as prestações que o Estado devia a
sociedade também eram mínimas. A atividade financeira do Estado limitava-se a manter o equilíbrio
econômico, ideia vitoriana de que você só pode gastar o que você arrecada. Já o Estado social, ele passou a
admitir um grande número de prestações que não eram garantidas pelo Estado liberal, o Estado liberal
contemplava com prestações apenas o básico, a justiça, a segurança, a liberdade individual, já o Estado
social passou uma gama de prestações que no Estado Liberal era consideradas obrigações, ou preocupações
do próprio individuo, e não do Estado. Passou a contemplar saúde, educação gratuita, básica, assistência
social, previdência social, ou seja, o Estado social precisou arrecadar mais recursos. Ao mesmo tempo que
ele precisou arrecadar mais, ser mais intervencionista, ele passou a usar mais a extrafiscalidade como forma
de alcançar esses objetivos de natureza social que o Estado liberal não previa.

Então a atividade financeira do Estado se expande no Estado social, e ela se torna também
mais extrafiscal. Enquanto que no Estado liberal o equilíbrio entre receita e despesa era praticamente
absoluto, o Estado social ele gasta mais, passa a não ver mais esse equilíbrio entre despesa e recurso de
maneira absoluta, passa a admitir um certo nível de endividamento, e também a utilizar a extrafiscalidade, os
instrumentos extrafiscais para produzir esses resultados sociais, que o estado liberal considerada que não
fossem obrigações do Estado, mas sim preocupações exclusivas do indivíduo.

“O direito financeiro recebe pouca atenção, normalmente toda atenção é dada ao direito tributário, do
ponto de vista das limitações constitucionais do poder de tributar, quase nada se fala da dívida pública, dos
planos, dos orçamentos, e dos direitos subjetivos criados pelos programas de governo”. José Reinaldo

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