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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE LETRAS
COORDENAÇÃO ACADÊMICA DE ENSINO
ÁREA DE FILOLOGIA
DISCIPLINA: LETA23 INTRODÇÃO À LINGUÍSTICA ROMÂNICA
DISCENTE: GUILHERME LAVIGNE LINS SILVA

ROTEIRO PARA ATIVIDADE AVALIATIVA 2

Assuntos: mudanças fonéticas e fonológicas no latim falado e nas línguas românicas

Limites de tempo de realização e postagem:


Disponível no Moodle a partir das 13:00 de 01/11/2021
Resposta deverá ser postada até as 22:00 de 03/11/2021

Instruções:
1. As atividades deverão ser feitas individualmente ou em duplas.
2. A atividade vale 5,0 (cinco inteiros). Os valores de cada questão estão entre
parênteses. Atente para os valores. Responda somente as questões que estão com
valor.
3. Os enunciados introdutórios não se constituem questão, mas pistas para
direcionar o raciocínio sobre o que de fato se quer perguntar.
4. Os fenômenos que deverão ser analisados estão em destaque (negrito) e
transcritos em símbolos do alfabeto fonético internacional.

1. VOCALISMO LATINO/ROMANCE
1.1 Observe o quadro seguinte, relativo ao vocalismo românico tônico:

Vogais do latim standard ī ĭ ē ě ā ă ŏ ō ŭ ū


Vogais do sistema qualitativo itálico i e ε a ͻ o u

1.1.1 Em que consiste as mudanças no sistema do latim falado na maior parte do


Império Romano (1,0)?
Como é comum que os fonemas longos sejam mais fechados e que os abertos
sejam pronunciados maior abertura, o sistema passou a ser qualitativo ao invés de
quantitativo, porque a percepção do falante priorizou o grau de abertura como
traço fonológico e distintivo, resultando em sete vogais tônicas: i, e, ε, a, ɔ, o, u.
Esse sistema qualitativo recebe o nome de sistema qualitativo itálico.

1.1.2 Vejamos agora exemplos de outras mudanças linguísticas no latim e nas línguas
românicas em relação às vogais. Identifique o fenômeno representado nos exemplos
seguintes (0,5):
FĚLE [e], [e] > port., cat., prov. fel [ε] esp. hiel, fr. fiel, it. fiele [ye]
O primeiro -e breve (média-alta e fechado) do latim resulta em –ε (média-baixa e aberto)
no português, catalão e provençal. Já no espanhol, francês e italiano, línguas onde a
ditongação é recorrente, o -e breve ditonga mas mantém a vogal média-alta e fechada. O
segundo -e da palavra sofre apócope em todas, menos no italiano.
RŎTA [o] > port., cat., prov. rota [ͻ], esp. rueda [we], fr. arc. ruede [we], it. ruota [wo]
Em português, catalão e provençal, o -o breve (média-alta e fechado) resulta em -ͻ
(média-baixa e aberto). Já no espanhol e francês ditonga trocando o -o posterior por -e
anterior. No italiano, há ditongação, mas mantém a vogal posterior.
CAECUS [ay] > [ε] > it. cieco, ant. fr. cieu, esp. ciego [ye] prov., cat. cec, port. cego [ε]
Os ditongos latinos ae e oe já estão monotongados no latim vulgar do séc. I d. C.,
tornando-se ae > ɛ. No italiano, francês e espanhol a vogal latina -ɛ (média-baixa e
aberta) passa a -e (média-alta e fechado). Nas línguas que não ditongam, a média-baixa
aberta se mantém.
LĚPORE [o] > it. lepra, fr. lièvre, prov., port. lebre, cat. llebre, esp. liebre
A síncope de vogais postônicas (desaparecimento da vogal no meio da palavra) resulta
no desaparecimento da maior parte das proparoxítonas nas línguas românicas.

