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DIREITO DAS SUCESSÕES

Professor David Accioly de Carvalho

1 ASPECTOS GERAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

§ 1. Intróito

* “As relações jurídicas modificam-se, permanecendo inalteradas em sua identidade. A


modificação pode ser subjetiva ou objetiva. A mudança do sujeito na posição ativa ou passiva
da relação toma o nome técnico de sucessão”. (ORLANDO GOMES).

* Etimologia da expressão sucessão: successio, succedere.

- Acepção geral da expressão sucessão: Transmissão; substituição;


- Acepção jurídica da expressão sucessão: tomar o lugar de outrem em dada relação
jurídica. Ocorre quando uma pessoa fica investida em um direito, obrigação ou conjuntos
deles, antes pertencentes a outra pessoa.

* Em direito, a sucessão dá-se: (i) por ato inter vivos, ou seja, em decorrência da vontade de
dois ou mais sujeitos [é o que ocorre numa cessão contratual, numa sucessão trabalhista,
ou mesmo em uma sucessão empresarial]; ou (ii) causa mortis, hipótese que independe da
vontade dos sujeitos, por decorrer do fato jurídico morte.

* Para o Direito das Sucessões importa a sucessão causa mortis.

§ 2. Direito das Sucessões: Objeto de estudo

* “[...] em sentido objetivo, é o conjunto das normas reguladoras da transmissão dos bens e
obrigações de um indivíduo em consequência de sua morte. No sentido subjetivo, mais
propriamente se diria direito de suceder, isto é, de receber o acervo hereditário de um
defunto”. (CARLOS MAXIMILIANO).

* “Direito das Sucessões é a parte especial do Direito Civil que regula a destinação do
patrimônio de uma pessoa depois de sua morte. [...] Disciplina, concisamente falando, os
efeitos da morte de uma pessoa natural, na área do Direito Privado”. (ORLANDO GOMES).

* “Direito hereditário, ou das sucessões, é o complexo dos princípios segundo os quais se


realiza a transmissão do patrimônio de alguém que deixa de existir”. (CLÓVIS BEVILÁQUA).

§ 3. Fundamento ideológico da sucessão causa mortis

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* Para BEVILÁQUA, o que fundamenta a sucessão é “a continuidade da vida na humanidade,
através da cadeia não interrompida das gerações, que se sucedem mediante a renovação
dos elementos de que ela se compõe”.

* Segundo WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO: “Propriedade que se extinga com a morte


do respectivo titular e não se transmita a um sucessor não é propriedade, porém mero
usufruto. Como ensina Demolombe, a propriedade não existiria se não fosse perpétua e a
perpetuidade do domínio descansa precisamente na sua transmissibilidade post mortem”.

* “A sucessão mortis causa encontra sua justificação, conforme acentua Degni, nos mesmos
princípios que explicam e justificam o direito de propriedade individual, do qual é a
expressão mais enérgica e a extrema, direta e lógica consequência. Esse, o seu fundamento
racional”. (ORLANDO GOMES).

* Para FRANCISCO CAHALI, não há como se negar a relevante função social desempenhada
pela possibilidade de transmissão causa mortis, pois valoriza a propriedade e o interesse
individual na formação e avanço patrimonial, estimulando a poupança e o desempenho
pessoal no progresso econômico, fatos que, direta ou indiretamente, propulsionam o
desenvolvimento da própria sociedade.

§ 4. Oposição ideológica

* Para MONTESQUIEU e AUGUSTO COMTE o direito hereditário não teria fundamento ou seria
imoral, pois os filhos não deveriam esperar dos pais quaisquer bens além do necessário para
dar início à sua carreira profissional.

* No mesmo sentido STUART MILL opõe-se tenazmente à sucessão intestada, principalmente


quando esta vai beneficiar parentes colaterais. (BEVILÁQUA, Clóvis. Direito..., 1983, p. 14-
15).

* LASSALE combateu-o, por se apoiar em duas ideias anacrônicas: a) a de continuação da


vontade do defunto e b) a da compropriedade aristocrática da família romana; [...] Outros
sustentam, com apoio em Saint Simon, que o Estado deveria ser o herdeiro universal das
fortunas privadas, obtendo-se, desse modo, sem violência, sua transferência ao domínio
público. MENGER preconiza a proibição de se transmitirem, mortis causa, os bens de
produção, admitindo, entretanto, o direito de disposição dos bens de consumo. (ORLANDO
GOMES).

§ 5. Fundamento constitucional da sucessão hereditária

* CF 5º, XXX – é garantido o direito de herança;


* CF 5º, XXII – é garantido o direito de propriedade.

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§ 6. Sucessão causa mortis

* Caracteriza-se por ser translativa. Assim, a sucessão hereditária implica definitiva


transferência dos direitos do autor da herança aos sucessores, que os adquirem na medida
em que aquele os perdeu.

* A sucessão causa mortis pode ocorrer: (i) a título universal; e (ii) a título singular.

* Diferentemente da sucessão causa mortis, a sucessão por ato inter vivos [que se dá em
decorrência da vontade de dois ou mais sujeitos e não é objeto de estudo do Direito das
Sucessões], necessariamente, dá-se a título singular.

* Logo, temos que: “Em nosso Direito, a sucessão a título universal somente se admite mortis
causa”. (ORLANDO GOMES).

* Vejamos a classificação ora proposta:

(i) A título universal. Sucessio in universum jus:

- Dá-se sempre que o sucessor “recolhe a totalidade dos bens da herança ou uma
fração aritmética da universalidade”. (ORLANDO GOMES).

- Induz a sub-rogação abstrata na totalidade dos direitos ou em fração ideal deles.

- “Denomina-se herdeiro aquele que sucede a título universal”. (ORLANDO GOMES).

§ Nota: Há autores que admitem a utilização da expressão herdeiro em sentido lato,


abrangendo tanto os que sucedem a título universal como a título singular. Nesse
sentido, ROBERTO SENISE LISBOA, segundo o qual: “Herdeiro é o sujeito que
sucede a título universal ou singular”. Contudo, sugerimos não adotar esse
posicionamento, pois aquele que herda a título singular é especificado como
legatário, conforme será abordado adiante.

- Ressalvada a observação acima, temos que, em sentido estrito: Herdeiro é


destinatário de herança, assim compreendidos “[...] todos os direitos que não se
extinguem com a morte. Excluem-se os que não se concebem desligados da pessoa,
como os direitos de personalidade. Integram-na bens móveis e imóveis, direitos e
ações, obrigações. Abrange também coisas futuras”. (ORLANDO GOMES).

(ii) A título singular: “Quando o sucessor recebe bens determinados, certa generalidade de
coisas, ou uma quota concreta de bens. [...] deriva unicamente de testamento,
limitando-se a objeto determinado que pode compreender um conjunto de bens,

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contanto que não formem unidade na qual percam sua individualidade – singularum
rerum”. (ORLANDO GOMES).

§ Nota. Afirmou-se que a sucessão a título singular ocorre tão somente na sucessão
testamentária. Contudo, a sucessão testamentária admite, igualmente, a
sucessão a título universal. Seria o caso de o testador atribuir uma fração ideal de
sua herança a determinada pessoa, instituindo-a, assim, como sua herdeira
testamentária, conforme será explicado oportunamente.

- “A sucessão a título singular induz sub-rogação concreta do novo sujeito em


determinada relação de direito”. (CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA).

- Denomina-se legatário aquele que sucede a título singular;

- “Legatário é destinatário de legado, isto é, o bem, ou o conjunto de bens certos e


determinados, integrantes da herança, deixado pelo testador para alguém”.
(ORLANDO GOMES).

§ Nota: “A distinção entre herdeiro e legatário tem importância prática em razão


das consequências ligadas a essas posições. O legatário precisa pedir ao herdeiro
a entrega da coisa legada e não responde pelas dívidas da herança. É, numa
palavra, sucessor a título singular”. (ORLANDO GOMES).

* A sucessão causa mortis é deferida por lei ou testamento. Nesse sentido, art. 1.786 do CCB:
“A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade”.

* É nulo, portanto, o ato bilateral pelo qual dispõe alguém de sua própria sucessão, ou dos
direitos que lhe possam vir a caber em sucessão ainda não aberta. A proibição é absoluta,
apanhando todo e qualquer negócio bilateral, inclusive os pactos antenupciais. A razão
principal da proibição reside no interesse de evitar que a pessoa se prive do direito de
regular livremente a própria sucessão, ainda autolimitando a vontade, porque deve esta
estar livre até o momento da morte. (ORLANDO GOMES).

* Portanto: “Nosso Direito não admite outros títulos de vocação sucessória. São proibidos os
pactos sucessórios. Nulo de pleno direito é o contrato sobre herança de pessoa viva[1].
Permitida não é, entre nós, a renúncia à sucessão que ainda não se abriu. Nem qualquer ato
de disposição de herança esperada. Em suma, ilícita a sucessão contratual. Na proibição, a
disposição, em contrato social, para que a sociedade continue com determinado filho do
sócio”. (ORLANDO GOMES).

* Vejamos, pois, essa segunda classificação:

1 CCB 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.

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(i) Sucessão legal, legítima, ab instestato:

- “Dá-se quando seu autor não haja disposto validamente, no todo ou em parte, de
seus bens, por testamento”. (ORLANDO GOMES).
- “Verifica-se necessariamente, em parte, quando há herdeiros aos quais destine a lei
determinada porção da herança”. (ORLANDO GOMES). Refere-se, aqui, aos
denominados herdeiros necessários.
- Dá-se, ainda, quando o testamento caducar, ou for julgado nulo, nas hipóteses de
nulidade absoluta, nos termos do art. 1.788 do CCB, verbis:

Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros
legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no
testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado
nulo.[2]

- “Dá-se sempre a título universal”. (ORLANDO GOMES).


- Logo, “o sucessor é necessariamente herdeiro”. (ORLANDO GOMES).
- O herdeiro é denominado legítimo, por integrar um rol legal, previsto no art. 1.829
do CCB;

(ii) Sucessão testamentária: Deriva de ato de última vontade [ordinariamente de


testamento] praticado pela forma e nas condições estabelecidas na lei.

- Pela sucessão testamentária instituem-se herdeiros ou legatários, isto é, sucessores


a título universal ou particular. Concede a lei ao testador o direito de chamar à sua
sucessão, na totalidade ou em parte da alíquota do seu patrimônio, quem institua na
condição de herdeiro. (ORLANDO GOMES).
- “Dá-se a título universal ou singular. Desse modo, na sucessão testamentária, pode
haver herdeiro [em sentido estrito] ou legatário, sucedendo, nesta última
hipótese, a título singular”. (ORLANDO GOMES).
- O testamento, negócio jurídico unilateral não receptício, será estudado em um
tópico específico do curso.

§ 7. Diferentes sistemas de sucessão hereditária

* No mundo há basicamente três possíveis sistemas de sucessão hereditária. São eles:

2 Nesse ponto, deve-se registrar que a doutrina faz uma crítica a esse dispositivo, pelo fato de não prever a
subsistência da sucessão legítima, na hipótese de anulação do testamento em virtude do reconhecimento de
nulidades relativas. Faço, contudo, uma poderação.

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(i) Concentração obrigatória: “Defere-se a determinada pessoa, de ordinário o filho
primogênito, com exclusão dos outros membros da família. A finalidade é impedir o
fracionamento do acervo hereditário”. (ORLANDO GOMES).

(ii) Divisão necessária: “O espólio partilha-se entre todos os filhos do autor da herança, ou
entre os parentes mais próximos. Havendo descendentes, parte dos bens destina-se a
eles obrigatoriamente, no pressuposto de que lhes pertencem de pleno direito. Não
havendo, ainda assim se divide a herança entre os herdeiros sucessíveis, se não tiver a
partilha de obedecer a outro critério estabelecido em testamento. [...] jamais
compreende todo o patrimônio. Aplica-se apenas a uma parte, geralmente a metade”.
(ORLANDO GOMES). É o modelo adotado no Brasil.

(iii) Liberdade testamentária: “Não há herdeiros necessários entre os quais deva ser
partilhada a herança, de sorte que seu autor pode decidir livremente o destino dos
bens”. (ORLANDO GOMES).

§ 8. Elementos gerais da relação jurídica hereditária

* Sujeitos: Indivíduos envolvidos na relação:

a) Sujeito ativo da sucessão: Considerado o autor da herança; o inventariado [na


linguagem processual]; igualmente denominado de de cujus em razão das expressões
de cujus hereditatis agitur ou de cuius successione agitur.

b) Sujeito passivo da sucessão: Aqueles que sucedem o morto.

(i) Herdeiro legítimo: É sucessor a título universal instituído por lei. Destaque-se que
a classe dos herdeiros legítimos é gênero da qual são espécies os herdeiros
necessários ou reservatários – aos quais a lei reserva metade dos bens da herança,
assim compreendida a legítima – e os herdeiros facultativos (conforme definidos
no CCB). No caso de herdeiros necessários, fala-se em sucessão legitimária. Já no
caso dos demais herdeiros, fala-se em sucessão legítima facultativa ou simplesmente
sucessão legítima.

Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da


metade da herança.

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o


cônjuge.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade


dos bens da herança, constituindo a legítima.

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Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na abertura
da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral, adicionando-se, em
seguida, o valor dos bens sujeitos a colação.

JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA

RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. BENS À COLAÇÃO. VALOR DOS BENS


DOADOS. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA ABERTURA DA SUCESSÃO.
APLICAÇÃO DA REGRA DO ART. 2.004 DO CC/2002. VALOR ATRIBUÍDO NO
ATO DE LIBERALIDADE COM CORREÇÃO MONETÁRIA ATÉ A DATA DA
SUCESSÃO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Tendo sido aberta a sucessão na vigência do Código Civil de 2002, deve-se
observar o critério estabelecido no art. 2.004 do referido diploma, que
modificou o art. 1.014, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973,
pois a contradição presente nos diplomas legais, quanto ao valor dos bens
doados a serem trazidos à colação, deve ser solucionada com observância do
princípio de direito intertemporal tempus regit actum.
2. O valor de colação dos bens deverá ser aquele atribuído ao tempo da
liberalidade, corrigido monetariamente até a data da abertura da sucessão.
3. Existindo divergência quanto ao valor atribuído aos bens no ato de
liberalidade, poderá o julgador determinar a avaliação por perícia técnica
para aferir o valor que efetivamente possuíam à época da doação.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1166568/SP, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES – DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO – QUARTA TURMA, julgado em 12/12/2017,
DJe 15/12/2017)

Ocorre que esse julgado trata de demanda promovida antes da entrada em


vigor do novo CPC e, por isso, não se aplica àquelas inauguradas após o novel
diploma que, como se verá, restabeleceu a regra consagrada pelo CPC/73,
definindo que:

Art. 639. No prazo estabelecido no art. 627, o herdeiro obrigado à colação


conferirá por termo nos autos ou por petição à qual o termo se reportará os
bens que recebeu ou, se já não os possuir, trar-lhes-á o valor.

Parágrafo único. Os bens a serem conferidos na partilha, assim como as


acessões e as benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que
tiverem ao tempo da abertura da sucessão.

(ii) Herdeiro testamentário: É sucessor a título universal instituído por testamento,


sendo destinatário de um percentual ou fração da herança (CCB 1.857).

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(iii) Legatário: É sucessor a título singular, instituído em testamento. A ele é destinado
um bem ou direito específico, conforme já abordado anteriormente. A ele são
destinados bens determinados, certa generalidade de coisas, ou uma quota
concreta de bens [...], contanto que não formem unidade na qual percam sua
individualidade. (ORLANDO GOMES).

Nota: Um mesmo sujeito pode ser, a um só tempo, herdeiro testamentário e


legatário. A esse respeito, merece ser destacada a regra do CCB que prevê a
possibilidade de o sujeito ser a um só tempo herdeiro e legatário:

Art. 1.808. Caput.


§ 1º. O herdeiro, a quem se testarem legados, pode aceitá-los,
renunciando a herança; ou, aceitando-a, repudiá-los.

Art. 1.849. O herdeiro necessário, a quem o testador deixar a sua parte


disponível, ou algum legado, não perderá o direito à legítima.

Nota: Assim “[...] havendo prelegado, isto é, legado deferido a um herdeiro, este
pode aceitá-lo e recusar a herança, ou aceitar esta e repudiar o legado, já que não
se confundem os dois títulos sucessórios [...]”. (LUIZ PAULO VIEIRA DE
CARVALHO).

* Objeto da sucessão: Herança [acervo hereditário, monte-mor, monte partível, massa,


patrimônio inventariado e também, especialmente sob a ótica processual, espólio].
Constituída pela universalidade das relações jurídicas [universitas rerum] deixadas pelo
falecido, enquanto não promovida a partilha aos sucessores [ou a adjudicação ao herdeiro
único].

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2 ABERTURA DA SUCESSÃO

§ 9. Noção inicial de abertura da sucessão

* “Abertura da sucessão é o momento em que nasce o direito hereditário, o prius necessário


à substituição que se encerra no fenômeno sucessório”. (ORLANDO GOMES).

* No Brasil, dá-se com a verificação da morte do sujeito. A morte da pessoa natural é o marco
final de sua existência é, também, o marco inicial do direito das sucessões.

Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros
legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no
testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado
nulo.

§ 10. Transmissão da titularidade dos bens da herança: momento

* Droit de saisine: Instituído em França por volta do século XIII [Idade Média, portanto], no
intuito de proteger os herdeiros de servos, de quem os senhores exigiam o pagamento de
uma quantia para que pudessem ser imitidos na posse dos bens deixados pelo falecido.

* Essa expressão deriva do brocardo francês: Le serf mort saisit le vif, son hoir de plus proche
– o vivo herda do morto – e do alemão: Die Tochter beerbt ihre Eltern - a filha herda dos
seus pais.

* Em Brasil, a ideia foi admitida por meio do Alvará de 9 de novembro de 1754. Até então
vigorava a tradição romana, que distinguia o modo e o momento da aquisição da herança
pelos herdeiros necessários [que se dava com a morte e no mesmo instante,
independentemente de ato seu] dos demais herdeiros [que deviam aceitar expressamente
a herança, somente após o que esta deixava o estado de jacência].

* Atualmente, dispõe o CCB:

Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos
e testamentários.

* Interessante a síntese de Nelso Nery Jr e Rosa Maraia de Andrade Nery em nota ao artigo
em comento, sob a rubrica “Consequências da saisine”. Vejamos:

“Os herdeiros são investidos na posse e adquirem a propriedade pelo simples fato da morte
do autor da herança. Adquirem os direitos e obrigações do morto com todas as suas
qualidades e vícios (CC 1203 e 1206). A posse é por eles adquirida sem que haja necessidade

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de apreensão material do bem. Independentemente da abertura do inventário, podem fazer
uso dos instrumentos de proteção da posse (interditos possessórios) e da propriedade (v.g.,
ação reivindicatória, ação de usucapião), podendo somar à sua a posse do de cujus (CC
1207), para fins de usucapião (Pontes de Miranda. Tratado, v. XI4, § 1194, n. 3, p. 132). Como
a morte do de cujus faz os seus bens ingressarem no patrimônio dos herdeiros,
independentemente de qualquer outra providência, a renúncia à herança pode constituir-
se em fraude contra credores, pois o herdeiro já é possuidor e proprietário no momento da
morte e, ao dispor desses direitos com a renúncia à herança, pode praticar, em tese, ato
apto a fraudar direitos dos credores”.

* Façamos algumas especificações a respeito da abertura da sucessão.

§ 11. Transmissão da titularidade dos bens da herança: destinatários

* Ainda com base no CCB 1.784, identificam-se os sujeitos passivos da sucessão, no caso, os
herdeiros legítimos e testamentários sobrevivos, é dizer, aqueles que estejam vivos no
momento da morte do de cujus. Vale destacar o seguinte:

Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos
e testamentários.

* Conforme já destacado anteriormente, por herdeiros legítimos entendem-se aqueles


chamados a suceder por força de lei; por testamentários, aqueles que herdam por vontade
do de cujus.

