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*O CASO DELL

Em novembro, o Banco SOFISA, uma instituição com sede em São Paulo, decidiu comprar novos
computadores e periféricos para ampliar o banco de dados dos clientes. O gerente de suporte e
produção do banco, seguiu a praxe e fez uma cotação de preços no mercado. Acrescentou apenas
uma novidade: incluiu entre os possíveis fornecedores a marca americana Dell, que estava
inaugurando naquele mês a sua fábrica brasileira. Dias depois, o Banco comunicou à Dell que ela
havia ganho a parada – uma encomenda de R$ 300.000 reais – contra revendedores de sua rival HP,
líder na venda de PCs no Brasil e no mundo. A decisão do Banco SOFISA foi motivada por preços
50% inferiores e condições de assistência muito melhores do que os concorrentes.
Com uma fábrica instalada em Eldorado do sul, na vizinhança de Porto Alegre e a segunda em
Jaguariuna – SP, a Dell reproduz aqui o modelo de negócio que tornou a segunda maior vendedora
de PCs do mundo, superando a IBM e a HP. No Brasil, a Dell entrou na disputa de um bolo
estimado em 1 bilhão de dólares por ano em servidores de rede, 600 milhões em PCs e mais de 100
milhões de dólares em estações de trabalho – sem contar as vendas da pirataria.
Fundada pelo texano Michael Dell há 15 anos, a empresa faturou 18 bilhões de dólares e
lucrou 1,5 bilhão no ano passado. A líder HP teve mais que o dobro de receita, mas seu lucro ficou
em 569 milhões de dólares. O esquema de crescimento rápido e com alta rentabilidade da Dell é
mais conhecido por sua proposta de vender exclusivamente sem intermediários, com o mínimo de
estoque e, de preferência, via Internet. Mas não se resume a isso. Outro ponto forte da empresa é a
estrutura de relacionamento com os clientes, principalmente as grandes organizações, responsáveis
por quase 70% de seu faturamento global. O fato de ter nascido com o conceito de só vender direto
ajuda. Fica mais fácil para a Dell ouvir o cliente e gerenciar a operação para satisfazer seus desejos.
Como isso se dá na prática? Em primeiro lugar, a filosofia da Dell é facilitar os negócios no
dia-a-dia. E mais: com o mínimo de recursos e no menor tempo. São princípios simples e óbvios,
mas poderosos. Tais premissas levaram o atendimento direto a evoluir para a criação de uma
extranet chamada de páginas preferenciais. Trata-se de uma ferramenta de comunicação online
individualizada. a Dell abre para cada cliente um site na Web com acesso protegido por
criptografia. A página oferece um pacote de serviços: algumas configurações predefinidas de
produtos, histórico de compras, rastreamento dos pedidos e assistência técnica básica. Por ela, é
possível comprar, a qualquer dia ou hora, sem precisar conversar com ninguém nem sequer
transmitir um e-mail.
O pedido feito aciona imediatamente a linha de produção da Dell, que só trabalha sob
encomenda – outra maneira de economizar. Além disso, as páginas estão conectadas aos
fornecedores de componentes. Eles também regulam sua produção pela demanda.
A Dell já criou mundialmente, nos últimos três anos, mais de 40 000 páginas preferenciais, em
21 idiomas e 42 países. Para grandes empresas, esses sites também funcionam como uma espécie de
conta corrente. Primeiramente, é acertado com a Dell um limite de crédito. Com isso, a empresa
pode descentralizar as decisões de compra. Sem fechar as comportas, as páginas permitem controlar
o fluxo: oferecem até três níveis de estratificação do acesso, segundo o grau hierárquico dos
funcionários. Isso significa distinguir entre quem pode apenas fazer consultas e os autorizados a
gastar online. Quando quer saber como o anda a situação, o executivo responsável pela área clica o
comando de status das encomendas. Esse recurso é usado 1,5 milhão de vezes por mês no sistema
da Dell. O número total de visitas aos sites é superior a 6 milhões por mês.
O sucesso dessa ferramenta rápida, simplificada e que dispensa papelada é atestado pela
participação de 70% nas vendas de 40 milhões de dólares por dia que a Dell faz globalmente pela
Internet. No Brasil a participação das páginas preferenciais nas vendas pela Web está na casa dos
23%. O restante dos negócios ocorre pela loja virtual da Dell. Tal índice, em apenas três meses de
operação, é considerado alto (a média da América Latina e da China foi de 10% nos primeiros
meses após o lançamento do serviço.
As páginas preferenciais servem também para que a empresa tenha uma estrutura de retaguarda
reduzida. O serviço de assistência técnica, por exemplo, é canalizado ao máximo para a Internet e o
telefone. Isso é possível graças ao sistema que começa na produção: cada equipamento, tem desde o
momento em que foi encomendado, uma espécie de carteira de identidade, um código com quatro
letras e dois números. Uma ficha com todas as suas características é armazenada no banco de dados
da Dell. Ela é mantida atualizada com um relógio de contagem regressiva do tempo de garantia e
histórico de ocorrências.
Quando um cliente tem dúvida na operação ou um problema técnico, dispõe de uma série de
respostas e orientações específicas para seu equipamento, identificado pelo RG, por meio da página
preferencial. Globalmente, a Dell contabiliza 175 000 downloads de fichas de produtos por semana.
Se precisar recorrer ao serviço de atendimento por telefone, o cliente menciona o código do
produto. A ficha é imediatamente chamada na tela do atendente, com isso resolve-se 70% dos casos
sem precisar mandar técnico ao cliente. Mesmo quando há necessidade de deslocar um técnico, ele
já chega mais preparado, por exemplo, levando exatamente os componentes daquele micro para
uma eventual reposição.
Para serviços técnicos no escritório do cliente, a Dell, por meio de um contrato com a Unisys,
promete o atendimento in loco até o dia seguinte ao da chamada. Nos próximos meses a Dell deverá
reduzir para 4 horas sua promessa de chegar com socorro técnico. Será mais um apelo para seduzir
especialmente empresas prestadoras de serviço e call centers.
Os pormenores para reduzir custos e ganhar tempo são completados pela Dell com um sistema
para administrar a fidelização dos clientes corporativos. Eles são classificados conforme sua
experiência como compradores da marca. Os segmentos (ou níveis) são basicamente três. Num
deles estão os clientes em fase de evangelização, os que estão começando a comprar e aprendendo a
utilizar a estrutura de atendimento.
Passada essa etapa, o cliente é reclassificado para o nível chamado de cross-selling, quando
estaria se interessando por outras linhas de produtos e serviços da Dell. O grau mais elevado é o de
relacionamento estratégico.
Com base nessa segmentação, a Dell distribui os recursos de sua força de vendas. Na central de
atendimento, todos com pelo menos nível universitário. Uma parte é constituída por técnicos, para
dar suporte à manutenção. Outra é a de vendas para pessoas físicas e pequenas empresas, que
trabalha reativamente, respondendo, a chamadas motivadas pela propaganda. e a terceira equipe é a
que atende a clientes corporativos e sai à caça de novos negócios. Esta é formada por profissionais
com média de cinco a sete anos de experiência na venda de produtos de informática. Quase todos
têm diploma de MBA.

* De Angelo, C et ali. Manual de Varejo no Brasil. São Paulo: Editora Saint Paul, 2012. (pp. 90 – 92).

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