2. CONSONANTISMO LATINO/ROMANCE

2.1. Observe o quadro de consoantes latinas (adaptado de Väänänen, 1968, p. 90) para
identificar os fonemas existentes na língua latina standard. Do ponto de vista do modo
de articulação, na série de oclusivas orais há três pares mínimos de fonemas que se
opõem: p/b; t/d; k/g. Entretanto, na série das fricativas a situação não é a mesma.
Labiais Lábio- Dentais- Palatais Velares Laringais
velares alveolares
+ - + - + - + - + -
Oclusivas Orais b p d t g k
Nasais m n
Fricativas f w r s y h
(u) l (i)

2.1.1 O que se observa em relação aos fonemas fricativos no latim standard (0,25)
Faltava a sonora [v], que faria par com a surda [f]; a dental alveolar surda [s] também
carecia de seu par sonoro [z]. Não existia uma gama de fonemas que hoje estão presentes
nas línguas românicas, como a lateral palatal [λ], as fricativas palatais alveolares [ʃ] e [ʒ],
além da série de africadas [dz] e [dʒ], [ts] e [tʃ].

2.1.2 Observando o ponto de articulação, verificamos que há fonemas bilabiais, dentais


alveolares, velares. O que você observa na série de palatais? Cite exemplos de fonemas
palatais nas línguas românicas modernas (0,25)?
Existia apenas a semi-vogal y, que resultou em consoantes palatais. No período latino, a
semivogal confunde-se com a pronúncia do g diante de e e de i. Alguns fonemas que
vieram a surgir: ʒ, dʒ, tʃ e ʃ.

3. A palatalização consiste no deslocamento do ponto de produção do fonema latino


original através do palato, em razão de especificidades do ambiente fonético.
Normalmente, o ambiente fonético que favorece a palatalização é a vizinhança (sobretudo
na posição imediatamente posterior) de um fonema palatal, geralmente uma vogal
anterior (i ou e), mas pode ser também uma consoante lateral l.

3.1 Identifique dois fenômenos de palatalização de fonemas em posição inicial e medial,


no latim falado, um para cada entorno (vizinhança) citados a seguir. Explique em que
consiste a mudança (1,0).

CĚNTUM [k] > it. cento [tʃ], fr. cent [s], prov. cen [s], cat. cent [s], esp. ciento [θ], port.
cento [s]
Oclusiva velar latina k em posição inicial diante de vogais anteriores palataliza-se. No
italiano, passa como africada e nas demais como fricativas.
FACĚRE [k]> rom. face [ts], it. fare, fr., prov. faire, cat. fer, esp. hacer [θ], port. fazer
[z]
Oclusiva velar latina k em posição medial diante de vogais anteriores palataliza-se no
romeno, espanhol e português. Nas demais, há síncope.
GĒLU > rom. ger [dZ], it. gelo [dZ], fr. arc. gel [Z], prov. gel [Z], esp. hielo, port. gelo [Z]
Oclusiva velar latina k em posição inicial diante de vogais anteriores palataliza-se. No
italiano e romeno passa como africada e em francês, provençal e português como
fricativas. No espanhol, o g passa regularmente a ie, dando gie, que se reduz a ie.
COAG(U)LU [gl] > it. caglio [λ], prov. calh [λ], cat. call [λ], port. coalho [λ]
Na posição medial, os grupos consoante + l tendem à palatalização. Ocorre síncope da
pós-tônica.
PLĒNUS [pl]> it. pieno [py], fr. plein, prov., cat. ple [pl], esp. lleno [λ], port. cheio [ʃ]
Na posição inicial, os grupos consoante + l no francês, catalão e provençal se mantêm.
No italiano houve vocalização da consoante L, e no espanhol e português palatalizam.