* Portanto, coexistem a sucessão legítima e testamentária, outrora incompatíveis, segundo a


parêmia nemo pro parte testatus et pro parte intestatus decedere potest [3].

§ 12. Transmissão da titularidade dos bens da herança: lugar

* De acordo com o CCB 1.785:

Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.

§ 13. Jurisdição e competência

* Partindo dessa premissa, o NCPC, Lei 13.105/2015, além de estabelecer a competência da


jurisdição brasileira para proceder ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil,
especifica regra para a fixação do foro competente para o processamento da ação de
inventário. Vejamos:

3 Ninguém pode falecer em parte testando (com testamento) e, em parte, sem testar (sem testamento).

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Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:
[...]
II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular
e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja
de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional;

Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competente para o


inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade,
a impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o
espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro.

Parágrafo único. Se o autor da herança não possuía domicílio certo, é competente:

I - o foro de situação dos bens imóveis;


II - havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes;
III - não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do espólio.

§ 14. Lei material aplicável

* O art. 10, §1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB prevê
expressamente a aplicação da lei do país em que domiciliado o falecido como sendo a
regente da sucessão aberta:

Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado
o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.

§ Nota: Assim, regra geral, caso um estrangeiro faleça no Brasil, deixando bens em
território brasileiro, quanto a estes [já que não compete à Jurisdição brasileira dizer
sobre a partilha de bens situados fora do Brasil], a sucessão será submetida às
normas do país onde aquele era domiciliado. “Por isso, em inventários abertos no
Brasil, o juiz eventualmente terá que aplicar a lei sucessória estrangeira”. (CAIO
MÁRIO DA SILVA PEREIRA).

§ [...] o art. 10 abrange todos os bens (móveis ou imóveis; corpóreos ou


imateriais), bem como qualquer tipo de sucessão (testamentária ou legítima; por
morte ou ausência), importando tão somente a determinação do domicílio do de
cujus ou ausente: se domiciliado no Brasil, será utilizada a lei brasileira; caso seja
seu domicílio no exterior, a lei estrangeira. (André de Carvalho Ramos e Erik
Frederico Gramstrup: Comentários à Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro – LINDB, p. 202).

§ A esse respeito, a seguinte notícia jurisprudencial publicada pelo STJ.

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DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. RELATIVIDADE DO ART. 10 DA LINDB.
Ainda que o domicílio do autor da herança seja o Brasil, aplica-se a lei estrangeira
da situação da coisa - e não a lei brasileira - na sucessão de bem imóvel situado
no exterior. A LINDB, inegavelmente, elegeu o domicílio como relevante regra
de conexão para solver conflitos decorrentes de situações jurídicas relacionadas
a mais de um sistema legal (conflitos de leis interespaciais), porquanto
consistente na própria sede jurídica do indivíduo. Assim, a lei do país em que for
domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da
personalidade, o direito ao nome, a capacidade jurídica e dos direitos de família
(art. 7º). Por sua vez, a lei do domicílio do autor da herança regulará a correlata
sucessão, nos termos do art. 10 da lei sob comento. Em que pese a prevalência
da lei do domicílio do indivíduo para regular as suas relações jurídicas pessoais,
conforme preceitua a LINDB, esta regra de conexão não é absoluta. Como bem
pondera a doutrina, outros elementos de conectividade podem, a depender da
situação sob análise, revelarem-se preponderantes e, por conseguinte,
excepcionar a aludida regra, tais como a situação da coisa, a faculdade
concedida à vontade individual na escolha da lei aplicável, quando isto for
possível, ou por imposições de ordem pública. Esclarece, ainda, que "a adoção
de uma norma de direito estrangeiro não é mera concessão do Estado, ou um
favor emanado de sua soberania, mas a consequência natural da comunidade
de direito, de tal forma que a aplicação da lei estrangeira resulta como
imposição de um dever internacional. Especificamente à lei regente da sucessão,
pode-se assentar, de igual modo, que o art. 10 da LINDB, ao estabelecer a lei do
domicílio do autor da herança para regê-la, não assume caráter absoluto. A
conformação do direito internacional privado exige, como visto, a ponderação
de outros elementos de conectividade que deverão, a depender da situação,
prevalecer sobre a lei de domicílio do de cujus. Além disso, outras duas razões -
a primeira de ordem legal; a segunda de ordem prática - corroboram com a
conclusão de relatividade do disposto no art. 10, caput, da LINDB. No tocante ao
primeiro enfoque, o dispositivo legal sob comento deve ser analisado e
interpretado sistematicamente, em conjunto, portanto, com as demais normas
internas que regulam o tema, em especial o art. 8º, caput, e § 1º do art. 12,
ambos da LINDB e o art. 89 do CPC. E, o fazendo, verifica-se que, na hipótese de
haver bens imóveis a inventariar situados, simultaneamente, aqui e no exterior,
o Brasil adota o princípio da pluralidade dos juízos sucessórios. Como se
constata, a própria LINDB, em seu art. 8º, dispõe que as relações concernentes
aos bens imóveis devem ser reguladas pela lei do país em que se encontrem.
Inserem-se, inarredavelmente, no espectro de relações afetas aos bens imóveis
aquelas destinadas a sua transmissão/alienação, seja por ato entre vivos, seja
causa mortis, cabendo, portanto, à lei do país em que situados regê-las. Por sua
vez, o CPC, em seu art. 89 (abrangendo disposição idêntica à contida no § 2º do
art. 12 da LINDB), é expresso em reconhecer que a jurisdição brasileira, com
exclusão de qualquer outra, deve conhecer e julgar as ações relativas aos

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imóveis situados no país, assim como proceder ao inventário e partilha de bens
situados no Brasil, independente do domicílio ou da nacionalidade do autor da
herança. Sobressai, no ponto, a insubsistência da tese de que o Juízo sucessório
brasileiro poderia dispor sobre a partilha de bem imóvel situado no exterior.
Como assinalado, não resta sequer instaurada a jurisdição brasileira para
deliberar sobre bens imóveis situados no estrangeiro, tampouco para proceder
a inventario ou à partilha de bens imóveis sitos no exterior. O solo, em que se
fixam os bens imóveis, afigura-se como expressão da própria soberania de um
Estado e, como tal, não pode ser, sem seu consentimento ou em contrariedade
ao seu ordenamento jurídico, objeto de ingerência de outro Estado. No ponto,
já se pode antever a segunda razão - esta de ordem prática - a justificar a
assertiva de que o art. 10 da LINDB encerra, de fato, regramento que comporta
exceções. É que um provimento judicial emanado do juízo sucessório brasileiro
destinado a deliberar sobre imóvel situado no exterior, além de se afigurar
inexistente, pois, como visto, não instaurada sequer sua jurisdição, não deteria
qualquer eficácia em outro país, destinatário da "ordem" judicial. Aliás, dentre
os princípios que regem o Direito Internacional Privado, ganha cada vez mais
relevo o da eficácia das decisões ou do Estado com melhor competência,
informador da competência da lex rei sitae (lei da situação da coisa) para regular
as relações concernentes aos bens imóveis, pois esta é a lei, inarredavelmente,
que guarda melhores condições de impor a observância e o acatamento de seus
preceitos. Assim, em havendo bens imóveis a serem inventariados ou
partilhados simultaneamente no Brasil e no estrangeiro, a premissa de que a lei
do domicílio do de cujus, sempre e em qualquer situação, regulará a sucessão,
somente poderia ser admitida na remota - senão inexistente - hipótese de o
Estado estrangeiro, cujas leis potencialmente poderiam reger o caso (em virtude
de algum fator de conexão, v.g., situação da coisa, existência de testamento,
nacionalidade, etc), possuir disposição legal idêntica à brasileira. Mais do que
isso. Seria necessário que, tanto o Brasil, em que domiciliado a autora da
herança, assim como o país estrangeiro, país em que situado o imóvel a ser
inventariado, adotassem o princípio da unidade ou universalidade do juízo da
sucessão e que, em ambos os países, o juízo sucessório fosse (com prejuízo de
qualquer outra regra de conexão) o do domicílio do autor da herança. Todavia,
em se tratando de bem imóvel situado no estrangeiro, circunstância que se
relaciona diretamente com a própria soberania do Estado, difícil, senão
impossível, cogitar a hipótese de este mesmo Estado estrangeiro dispor que a
sucessão deste bem, nele situado, fosse regulada pela lei de outro país. No
ordenamento jurídico nacional (art. 8º, caput, da LINDB, em conjunto com o art.
89 do CPC - abrangendo disposição idêntica à contida no § 2º do art. 12 da
LINDB), tal hipótese seria inadmissível. A exegese ora propugnada, encontra
ressonância na especializada doutrina, que bem esclarece a inidoneidade (e
mesmo ineficácia) do critério unitário para reger a sucessão de bens imóveis
situados em mais de um Estado, em claro descompasso com as demais normas

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internas que tratam do tema. Ademais, a jurisprudência do STJ, na linha da
doutrina destacada, já decidiu que, "Adotado no ordenamento jurídico pátrio o
princípio da pluralidade de juízos sucessórios, inviável se cuidar, em inventário
aqui realizado, de eventuais depósitos bancários existentes no estrangeiro."
(REsp 397.769-SP, Terceira Turma, DJ 19/12/2002). REsp 1.362.400-SP, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 28/4/2015, DJe 5/6/2015.

Art. 10. Caput


§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira
em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que
não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus. (Redação dada pela Lei nº 9.047,
de 1995).

§ Nota: A regra em comento reflete o disposto no art. 5º, XXXI da CRFB – a


sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira
em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais
favorável a lei pessoal do de cujus. Assim, excepcionalmente, a lei brasileira poderá
ser aplicada à sucessão de bens de estrangeiro falecido no Brasil, desde que para
beneficiar cônjuge ou filhos brasileiros.

§ Hipótese: Finado português e domiciliado em Portugal, mas deixou bens em


nosso país, tendo falecido sem descendentes, com cônjuge brasileiro e pais vivos,
sua herança legal não será partilhada na proporção de 1/3 (um terço) para cada
herdeiro, nos termos do art. 1.837, primeira parte, do Código Civil brasileiro, e sim
na proporção de 2/3 (dois terços) para o cônjuge brasileiro e de 1/3 (um terço) para
os pais do falecido, de acordo com o art. 2.142, 1, do Código Civil português, verbis:
“Se não houver descendentes e o autor da sucessão deixar cônjuge e ascendentes,
ao cônjuge pertencerão duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte da
herança”, por ser, nesse ponto, mais favorável ao consorte brasileiro a lei pessoal
do de cuius. LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO (2019, p. 125)

* Capacidade para suceder

Art. 10. Caput.

§ 2º A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder.

§ Nota: [...] a capacidade ora mencionada se refere apenas à legitimação para


exercer o direito sucessório, visto que será a lei do domicílio do de cuius a
competente para reger a capacidade para ter direito à sucessão. LUIZ PAULO VIEIRA
DE CARVALHO (2019, p. 126).

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§ Sedo assim: [...] uma vez determinado pela lei do domicílio do autor da herança
– art. 10 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (LINDB) (ou então
pela nossa lei ou pela lei pessoal daquele, na hipótese do § 1º do art. 10 da LINDB)
– quem são seus vocacionados sucessórios (herdeiros e/ou legatários), a lei do
domicílio deste(s) herdeiro(s) ou destes(s) legatário (§ 2º do art. 10 da LINDB) será
a que regerá as questões relativas à aceitação ou renúncia ao direito hereditário, à
deserdação (do herdeiro necessário), à indignidade (do herdeiro ou do legatário) e
à falta de capacidade sucessória (ou legitimação para suceder) relacionada a
qualquer deles. LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO (2019, p. 127).

§ Conforme ensina MARIA HELENA DINIZ (2018, p. 62), a explicação impõe a distinção
entre dois institutos, conforme ensinado pelos alemães. Veja. A capacidade para ter direito
à sucessão (Erbfähigkeit) está sujeita à lei do domicílio do auctor successionis; já a
capacidade de agir relativamente aos direitos sucessórios, ou seja, a aptidão para suceder
ou para aceitar – ou exercer direitos do sucessor (Erbrechtliche Handlungsfähigkeit), está
subordina à lei pessoal do herdeiro ou sucessível (LICC, art. 10, § 2º).

JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. ART. 10, § 2º, DO CÓDIGO CIVIL. CON-DIÇÃO DE


HERDEIRO. CAPACIDADE DE SUCEDER. LEI APLICÁVEL. CAPACIDADE PARA SUCEDER NÃO
SE CONFUNDE COM QUALIDADE DE HERDEIRO. ESTA TEM A VER COM A ORDEM DA
VOCAÇÃO HEREDITÁRIA QUE CONSISTE NO FATO DE PERTENCER A PESSOA QUE SE
APRESENTA COMO HERDEIRO A UMA DAS CATEGORIAS QUE, DE UM MODO GERAL, SÃO
CHAMADAS PELA LEI À SUCESSÃO, POR ISSO HAVERÁ DE SER AFERIDA PELA MESMA LEI
COMPETENTE PARA REGER A SUCESSÃO DO MORTO QUE, NO BRASIL, ‘OBEDECE A LEI
DO PAÍS EM QUE ERA DOMICILIADO O DEFUNTO’ (ART. 10, CAPUT, DA LICC). RESOLVIDA
A QUESTÃO PREJUDICIAL DE QUE DETERMINADA PESSOA, SEGUNDO O DOMICÍLIO QUE
TINHA O DE CUJUS, É HERDEIRA, CABE EXAMINAR SE A PESSOA INDICADA É CAPAZ OU
INCAPAZ PARA RECEBER A HERANÇA, SOLUÇÃO QUE É FORNECIDA PELA LEI DO
DOMICÍLIO DO HERDEIRO (ART. 10, § 2º, DA LICC). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO”
(Superior Tribunal de Justiça. REsp 61.434, 4ª Turma, Rel. Min. César Asfor Rocha, julgado
em 17.06.1997)

§ 15. Lei sucessória no tempo

* A sucessão é regida pela lei vigente à época de sua abertura, nos termos do art. 1.787 do
CCB. Veja:

Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da
abertura daquela.

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Nota: Portanto, temos que, as regras do CCB 2002 não se aplicam à sucessão dos
indivíduos falecidos até 10 de janeiro de 2003 – i.e um dia antes da entrada em
vigor do referido Codex.

RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL. INÍCIO ANTERIOR E DISSOLUÇÃO


POSTERIOR À EDIÇÃO DA LEI 9.278/96. BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE
ANTES DE SUA VIGÊNCIA.
1. Não ofende o art. 535 do CPC a decisão que examina, de forma fundamentada,
todas as questões submetidas à apreciação judicial.
2. A ofensa aos princípios do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa
julgada encontra vedação em dispositivo constitucional (art. 5º XXXVI), mas seus
conceitos são estabelecidos em lei ordinária (LINDB, art. 6º). Dessa forma, não
havendo na Lei 9.278/96 comando que determine a sua retroatividade, mas
decisão judicial acerca da aplicação da lei nova a determinada relação jurídica
existente quando de sua entrada em vigor - hipótese dos autos - a questão será
infraconstitucional, passível de exame mediante recurso especial. Precedentes
do STF e deste Tribunal
3. A presunção legal de esforço comum na aquisição do patrimônio dos
conviventes foi introduzida pela Lei 9.278/96, devendo os bens amealhados no
período anterior à sua vigência, portanto, ser divididos proporcionalmente ao
esforço comprovado, direito ou indireto, de cada convivente, conforme
disciplinado pelo ordenamento jurídico vigente quando da respectiva aquisição
(Súmula 380/STF).
4. Os bens adquiridos anteriormente à Lei 9.278/96 têm a propriedade - e,
consequentemente, a partilha ao cabo da união - disciplinada pelo ordenamento
jurídico vigente quando respectiva aquisição, que ocorre no momento em que se
aperfeiçoam os requisitos legais para tanto e, por conseguinte, sua titularidade
não pode ser alterada por lei posterior em prejuízo ao direito adquirido e ao ato
jurídico perfeito (CF, art. 5, XXXVI e Lei de Introdução ao Código Civil, art. 6º).
5. Os princípios legais que regem a sucessão e a partilha de bens não se
confundem: a sucessão é disciplinada pela lei em vigor na data do óbito; a
partilha de bens, ao contrário, seja em razão do término, em vida, do
relacionamento, seja em decorrência do óbito do companheiro ou cônjuge, deve
observar o regime de bens e o ordenamento jurídico vigente ao tempo da
aquisição de cada bem a partilhar.
6. A aplicação da lei vigente ao término do relacionamento a todo o período de
união implicaria expropriação do patrimônio adquirido segundo a disciplina da
lei anterior, em manifesta ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.
7. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1124859/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe
27/02/2015)

§ 16. Transmissão da titularidade dos bens da herança: conteúdo

* “Em princípio, diz-se que a abertura da sucessão implica na mutação subjetiva do


patrimônio, que se transmite aos herdeiros legítimos e testamentários. A noção é correta,

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no sentido de que todo o complexo de valores positivos e negativos passa aos sucessores, ut
universitas”. (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA).

* Uma ressalva: “Há certos direitos que se não transmitem aos herdeiros. Alguns, por sua
natureza personalíssima, se extinguem com a morte, como sejam os direitos de família
puros, os direitos políticos e, em regra, os direitos da personalidade, ressalvada, quanto a
estes, alguma exceção prevista em lei (Código Civil de 2002, art. 11): de lege lata, é o caso
de certos direitos morais do autor, os quais, embora passíveis de inserção naquela categoria
doutrinária, são, todavia, transmissíveis causa mortis (Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de
1998, art. 24, § 1º). Outros, não obstante a sua patrimonialidade, não sobrevivem nos
herdeiros, dada a sua inerência à pessoa do de cuius, como o uso, o usufruto, o direito de
preferência concedido ao vendedor (Código Civil de 2002, art. 520)”. (CAIO MÁRIO DA SILVA
PEREIRA).

* Há de se observar, ainda, que a lei mesma exclui certos bens da herança em situações
específicas. Senão vejamos:

Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se
sobreviver ao donatário.

Nota: Esse dispositivo trata da denominada cláusula de reversão, que pode ser
estipulada no contrato de doação. Assim, nessa situação, caso o donatário faleça
antes do doador, o bem doado não passará à titularidade dos herdeiros do
donatário.

Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa
entende-se distribuída entre elas por igual.

Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na


totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo.

Nota: Aqui a observação recai sobre a doação conjuntiva feita a marido e mulher
[cônjuges]. De acordo com a regra explicitada no parágrafo único, sendo os
cônjuges donatários conjuntivos, em caso de falecimento de um deles, a quota-
parte devida ao morto não integra o seu acervo hereditário, antes, integraliza-se
ao patrimônio do cônjuge sobrevivo.

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital
estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos
os efeitos de direito.

Nota: Como explicitado no texto legal, o capital estipulado no seguro de vida ou de


acidentes pessoais para o caso de morte não se considera herança para todos os
efeitos de direito, de tal modo que, de rigor, não são os herdeiros do estipulante
falecido seus destinatários.

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3 DA HERANÇA E SUA ADMINISTRAÇÃO

§ 17. Conteúdo da herança

* O conteúdo da herança, objeto da sucessão, atualmente, tem caráter eminentemente


patrimonial ou econômico, sendo a universalidade das relações jurídicas do finado, com essa
natureza, transmitida aos seus herdeiros. (CAHALI e HIRONAKA)

* Entretanto, são em regra excluídas da herança: (i) as relações jurídicas não patrimoniais; e
(ii) as personalíssimas, mesmo com conteúdo econômico, tituladas pelo falecido, como, por
exemplo, o poder familiar, a tutela ou a curatela eventualmente exercidos pelo de cujus, o
usufruto, o uso, o direito real de habitação, as rendas vitalícias, a pensão previdenciária, o
contrato de trabalho, porque o sucessor não é a continuação da pessoa do de cujus. (CAHALI
e HIRONAKA).

