Você está na página 1de 7

UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS

Virgílio José Matos Emídio

DIREITO DAS SUCESSÕES - REVOGAÇÃO E ROMPIMENTO DO


TESTAMENTO

Barbacena - MG
Dezembro/2021
INTRODUÇÃO

O testamento é a prova de que a autonomia da vontade deve ser


respeitada mesmo após a morte. Segundo Maria Berenice Dias (2019, p. 475),
trata-se de um “ato de última vontade para significar ser a derradeira decisão
de uma pessoa sobre bens ou assuntos de seu interesse”. Qualquer pessoa
capaz pode testar, inclusive os maiores de 16 anos, podendo dispor de parte
ou da totalidade dos seus bens, acaso não existam herdeiros necessários,
ocasião em que a liberalidade poderá atingir apenas 50% do patrimônio.

Importante ressaltar que o testamento poderá ter caráter patrimonial ou


não, sendo perfeitamente possível, por exemplo, a nomeação de tutor ou
curador por meio dele.

Trata-se de um negócio jurídico essencialmente formal e solene,


personalíssimo, unilateral, revogável, unipessoal, gratuito, imprescritível e com
efeito causa mortis, sujeito a condição suspensiva, eis que sua eficácia
dependerá de evento futuro e certo, que é a morte do testador, durante sua
vida o que existe é apenas a expectativa.
REVOGAÇÃO E ROMPIMENTO DO TESTAMENTO

I - Revogação

O instituto é tratado pelo Código Civil, nos art. 1.969 a 1.972. A


expressão “revogação” traduz a ideia de “extinguir um negócio jurídico,
privando a produção de efeitos pela simples declaração volitiva do titular,
independentemente de oposição de quem quer que seja” (FARIAS E
ROSENVALD, 2017, p. 510), sendo fruto da discricionariedade do titular do
patrimônio, que é tratada no Direito como autonomia privada. Insta dizer que a
lei não estabelece ocasiões em que o testador poderá revogar o testamento,
nem mesmo exige a existência de justo motivo para a realização deste ato,
podendo assim fazê-lo conforme sua livre vontade, quer seja por
arrependimento, simples desistência, dentre outros. E, ainda, prescinde da
ciência ou concordância do beneficiário/legatário.

Consoante abalizado magistério de Maria Berenice Dias (2019, p. 477)


“o testamento torna-se perfeito e acabado no momento da declaração de
vontade e irrevogável quando da abertura da sucessão”, tornando-se definitivo.
Sendo assim, o testamento poderá ser revogado a qualquer tempo pelo
testador, total ou parcialmente, sem a necessidade de se elaborar outro em
substituição, porém apenas em relação às disposições patrimoniais. As
disposições não patrimoniais, como por exemplo nomeação de tutor e curador,
reconhecimento de filho, dentre outras, continuarão sendo válidas ainda que
haja a revogação, eis que trata de disposições irretratáveis.

Avulta notar que, em se tratando de revogação parcial, "ou se o


testamento posterior não contiver cláusula revogatória expressa, o anterior
subsiste em tudo que não for contrário ao posterior", conforme o parágrafo
único do art. 1.970 do Código Civil. Os ilustres doutrinadores Nelson Rosenvald
e Cristiano Chaves de Farias, explicam:

se a revogação é total, a transmissão hereditária restará submetida


às regras da sucessão legítima, uma vez que a vontade declarada
sofreu cessação de eficácia; se parcial a revogação, incidem,
simultaneamente, as regras da sucessão legítima e testamentária,
respeitada a legítima, se for o caso.
A legislação permite que coexistam vários testamentos, desde que um
não contrarie o outro. Se isso acontecer, ocorrerá a revogação tácita e será
válido o testamento realizado em data mais recente. Entretanto, “a revogação
do testamento revogador, ou a sua eventual caducidade, não restabelece os
efeitos do testamento revogado”.

É sabido que a vontade do testador pode mudar várias vezes até a sua
morte, contudo ele não poderá se vincular a não revogar o testamento e o
codicilo, razão pela qual serão nulas quaisquer cláusulas que estabeleçam a
irrevogabilidade e que sejam pré-excludentes de futuros testamentos, uma vez
que afrontam uma das principais características do testamento: sua
revogabilidade.