4. A lei do menor esforço, ou a economia, como denominou Martinet, é responsável pelo


enfraquecimento ou mesmo o apagamento dos fonemas ao longo da história de uma
língua. O falante economiza esforço articulatório e, consequentemente, enfraquece ou
apaga o fonema. A posição medial é a mais suscetível aos fenômenos de lenição
(abrandamento) e apagamento dos fonemas.
Veja-se o exemplo seguinte: lat. VITA > it. vita; > port. vida; fr. vie
No latim a palavra vita (vida) tinha um fonema medial oclusivo dental alveolar
surdo t, que foi mantido no italiano, mas em português o t sonorizou-se em d, resultando
em vida (d é oclusivo dental alveolar sonoro). Os fonemas sonoros são menos
proeminentes que os surdos, pois a corrente de ar debilita-se ao fazer soar as cordas
vocais. Agora observe que o francês apagou completamente o fonema consonântico
medial resultando numa palavra monossilábica vie. Ou seja, o processo de lenição do
fonema intervocálico t em francês atingiu o grau máximo, resultando em apagamento
total.

4.1 Identifique nos exemplos seguintes os fenômenos de lenição exemplificados e


destacados. Explique-os (1,0).
ABBATIA [b:] > fr. abbaye [b], esp., cat., prov., port. abadia [b]
Ocorre simplificação das geminadas, onde “bb” passa a “b” na fala,
e na escrita apenas o francês mantém.
APRĪLIS [p] > it. aprile [p], fr. avril [v], prov., cat., esp. port. abril [b]
No francês, o “p” inicialmente sonoriza, e depois torna-se a
fricativa labiodental sonora “v” e ocorre sonorização da oclusiva
surda “p” em “b” nas demais. As geminadas foram mantidas apenas
no italiano, no sardo e em dialetos do sul da Itália.
CADĚRE [d] > ro. cădea [d], it. cadere [d], fr. cheoir, cat. cáurer, esp. caer, port.
caer > cair
Exceto no italiano e no romeno, ocorre síncope da consoante “d”.
CABĂLLĬCĀRE [b], [k] > it. cavalcare [v], [k], prov., cat., port. cavalgar ,[v], [g] esp.
cabalgar [β], [g]
Ocorre processo de fricatização da sonora “b” que passa a “v” e a “β” no espanhol, e
sonorização da oclusiva surda intervocálica “k” que passa a “g”, exceto no italiano,
que está abaixo da isoglossa La Spezzia – Rimini, que divide fenômenos linguísticos.

5. Os fenômenos exemplificados a seguir são muito comuns em várias regiões da


România e ocorrem em muitas palavras da norma padrão das línguas românicas,
entretanto, nas variantes do português brasileiro são estigmatizadas, porque são
associadas a desvios de falantes de baixa escolaridade ou de regiões periféricas.
Identifique os fenômenos demonstrados e dê exemplos de DOIS deles no português
brasileiro (1,0).

VĚRRŪCA [w] > [v] > it. verruca [v], sard. camp. berruga [b], prov. cat. verruga [v],
esp. verruga [β]
Betacismo (troca do “v” por “b” ou “β”) no sardo, no espanhol e no italiano.
No português coloquial há utilização das variantes “brabo” (bravo) e “bassoura”
(vassoura).
PLANCTUS > it. pianto [py], sard. log. prantu [pr], ant. fr. plaint [pl], prov. planh [pl],
cat. plant [pl], esp. llanto [λ], port. ant. chanto [tʃ], port. mod. pranto [r],
Rotacismo (troca do “l” por “r”) no sardo e no português.
No português coloquial há utilização das variantes “praca” (placa) e “bicicreta”
(bicicleta).
ALTER > it. altro, fr. autre, esp. otro, port. Outro
Metátase (troca de lugar dos fonemas) em todas as línguas acima.
No português, há utilização das variantes “tauba” (tábua) e “drobar” (dobrar).

Bom trabalho!
Risonete

Sugestões de consulta bibliográfica:


Utilize os esquemas disponibilizados no Moodle.
Consulte os textos de Lausberg – vocalismo e consonantismo

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