* No mesmo sentido: “Há certos direitos que se não transmitem aos herdeiros. Alguns, por
sua natureza personalíssima, se extinguem com a morte, como sejam os direitos de família
puros, os direitos políticos e, em regra, os direitos da personalidade, ressalvada, quanto a
estes, alguma exceção prevista em lei (Código Civil de 2002, art. 11): de lege lata, é o caso
de certos direitos morais do autor, os quais, embora passíveis de inserção naquela categoria
doutrinária, são, todavia, transmissíveis causa mortis (Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de
1998, art. 24, § 1º). Outros, não obstante a sua patrimonialidade, não sobrevivem nos
herdeiros, dada a sua inerência à pessoa do de cuius, como o uso, o usufruto, o direito de
preferência concedido ao vendedor (Código Civil de 2002, art. 520)”. (CAIO MÁRIO DA SILVA
PEREIRA). Já o patrimônio a ser objeto de sucessão, ressalvadas as exceções acima, tem sua
abrangência estendida à integralidade não só dos bens, como dos direitos e obrigações
pertencentes à pessoa no momento de seu falecimento, acrescido, em situações especiais,
aos doados a herdeiros como adiantamento de legítima. (CAHALI e HIRONAKA)

* Integram o acervo hereditário não só bens imóveis, como móveis (carros, joias etc) e
qualquer outra relação jurídica de direitos e obrigações, como dinheiro, linhas telefônicas,
aplicações financeiras, ações ou quotas sociais, direitos possessórios (cf. art. 1.206, CC) (já
em curso ou não eventuais processos, inclusive de usucapião), créditos perante terceiros
(v.g., restituição de imposto de renda) e o direito de propor (ou seguir se já propostas) as
respectivas ações (buscando crédito judicial em ação de cobrança, indenizatória ou de
repetição de indébito) etc. (CAHALI e HIRONAKA).

EM CASO DE MORTE DE COTITULAR, SALDO EM CONTA CONJUNTA SOLIDÁRIA DEVE SER


OBJETO DE INVENTÁRIO E PARTILHA

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Com o falecimento de um dos cotitulares de conta-corrente conjunta solidária, o saldo
existente deve ser objeto de inventário e partilha entre os herdeiros, aplicando-se a pena
de sonegados ao cotitular que, com dolo ou má-fé, ocultar valores.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou esse entendimento para
determinar que um homem restituísse ao espólio do irmão 50% do saldo existente na
conta que mantinham juntos.

O recurso teve origem em ação de sonegados ajuizada pelo espólio, na qual pleiteou a
restituição e colação de 50% do saldo bancário existente na conta conjunta, sob o
argumento de que o irmão sobrevivente teria dolosamente ocultado o valor após a morte.
Na ação, o espólio pedia ainda que o cotitular perdesse o direito à partilha desse valor.

A ação foi parcialmente procedente em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul entendeu que os irmãos assinaram termo de solidariedade, estabelecendo
que a conta poderia ser movimentada e encerrada isoladamente por qualquer um deles.
Concluiu que o todo passou a pertencer a qualquer um deles, razão pela qual o valor
poderia ser levantado apenas por um sem a necessidade de posterior inclusão na partilha
de bens decorrente do falecimento.

Conta solidária

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que existem duas espécies
de conta-corrente bancária: a individual (ou unipessoal), em que há um único titular que
a movimenta por si ou por meio de procurador; e a coletiva (ou conjunta), cuja
titularidade é de mais de uma pessoa.

Segundo ela, esta última pode ser fracionária, sendo movimentada apenas por todos os
titulares; ou solidária, em que qualquer um dos titulares pode movimentar a integralidade
dos fundos disponíveis, em decorrência da solidariedade dos correntistas
especificamente em relação à instituição financeira mantenedora da conta, mas não em
relação a terceiros, “sobretudo porque a solidariedade, na forma do artigo 265 do Código
Civil, somente decorre da lei ou do contrato, e não se presume”.

Ao citar precedentes sobre o tema, a ministra ressaltou que “o cotitular de conta-corrente


conjunta não pode sofrer constrição em virtude de negócio jurídico celebrado pelo outro
cotitular e por ele inadimplido, podendo, nessa hipótese, comprovar os valores que
compõem o patrimônio de cada um e, na ausência ou na impossibilidade de prova nesse
sentido, far-se-á a divisão do saldo de modo igualitário”.

Para a ministra, esse mesmo entendimento deve ser aplicado na hipótese de


superveniente falecimento de um dos cotitulares da conta conjunta. “A atribuição de
propriedade exclusiva sobre a totalidade do saldo em razão de uma solidariedade que,

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repise-se, apenas existe entre correntistas e instituição bancária, representaria grave
ofensa aos direitos sucessórios dos herdeiros necessários, de modo que a importância
titularizada pelo falecido deverá, obrigatoriamente, constar do inventário e da partilha”,
afirmou.

Direitos sucessórios

O espólio também questionou a titularidade dos valores depositados na conta conjunta,


mas, diante da ausência de esclarecimento sobre a matéria fática, havendo dúvidas sobre
a propriedade do valor, a ministra entendeu que deve incidir a presunção de que o saldo
existente ao tempo do falecimento pertencia a ambas as partes em igualdade de
condições – razão pela qual o valor deverá ser dividido em cotas idênticas.

Quanto à aplicação da pena de sonegados, Nancy Andrighi lembrou que o STJ já decidiu
que a aplicação dessa penalidade exige prova de má-fé ou dolo na ocultação de bens que
deveriam ser trazidos à colação. Na hipótese dos autos, a relatora afastou a incidência da
pena, uma vez que não havia prova segura da autoria e da propriedade dos depósitos
realizados na conta conjunta, razão pela qual não seria razoável atribuir ao cotitular a
prática de ato doloso, fraudulento ou de má-fé.

Processo: REsp 1.836.130 – RS


Fonte: STJ (01/04/2020)

* Sendo casada a pessoa falecida, a sua meação decorrente do regime de bens adotado no
matrimônio igualmente integra a herança, ainda que algumas coisas estejam tituladas em
nome do outro cônjuge. Por exemplo, o veículo, quotas sociais, aplicações financeiras e
quaisquer outros bens e direitos em nome apenas da viúva, mas pertencentes ao casal,
fazem parte do monte partilhável no limite da meação do falecido. (CAHALI e HIRONAKA).

* Por outro lado, também as dívidas de qualquer natureza e obrigações do falecido, não sendo
personalíssimas, integram o monte (v.g., financiamentos, cheques e títulos emitidos e ainda
não saldados, responsabilidade civil por atos praticados etc.). Os encargos deixados pelo
falecido, entretanto, não se transmitem aos herdeiros, se superiores às forças da herança
(CC, art. 1.792). (CAHALI e HIRONAKA).

Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança;
incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse,
demostrando o valor dos bens herdados.

Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a
partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança
lhe coube.

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NOTÍCIA CORRELATA.
Terça-feira, 7 de agosto de 2018
Morte de consignante não extingue dívida oriunda de crédito consignado

A morte da pessoa contratante de crédito consignado com desconto em folha de


pagamento (consignante) não extingue a dívida por ela contraída, já que a Lei 1.046/50,
que previa a extinção da dívida em caso de falecimento, não está mais em vigor, e a
legislação vigente não tratou do tema. Dessa forma, há a obrigação de pagamento da
dívida pelo espólio ou, caso já tenha sido realizada a partilha, pelos herdeiros, sempre
nos limites da herança transmitida. O entendimento da Terceira Turma foi firmado ao
negar recurso especial que buscava o reconhecimento da extinção da dívida pela morte
da consignante e, por consequência, o recálculo do contrato e a condenação da
instituição financeira a restituir em dobro os valores cobrados. De acordo com o
recorrente, a Lei 1.046/50 não foi revogada pela Lei 10.820/03, já que a lei mais recente
não tratou de todos os assuntos fixados pela legislação anterior, de forma que não
haveria incompatibilidade legal de normas sobre a consequência das dívidas em razão
do falecimento do contratante do empréstimo. A relatora do recurso especial, ministra
Nancy Andrighi, destacou inicialmente que, pelo contexto extraído dos autos, não é
possível confirmar se a consignante detinha a condição de servidora pública estatutária
ou de empregada regida pelo regime celetista, tampouco foi esclarecido se ela se
encontrava em atividade ou inatividade no momento da contratação do crédito. A
relatora também ressaltou que a Lei 1.046/50, que dispunha sobre a consignação em
folha de pagamento para servidores civis e militares, previa em seu artigo 16 que,
ocorrido o falecimento do consignante, ficaria extinta a dívida. Por sua vez, a Lei
10.820/03, relativa à autorização para desconto de prestações em folha dos
empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, não tratou das hipóteses
de morte do contratante e, na verdade, versa sobre situações distintas daquelas
anteriormente previstas pela Lei 1.046/50.

Regras revogadas

No caso dos servidores públicos estatutários, a ministra também apontou que a


jurisprudência do STJ foi firmada no sentido de que, após a edição da Lei 8.112/90,
foram suprimidas de forma tácita (ou indireta) as regras de consignação em pagamento
previstas pela Lei 1.046/50. De acordo com a relatora, mesmo sem ter certeza da
condição da consignante (estatutária ou celetista), a conclusão inevitável é a de que o
artigo 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em caso de falecimento do
consignante, não está mais em vigor. “Assim, a morte da consignante não extingue a
dívida por ela contraída mediante consignação em folha, mas implica o pagamento por
seu espólio ou, se já realizada a partilha, por seus herdeiros, sempre nos limites da
herança transmitida (artigo 1.997 do Código Civil de 2002)”, concluiu a ministra ao
negar provimento ao recurso especial.

Processo: REsp 1498200

* Nota: Natureza do direito à sucessão aberta.

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§ Para efeitos legais, em razão da expressa previsão contida no art. 80, II, do Código Civil,
o conjunto de bens e direitos objeto da sucessão é considerado imóvel. [...], mesmo
constituído o acervo apenas de bens móveis ou direitos. (CAHALI e HIRONAKA).

Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:


[...]
II - o direito à sucessão aberta.

§ É, ainda, considerada uma universalidade de direito, nos termos seguintes:

Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma


pessoa, dotadas de valor econômico.

* Observação. Indivisibilidade da herança. O conjunto de bens e direitos arrecadados também


é tido como indivisível, mesmo se existirem dois ou mais herdeiros, até a adição do
respectivo quinhão em favor de cada um, pela partilha, por expressa disposição contida no
parágrafo único do art. 1.791 do Código Civil. (CAHALI e HIRONAKA).

Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.

Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da
herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.

Notícia correlata
quinta-feira, 28 de junho de 2018

Herdeiro pode pleitear usucapião extraordinária de imóvel objeto de herança

Mesmo no caso de imóvel objeto de herança, é possível a um dos herdeiros pleitear a


declaração da prescrição aquisitiva do bem (usucapião), desde que observados os
requisitos para a configuração extraordinária previstos no artigo 1.238 do Código Civil de
2002 – o prazo de 15 anos cumulado com a posse exclusiva, ininterrupta e sem oposição
dos demais proprietários ou de terceiros. O entendimento foi reafirmado pela Terceira
Turma ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo e determinar o retorno
dos autos à origem para o prosseguimento da ação de usucapião, anteriormente julgada
extinta sem resolução de mérito. A ação de usucapião extraordinária, proposta por um dos
herdeiros, buscava o reconhecimento, em seu favor, do domínio do imóvel objeto de
herança. Em primeira instância – a sentença foi posteriormente confirmada pelo TJSP –, o
juiz julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, por entender que o fato de a
herdeira afirmar que é possuidora do bem de forma exclusiva não permite que ela adquira
a propriedade individualmente, pois a tolerância dos demais herdeiros gera a detenção do
bem, mas não sua posse.

Requisitos

A relatora do recurso especial da herdeira, ministra Nancy Andrighi, destacou que, com o
falecimento, ocorre a transmissão do imóvel aos seus herdeiros, conforme regra do artigo
1.784 do Código Civil de 2002. “A partir dessa transmissão, cria-se um condomínio pro

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indiviso sobre o acervo hereditário, regendo-se o direito dos coerdeiros, quanto à
propriedade e posse da herança, pelas normas relativas ao condomínio, como mesmo
disposto no artigo 1.791, parágrafo único, do CC/02”, apontou a ministra. Todavia, a
relatora destacou que o STJ possui jurisprudência no sentido de que é possível o
condômino usucapir, em nome próprio, desde que atendidos os requisitos legais da
usucapião e que tenha sido exercida a posse exclusiva pelo herdeiro/condômino como se
dono fosse (animus domini). “Conclui-se, portanto, que a presente ação de usucapião
ajuizada pela recorrente não deveria ter sido extinta, sem resolução do mérito, devendo
os autos retornar à origem a fim de que a esta seja conferida a necessária dilação
probatória para a comprovação da exclusividade de sua posse, bem como dos demais
requisitos da usucapião extraordinária”, concluiu a ministra ao determinar o retorno dos
autos à origem.

Ementa do acórdão noticiado

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO


EXTRAORDINÁRIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. HERDEIRA.
IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA. POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO POR CONDÔMINO SE
HOUVER POSSE EXCLUSIVA.
1. Ação ajuizada 16/12/2011. Recurso especial concluso ao gabinete em 26/08/2016.
Julgamento: CPC/73.
2. O propósito recursal é definir acerca da possibilidade de usucapião de imóvel objeto de
herança, ocupado exclusivamente por um dos herdeiros.
3. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o
conhecimento do recurso especial.
4. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e
testamentários (art. 1.784 do CC/02).
5. A partir dessa transmissão, cria-se um condomínio pro indiviso sobre o acervo
hereditário, regendo-se o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da
herança, pelas normas relativas ao condomínio, como mesmo disposto no art. 1.791,
parágrafo único, do CC/02.
6. O condômino tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a
posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à
usucapião, bem como tenha sido exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo
prazo determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários.
7. Sob essa ótica, tem-se, assim, que é possível à recorrente pleitear a declaração da
prescrição aquisitiva em desfavor de seu irmão - o outro herdeiro/condômino -, desde que,
obviamente, observados os requisitos para a configuração da usucapião extraordinária,
previstos no art. 1.238 do CC/02, quais sejam, lapso temporal de 15 (quinze) anos
cumulado com a posse exclusiva, ininterrupta e sem oposição do bem.
8. A presente ação de usucapião ajuizada pela recorrente não deveria ter sido extinta, sem
resolução do mérito, devendo os autos retornar à origem a fim de que a esta seja conferida
a necessária dilação probatória para a comprovação da exclusividade de sua posse, bem
como dos demais requisitos da usucapião extraordinária.
9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.

(REsp 1631859/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em


22/05/2018, DJe 29/05/2018)

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§ 18. Da cessão de direitos hereditários

* Desde a abertura da sucessão [nunca antes, por força do art. 426, CCB, segundo o qual: “Não
pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva”] o herdeiro pode promover a
transferência de seus direitos a terceiros, através de cessão de direitos hereditários. É o que
estabelece o CCB:

Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-
herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.

* Outra consequência lógica é que a cessão de direito hereditário somente pode ser feita
antes da partilha.

* A falta da escritura pública é repelida pela lei como nulidade do negócio jurídico. Faltando-
lhe esse requisito essencial, a sanção imposta pela lei é de nulidade. O negócio jurídico é
nulo, quando ofende preceitos de ordem pública, e a obrigação da escritura pública é,
repetindo, essencial para a validade do ato ou negócio jurídico. (CATEB). De fato, basta que
se recorde o disposto no art. 104, III do CCB.

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:


[...]
III - forma prescrita ou não defesa em lei

* Com a escritura pública da cessão o cessionário pode participar do processo de inventário,


para, no final, ser contemplado na partilha. (CATEB).

* Cessão da herança não importa na transmissão da qualidade de herdeiro, pois essa não se
transfere. (VENOSA, Código Interpretado).

* Obviamente, a extensão da cessão não abrange outros bens que, após a sua realização,
venham a ser incluídos no monte, seja em razão de substituições4 ou de direito de acrescer5.
Isso porque: a cessão interpreta-se restritivamente (VENOSA, Código Interpretado). É o que
estabelece o § 1º do mesmo artigo. Vejamos:

Art. 1.793. Caput.

4 Na sucessão legítima a substituição é sempre automática e ocorre na falta de um herdeiro preferencial, hipótese
em que são chamados a suceder os demais da mesma classe, se houver, ou de classe subsequente. Na sucessão
testamentária a matéria é tratada nos arts. 1.947 e seguintes e será abordada oportunamente.

5 Observe-se que:
Art. 1.810. Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros da mesma classe e, sendo
ele o único desta, devolve-se aos da subsequente.

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§ 1º Os direitos, conferidos ao herdeiro em consequência de substituição ou de direito
de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.

* Ademais, vale observar que, como a herança é considerada uma universalidade, o herdeiro
somente pode cedê-la integralmente ou uma fração ideal dela, mas nunca poderá realizar a
cessão de bens isolados, já que, até a partilha, é coproprietário de todos os bens que
integram o monte, não titularizando bens específicos. Nesse sentido:

Art. 1.793. Caput.


[...]
§ 2º. É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem
da herança considerado singularmente.
§ 3º. Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer
herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade.

* Consequência da indivisibilidade da herança e de sua natureza condominial (art. 1.791,


parágrafo único) está refletida no seguinte dispositivo:

Art. 1.794. O co-herdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à
sucessão, se outro co-herdeiro a quiser, tanto por tanto.

Art. 1.795. O co-herdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão, poderá,


depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até cento e
oitenta dias após a transmissão.

Parágrafo único. Sendo vários os co-herdeiros a exercer a preferência, entre eles se


distribuirá o quinhão cedido, na proporção das respectivas quotas hereditárias.

Nota: Sendo assim, se o herdeiro “A” alienar sua quota hereditária a pessoa alheia ao
condomínio hereditário, sem o consentimento dos demais herdeiros “B” e “C”, estes
poderão, observado o prazo de até 180 dias a contar da cessão, reclamar para si o
quinhão irregularmente cedido. Nesse caso, a quota reclamada não será dividida
necessariamente em partes iguais, mas proporcionalmente à participação de cada
herdeiro reclamante.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SUCESSÕES. VIOLAÇÃO DO ART.


535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. INVENTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART.
522 DO CPC/1973. CESSÃO ONEROSA DE QUOTA HEREDITÁRIA À TERCEIRO. DIREITO DE
PREFERÊNCIA DOS COERDEIROS. ARTS. 1.794 E 1.795 DO CÓDIGO CIVIL. AQUISIÇÃO
TANTO POR TANTO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. NECESSIDADE. INDICAÇÃO DE PREÇO E
CONDIÇÕES DE PAGAMENTO. IMPRESCINDIBILIDADE.
1. É permitido ao herdeiro capaz ceder a terceiro, no todo ou em parte, os direitos que
lhe assistem em sucessão aberta.
2. A alienação de direitos hereditários a pessoa estranha à sucessão exige, por força do
que dispõem os arts. 1.794 e 1.795 do Código Civil, que o herdeiro cedente tenha
oferecido aos coerdeiros sua quota parte, possibilitando a qualquer um deles o exercício
do direito de preferência na aquisição, "tanto por tanto", ou seja, por valor idêntico e

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pelas mesmas condições de pagamento concedidas ao eventual terceiro estranho
interessado na cessão.
3. À luz do que dispõe o art. 1.795 do Código Civil e em atenção ao princípio da boa-fé
objetiva, o coerdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão, poderá, depositado o
preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até 180 (cento e oitenta)
dias após ter sido cientificado da transmissão.
4. No caso, apesar de o recorrente ter sido chamado a se manifestar a respeito de
eventual interesse na aquisição da quota hereditária de seu irmão, não foi naquele ato
cientificado a respeito do preço e das condições de pagamento que foram avençadas
entre este e terceiro estranho à sucessão, situação que revela a deficiência de sua
notificação por obstar o exercício do direito de preferência do coerdeiro na aquisição,
tanto por tanto, do objeto da cessão.
5. Recurso especial provido.
(REsp 1620705/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 21/11/2017, DJe 30/11/2017)

* Não se deve confundir a cessão da herança com a cessão da meação.