Caso o testamento seja particular ou cerrado, basta que o mesmo seja


rasgado para se levar a efeito a revogação. Não obstante, “o testamento
cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for aberto ou dilacerado com seu
consentimento, haver-se-á como revogado” (art. 1.972 do Código Civil), sendo
imprescindível que o agente esteja em gozo de suas faculdades mentais.

Embora o art. 1.969 do diploma civilista preveja que o testamento pode


ser revogado pelo mesmo modo e forma como pode ser feito, devemos fazer
uma interpretação extensiva e flexível do assunto, porquanto, à guisa de
exemplo, não seria razoável exigir que o testador volte a uma situação de
guerra ou praça sitiada para revogar um testamento militar. Nessa mesma linha
de intelecção, admite-se, portanto, que um testamento público seja revogado
por um cerrado e vice-versa, necessitando apenas que o documento seja
elaborado em consonância com as formalidades legais.

Ressalta-se que a revogação produzirá seus efeitos, ainda quando o


testamento, que a encerra, vier a caducar por exclusão, incapacidade ou
renúncia do herdeiro nele nomeado; não valerá, se o testamento revogatório for
anulado por omissão ou infração de solenidades essenciais ou por vícios
intrínsecos (art. 1971 do Código Civil).
II - Rompimento

Previsto nos art. 1.973 a 1.975 do Código Civil, em que pese muitos
doutrinadores considerarem o instituto como uma revogação tácita, é
importante salientar que, na verdade, trata-se de caducidade.
O testamento será rompido, em todas as suas disposições, quando
sobrevier descendente sucessível ao testador, que não o tinha ou não o
conhecia quando testou (art. 1.973), capaz de alterar a sua vontade, ou se o
ato de última vontade tiver sido realizado na ignorância de existirem outros
herdeiros necessários (art. 1.974). Contudo, se o instrumento respeitar o limite
da legítima, qual seja, 50% de seu patrimônio, não haverá a
ruptura/rompimento, conforme aduzido no art. 1.975.
A justificativa é simples: se o testador tivesse conhecimento do herdeiro
quando da confecção do testamento, respeitaria o limite legal da legítima, de
forma a não privá-lo do benefício sucessório. Mesmo porque, havendo
herdeiros necessários conhecidos, se o testador dispusesse de mais de 50%
de seu patrimônio, haveria a nulidade da parte excedente e não o rompimento
do testamento.
Destaca-se que o testamento só será rompido por superveniência de
descendente se o autor da herança já não tivesse nenhum herdeiro dessa
classe.
Rosenvald (2017) esclarece sobre a possibilidade do testador fazer
constar da cédula testamentária a previsão expressa de que a superveniência
de herdeiro necessário não implicaria ruptura da declaração de vontade, sob a
justificativa da autonomia privada.
O rompimento do testamento deverá ocorrer nos próprios autos do
inventário, ante a natureza de juízo universal e poderá ser requerido de ofício,
por interessado ou pelo MP, se existir menor ou incapaz, não reclamando alta
dilação probatória.
CONCLUSÃO

Após uma análise sistemática e extensiva do presente trabalho, pode-se


concluir que, em que pese entendimentos doutrinários contrário, rompimento e
revogação de testamento não significam a mesma coisa. Aquele ocorrerá tão
somente nas hipóteses previstas pela legislação civilista (superveniência de
descendente sucessível desconhecido ou herdeiro necessário ignorado).
Enquanto este último não necessita de motivação, não tendo a lei estabelecido
hipóteses para o seu cabimento, podendo, portanto, ser realizado com
discricionariedade, pautado pela autonomia privada. Tal estudo exerce,
portanto, pequena contribuição bibliográfica e reflexiva, necessitando, porém,
de outras pesquisas e trabalhos no mesmo sentido, desenvolvendo, de forma
mais detalhada, as diversas acepções encontradas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 6. ed. rev., ampl. e atual. Ed.
JusPodivm, 2019;
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil:
Sucessões. 3. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2017;
Júnior, João Paulo Meneia Arroyo. Do rompimento do testamento. JusBrasil.
Disponível em: < https://jpmaj.jusbrasil.com.br/artigos/152848076/do-
rompimento-do-testamento>. Acesso em: 02 de dez. 2021.

Você também pode gostar