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erturbação do Espetro do Autismo

Ainda uma pequena reflexão a propósito da Síndrome de


Asperger…
No DSM-IV (1), bem como no CID-10 (2), o diagnóstico de Autismo incluía, genericamente, três
grupos de manifestações, a saber: dificuldades na reciprocidade e interacção social;
dificuldades na linguagem; e comportamentos repetitivos, estereotipados e restritos. Nos
mesmos sistemas classificativos, a síndrome de Asperger, em homenagem ao insigne pediatra
austríaco Hans Asperger, apresentava, como critérios de inclusão, tão-somente e grosso modo,
dificuldades na reciprocidade e interacção social associadas a comportamentos repetitivos,
estereotipados e restritos, devendo ser convencionais a linguagem e a cognição; ou seja, por
outras palavras, estas funções neurodesenvolvimentais teriam de estar essencialmente
preservadas.
Com o DSM-5 (3), o diagnóstico de síndrome de Asperger é extinto e a nova entidade proposta
neste domínio nosológico toma a designação de Perturbação do Espectro do Autismo; e herda,
basicamente, os critérios de inclusão, ou seja, classificativos, da síndrome de Asperger. Se
forem detectados défices na área da linguagem, sem atingimento da cognição não-verbal,
deverão ser formulados os diagnósticos, em co-morbilidade, de Perturbação da Linguagem e
de Perturbação do Espectro do Autismo; se forem detectados défices na área da linguagem e
na área da cognição, deverão ser formulados os diagnósticos, em co-morbilidade, de
Perturbação de Desenvolvimento Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo ou
ainda, o que não é tão raro, de Perturbação de Desenvolvimento Intelectual, de Perturbação da
Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo, caso a linguagem apresente um défice
desproporcionalmente significativo (superior a 20%) relativamente à cognição não-verbal.
Idêntico entendimento, este de extinguir a síndrome de Asperger, parece ser o da comissão de
peritos da OMS, que, na versão Beta draft  do CID-11, a publicar em 2018, e actualmente em
consulta pública no sítio electrónico da Organização Mundial de Saúde, propõe, no momento
presente, no âmbito das Perturbações do Espectro do Autismo, as seguintes sub-categorias
nosológicas:
1. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e sem défice ou com ligeiro défice da linguagem funcional;
2. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e sem défice ou com ligeiro défice da linguagem funcional;
3. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e com défice da linguagem funcional;
4. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e com défice da linguagem funcional;
5. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e com ausência de linguagem funcional;
6. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento
Intelectual e com ausência de linguagem funcional;
A sub-categoria 1 corresponde à extinta síndrome de Asperger (CID-10 e DSM-IV) e à actual
Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5).

A sub-categoria 2 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento


Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);
A sub-categoria 3 corresponde à co-morbilidade de Perturbação da Linguagem e de
Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 4 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento


Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo, ou, se o défice linguístico for
desproporcionalmente significativo relativamente à cognição não-verbal, a uma co-morbilidade
de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual, de Perturbação da Linguagem e de
Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 5 corresponde à co-morbilidade de grave Perturbação da Linguagem e de


Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 6 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento


Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo, ou, se o défice linguístico for
desproporcionalmente significativo relativamente à cognição não-verbal, a uma co-morbilidade
de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual, de grave Perturbação da Linguagem e de
Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5).

Esta sub-categorização é, na sua essência, clinicamente compatível e comparável aos graus


de gravidade das Perturbações do Espectro do Autismo propostos no DSM-5; mas,
independentemente de ser, ou não, exequível formular os diagnósticos de algumas das sub-
categorias (por exemplo, a sub-categoria 5, a existir, será absolutamente excepcional, dada a
quase inevitabilidade de contaminação da cognição não-verbal pelo défice linguístico), esta
concepção representa um grande avanço epistemológico, com consequências assaz benéficas
em matéria de investigação e da clínica neurodesenvolvimental.

Em suma:

1. A extinção do diagnóstico de síndrome de Asperger, quer no DSM-5, quer no futuro


CID-11 (como resultado da análise dos elementos conhecidos no presente),
constitui um inequívoco avanço epistemológico;
2. A abordagem proposta provisoriamente no CID-11, sobretudo no que concerne à
metodologia de sub-categorização das Perturbações do Espectro do Autismo, de
um ponto de vista da clínica do neurodesenvolvimento e da teoria nosológica, faz
todo o sentido, é de uma grande utilidade e é compatível com a epistemologia
DSM-5.
Vejamos como irá evoluir o CID-11.

Bibliografia:

1. American Psychiatric Association (1994), “Asperger’s disorder”, in DSM – IV,


Lisboa: Climepsi Editores
2. ICD-10 10th revision of the International Statistical Classification of Diseases and
Related Health Problems (ICD), a medical classification list by the World Health
Organization (WHO)
3. American Psychiatric Association (2014) “Perturbações do Espectro do Autismo”, in
DSM – 5, Lisboa: Climepsi Editores, páginas 91-100
https://diferencas.net/?page_id=631

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