DIREITO CIVIL. FORMA PRESCRITA EM LEI PARA A CESSÃO GRATUITA DE MEAÇÃO.

A lavratura de escritura pública é essencial à validade do ato praticado por viúva


consistente na cessão gratuita, em favor dos herdeiros do falecido, de sua meação sobre
imóvel inventariado cujo valor supere trinta salários mínimos, sendo insuficiente, para
tanto, a redução a termo do ato nos autos do inventário. Isso porque, a cessão gratuita
da meação não configura uma renúncia de herança, que, de acordo com o art. 1.806 do
CC, pode ser efetivada não só por instrumento público, mas também por termo judicial.
Trata-se de uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do CC, far-se-á por
escritura pública ou instrumento particular, devendo-se observar, na hipótese, a
determinação contida no art. 108 do CC, segundo a qual "a escritura pública é essencial
à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou
renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário
mínimo vigente no País". De fato, enquanto a renúncia da herança pressupõe a abertura
da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro -
a posse ou a propriedade dos bens do de cujus transmitem-se aos herdeiros quando e
porque aberta a sucessão (princípio do saisine) -, a meação, de outro modo, independe
da abertura da sucessão e pode ser objeto de ato de disposição pela viúva a qualquer
tempo, seja em favor dos herdeiros ou de terceiros, já que aquele patrimônio é de
propriedade da viúva em decorrência do regime de bens do casamento. Além do mais,
deve-se ressaltar que o ato de disposição da meação também não se confunde com a
cessão de direitos hereditários (prevista no art. 1.793 do CC), tendo em vista que esta
também pressupõe a condição de herdeiro do cedente para que possa ser efetivada.
Todavia, ainda que se confundissem, a própria cessão de direitos hereditários exige a
lavratura de escritura pública para sua efetivação, não havendo por que prescindir dessa
formalidade no que tange à cessão da meação. REsp 1.196.992-MS, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 6/8/2013.

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§ 19. Prazo para abertura do inventário

* O art. 1.796 do CCB foi revogado pelo art. 611 do NCPC:

CCB
Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á
inventário do patrimônio hereditário, perante o juízo competente no lugar da sucessão,
para fins de liquidação e, quando for o caso, de partilha da herança.

CPC
Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois)
meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses
subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de
parte.

§ Nota: No Estado do Ceará, o D32082/2016 estabelece que se o requerimento de abertura


de inventário ou da partilha for feito após o prazo legal, o ITCD será acrescido de multa
equivalente a:

(i) 10% (dez por cento) do seu valor, caso o atraso no requerimento do inventário ou
arrolamento não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir do falecimento
do autor da herança ou legado; ou
(ii) 20% (vinte por cento) do valor do imposto devido, caso o atraso no requerimento do
inventário ou arrolamento ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir do
falecimento do autor da herança ou legado.

§ 20. Administração da herança

* Enquanto o processo de Inventário não é instaurado, nomeado inventariante e este assumir


o compromisso, diz o CCB estabelece o seguinte:

Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá,


sucessivamente:

I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da


sucessão;
II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um
nessas condições, ao mais velho;
III - ao testamenteiro;
IV - a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos
antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao
conhecimento do juiz.

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4 DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

§ 21. Legitimação sucessória geral: requisitos e sua verificação

* O CCB trata da legitimação sucessória no dispositivo seguinte:

Art. 1.798. Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da


abertura da sucessão.

* Portanto, estar vivo [nascido ou concebido] no momento da abertura da sucessão é um


elemento essencial. Trata-se do princípio da coexistência. [Nelson Rosenvald e Cristiano
Chaves]. Assim, somente herdam aqueles que existam no momento da morte do de cujus.

* Segundo Orlando Gomes: São incapazes de suceder os indivíduos que, ao tempo da abertura
da sucessão, não estão ainda concebidos, ou premorreram ao autor da herança, a quem
sucederiam.

* O nascituro, indicado na expressão “pessoas já concebidas”, deve ser identificado como


aquele que já está concebido no ventre materno, mas ainda não nasceu.

* Questão que suscita debate envolve a fecundação artificial, seja ela homóloga [aquela que
se dá quando o óvulo e o sêmen pertencerem ao casal, pais da criança] ou heteróloga
[aquela na qual o material fertilizante é de terceiro], com prévia autorização do de cujus.

* A respeito da questão, o enunciado n. 267 do CJF: A regra do art. 1.798 do Código Civil deve
ser estendida aos embriões formados mediante o uso de técnicas de reprodução assistida,
abrangendo, assim, a vocação hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitos
patrimoniais se submetem às regras previstas para a petição da herança. Se se fala em
embrião, pressupõe-se, portanto, a concepção, não havendo que se falar em direito
sucessório em relação a óvulos ou sêmen congelados. Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves].

Nota: Sério problema ocorrerá com a possibilidade de inseminação post mortem dos
embriões excedentários. Em vida do autor da herança, o embrião só poderá ser
inseminado com autorização do próprio. Porém, após seu óbito, a autorização dada em
vida perderá seu valor. Essa autorização só poderá se efetivar através de testamento, o
ato válido para disposições post mortem, quer se trate de patrimoniais ou não. A
possibilidade de se atribuir parte da herança ao embrião inseminado após a morte do de
cujus dependerá de lei complementar que a regulamente. [Mário Roberto Carvalho de
Faria – Atualizador da obra de Orlando Gomes].

* Há, ainda, uma discussão sobre a natureza condicional da legitimação do nascituro.

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* Para uma corrente, vindo a nascer com vida, o nascituro recebe a herança ou o legado que
lhe foi dedicado; em se tratando de natimorto, não será beneficiado pela transmissão
sucessória.

* Registre-se, no entanto, que vem sendo desenvolvida tese que defende a capacidade
sucessória plena do nascituro, de modo que, o só fato deste estar concebido ao tempo da
morte do autor da herança é suficiente para deferir-lhe participação sucessória, de sorte
que, não vindo a nascer vivo (natimorto), sua quota hereditária haveria de ser transmitida
aos seus herdeiros, no caso seus pais, ou outro ascendente, conforme o caso.

* Em verdade o tema passa pela análise das teorias que discutem o início da personalidade
civil, a saber: (i) Teoria Natalista; (ii) Teoria da Personalidade Condicional; e (iii) Teoria
Concepcionista. Recorde:

* Perceba que o momento para a averiguação da legitimação para suceder é, em harmonia


com o droit de saisine, o momento da morte do titular do patrimônio.

* Por isso, são irrelevantes as modificações que se verificarem na legitimação dos sucessores
após a abertura da sucessão;

* Ademais, anote-se que animais estão naturalmente excluídos, assim da sucessão legítima
como testamentária, sendo válido observar, contudo, que, através de testamento é possível
designar alguém para receber bens e utilizá-los a manutenção e cuidado de animais. [Nelson
Rosenvald e Cristiano Chaves].

§ 22. Legitimação sucessória testamentária

* A respeito da sucessão testamentária, o CCB possui regra específica, segundo a qual:

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas
estas ao abrir-se a sucessão;
II - as pessoas jurídicas;
III - as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de
fundação.

* Segundo [Mário Roberto Carvalho de Faria – Atualizador da obra de Orlando Gomes]. Na


sucessão testamentária, os nascituros não concebidos têm capacidade sucessória, se filhos
forem de pessoa determinada, viva ao tempo da abertura da sucessão ou se instituídos por
substituição fideicomissária, hipótese em que não se exige o laço de parentesco.

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* Nesses casos, vale destacar o seguinte:

Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados,
após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

§ 1º Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo filho o


testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no art. 1.775.

§ 2º Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado, regem-se


pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no que couber.

§ 3º Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos
e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador.

§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro
esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos
herdeiros legítimos.

* Portanto: Na disposição testamentária em favor de prole eventual, não sendo o herdeiro


concebido até dois anos após a abertura da sucessão, os bens reservados serão destinados
aos herdeiros legítimos, salvo disposição em contrário do testador. [Mário Roberto Carvalho
de Faria – Atualizador da obra de Orlando Gomes].

* Trata-se do chamado prazo de espera. [Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves].

§ 23. Falta de legitimação para a sucessão testamentária

* A fim de reservar a liberdade de testar, afastando interferências indevidas, o legislador


estabelece que:

Art. 1.801. Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários:

I – a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou companheiro, ou


os seus ascendentes e irmãos;
II – as testemunhas do testamento;
III – o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver separado de
fato do cônjuge há mais de cinco anos;
IV - o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante quem se fizer, assim
como o que fizer ou aprovar o testamento.

* Consequência do descumprimento da regra acima é a nulidade absoluta da cláusula


violadora, [princípio da redução parcial da invalidade prevista no art. 184, CCB], por violação
de expressa disposição legal, nos termos do art. 166, CCB.

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* A respeito do inciso II, Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves advogam a tese de que o prazo
de cinco anos deve ser desconsiderado, tendo em vista que a pessoa casada, separada de
fato por qualquer período de tempo, pode livremente constituir união estável, nos termos
do art. 1.723 do CCB, devendo prevalecer, aqui, uma interpretação sistêmica do Codex.

* Consequência das limitações legais acima definidas, temos que:

Art. 1.802. São nulas as disposições testamentárias em favor de pessoas não legitimadas
a suceder, ainda quando simuladas sob a forma de contrato oneroso, ou feitas mediante
interposta pessoa.

Parágrafo único. Presumem-se pessoas interpostas os ascendentes, os descendentes, os


irmãos e o cônjuge ou companheiro do não legitimado a suceder.

* No entanto, por força do princípio da não discriminação inserto no art. 227, §6º, CRFB, o
CCB não poderia deixar de reconhecer, mesmo de modo redundante, que:

Art. 1.803. É lícita a deixa ao filho do concubino, quando também o for do testador.

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5 DIREITO DE DELIBERAR: DA ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA
HERANÇA

§ 24. Direito de Deliberar: noção primeira

* “A aquisição da herança opera-se em momento cronologicamente ulterior à delação,


embora se transmita, ex vi legis, com a abertura da sucessão. Ao herdeiro chamado, concede
a lei a faculdade de deliberar se aceita, ou não, a herança transmitida ipso jure. Sua
deliberação tem de ser declarada, expressa ou tacitamente, para confirmação dos efeitos
da devolução sucessória”. (ORLANDO GOMES).

* “A previsão legal da aceitação aparenta colidir com o princípio da saisine plena, que importa
transmissão imediata dos bens deixados pelo de cujus desde sua morte. Todavia, a aceitação
conforma-se ao princípio constitucional da liberdade ou de autodeterminação, pois
ninguém pode ser obrigado a receber herança, se não a deseja. Assim, a autodeterminação
do herdeiro ou do legatário tanto pode ser no sentido de confirmar quanto no de rejeitar a
herança”. (PAULO LOBO).

* Aceitação é o negócio jurídico pelo qual o herdeiro, legítimo ou testamentário, adquire


concretamente o direito à herança, transmitida ipso jure com a abertura da sucessão.
Declarando a vontade de recolher a herança, confirma o herdeiro a transmissão efetuada
ex vi legis. (ORLANDO GOMES).

* Renúncia é o negócio jurídico unilateral pelo qual o herdeiro declara não aceitar a herança.
(ORLANDO GOMES).

Nota: Admite mandato, desde que por instrumento público e com poderes especiais.

§ 25. Prazo para a deliberação

* “Não fixa a lei prazo específico para tal declaração. O direito de deliberar extingue-se,
consequentemente, no prazo da prescrição comum, tratando-se embora de caducidade. O
pronunciamento do herdeiro pode ser, entretanto, provocado por interessado”. (ORLANDO
GOMES). Vejamos:

Art. 1.807. O interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não, a herança,


poderá, vinte dias após aberta a sucessão, requerer ao juiz prazo razoável, não
maior de trinta dias, para, nele, se pronunciar o herdeiro, sob pena de se haver a
herança por aceita.

* Nesse caso: “O prazo judicial somente pode começar do momento em que o herdeiro tem
conhecimento exato da notificação para manifestar-se”. (PAULO LOBO).

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* Ademais: “Vencido o prazo, depois de devidamente notificado, tem-se a herança como
confirmada e aceita, de modo irrevogável. Dá-se a presunção legal absoluta”. (PAULO
LOBO).

* Sendo assim: “[...] quando requerido por qualquer herdeiro, o sucessível poderá renunciar
à herança; não mais, depois dele”.

* Vale observar, aqui, que na hipótese de o herdeiro ser absolutamente incapaz, notificação
deverá ser dirigida ao se representante legal. Caso se trate de relativamente incapaz,
notificados deverão ser o herdeiro e seu assistente legal. Na falta de
representante/assistente, por óbvio, o prazo não se inicia. Em relação ao nascituro, o prazo
somente se inicia se ocorrer o nascimento com vida. Nesse sentido PAULO LOBO.

* “Se o herdeiro falecer antes de declarar se aceita, ou não, a herança, o direito de deliberar
transmite-se a seus sucessores”. (ORLANDO GOMES). É o que está previsto no CCB 1.809:

Art. 1.809. Falecendo o herdeiro antes de declarar se aceita a herança, o poder de aceitar
passa-lhe aos herdeiros, a menos que se trate de vocação adstrita a uma condição
suspensiva, ainda não verificada.

Parágrafo único. Os chamados à sucessão do herdeiro falecido antes da aceitação, desde


que concordem em receber a segunda herança, poderão aceitar ou renunciar a primeira.

Nota: Sendo assim, se “João Filho” (herdeiro de “João”) falecer antes de se


manifestar sobre a aceitação da herança deixada por “João” (considerada como
primeira herança), “João Neto” (herdeiro de “João Filho”), se aceitar a herança
deixada por “João Filho” (considerada como segunda herança), poderá deliberar
(isto é, aceitar ou renunciar) a primeira herança (isto é, aquela deixada por “João”).

* “A aceitação apenas pode ser considerada se feita após a morte do autor da herança. A
aceitação prévia é tida como juridicamente inexistente e não apenas como inválida ou
ineficaz. A inexistência da aceitação prévia decorre do princípio do direito brasileiro de
vedação total de qualquer ato que tenha por objeto herança de pessoa viva, denominado
de pacto sucessório”. (PAULO LOBO).

§ 26. Teor da deliberação

* De acordo com o CCB a deliberação (aceitação ou renúncia) não pode ser parcial, condicional
ou a termo.

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Art. 1.808. Não se pode aceitar ou renunciar a herança em parte, sob condição ou a
termo.

§ 1º. O herdeiro, a quem se testarem legados, pode aceitá-los, renunciando a herança;


ou, aceitando-a, repudiá-los..

Nota: Assim “[...] havendo prelegado, isto é, legado deferido a um herdeiro, este
pode aceitá-lo e recusar a herança, ou aceitar esta e repudiar o legado, já que não
se confundem os dois títulos sucessórios [...]”. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

§ 2º. O herdeiro, chamado, na mesma sucessão, a mais de um quinhão hereditário, sob


títulos sucessórios diversos, pode livremente deliberar quanto aos quinhões que aceita e
aos que renuncia.

Nota: “[...] permite-se a um herdeiro legal ou legítimo, sucessor de uma quota-


parte da herança, quando for beneficiado, mediante testamento, com outra quota-
parte do mesmo acervo hereditário, que renuncie a uma delas, conservando o
direito de aceitar a outra. Aqui, embora os títulos sejam semelhantes, a saber,
sucessão legítima e sucessão testamentária, ambas a título universal, as origens
delas são diversas, vale dizer, a primeira decorre da lei e a segunda da vontade do
testador”. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

§ 27. Efeitos da deliberação

* Vale observar, aqui, o seguinte: “Não se entenda que a transmissão da herança por força de
lei é provisória, que apenas se convolaria em definitiva com a aceitação do herdeiro. A
transmissão não é provisória, pendente ou suspensa. A transmissão já existiu plenamente
desde a abertura da sucessão, e o herdeiro apenas confirma essa situação jurídica”. (PAULO
LOBO).

* No caso de aceitação, a herança tem-se por transmitida definitivamente ao herdeiro, com


efeito ex tunc.

Art. 1.804. Aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a
abertura da sucessão.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. SUCESSÕES. HERANÇA. ACEITAÇÃO TÁCITA. ART.


1.804 DO CÓDIGO CIVIL. ABERTURA DE INVENTÁRIO. ARROLAMENTO DE BENS.
RENÚNCIA POSTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. ARTS. 1.809 E 1.812 DO CÓDIGO CIVIL. ATO
IRRETRATÁVEL E IRREVOGÁVEL.
1. A aceitação da herança, expressa ou tácita, torna definitiva a qualidade de herdeiro,
constituindo ato irrevogável e irretratável.

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2. Não há falar em renúncia à herança pelos herdeiros quando o falecido, titular do
direito, a aceita em vida, especialmente quando se tratar de ato praticado depois da
morte do autor da herança.
3. O pedido de abertura de inventário e o arrolamento de bens, com a regularização
processual por meio de nomeação de advogado, implicam a aceitação tácita da herança.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1622331/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 08/11/2016, DJe 14/11/2016)

* Caso renunciada a herança, por óbvio, considera-se que a herança não se transmitiu ao
herdeiro.

Art. 1.804. Caput.


Parágrafo único. A transmissão tem-se por não verificada quando o herdeiro renuncia à
herança.

* Outro efeito que pode ser indicado:

Art. 1.810. Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros
da mesma classe e, sendo ele o único desta, devolve-se aos da subsequente.

Nota: Sendo assim, se o JOÃO – irmão de JOSÉ e MARIA, todos filhos de PEDRO –
renunciar a herança deixada pelo pai, sua quota será devolvida ao monte,
beneficiando seus irmãos. Acaso todos os filhos (herdeiros de primeiro grau na
classe dos descendente) renunciem a herança, devem ser chamados os netos
(herdeiros de segundo grau na classe dos descentedente) e assim sucessivamente.

Art. 1.811. Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele
for o único legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem a
herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito próprio, e por cabeça.

Nota: “[...] os herdeiros do renunciante jamais dele poderão herdar por direito de
representação, uma vez que ele é considerado, por força da eficácia retroativa de
seu repúdio, como aquele que nunca foi sucessor do falecido, não sendo, pois, nem
pré-morto, nem a este equiparado”. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

Nota: Aqui uma consequência lógica do artigo anterior. Veja. Foi dito que se JOÃO
– irmão de JOSÉ e MARIA, todos filhos de PEDRO – renunciar a herança deixada
pelo pai, sua quota será devolvida ao monte, beneficiando seus irmãos (herdeiros
de primeiro grau na classe dos descendentes). No entanto, caso JOÃO fosse filho
único, seus filhos poderiam participar da sucessão do avô PEDRO. Caso JOÃO, JOSÉ
e MARIA, tendo filhos, renunciassem a herança, seus filhos (netos de PEDRO)
seriam os chamados a suceder, não representando seus pais, mas por direito

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próprio (já que os renunciantes são considerados como se nunca houvessem
existido) e por cabeça (isto é, dividindo-se a herança em tantas partes quantos
sejam os netos de PEDRO).

* Por fim, a irrevogabilidade da deliberação pode ser indicada como um de seus efeitos, nos
termos do artigo seguinte do CCB:

Art. 1.812. São irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança.

* Um caso de anulação do ato de renúncia, em razão de erro

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. INADMISSIBILIDADE DO AGRAVO POR DIFERENTES


PRECLUSÕES. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INOCORRÊNCIA EM VIRTUDE DOS
DISTINTOS OBJETOS RECURSAIS. RENÚNCIA À HERANÇA DOS HERDEIROS EM FAVOR DA
CÔNJUGE SOBREVIVENTE. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. RENÚNCIA ABDICATIVA.
INOCORRÊNCIA. SURGIMENTO POSTERIOR DE NOVO HERDEIRO. ERRO SUBSTANCIAL
QUANTO AO OBJETO DA RENÚNCIA CONFIGURADO. ANULAÇÃO DOS ATOS DECISÓRIOS
NA AÇÃO DE INVENTÁRIO, COM A CONSEQUENTE INVALIDAÇÃO DA RENÚNCIA
ANTERIORMENTE REALIZADA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO.

1- Ação distribuída em 01/02/2011. Recurso especial interposto em 22/05/2013 e


atribuído à Relatora em 25/08/2016.
2- Os propósitos recursais consistem em definir se o agravo de instrumento interposto
pelos recorridos era admissível diante da alegação de ocorrência de preclusão e, ainda,
se a renúncia anteriormente realizada pelos herdeiros foi abdicativa, em favor do monte-
mor, ou translativa, mediante cessão de direitos hereditários feita em favor
especificamente da viúva meeira.
3- A alegada existência de preclusão em virtude de ter o juízo de 1º grau enfrentado a
questão controvertida em momento anterior não foi examinada pelo acórdão recorrido,
o que torna inviável o recurso especial, nesse particular, por ausência de
prequestionamento.
Incidência da Súmula 211/STJ.
4- Havendo substanciais diferenças entre o que fora decidido pelo Tribunal na apelação,
por meio da qual foram nulificados todos os atos decisórios tomados na ação de
inventário em função da ausência de litisconsorte passiva necessária, e o que fora
decidido no agravo, em que se reconheceu a invalidade da renúncia à herança
anteriormente realizada pelos herdeiros em favor da genitora, igualmente não há que se
falar em preclusão e em violação aos arts.
522, 527, I e 557, todos do CPC/73.
5- Apurada a intenção dos demais herdeiros era de renunciar à herança especificamente
em favor da genitora e cônjuge sobrevivente, o que configura a renúncia translativa ou
cessão de direitos hereditários, a eventual existência de vícios de linguagem na
celebração do negócio jurídico que poderiam induzir à existência de renúncia abdicativa

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pode ser relevada, a fim de que seja atingido o propósito efetivamente almejado pelas
partes.
6- Caracteriza-se a existência de erro substancial quanto ao objeto principal da
declaração apto a invalidar o negócio jurídico na hipótese em que, renunciada a herança
pelos demais herdeiros em favor da cônjuge sobrevivente - renúncia translativa ou cessão
de direitos hereditários - descobre-se, posteriormente, a existência de herdeiro de que
não se tinha ciência inequívoca no momento do ato de disposição.
7- O Tribunal na origem, ao nulificar todos os atos decisórios em virtude da ausência de
litisconsorte passiva necessária, também decretou por arrastamento a nulidade da
própria renúncia à herança anteriormente realizada, pois, a despeito de se tratar de ato
de disposição de natureza preponderantemente material, a renúncia à herança também
possui um requisito de validade específico de índole processual, a saber, a exigência legal
de que ocorra por meio de termo judicial.
8- Não se conhece do recurso especial interposto ao fundamento de dissídio
jurisprudencial se ausente o cotejo analítico dos julgados tidos por divergentes.
9- Recurso especial conhecido em parte e, na parte conhecida, desprovido.
(REsp 1402675/RN, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
12/12/2017, DJe 18/12/2017)

§ 28. Forma da deliberação

A) Forma da aceitação:

* A aceitação pode ser: (i) expressa, que se faz deliberada e objetivamente por declaração
escrita; ou (ii) tácita ou presumida, isto é, que, para se configurar, requer “a prática de
um fato concludente, incompatível com a vontade de renunciar, com existência objetiva,
isto é, independentemente de averiguação do ânimo de aceitar”. (ORLANDO GOMES). Nesse
sentido temos:

Art. 1.805. A aceitação da herança, quando expressa, faz-se por declaração escrita;
quando tácita, há de resultar tão somente de atos próprios da qualidade de herdeiro.

§ 1º. Não exprimem aceitação de herança os atos oficiosos, como o funeral do finado, os
meramente conservatórios, ou os de administração e guarda provisória.

Nota: De acordo com SÍLVIO DE SALVO VENOSA: “Esses atos, descritos


exemplificativamente no texto, não exprimem aceitação, mas são fortes indícios de
que ela tenha efetivamente ocorrido”. O autor recorda a lição de CLÓVIS
BEVILÁQUA, para quem atos oficiosos são “[...] os que se praticam
desinteressadamente, no intuito de prestar um favor, ser agradável, de satisfazer
sentimentos piedosos ou humanitários”. Igualmente são considerados oficiosos os
atos praticados em cumprimento de obrigação legal [como o requerimento de

direito_sucessões_dac_2020.1 Página 38 de 130


abertura de inventário] ou mesmo de obrigação natural [tal como o pagamento
espontâneo de dívida do de cujus, com dinheiro próprio].

§ 2º. Não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples, da herança,
aos demais co-herdeiros.

Nota: Segundo SÍLVIO DE SALVO VENOSA: “Quem cede gratuitamente a herança


nunca teve realmente a intenção de ser herdeiro. [...] O legislador entende que
nessa hipótese há renúncia da herança”.

B) Forma da renúncia:

* Admite apenas a forma expressa. Vejamos:

Art. 1.806. A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público


ou termo judicial.

DIREITO CIVIL. RENÚNCIA À HERANÇA POR PROCURADOR. REQUISITOS FORMAIS.


A constituição de procurador com poder especial para renunciar à herança de valor
superior a trinta vezes o maior salário mínimo deve ser feita por instrumento público ou
termo judicial para ter validade. Segundo o art. 1.806 do CC, a renúncia da herança deve
constar expressamente de instrumento público ou termo judicial. Tal formalidade é uma
decorrência lógica do previsto nos arts. 88, II, e 108 do mesmo diploma legal. Segundo o
art. 80, II, considera-se bem imóvel a sucessão aberta. Já o art. 108 do mesmo código
determina que a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem
à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de
valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo. Assim, se a renúncia feita pelo
próprio sucessor só tem validade se expressa em instrumento público ou termo judicial
(art. 1.806 do CC), a transmissão de poderes para tal desiderato deverá observar a mesma
formalidade. REsp 1.236.671-SP, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão
Min. Sidnei Beneti, julgado em 9/10/2012.

§ 29. Inviolabilidade do direito de terceiros

* Reflexo do princípio da Boa-Fé Objetiva, o CCB estabelece que:

Art. 1.813. Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à herança,


poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante.

§ 1º. A habilitação dos credores se fará no prazo de trinta dias seguintes ao conhecimento
do fato.

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§ 2º. Pagas as dívidas do renunciante, prevalece a renúncia quanto ao remanescente, que
será devolvido aos demais herdeiros.

Nota: A presente regra somente faz sentido se o herdeiro for devedor insolvente,
isso porque, se possui bens suficientes para saldar suas dívidas, a renúncia à
herança não colocará em risco o adimplemento de suas obrigações.

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6 HERANÇA JACENTE E HERANÇA VACANTE

§ 30. Da Herança Jacente: aspectos gerais

* Hereditas jacens, a que jaz à espera de ser aceita.

* Trata-se de um estado temporário, é dizer, transitório da herança, compreendido entre o


período da delação e a aceitação ou repúdio pelo herdeiro estranho.

* Segundo Clóvis Beviláqua, herança jacente é aquela cujos herdeiros ainda não se
conhecem, quae heredem nondum habetm, sed habere sperat, diferindo da herança vaga,
em que sequer há herdeiro, razão pela qual é devolvida ao Estado: vacans vero quae nec
habet nec habere esperat.

* Saliente-se que há, ainda, quem afirme sobre a ocorrência de herança jacente em hipóteses
não afetadas à sucessão legal a favor do Poder Público, a saber: (i) na hipótese do filho já
concebido, mas ainda não nascido; (ii) enquanto se aguarda a constituição de pessoa
jurídica; (iii) à espera do nascimento de filho ainda não concebido, nos termos do art. 1.799,
inciso I, do Código Civil (sucessão testamentária).

* A herança jacente está tratada no CCB da seguinte maneira:

Art. 1.819. Falecendo alguém sem deixar testamento nem herdeiro legítimo
notoriamente conhecido, os bens da herança, depois de arrecadados, ficarão sob a
guarda e administração de um curador, até a sua entrega ao sucessor devidamente
habilitado ou à declaração de sua vacância.

§ 31. Aspectos procedimentais: Arrecadação dos bens

* Os bens que sejam considerados jacentes são, inicialmente, arrecadados e inventariados


[não no sentido processual, mas no sentido de organizados]. Acerca disso, estabelece o CPC
o seguinte:

CPC

Art. 738. Nos casos em que a lei considere jacente a herança, o juiz em cuja comarca
tiver domicílio o falecido procederá imediatamente à arrecadação dos respectivos bens.

Art. 739. A herança jacente ficará sob a guarda, a conservação e a administração de um


curador até a respectiva entrega ao sucessor legalmente habilitado ou até a declaração
de vacância.

Art. 741. Ultimada a arrecadação, o juiz mandará expedir edital, que será publicado na
rede mundial de computadores, no sítio do tribunal a que estiver vinculado o juízo e na

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plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça, onde permanecerá por 3 (três)
meses, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da comarca, por 3 (três)
vezes com intervalos de 1 (um) mês, para que os sucessores do falecido venham a
habilitar-se no prazo de 6 (seis) meses contado da primeira publicação.

§ 1º Verificada a existência de sucessor ou de testamenteiro em lugar certo, far-se-á a


sua citação, sem prejuízo do edital.

§ 2º Quando o falecido for estrangeiro, será também comunicado o fato à autoridade


consular.

§ 3º Julgada a habilitação do herdeiro, reconhecida a qualidade do testamenteiro ou


provada a identidade do cônjuge ou companheiro, a arrecadação converter-se-á em
inventário.

§ 32. Aspectos procedimentais: Publicidade e declaração da vacância

* Após a fase de arrecadação e já havendo sido indicado curador para administrar a herança
jacente, inicia-se a fase de publicidade, em que serão convocados eventuais interessados.
Vejamos:

CCB

Art. 1.820. Praticadas as diligências de arrecadação e ultimado o inventário, serão


expedidos editais na forma da lei processual, e, decorrido um ano de sua primeira
publicação, sem que haja herdeiro habilitado, ou penda habilitação, será a herança
declarada vacante.

CPC.

Art. 743. Passado 1 (um) ano da primeira publicação do edital e não havendo herdeiro
habilitado nem habilitação pendente, será a herança declarada vacante.

§ 1º Pendendo habilitação, a vacância será declarada pela mesma sentença que a julgar
improcedente, aguardando-se, no caso de serem diversas as habilitações, o julgamento
da última.

§ 2º Transitada em julgado a sentença que declarou a vacância, o cônjuge, o


companheiro, os herdeiros e os credores só poderão reclamar o seu direito por ação
direta.

§ 33. Aspectos procedimentais: habilitação tardia dos herdeiros e transmissão da


propriedade para a Fazenda Pública

* Acerca da transferência da propriedade dos bens para o Poder Público:

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CCB

Art. 1.822. A declaração de vacância da herança não prejudicará os herdeiros que


legalmente se habilitarem; mas, decorridos cinco anos da abertura da sucessão, os bens
arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas
respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União quando situados em
território federal.

* Assim temos que: [...] decretada a vacância da herança antes de cinco anos da morte do
hereditando, a propriedade dos bens que compõem o monte hereditário é ainda resolúvel
para o Poder Público, pois, enquanto não alcançado o termo final de tal prazo, pode surgir
alguém, pretendendo – porém agora somente por ação própria, quais sejam, a ação de
petição de herança cumulada ou não com a investigatória de paternidade, a ação de petição
de legado, ou, então, a ação de cobrança – o reconhecimento de sua condição de sucessor
legal, de sucessor testamentário, de legatário ou de credor. No entanto, alcançado o prazo
em questão, ou seja, cinco anos, contados a partir da morte do hereditando, já tendo sido
proferida anteriormente a sentença de vacância sem que tenham sido propostas as
demandas próprias, ou, então, havendo tal propositura dentro de tal prazo, tendo sido,
contudo, os pedidos definitivamente rejeitados, aí sim o poder público torna-se proprietário
pleno e irrestrito do monte hereditário líquido, nos termos do já mencionado art. 1.822 do
Código Civil. [LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO].

* A posição dos colaterais. De acordo com o CCB:

Art. 1.822. Caput.

Parágrafo único. Não se habilitando até a declaração de vacância, os colaterais ficarão


excluídos da sucessão.

* De acordo com [LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO], a redação do parágrafo único do art.
1.822 foi na contramão do que estabelecia o CPC/73, que não criava distinções entre
herdeiros colaterais e os ascendentes e descendentes e, por isso, foi bastante criticado.
Atualmente, Código de Processo Civil de 2015, art. 743, § 2º, dispõe que: “Transitada em
julgado a sentença que declarou a vacância, o cônjuge, o companheiro, os herdeiros e os
credores só poderão reclamar o seu direito por ação direta”. Assim, temos que a atual
redação do parágrafo único do art. 1.822 do Código Civil de 2002, não mais subsiste em
nosso ordenamento, incompatível com o novo diploma processual civil.

* Quanto às pretensões de credores do de cujus temos o seguinte:

CCB

Art. 1.821. É assegurado aos credores o direito de pedir o pagamento das dívidas
reconhecidas, nos limites das forças da herança.

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CPC

Art. 741. Caput.


[...]
§ 4º Os credores da herança poderão habilitar-se como nos inventários ou propor a ação
de cobrança.

Art. 1.823. Quando todos os chamados a suceder renunciarem à herança, será esta desde
logo declarada vacante.

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7 ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

§ 34. Aspectos Gerais da Ordem de Vocação Hereditária

* Entenda o presente tópico como uma ordem preferencial sucessória.

§ Nota: inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CCB

Atualmente, está pacificado o entendimento a respeito da inconstitucionalidade do


artigo 1.790 do CCB6, que estabelecia regra específica para a sucessão dos companheiros.
Vejamos:

STF
Ementa: Direito constitucional e civil. Recurso extraordinário. Repercussão geral.
Aplicação do artigo 1.790 do Código Civil à sucessão em união estável homoafetiva.
Inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre cônjuges e
companheiros. 1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família
legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas
mediante união estável, hetero ou homoafetivas. O STF já reconheceu a “inexistência
de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição
de um novo e autonomizado núcleo doméstico”, aplicando-se a união estável entre
pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e mesas consequências da união estável
heteroafetiva (ADI 4277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, j. 05.05.2011) 2. Não é
legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a
família formada pelo casamento e a formada por união estável. Tal hierarquização
entre entidades familiares é incompatível com a Constituição de 1988. Assim sendo, o
art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nº 8.971/1994 e nº 9.278/1996 e
discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos sucessórios bem
inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios
da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade como vedação à proteção
deficiente e da vedação do retrocesso. 3. Com a finalidade de preservar a segurança
jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em
que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha e às partilhas
extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública. 4. Provimento do recurso

6 Importante conhecer o teor do dispositivo legal em comento:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos
onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um
daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

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extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “No sistema
constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre
cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime
estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”. (RE 646721, Relator(a): Min. MARCO
AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em
10/05/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-204 DIVULG
08-09-2017 PUBLIC 11-09-2017)

Disponível em:
http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCL
A%2E+E+646721%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+646721%2EAC
MS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/mzepo8h

Ementa: Direito constitucional e civil. Recurso extraordinário. Repercussão geral.


Inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre cônjuges e
companheiros. 1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família
legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas
mediante união estável. 2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os
cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por
união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a
Constituição de 1988. 3. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis
nºs 8.971/94 e 9.278/96 e discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe
direitos sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em
contraste com os princípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade
como vedação à proteção deficiente, e da vedação do retrocesso. 4. Com a finalidade
de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos
inventários judiciais em que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de
partilha, e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública. 5.
Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte
tese: “No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos,
o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”. (RE 878694, Relator(a): Min.
ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2017, PROCESSO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-021 DIVULG 05-02-2018 PUBLIC 06-02-2018)

Disponível em:
http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCL
A%2E+E+878694%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+878694%2EAC
MS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/mkd8twz

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STJ

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES.


DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO ENTRE CÔNJUGES E COMPANHEIROS.
IMPOSSIBILIDADE. ART. 1.790 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INCONSTITUCIONALIDADE.
STF. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. ART. 1.829 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
PRINCÍPIOS DA IGUALDADE, DIGNIDADE HUMANA, PROPORCIONALIDADE E DA
RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA. VEDAÇÃO AO RETROCESSO. APLICABILIDADE.
1. No sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado em ambos os casos
o regime estabelecido no artigo 1.829 do CC/2002, conforme tese estabelecida pelo
Supremo Tribunal Federal em julgamento sob o rito da repercussão geral (Recursos
Extraordinários nºs 646.721 e 878.694).
2. O tratamento diferenciado acerca da participação na herança do companheiro ou
cônjuge falecido conferido pelo art. 1.790 do Código Civil/2002 ofende frontalmente
os princípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade e da vedação
ao retrocesso.
3. Ausência de razoabilidade do discrímen à falta de justo motivo no plano sucessório.
4. Recurso especial provido. (REsp 1332773/MS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS
CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 01/08/2017)

Disponível em:
http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=201201396745.REG.

* Dito isto, veremos que as classes sucessórias, fundamentais são:

1ª. Classe dos descendentes;


2ª. Classe dos ascendentes
3ª. Classe do cônjuge supérstite/companheiro;
4ª. Classe dos colaterais até o 4º grau (2º grau, os irmãos; 3º grau, tios e sobrinhos; 4º grau,
primos, tios avós e sobrinhos netos).
5ª. Poder Público que, embora não mais considerado como herdeiro, é o último dos
sucessores legais.

* Vejamos os detalhes do texto legal:

§ 35. Sucessão dos descendentes em concorrência com o cônjuge ou


companheiro

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este


com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens

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(art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança
não houver deixado bens particulares;

* Interpretando o artigo 1.829, I do CCB, temos que haverá concorrência dos descendentes
com o cônjuge, salvo se este for casado com o falecido:

a) No regime da comunhão universal; ou


b) No da separação obrigatória de bens (art. 1.641. Veja que o legislador errou ao fazer
referência ao art. 1.640); ou
c) No regime da comunhão parcial e o autor da herança não houver deixado bens
particulares.

DIREITO CIVIL. CÔNJUGE SUPÉRSTITE CASADO EM REGIME DE SEPARAÇÃO


CONVENCIONAL E SUCESSÃO "CAUSA MORTIS".

No regime de separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente concorre na


sucessão causa mortis com os descendentes do autor da herança. Quem determina a
ordem da vocação hereditária é o legislador, que pode construir um sistema para a
separação em vida diverso do da separação por morte. E ele o fez, estabelecendo um
sistema para a partilha dos bens por causa mortis e outro sistema para a separação em
vida decorrente do divórcio. Se a mulher se separa, se divorcia, e o marido morre, ela não
herda. Esse é o sistema de partilha em vida. Contudo, se ele vier a morrer durante a união,
ela herda porque o Código a elevou à categoria de herdeira. São, como se vê, coisas
diferentes. Ademais, se a lei fez algumas ressalvas quanto ao direito de herdar em razão
do regime de casamento ser o de comunhão universal ou parcial, ou de separação
obrigatória, não fez nenhuma quando o regime escolhido for o de separação de bens não
obrigatório, de forma que, nesta hipótese, o cônjuge casado sob tal regime, bem como
sob comunhão parcial na qual não haja bens comuns, é exatamente aquele que a lei
buscou proteger, pois, em tese, ele ficaria sem quaisquer bens, sem amparo, já que,
segundo a regra anterior, além de não herdar (em razão da presença de descendentes)
ainda não haveria bens a partilhar. Essa, aliás, é a posição dominante hoje na doutrina
nacional, embora não uníssona. No mesmo sentido, caminha o Enunciado 270 do CJF,
aprovado na III Jornada de Direito Civil, ao dispor que: "O art. 1.829, inc. I, só assegura ao
cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da
herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados
nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse
bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os
bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes". Ressalta-
se ainda que o art. 1.829, I, do CC, ao elencar os regimes de bens nos quais não há
concorrência entre cônjuge supérstite e descendentes do falecido, menciona o da
separação obrigatória e faz constar entre parênteses o art. 1.640, parágrafo único.
Significa dizer que a separação obrigatória a que alude o dispositivo é aquela prevista no

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artigo mencionado entre parênteses. Como registrado na doutrina, a menção ao art.
1.640 constitui equívoco a ser sanado. Tal dispositivo legal não trata da questão. A
referência correta é ao art. 1.641, que elenca os casos em que é obrigatória a adoção do
regime de separação. Nessas circunstâncias, uma única conclusão é possível: quando o
art. 1.829, I, do CC diz separação obrigatória, está referindo-se apenas à separação legal
prevista no art. 1.641, cujo rol não inclui a separação convencional. Assim, de acordo com
art. 1.829, I, do CC, a concorrência é afastada apenas quanto ao regime da separação
legal de bens prevista no art. 1.641 do CC, uma vez que o cônjuge, qualquer que seja o
regime de bens adotado pelo casal, é herdeiro necessário (art. 1.845 do CC). Precedentes
citados: REsp 1.430.763-SP, Terceira Turma, DJe 2/12/2014; e REsp 1.346.324-SP,
Terceira Turma, DJe 2/12/2014. REsp 1.382.170-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. para
acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 22/4/2015, DJe 26/5/2015.

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DIREITO CIVIL. SUCESSÃO CAUSA MORTIS E REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS.


O cônjuge sobrevivente casado sob o regime de comunhão parcial de bens concorrerá
com os descendentes do cônjuge falecido apenas quanto aos bens particulares
eventualmente constantes do acervo hereditário. O art. 1.829, I, do CC estabelece que o
cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes do falecido, salvo se casado: i) no
regime da comunhão universal; ou ii) no da separação obrigatória de bens (art. 1.641, e
não art. 1.640, parágrafo único); ou, ainda, iii) no regime da comunhão parcial, quando o
autor da herança não houver deixado bens particulares. Com isso, o cônjuge supérstite é
herdeiro necessário, concorrendo com os descendentes do morto, desde que casado
com o falecido no regime: i) da separação convencional (ou consensual), em qualquer
circunstância do acervo hereditário (ou seja, existindo ou não bens particulares do
falecido); ou ii) da comunhão parcial, apenas quando tenha o de cujus deixado bens
particulares, pois, quanto aos bens comuns, já tem o cônjuge sobrevivente o direito à
meação, de modo que se faz necessário assegurar a condição de herdeiro ao cônjuge
supérstite apenas quanto aos bens particulares. Dessa forma, se o falecido não deixou
bens particulares, não há razão para o cônjuge sobrevivente ser herdeiro, pois já tem a
meação sobre o total dos bens em comum do casal deixados pelo inventariado, cabendo
a outra metade somente aos descendentes deste, estabelecendo-se uma situação de
igualdade entre essas categorias de herdeiros, como é justo. Por outro lado, se o falecido
deixou bens particulares e não se adotar o entendimento ora esposado, seus
descendentes ficariam com a metade do acervo de bens comuns e com o total dos bens
particulares, em clara desvantagem para o cônjuge sobrevivente. Para evitar essa
situação, a lei estabelece a participação do cônjuge supérstite, agora na qualidade de
herdeiro, em concorrência com os descendentes do morto, quanto aos bens particulares.
Assim, impõe uma situação de igualdade entre os interessados na partilha, pois o cônjuge
sobrevivente permanece meeiro em relação aos bens comuns e tem participação na
divisão dos bens particulares, como herdeiro necessário, concorrendo com os
descendentes. A preocupação do legislador de colocar o cônjuge sobrevivente na

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condição de herdeiro necessário, em concorrência com os descendentes do falecido,
assenta-se na ideia de garantir ao cônjuge supérstite condições mínimas para sua
sobrevivência, quando não possuir obrigatória ou presumida meação com o falecido
(como ocorre no regime da separação convencional) ou quando a meação puder ser até
inferior ao acervo de bens particulares do morto, ficando o cônjuge sobrevivente (mesmo
casado em regime de comunhão parcial) em desvantagem frente aos descendentes.
Noutro giro, não se mostra acertado o entendimento de que deveria prevalecer para fins
sucessórios a vontade dos cônjuges, no que tange ao patrimônio, externada na ocasião
do casamento com a adoção de regime de bens que exclua da comunhão os bens
particulares de cada um. Com efeito, o regime de bens tal qual disciplinado no Livro de
Família do Código Civil, instituto que disciplina o patrimônio dos nubentes, não rege o
direito sucessório, embora tenha repercussão neste. Ora, a sociedade conjugal se
extingue com o falecimento de um dos cônjuges (art. 1.571, I, do CC), incidindo, a partir
de então, regras próprias que regulam a transmissão do patrimônio do de cujus, no
âmbito do Direito das Sucessões, que possui livro próprio e específico no Código Civil.
Assim, o regime de bens adotado na ocasião do casamento é considerado e tem
influência no Direito das Sucessões, mas não prevalece tal qual enquanto em curso o
matrimônio, não sendo extensivo a situações que possuem regulação legislativa própria,
como no direito sucessório (REsp 1.472.945-RJ, Terceira Turma, DJe de 19/11/2014). Por
fim, ressalte-se que essa linha exegética é a mesma chancelada no Enunciado 270 do
Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil. Precedente citado:
REsp 974.241-DF, Quarta Turma, DJe 5/10/2011. REsp 1.368.123-SP, Rel. Min. Sidnei
Beneti, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 22/4/2015, DJe 8/6/2015.
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RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO E PARTILHA. REGIME DE


BENS. SEPARAÇÃO CONVENCIONAL. PACTO ANTENUPCIAL POR ESCRITURA PÚBLICA.
CÔNJUGE SOBREVIVENTE. CONCORRÊNCIA NA SUCESSÃO HEREDITÁRIA COM
DESCENDENTES. CONDIÇÃO DE HERDEIRO. RECONHECIMENTO. EXEGESE DO ART. 1.829,
I, DO CC/02. AVANÇO NO CAMPO SUCESSÓRIO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRINCÍPIO DA
VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL.
1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002 confere ao cônjuge casado sob a égide do regime
de separação convencional a condição de herdeiro necessário, que concorre com os
descendentes do falecido independentemente do período de duração do casamento,
com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário para uma sobrevivência digna.
2. O intuito de plena comunhão de vida entre os cônjuges (art. 1.511 do Código Civil)
conduziu o legislador a incluir o cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários
(art. 1.845), o que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo sucessório,
à luz do princípio da vedação ao retrocesso social.
3. O pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe
acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do
casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento pátrio

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previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao
regime matrimonial.
4. O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e não, como cediço
no direito de família, a vida em comum. As situações, porquanto distintas, não
comportam tratamento homogêneo, à luz do princípio da especificidade, motivo pelo
qual a intransmissibilidade patrimonial não se perpetua post mortem.
5. O concurso hereditário na separação convencional impõe-se como norma de ordem
pública, sendo nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque o
referido regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência posta no art.
1.829, I, do Código Civil.
6. O regime da separação convencional de bens escolhido livremente pelos nubentes à
luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se
confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de
forma cogente pela legislação (art. 1.641 do Código Civil), e no qual efetivamente não há
concorrência do cônjuge com o descendente.
7. Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o intérprete restringir onde a
lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma da separação dos Poderes (art. 2º
da Constituição Federal de 1988).
8. O novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao
casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda que os únicos
deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões deve ser conferido ao casado
pela separação convencional, cujo patrimônio é, inexoravelmente, composto somente
por acervo particular.
9. Recurso especial não provido.
(REsp 1472945/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 23/10/2014, DJe 19/11/2014).

CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. HERDEIRO NECESSÁRIO. ART.


1.845 DO CC. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. CONCORRÊNCIA COM
DESCENDENTE. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CC.
1. O cônjuge, qualquer que seja o regime de bens adotado pelo casal, é herdeiro
necessário (art. 1.845 do Código Civil).
2. No regime de separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente concorre com
os descendentes do falecido. A lei afasta a concorrência apenas quanto ao regime da
separação legal de bens prevista no art. 1.641 do Código Civil. Interpretação do art.
1.829, I, do Código Civil.
3. Recurso especial desprovido.
(REsp 1430763/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO
OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 02/12/2014)

* A questão do quinhão mínimo em favor do cônjuge:

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Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge
quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à
quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.

* NOTA: A maior parte da doutrina e mesmo o STJ entendem que a regra acima somente é
aplicável na hipótese de o cônjuge sobrevivente concorrer EXCLUSIVAMENTE com
descendentes comuns, de tal modo que se concorrerem à herança descendentes apenas do
falecido, a divisão da herança deverá ser feita de modo simples, ou seja, em quinhões de
igual proporção. Veja:

PROCESSO: REsp 1.617.650-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por
unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019

A reserva da quarta parte da herança, prevista no art. 1.832 do Código Civil, não se aplica
à hipótese de concorrência sucessória híbrida.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em torno da fixação do quinhão hereditário a que faz jus a


companheira, quando concorre com um filho comum e, ainda, outros seis filhos exclusivos
do autor da herança. O artigo 1.790 do Código Civil, ao tratar da sucessão entre os
companheiros, estabeleceu que este participará da sucessão do outro somente quanto
aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável e, concorrendo com filhos
comuns, terá direito à quota equivalente ao filho, e, concorrendo com filhos do falecido,
tocar-lhe-á metade do que cada um receber. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a
inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC tendo em vista a marcante e inconstitucional
diferenciação entre os regimes sucessórios do casamento e da união estável. Sendo
determinada a aplicação ao regime sucessório na união estável o quanto disposto no art.
1.829 do CC acerca do regime sucessório no casamento. Esta Corte Superior,
interpretando o inciso I desse artigo, reconheceu, através da sua Segunda Seção, que a
concorrência do cônjuge e, agora, do companheiro, no regime da comunhão parcial, com
os descendentes somente ocorrerá quando o falecido tenha deixado bens particulares e,
ainda, sobre os referidos bens. Por sua vez, o art. 1.832 do CC, ao disciplinar o quinhão do
cônjuge (e agora do companheiro), estabelece caber à convivente supérstite quinhão
igual ao dos que sucederem por cabeça, e que não poderá, a sua quota, ser inferior à
quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer. A norma
não deixa dúvidas acerca de sua interpretação quando há apenas descendentes exclusivos
ou apenas descendentes comuns, aplicando-se a reserva apenas quando o cônjuge ou
companheiro for ascendente dos herdeiros com que concorrer. No entanto, quando a
concorrência do cônjuge ou companheiro se estabelece entre herdeiros comuns e
exclusivos, é bastante controvertida na doutrina a aplicação da parte final do art. 1.832
do CC. A interpretação mais razoável do enunciado normativo é a de que a reserva de 1/4
da herança restringe-se à hipótese em que o cônjuge ou companheiro concorrem com os

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descendentes comuns, conforme Enunciado 527 da V Jornada de Direito Civil. A
interpretação restritiva dessa disposição legal assegura a igualdade entre os filhos, que
dimana do Código Civil (art. 1.834 do CC) e da própria Constituição Federal (art. 227, § 6º,
da CF), bem como o direito dos descendentes exclusivos não verem seu patrimônio
injustificadamente reduzido mediante interpretação extensiva de norma. Assim, não
haverá falar em reserva quando a concorrência se estabelece entre o
cônjuge/companheiro e os descendentes apenas do autor da herança ou, ainda, na
hipótese de concorrência híbrida, ou seja, quando concorrem descendentes comuns e
exclusivos do falecido.

* Observação:

Art. 1.833. Entre os descendentes, os em grau mais próximo excluem os mais remotos,
salvo o direito de representação.

* Isso significa que, em primeiro lugar, são convocados os filhos (1º grau); na falta de filhos,
os netos (2º grau); na falta destes, os bisnetos (3º grau); na falta de bisnetos, em raríssima
hipótese, os trinetos (4º grau); e assim sucessivamente ao infinito (ad infinitum), salvo na
hipótese da ocorrência do direito de representação (art. 1.851 e ss do CCB).

* Caso herde por representação, aos descendentes são garantidos os mesmos direitos à
sucessão de seus ascendentes:

Art. 1.834. Os descendentes da mesma classe têm os mesmos direitos à sucessão de seus
ascendentes.

* Sucessão por cabeça e por estirpe. De acordo com o CCB:

Art. 1.835. Na linha descendente, os filhos sucedem por cabeça, e os outros


descendentes, por cabeça ou por estirpe, conforme se achem ou não no mesmo grau.

Direito de representação: um parêntese necessário


* Aqui, um parêntese a respeito do direito de representação. Este ocorre quando a lei
chama certos parentes do falecido a suceder em todos os direitos, em que ele
sucederia, se vivo fosse.

Art. 1.851. Dá-se o direito de representação, quando a lei chama certos parentes do
falecido a suceder em todos os direitos, em que ele sucederia, se vivo fosse.

* Esse direito de representação somente se dá na linha reta descendente, mas nunca na


ascendente.

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Art. 1.852. O direito de representação dá-se na linha reta descendente, mas nunca
na ascendente.

* Dá-se, ainda, em uma hipótese específica, na linha transversal:

Art. 1.853. Na linha transversal, somente se dá o direito de representação em favor


dos filhos de irmãos do falecido, quando com irmãos deste concorrerem.

* Ocorrendo alguma hipótese de representação, os representantes herdam aquilo que


o representado herdaria [em consonância com o que já foi destacado a respeito do art.
1.834], partindo-se o quinhão deste em partes iguais, entre aqueles. Vejamos:

Art. 1.854. Os representantes só podem herdar, como tais, o que herdaria o


representado, se vivo fosse.

Art. 1.855. O quinhão do representado partir-se-á por igual entre os representantes.

Art. 1.856. O renunciante à herança de uma pessoa poderá representá-la na


sucessão de outra.
* Sendo assim temos que:

David, filho de Antonino. Este, filho de Cid. Nessa situação, caso Antonino faleça antes
de Cid e David renuncie à herança decorrente da morte do pai, isso não impedirá David
de representar Antonino na sucessão de Cid.

§ 36. Sucessão dos ascendentes em concorrência com o cônjuge

* Na ausência de descendentes, são chamados a suceder os ascendentes, respeitada,


igualmente, a ideia de que os parentes mais próximos devem preceder aos mais remotos:

Art. 1.836. Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes, em


concorrência com o cônjuge sobrevivente.

§ 1º. Na classe dos ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção
de linhas.

§ 2º. Havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna


herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna.

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Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço
da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for
aquele grau.

* Observe que em caso de concorrência de ascendentes com cônjuge/companheiro, não há


distinções baseadas no regime patrimonial do casamento do cônjuge sobrevivente com o
de cujus.

§ 37. Sucessão do cônjuge sem concorrentes

* Assumindo a terceira posição na ordem de vocação hereditária, o cônjuge sobrevivente


herda integralmente, independentemente do regime patrimonial.

Art. 1.838. Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro
ao cônjuge sobrevivente.

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES.


UNIÃO ESTÁVEL. ART. 1.790 DO CC/2002. INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1.829 DO
CC/2002. APLICABILIDADE. VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. PARTILHA. COMPANHEIRO.
EXCLUSIVIDADE. COLATERAIS. AFASTAMENTO. ARTS. 1.838 E 1.839 DO CC/2002.
INCIDÊNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de
Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado em ambos os casos
o regime do artigo 1.829 do CC/2002, conforme tese estabelecida pelo Supremo
Tribunal Federal em julgamento sob o rito da repercussão geral (Recursos
Extraordinários nºs 646.721 e 878.694).
3. Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao
cônjuge ou companheiro sobrevivente, ressalvada disposição de última vontade.
4. Os parentes colaterais, tais como irmãos, tios e sobrinhos, são herdeiros de quarta
e última classe na ordem de vocação hereditária, herdando apenas na ausência de
descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro, em virtude da ordem legal de
vocação hereditária.
5. Recurso especial não provido.
(REsp 1357117/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 13/03/2018, DJe 26/03/2018)

* No entanto, é preciso observar que, o cônjuge somente concorre à sucessão se ao tempo


da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais
de dois anos, ressalvada a possibilidade, neste último caso, de se provar que essa
convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

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Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao
tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato
há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara
impossível sem culpa do sobrevivente.

INFORMATIVO Nº 0573 – STJ

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DISCUSSÃO DE CULPA NO DIREITO SUCESSÓRIO E


ÔNUS DA PROVA.

Ocorrendo a morte de um dos cônjuges após dois anos da separação de fato do casal, é
legalmente relevante, para fins sucessórios, a discussão da culpa do cônjuge sobrevivente
pela ruptura da vida em comum, cabendo a ele o ônus de comprovar que a convivência
do casal se tornara impossível sem a sua culpa. A despeito das críticas doutrinárias a
respeito do art. 1.830 do CC/2002, no que se refere principalmente à possibilidade de
discussão de culpa como requisito para se determinar a exclusão ou não do cônjuge
sobrevivente da ordem de vocação hereditária, cumpre definir o sentido e o alcance do
texto expresso da lei. Posto isso, observa-se que as regras trazidas pelo CC/2002, na linha
de evolução do direito brasileiro, visam elevar a proteção conferida ao cônjuge
sobrevivente. Registre-se, desse modo, que o tratamento conferido ao cônjuge pelo
CC/1916 considerava a circunstância de que a maioria dos matrimônios seguia o regime
legal da comunhão universal. Assim, em caso de falecimento de um dos cônjuges, o outro
não ficava desamparado, já que a metade dos bens lhe pertencia, porque lhe era conferida
a meação sobre a totalidade do patrimônio do casal. A partir de 1977, com a edição da Lei
6.515 (Lei do Divórcio), o regime legal passou a ser o da comunhão parcial de bens, de
modo que o cônjuge supérstite não necessariamente ficaria amparado, em caso de morte
de seu consorte, já que a meação incidia apenas sobre os bens adquiridos onerosamente
na constância do casamento. Neste contexto, a doutrina esclarece que a exclusão do
direito sucessório do cônjuge sobrevivente com a simples separação de fato,
independente de lapso temporal ou arguição de culpa, não exprime "o valor da justiça nos
casos de abandono de lar por um dos cônjuges, ou de decretação de separação de fato
pelo Poder Judiciário dos consortes em virtude de tentativa de morte ou injúria grave, de
casais unidos, por exemplo, há mais de vinte anos, e que estão separados de fato há mais
de dois anos". Nesse sentido, a doutrina continua: "seria absurdo defender que uma
mulher que conviveu por anos com seu esposo e contribuiu para a dilatação do patrimônio
do casal, em sendo abandonada por seu marido não tivesse direito à herança do falecido,
por ser legalmente apartada da sucessão". Portanto, não há se falar em ilegalidade ou
impertinência da discussão da culpa no vigente direito sucessório. Por fim, cabe ao
cônjuge sobrevivente o ônus de comprovar que a convivência do casal se tornara
impossível sem a sua culpa, a fim de lhe reconhecer o direito sucessório na sucessão de
seu consorte. Isso porque, conforme se verifica da ordem de vocação hereditária prevista
no art. 1.829 do CC/2002, o cônjuge separado de fato é exceção à ordem de vocação.
Ademais, ao alçar o cônjuge sobrevivente à condição de herdeiro necessário, a intenção

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do CC/2002 é proteger as relações unidas por laços de afetividade, solidariedade e
convivência para as quais a proximidade e integração de seus membros são mais
relevantes que os laços mais distantes de parentesco.

REsp 1.513.252-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 3/11/2015, DJe
12/11/2015. QUARTA TURMA.

* Sobre o Direito real de habitação em favor do cônjuge

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será
assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de
habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o
único daquela natureza a inventariar.

DIREITO DAS SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO ABERTA NA VIGÊNCIA DO


CÓDIGO CIVIL DE 1916. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART.
1.611, § 2º, DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. EXTINÇÃO. CONSTITUIÇÃO DE NOVA ENTIDADE
FAMILIAR. UNIÃO ESTÁVEL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. O recurso especial debate a possibilidade de equiparação da união estável ao
casamento, para fins de extinção do direito real de habitação assegurado ao cônjuge
supérstite.
2. Em sucessões abertas na vigência do Código Civil de 1916, o cônjuge sobrevivente tem
direito real de habitação enquanto permanecer viúvo.
3. A atribuição do direto real de habitação consiste em garantia do direito de moradia por
meio da limitação do direito de propriedade de terceiros, uma vez que herdeiros e
legatários adquirem o patrimônio do acervo hereditário desde a abertura da sucessão,
por força do princípio da saisine.
4. Conquanto o marco para extinção fizesse referência ao estado civil, o qual somente se
alteraria pela contração de novas núpcias, não se pode perder de vista que apenas o
casamento era instituição admitida para a constituição de novas famílias.
5. Após a introdução da união estável no sistema jurídico nacional, especialmente com o
reconhecimento da família informal pelo constituinte originário, o direito e a
jurisprudência paulatinamente asseguram a equiparação dos institutos quanto aos efeitos
jurídicos, especialmente no âmbito sucessório, o que deve ser observado também para os
fins de extinção do direito real de habitação.
6. Tendo em vista a novidade do debate nesta Corte Superior, bem como a existência de
um provimento jurisdicional que favorecia o recorrido e o induzia a acreditar na
legitimidade do direito real de habitação exercido até o presente julgamento, deve o
aluguel ser fixado com efeitos prospectivos em relação à apreciação deste recurso
especial.
7. Recurso especial provido.
(REsp 1617636/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado
em 27/08/2019, DJe 03/09/2019)

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STJ - Quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Direito real de habitação de cônjuge sobrevivente não depende da inexistência de


outros bens no patrimônio próprio

O direito real de habitação do cônjuge sobrevivente no imóvel do casal, nos termos do


artigo 1.831 do Código Civil, é garantido independentemente de ele possuir outros bens
em seu patrimônio pessoal. Com esse entendimento, a Terceira Turma negou provimento
a um recurso que questionava o direito com a justificativa de que o cônjuge dispõe de
outros imóveis. Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator do caso no STJ, a única condição
que o legislador impôs para assegurar ao cônjuge sobrevivente o direito real de habitação
é que o imóvel destinado à residência do casal fosse o único daquela natureza a
inventariar. “Nenhum dos mencionados dispositivos legais impõe como requisito para o
reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que
natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente”, fundamentou.

Exigência controvertida

O relator citou entendimento da Quarta Turma do tribunal no sentido de que o direito


real de habitação é conferido em lei independentemente de o cônjuge ou companheiro
sobrevivente ser proprietário de outros imóveis. Villas Bôas Cueva destacou que a parte
final do artigo 1.831 faz referência à necessidade de que o imóvel seja “o único daquela
natureza a inventariar”, mas mesmo essa exigência não é interpretada de forma literal
pela jurisprudência. “Nota-se que até mesmo essa exigência legal – inexistência de outros
bens imóveis residenciais no acervo hereditário – é amplamente controvertida em sede
doutrinária. Daí porque esta corte, em pelo menos uma oportunidade, já afastou a
literalidade de tal regra”, disse ele.

Vínculo afetivo

O objetivo da lei, segundo o ministro, é permitir que o cônjuge sobrevivente permaneça


no mesmo imóvel familiar em que residia ao tempo da abertura da sucessão, como forma
de concretizar o direito à moradia e também por razões de ordem humanitária e social,
“já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelos
cônjuges com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência, constituíram não
somente residência, mas um lar”. O relator afirmou que a legislação protege interesses
mínimos de quem vive momento de “inconteste abalo” resultante da morte do cônjuge
ou companheiro.

****

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECONHECIMENTO DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO


DO COMPANHEIRO SOBREVIVENTE EM AÇÃO POSSESSÓRIA.

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Ainda que o companheiro supérstite não tenha buscado em ação própria o
reconhecimento da união estável antes do falecimento, é admissível que invoque o direito
real de habitação em ação possessória, a fim de ser mantido na posse do imóvel em que
residia com o falecido. O direito real de habitação é ex vi legis decorrente do direito
sucessório e, ao contrário do direito instituído inter vivos, não necessita ser registrado no
Cartório de Registro de Imóveis. É de se ver, portanto, que há direito sucessório
exercitável desde a abertura da sucessão, sendo que, a partir desse momento, terá o
cônjuge/companheiro sobrevivente instrumentos processuais para garantir o exercício do
direito de habitação, inclusive, por meio dos interditos possessórios. Assim sendo, é
plenamente possível a arguição desse direito para fins exclusivamente possessórios, até
porque, entender de forma diversa, seria negar proteção justamente à pessoa para o qual
o instituto foi desenvolvido e em momento pelo qual ele é o mais efetivo. Vale ressaltar
que a constituição do direito real de habitação do cônjuge/companheiro supérstite emana
exclusivamente da lei, "sendo certo que seu reconhecimento de forma alguma repercute
na definição de propriedade dos bens partilhados. Em se tratando de direito ex vi lege,
seu reconhecimento não precisa necessariamente dar-se por ocasião da partilha dos bens
deixados pelo de cujus" (REsp 1.125.901/RS, Quarta Turma, DJe 6/9/2013). Adequada,
portanto, a sentença que apenas vem a declarar a união estável na motivação do
decisório, de forma incidental, sem repercussão na parte dispositiva e, por conseguinte,
sem alcançar a coisa julgada (CPC, art. 469), mantendo aberta eventual discussão no
tocante ao reconhecimento da união estável e seus efeitos decorrentes. Ante o exposto,
não há falar em falta de interesse de agir, nem de questão prejudicial, pois, como visto, a
sentença que reconheça o direito do companheiro em ação possessória não depende do
julgamento de outro processo. Além do mais, uma vez que o direito real está sendo
conferido exatamente àquela pessoa que residia no imóvel, que realmente exercia poder
de fato sobre a coisa, a proteção possessória do companheiro sobrevivente está sendo
outorgada à luz do fato jurídico posse. Nesse contexto, vale ressaltar o disposto no art.
1.210, § 2º, do CC, segundo o qual "não obsta à manutenção ou reintegração na posse a
alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa", e o Enunciado 79 das
Jornadas de Direito Civil, que dispõe que "a exceptio proprietatis, como defesa oponível
às ações possessórias típicas, foi abolida pelo Código Civil de 2002, que estabeleceu a
absoluta separação entre os juízos possessório e petitório". REsp 1.203.144-RS, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 27/5/2014.

Quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Direito real de habitação na união estável não admite aluguel ou empréstimo do imóvel
Assim como no casamento, não é permitido ao companheiro sobrevivente de união
estável, titular do direito real de habitação, celebrar contrato de comodato ou locação do
imóvel com terceiro. Com esse entendimento, a Terceira Turma negou provimento ao
recurso de uma pessoa que, alegando não dispor de meios para manter um imóvel de luxo
localizado em área nobre, havia celebrado contrato de comodato com terceiro após o

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falecimento de seu companheiro. Segundo a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi,
não há nenhuma singularidade na união estável que justifique eventual tratamento
diferenciado em relação ao casamento, especificamente quanto às condições de exercício
do direito real de habitação. A ministra destacou que a regra do artigo 7º da Lei 9.278/96
deve ser interpretada em conjunto com o artigo 746 do Código Civil de 1916, vigente à
época, no sentido da impossibilidade de alugar ou emprestar o imóvel objeto do direito
real de habitação. “Interpretação em sentido diverso estabeleceria uma paradoxal
situação em que, tendo como base o mesmo instituto jurídico – direito real de habitação
– e que tem a mesma finalidade – proteção à moradia e à dignidade da pessoa humana –
, ao cônjuge supérstite seria vedado alugar ou emprestar o imóvel, mas ao companheiro
sobrevivente seria possível praticar as mesmas condutas, não havendo, repise-se,
nenhuma justificativa teórica para que se realizasse distinção dessa índole”, afirmou a
ministra.

Dificuldades financeiras

No recurso, a recorrente alegou ter sido vítima de esbulho possessório praticado pela filha
do seu falecido companheiro – e reconhecido em sentença transitada em julgado. Disse
que, ao retomar a posse do imóvel, encontrou-o danificado, e não tinha condições
financeiras para os reparos necessários, nem para a manutenção de rotina. Por isso, optou
por assinar contrato de comodato com uma pessoa que teria se comprometido a reformar
e conservar o imóvel. A ministra explicou que o esbulho não justifica a flexibilização da
regra legal que veda o comodato do imóvel sobre o qual recai o direito real de habitação.
Segundo ela, não há nexo de causalidade entre o esbulho possessório e a posterior
celebração do contrato de comodato. Nancy Andrighi lembrou que a recorrente poderia
ter adotado outras condutas na tentativa de superar as dificuldades que encontrou para
conservar o imóvel após o esbulho, inclusive pleitear indenização para recompor a
situação anterior.

Disponível em:

http://ckonder.blogspot.com/search/label/Sucess%C3%B5es

§ 38. Sucessão dos colaterais

* Os colaterais ocupam a quarta posição na ordem de vocação hereditária, somente sendo


chamados na hipótese de inexistirem os outros herdeiros mencionados nos itens anteriores,
valendo destacar que há uma limitação para essa categoria, vez que apenas serão chamados
a suceder os colaterais até o quarto grau.

Art. 1.839. Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no art.
1.830, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau.

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* A lógica de que os parentes de grau mais próximo excluem os de grau mais remoto também
se verifica aqui, com a ressalva de que é possível o direito de representação em relação aos
filhos de irmãos pré-mortos:

Art. 1.840. Na classe dos colaterais, os mais próximos excluem os mais remotos, salvo o
direito de representação concedido aos filhos de irmãos.

Nota: Vale observar que esse dispositivo está em consonância com o já mencionado
art. 1.853 do CCB.

Art. 1.853. Na linha transversal, somente se dá o direito de representação em


favor dos filhos de irmãos do falecido, quando com irmãos deste
concorrerem.

§ Concorrência entre irmãos bilaterais (filhos dos mesmos genitores do de cujus) e unilaterais
(filhos apenas do de cujus)

Art. 1.841. Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais,
cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar.

Art. 1.842. Não concorrendo à herança irmão bilateral, herdarão, em partes iguais, os
unilaterais.

* Inexistindo irmãos, serão chamados a suceder os sobrinhos do de cujus. Na falta de


sobrinhos, ascende-se, de modo a serem convocados os tios:

Art. 1.843. Na falta de irmãos, herdarão os filhos destes e, não os havendo, os tios.

§ 1º Se concorrerem à herança somente filhos de irmãos falecidos, herdarão por cabeça.

§ 2º Se concorrem filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos unilaterais, cada um


destes herdará a metade do que herdar cada um daqueles.

§ 3º Se todos forem filhos de irmãos bilaterais, ou todos de irmãos unilaterais, herdarão


por igual.

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8 PETIÇÃO DE HERANÇA

* Nenhuma legislação brasileira, até 2002, tratava especificamente do tema. [CATEB].

§ 39. Petição de Herança: Natureza Jurídica

* É ação de natureza real – porque o direito à sucessão aberta é considero coisa imóvel, nos
termos do já estudado art. 80 do CCB – assemelhando-se à ação de reivindicação, conforme
ensinamento de ITABAIANA DE OLIVEIRA. No entanto, desta se distingue por versar sobre
uma universalidade de bens e não sobre bens determinados.

§ 40. Petição de Herança: Legitimidade Ativa

* É ação própria do herdeiro [legítimo ou testamentário] preterido por outros, que postularam
o inventário sem sua presença, podendo cumulá-la com ação de investigação de
paternidade, visando ao reconhecimento de seu título e sua participação na partilha dos
bens inventariados. [CATEB].

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA E SUCESSÕES. AÇÃO DE


INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C PETIÇÃO DE HERANÇA. PEDIDO DE ANULAÇÃO DA
PARTILHA AMIGÁVEL HOMOLOGADA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 128 E 460 DO CPC.
INEXISTÊNCIA. ALEGAÇÃO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. CÁLCULO DO QUINHÃO
DEVIDO AO HERDEIRO PRETERIDO. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA.
1. Se a decisão proferida pelo Tribunal de origem não extrapola, no plano horizontal, os
limites impostos pelo objeto dos recursos levados a julgamento, não se pode qualifica-la de
ultra, quiçá extra petita.
2. O herdeiro que não participou do processo de inventário não sofre os efeitos da coisa
julgada, referente à sentença que homologou a partilha amigável.
3. A fim de evitar o enriquecimento sem causa, o cálculo da quota-parte a ser entregue pelos
coerdeiros ao meio-irmão observará, quanto aos bens alienados antes da citação, o valor
atualizado da venda, e, com relação àqueles dos quais ainda eram proprietários, na data em
que foram citados, o valor atual de mercado.
4. A litigância de má-fé, à que alude o parágrafo único do art. 538 do CPC, nada mais é que
uma forma de abuso do direito, e, portanto, só se concretiza quando demonstrado que a
parte se vale do direito de recorrer, não para ver a reforma, invalidação ou integração da
decisão impugnada, mas para postergar ou perturbar o resultado do processo.
5. Ainda que a pretensão recursal não tenha sido acolhida pelo Tribunal de origem, não se
pode taxar o recurso de manifestamente protelatório, ou sem qualquer fundamento,
especialmente ao se considerar que o acórdão embargado reformou a decisão de 1º grau e
que se tratam dos primeiros - e únicos - embargos de declaração opostos, nos quais, ao
menos em abstrato, foram apontadas contradições e obscuridades, além de vícios no
julgamento.

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6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
(REsp 1381655/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
13/08/2013, DJe 06/11/2013)

§ 41. Petição de Herança: legitimidade passiva

* A ação é movida contra quem quer que detenha a herança com a preterição do autor da
ação. É o que se depreende do trecho abaixo destacado:

Art. 1.824. O herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o


reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou de
parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo sem título, a possua.

§ NOTA:

¨ Se a ação é proposta antes da partilha, o STJ admite o seja em face do espólio que,
no caso, será representado pelo inventariante.

¨ Se a ação é proposta após a partilha, forçosamente serão demandados os herdeiros


e outros possuidores da herança (nos termos da lei).

* Ratificando essa ideia, o legislador previu no art. 1.827, que o herdeiro pode demandar os
bens da herança, ainda que em poder de terceiros, ficando o possuidor originário,
responsável pelo valor dos bens que alienou, caso não seja possível deferi-los ao autor da
ação de petição de herança por uma questão jurídica ou em caso de seu perecimento ou
sua depreciação. Vejamos:

Art. 1.827. O herdeiro pode demandar os bens da herança, mesmo em poder de


terceiros, sem prejuízo da responsabilidade do possuidor originário pelo valor dos bens
alienados.

Parágrafo único. São eficazes as alienações feitas, a título oneroso, pelo herdeiro
aparente a terceiro de boa-fé.

* A respeito das regras acima referidas, vale destacar a lição de LUIZ PAULO VIEIRA DE
CARVALHO:

“O art. 1.827, caput, do Código Civil permite ao herdeiro ajuizar a ação de petição de
herança na busca de bens componentes do monte hereditário que estejam nas mãos de
terceiros adquirentes, sem prejuízo da responsabilidade do possuidor originário pelo
valor dos bens alienados, em caso de seu perecimento ou sua depreciação.

O parágrafo único da norma acima referida dispõe, entretanto, que, se a alienação tiver
sido feita pelo herdeiro aparente (aquele que se encontra de modo ostensivo com os
bens hereditários como se fosse legítimo sucessor do hereditando), a título oneroso, a

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um terceiro de boa-fé, qual seja, aquele que ignora a situação de herdeiro aparente do
alienante, crendo ser este o verdadeiro herdeiro, a alienação será considerada válida, ou
seja, o bem alienado permanecerá na titularidade do terceiro adquirente de boa-fé,
cabendo ao verdadeiro herdeiro tão só pleitear a indenização devida pelos prejuízos
sofridos em face do herdeiro aparente.

Ao inverso do parágrafo único ora em comento, é de se destacar que, se a alienação tiver


sido realizada onerosamente a adquirente de má-fé ou gratuitamente (p. ex., através de
doação) a terceiro, o negócio será desfeito e o bem alienado deverá ser restituído ao
verdadeiro sucessor, independentemente, nesta última hipótese, da boa ou má-fé do
donatário”.

§ 42. Petição de Herança: Responsabilidade do possuidor da herança

* A responsabilidade do possuidor da herança [réu na ação de petição de herança], até o


momento de sua citação, é definida conforme esteja de boa ou má-fé, sendo importante,
por isso, recordar as regras previstas nos arts. 1.214 a 1.222 do CCB. Após a citação do
possuidor da herança, nos autos da ação em questão, este passa a ser considerado
possuidor de má-fé, obviamente se a pretensão autoral for julgada procedente. Vejamos:

Art. 1.826. O possuidor da herança está obrigado à restituição dos bens do acervo,
fixando-se-lhe a responsabilidade segundo a sua posse, observado o disposto nos arts.
1.214 a 1.222.

Parágrafo único. A partir da citação, a responsabilidade do possuidor se há de aferir pelas


regras concernentes à posse de má-fé e à mora.

* Prevê, ainda, o CCB:

Art. 1.828. O herdeiro aparente, que de boa-fé houver pago um legado, não está obrigado
a prestar o equivalente ao verdadeiro sucessor, ressalvado a este o direito de proceder
contra quem o recebeu.

* A aplicação desse dispositivo exige expressamente: (i) o cumprimento de um legado; (ii)


realizado de boa-fé; (iii) por um herdeiro aparente e, implicitamente, exige (iv) a nulidade
(absoluta ou relativa) do legado.

* Nessa hipótese, explica LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO, que o verdadeiro herdeiro
poderá reclamar a restituição ao monte apenas em face do legatário que teria se
locupletado indevidamente, isto se o legado for declarado insubsistente, e não em face do
suposto herdeiro, tudo dentro do primado do respeito à boa-fé e da segurança das relações
jurídicas acobertadas pelo manto da propriedade aparente, antes citado.

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§ 43. Petição de Herança: efeito retroativo e pretensões processuais

* O autor da ação pode pretender sejam-lhe entregues os bens da herança que lhe cabem,
com os seus acessórios e rendimentos, desde a morte do de cujus.

Art. 1.824. O herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o


reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou de
parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo sem título, a possua.

Art. 1.825. A ação de petição de herança, ainda que exercida por um só dos herdeiros,
poderá compreender todos os bens hereditários.

* Para Giselda Hironaka, o reconhecimento de que o demandante da petição de herança foi


preterido de seu direito hereditário, implica a ineficácia da partilha ou da adjudicação, para
que haja a restituição da herança ao monte-mor e haja a correção da distribuição da herança
em novo processo de inventário.

* Parte da doutrina entende que a procedência da petição de herança implica nulidade da


partilha e não ineficácia. De qualquer forma, procedente a petição de herança, deverá haver
uma nova partilha de bens, a ser executada mediante simples petição, sem necessidade de
propositura de ação anulatória autônoma após o trânsito em julgado da sentença de
procedência da petição de herança.

* Casos mais comuns:

a) Pedidos cumulados de investigação de paternidade ou de reconhecimento e dissolução


de união estável pós-morte. Quando existe essa cumulação, o juízo competente é da
Vara de Família do domicílio dos herdeiros, e, se forem vários, pode ser indicado o
domicílio de qualquer deles.
b) Proposta pelo herdeiro testamentário ou legatário que não recebeu seu direito
sucessório por desconhecimento ou supressão do testamento ao tempo da partilha.

§ 44. Prescrição da petição de herança

* A súmula 149 do Supremo Tribunal Federal estabelece expressamente que: É imprescritível


a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança.

* A doutrina majoritária entende que, por força do art. 205 do vigente Código Civil, a petição
de herança prescreve em 10 anos.

* Vale registrar a opinião minoritária, bem representada por LUIZ PAULO VIEIRA DE
CARVALHO, para quem:

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No entanto, minoritariamente, compartilhamos de opinião diversa. Primeiramente,
s.m.j., é necessário atentar que as pretensões reais não estão sujeitas à prescrição
extintiva, regendo-se pelos prazos da prescrição aquisitiva ou usucapião. Isso porque a
prescrição extintiva somente incidiria nos chamados direitos subjetivos relativos pessoais
(isto é, nas pretensões pessoais), quais sejam, os direitos obrigacionais, que têm por
objeto imediato a obtenção ou cumprimento de uma prestação pecuniária. Já os direitos
reais são direitos subjetivos absolutos, tendo por objeto imediato uma coisa e não uma
prestação e são, por sua natureza, perpétuos. Desse modo, entendemos não se aplicarem
a esses direitos os prazos concernentes à prescrição extintiva. Assim sendo, em nosso
sentir, as ações de petição de herança são imprescritíveis, podendo o réu alegar em sede
de defesa apenas a exceção de usucapião (Súmula 237 do STF), que atualmente tem
como prazo máximo 15 anos (na usucapião extraordinária sem posse social, art. 1.238,
caput, do CC).

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9 EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO

§ 45. Notas introdutórias sobre indignidade e deserdação

* Trata-se de institutos distintos, porém com raiz, fundamentos e consequências idênticas.

* Indignidade está tratada no âmbito da sucessão em geral.

* A deserdação, por sua vez, é tratada no campo da sucessão testamentária.

o Assim, enquanto a indignidade deriva tão só da lei e da decisão judicial, a deserdação


deriva não só da lei e da decisão judicial, mas, sobretudo, da intenção do testador aposta
em testamento. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

* Natureza jurídica: Ambas constituem pena, sanção civil, imposta ao herdeiro ou legatário,
conforme o caso.

§ 46. Aspectos comuns à indignidade e à deserdação

§ Necessidade de reconhecimento judicial da causa de indignidade e de


deserdação

* Indignidade e deserdação reclamam reconhecimento judicial, mediante devido processo


legal. Pressupõe o julgamento [trânsito em julgado] de ação civil de indignidade ou
deserdação, visando a desconstituição do direito de recebimento do patrimônio. Não há,
pois, exclusão automática, ainda que haja condenação do herdeiro ou legatário na esfera
criminal.

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade,


será declarada por sentença.

Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação, incumbe


provar a veracidade da causa alegada pelo testador.

§ Prazo decadencial para o exercício do direito de exclusão por indignidade ou


deserdação

* É de 4 anos o prazo decadencial para se exercer o direito de exclusão, seja em razão de


indignidade, seja em razão da deserdação. Vejamos:

Art. 1.815. Caput.

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§ 1º. O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro
anos, contados da abertura da sucessão.

Art. 1.965. Caput.

Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo de


quatro anos, a contar da data da abertura do testamento.

§ Efeitos da sentença

* Assim o indigno e como o deserdado perdem o direito hereditário que recebeu ou receberia
por ocasião da abertura da sucessão, com efeitos ex tunc (retroativos), passando a ser
considerado premorto na sucessão em questão. Nesse sentido:

“[...] será o deserdado excluído da quota legitimária como se nunca tivesse sido herdeiro,
por força dos efeitos retroativos de tal sentença (ex tunc), como se fora premorto, à
semelhança do indigno. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

Art. 1.816. São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro excluído


sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.

Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à


administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão
eventual desses bens.
* Ademais, o excluído (seja o indigno ou o deserdado) é tratado como possuidor de má-fé,
devendo restituir com juros e correção monetária, todos os frutos percebidos, ressalvadas
as despesas de conservação do acervo hereditário e das benfeitorias necessárias:

Art. 1.817. São válidas as alienações onerosas de bens hereditários a terceiros de boa-fé,
e os atos de administração legalmente praticados pelo herdeiro, antes da sentença de
exclusão; mas aos herdeiros subsiste, quando prejudicados, o direito de demandar-lhe
perdas e danos.

Parágrafo único. O excluído da sucessão é obrigado a restituir os frutos e rendimentos


que dos bens da herança houver percebido, mas tem direito a ser indenizado das
despesas com a conservação deles.

* Essa é a opinião de LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO:

[...] se, eventualmente, aliená-los, a título oneroso e a terceiro de boa-fé, tal alienação
será considerada válida, aplicando-se, do mesmo modo, por analogia, a regra
concernente à indignidade prevista no art. 1.817 do Código Civil em vigor.

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§ 47. Especificidades da indignidade

(i) Causas da indignidade

* Estão definidas taxativamente no art. 1.814 do CCB, nos termos seguintes:

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa


deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente
ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem
em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência [física ou moral] ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o
autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

§ Nota: Pelo princípio da independência das instâncias (art. 935, CCB) é dispensável
a prévia condenação do excluído na instância criminal, bastando a prova cabal das
práticas descritas nos incisos acima destacados.

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo


questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor,
quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.

§ Portanto, somente se restar decidido perante o juízo criminal não ter existido o fato
apontado como delituoso ou não ter sido o considerado como indigno o seu autor,
é que tais questões farão coisa julgada no juízo cível (art. 91, inciso I, do CP; art. 63
do CPP; art. 515, VI, do CPC – antes 475-N, inciso II, do CPC/73) e, aí sim, a decisão
impedirá o prosseguimento da ação. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

(ii) Legitimado ativo para a propositura da ação de indignidade

* Em síntese: [...] são legitimados para a propositura da ação de indignidade todos aqueles
que irão se aproveitar economicamente da exclusão do indigno [...]. (LUIZ PAULO VIEIRA
DE CARVALHO).

* Superando antiga controvérsia doutrinária e jurisprudencial, o CCB foi alterado para prever
que o Ministério Público tem legitimidade para ingressar com ação civil de indignidade,
conforme se depreende do art. 1815, §2º.

Art. 1.815. Caput.


[...]

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§ 2º. Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade para
demandar a exclusão do herdeiro ou legatário.” (NR)

“A legitimação do Ministério Público para “demandar a exclusão do herdeiro ou


legatário” no caso de indignidade foi introduzida expressamente com a inclusão de
um novo parágrafo ao artigo 1.815 do Código Civil, por efeito da Lei 13.532, de 7
de dezembro de 2017. Resolve-se assim um problema prático decorrente da
ausência de interesse de herdeiros em propor tais ações, muitas delas marcadas
por enormes constrangimentos emocionais. A ratio dessa norma é, porém,
discutível. Em se tratando de interesses patrimoniais no campo sucessório, qual a
justificativa político-jurídica para essa ampliação da legitimidade do órgão do
Ministério Público? Seria este mais um exemplo da moralização do Direito Civil no
campo patrimonial?” (NOTA DO PROF. LUIZ OTÁVIO RODRIGUES JÚNIOR, disponível
em: https://www.conjur.com.br/2017-dez-27/direito-civil-atual-2017-foi-ano-
grandes-mudancas-lei

(iii) Reabilitação do indigno

* Igualmente denominada de purgação da indignidade, é ato exclusivo do autor da herança,


em razão de seu caráter personalíssimo, que obsta a eficácia da indignidade que venha a ser
reconhecida.

Art. 1.818. Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusão da herança será
admitido a suceder, se o ofendido o tiver expressamente reabilitado em testamento, ou em
outro ato autêntico.

Nota: Ato autêntico é sempre lavrado por oficial público, observadas as formalidades
legais. Portanto, não são admitidos escritos particulares. Nesse sentido, Carlos
Maximiliano citado por LUIS PAULO VIEIRA DE CARVALHO (2019, p. 291)

Parágrafo único. Não havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em


testamento do ofendido, quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade,
pode suceder no limite da disposição testamentária.

* Presume-se a reabilitação do indigno, se, mesmo tendo ciência da ofensa que lhe foi
cometida, o ofendido beneficia aquele em testamento.

* Em tal caso, nos moldes do desenho legal acima reproduzido, pensamos estar limitada sua
participação à disposição testamentária correspondente, isto é, restrita à herança
testamentária ou ao legado a que foi indicado, a não ser, como é óbvio, que a ação de
deserdação não seja promovida em tempo hábil, caso em que ele manterá a sua quota
legítima. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

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* Há, ainda, entretanto, quem entenda que o perdão tácito ou implícito, nessa matéria,
decorreria tão só do fato de o testador, após ter inserido na cédula testamentária a
deserdação de determinado herdeiro necessário, vir a realizar novo testamento e, nessa
nova disposição de última vontade, não repetir a anterior cláusula alusiva à deserdação,
significando tal atitude a reabilitação total daquele que fora indicado como deserdado, em
especial quanto à quota legitimária. (LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

§ 48. Especificidades da deserdação

* Legitimidade ativa

* Deserdação é ato privativo do autor da herança, por declaração expressa de vontade, por
meio de testamento, que exclui da sua sucessão um herdeiro necessário, por conta da
prática de ato previsto em lei.

* Com base no caput do art. 1.965, temos que qualquer sucessor que in concreto, vá se
beneficiar da exclusão do herdeiro necessário.

Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação, incumbe


provar a veracidade da causa alegada pelo testador.
* Legitimidade passiva

* A deserdação priva da quota legitimária o herdeiro necessário.

Art. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em
todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão.

* Hipóteses

* Estão elencadas no dispositivo abaixo:

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos
descendentes por seus ascendentes:

I - ofensa física;
II - injúria grave;
III - relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV - desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos
ascendentes pelos descendentes:

I - ofensa física;

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II - injúria grave;
III - relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido
ou companheiro da filha ou o da neta;
IV - desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.

* Sintetizando os pressupostos da deserdação:

a) Existência de herdeiros necessários;

b) Testamento existente, válido e eficaz, contendo cláusula de deserdação;

Art. 1.964. Somente com expressa declaração de causa pode a deserdação ser
ordenada em testamento.

c) Expressa declaração da causa, dentre as previstas na lei.

d) Sentença condenatória transitada em julgado, em ação de deserdação. Aqui vale


recordar o dispositivo seguinte:

* Discussão em torno da deserdação parcial

* Admite parte da doutrina, com nosso apoio, que a deserdação possa ser parcial, o que não
é vedado pelo nosso legislador, a ocorrer quando o testador limita o quinhão do herdeiro
necessário por meio de cláusula deserdatória, pretendendo deferir-lhe apenas uma fração
da legítima ou lhe deixando legado(s), hipótese última em que não recolhe a herança, tão
só bem ou bens singularizados.111 Não custa lembrar que, em ambos os casos, a referida
disposição, para ser eficaz, terá de ser confirmada em juízo mediante ação própria.
(LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO).

* Deserdação e Erepção

* Não se pode confundir, também, deserdação com erepção. A erepção implica, na verdade,
a possibilidade de o herdeiro facultativo ser excluído totalmente da sucessão, por
testamento válido, feito pelo autor da herança, bastando que o mesmo disponha de todo o
seu patrimônio sem o contemplar, consoante o art. 1.850 do Código Civil atual.

Art. 1.850. Para excluir da sucessão os herdeiros colaterais, basta que o testador disponha
de seu patrimônio sem os contemplar.

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INDIGNIDADE DESERDAÇÃO
Tratada no campo da sucessão
Tratada no âmbito da sucessão em geral.
testamentária.
Herdeiros [legítimos e testamentários] e Apenas herdeiros necessários podem ser
legatários podem ser indignos. deserdados.
Somente o autor da herança pode deserdar
Em regra, podem propor a ação de
e o faz por meio de testamento, cabendo
indignidade qualquer herdeiro legítimo que
àquele que demonstrar interesse econômico
tenha interesse, além do Ministério Público,
direto na deserdação comprovar sua causa
na hipótese de homicídio.
em ação civil de deserdação.
Dá-se em virtude da prática de ato anterior à
Pode ser reconhecida por ato praticado antes abertura da sucessão, pois após a morte do
ou depois da abertura da sucessão. autor da herança seria impossível sua
previsão em testamento.
Ambas constituem pena, sanção civil.
Ambas reclamam a necessidade de reconhecimento judicial, mediante devido processo legal.
Assim, pressupõe o julgamento [trânsito em julgado] de ação civil de indignidade ou
deserdação.

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10 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

§ 49. Natureza jurídica do testamento e suas características gerais

* Testamento é negócio jurídico unilateral não receptício, isto é, ato jurídico que se aperfeiçoa
com a manifestação de vontade de um sujeito, no caso, o testador.

* É, ainda, ato personalíssimo, passível de alteração a critério de seu autor e a qualquer


tempo. A esse respeito, o CCB:

Art. 1.858. O testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer


tempo.

* Mais ainda, é revogável [total ou parcialmente] a qualquer tempo, nos termos seguintes:

Art. 1.969. O testamento pode ser revogado pelo mesmo modo e forma como pode
ser feito.

Art. 1.970. A revogação do testamento pode ser total ou parcial.

Parágrafo único. Se parcial, ou se o testamento posterior não contiver cláusula


revogatória expressa, o anterior subsiste em tudo que não for contrário ao
posterior.

Art. 1.971. A revogação produzirá seus efeitos, ainda quando o testamento, que a
encerra, vier a caducar por exclusão, incapacidade ou renúncia do herdeiro nele
nomeado; não valerá, se o testamento revogatório for anulado por omissão ou
infração de solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos.

Notícia correlata
sexta-feira, 27 de abril de 2018

Negado recurso que buscava invalidar testamento retificado 20 anos depois

Por unanimidade de votos, a Terceira Turma negou provimento a recurso especial


que buscava evitar a revogação de testamento que foi retificado pela testadora
quase 20 anos depois da sua primeira manifestação de vontade. De acordo com o
processo, um primeiro testamento foi lavrado em 1987, mas, em 2006, a testadora
fez novo testamento no qual foi consignada, de forma expressa, a revogação de
“todo e qualquer outro testamento que haja anteriormente feito, para que só este
tenha inteira e plena validade, como manifestação de sua última vontade”.
Familiares que tinham sido beneficiados no primeiro testamento alegaram haver

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uma diferença substancial de conteúdo entre o testamento lavrado em 1987 (em
que se deu certa destinação a uma série de imóveis) e o testamento de 2006 (que
tratou especificamente sobre saldo de conta corrente e aplicações financeiras).
Para eles, isso demonstraria que a relação existente entre um e outro não seria de
exclusão, mas de complementação.

Cláusula expressa

Para os ministros da Terceira Turma, no entanto, a revogação parcial não pode ser
presumida, uma vez que depende, obrigatoriamente, de declaração no sentido de
que o testamento posterior é apenas parcial ou, ainda, da inexistência de cláusula
revogatória expressa. A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, no caso
julgado, houve cláusula expressa de revogação do testamento anterior. Ela
também considerou o longo intervalo existente entre os dois testamentos. “É
absolutamente impossível realizar qualquer dedução ou ilação sobre o que
efetivamente ocorreu na relação existente entre a testadora e os recorrentes neste
longo período – pode ter ocorrido tudo ou pode não ter acontecido nada”, afirmou
a ministra. Desse modo, segundo Nancy Andrighi, só haverá segurança e certeza
quanto ao cumprimento da última vontade da testadora se apenas o saldo em
conta e as aplicações financeiras forem destinadas a quem ela indicou no segundo
testamento, “submetendo-se todos os demais bens e direitos de sua propriedade
à partilha na forma da lei”.
Processo: REsp 1694394

Ementa do acórdão em comento:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO SUCESSÓRIO. TESTAMENTO. OMISSÃO E


NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. TESTAMENTOS
SUCESSIVOS COM CONTEÚDOS DISTINTOS. PERQUIRIÇÃO DA VONTADE DO
TESTADOR IRRELEVANTE DIANTE DE CLÁUSULA REVOGATÓRIA EXPRESSA E
INDUVIDOSA. REVOGAÇÃO PARCIAL. INOCORRÊNCIA. INDISPENSABILIDADE DE
MANIFESTAÇÃO NESSE SENTIDO OU DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA
REVOGATÓRIA.
1- Ação distribuída em 30/04/2013. Recurso especial interposto em 30/04/2015 e
atribuído à Relatora em 02/09/2016.
2- Os propósitos recursais consistem em definir se houve negativa de prestação
jurisdicional, se o acórdão recorrido deixou de observar a vontade da testadora e
se a relação estabelecida entre os testamentos lavrados anterior e posteriormente
é de exclusão ou de complementariedade.
3- Ausentes os vícios do art. 535, I e II, do CPC/73, não há que se falar em negativa
de prestação jurisdicional.
4- A interpretação do testamento segundo a vontade do testador é relevante nas
hipóteses em que a cláusula testamentária é equívoca ou suscita dúvidas acerca de

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seu real sentido, de modo que, ausentes tais condições, deve-se considerar como
vontade do testador aquela manifestada por ele como sendo a sua declaração de
última vontade, aposta de forma expressa e inequívoca na própria cédula
testamentária, excluindo-se o exame de elementos colaterais, como testemunhos
e declarações.
5- Embora admissível, a revogação parcial do testamento não se presume,
dependendo, obrigatoriamente, da existência de declaração de que o testamento
posterior é apenas parcial ou da inexistência de cláusula revogatória expressa, que
não se pode inferir pelo simples exame de compatibilidade entre o conteúdo do
testamento anterior e o posterior, sobretudo se existente longo lapso temporal
entre ambos.
6- Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1694394/DF, Rel. Ministra
NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 26/03/2018)
Disponível em:
http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?processo=1694394&&b=ACOR
&thesaurus=JURIDICO&p=true

* Nota: Diverge a doutrina sobre as consequências da revogação do testamento revocatório.


Há duas teses a respeito. A primeira, defende que o testamento primitivo revive na hipótese
de ser revogado o testamento revogatório. A segunda, essa majoritária, com base em
analogia ao que dispõe o art. 2º da LINDB), defende que não ocorre repristinação
automática, de modo que, o primeiro testamento somente volta a ter eficácia se, no ato da
revogação do testamento revocatório, assim dispuser expressamente o testador.

* Como consequência dessas características, o CCB veda quaisquer das formas de testamento
conjuntivo [conjunto ou de mão comum]. Vejamos:

Art. 1.863. É proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recíproco ou


correspectivo.

Nota: É compreendido como testamento conjuntivo aquele feito por duas ou mais
pessoas, por intermédio do mesmo documento, em proveito recíproco ou de
terceiro [NERY JR]. Tal proibição resulta do fato de o ato de testar ser
personalíssimo e revogável. Do contrário, segundo a doutrina que justifica tal
proibição, a presença de mais de um testador, celebrando o mesmo ato, revestiria
o negócio com o caráter da irrevogabilidade. [NERY JR]. Nesse sentido, já decidiu o
STF. Vejamos:

“[...] A eventual reciprocidade, resultante de atos distintos, unilateralmente


revogáveis, não sacrifica a revogabilidade, que é da essência do testamento.
Não cabe, também, falar em pacto sucessório, em se tratando de
testamentos distintos. (STF, 1.ª T., RE 93603-GO, rel. Min. Néri da Silveira, j.
31.5.1994, DJU 4.8.1995, p. 22643)”.

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Nota: A hipótese de testamento simultâneo ocorreria no caso de serem admitidos
mais de um testador [VENOSA]; nessa modalidade os testadores falam na primeira
pessoa do plural, dizendo a mesma coisa [ORLANDO GOMES]. Dá-se quando duas
ou mais pessoas testarem, conjuntamente, em benefício de terceiro [CLÓVIS
BEVILAQUA]; já no testamento recíproco cada testador institui o outro seu
herdeiro, um devendo receber do outro [ORLANDO GOMES]. Essa modalidade
admitiria a instituição recíproca de herdeiros, devendo suceder o patrimônio do
outro aquele que sobreviver [CLÓVIS BEVILAQUA]; no testamento correspectivo,
por fim, seriam feitas instituições testamentárias com natureza de retribuição de
outras correspondentes [CLÓVIS BEVILAQUA]. Nessa modalidade, testadores
estipulariam deixas testamentárias em retribuição de outras correspondentes.
Sujeito A instituiria o sujeito B como seu herdeiro, desde que este, por sua vez,
realizasse testamento atendendo a alguma pretensão daquele. Nessa modalidade
a reciprocidade é declaradamente resultante da interdependência das disposições,
dizendo um que deixa para o outro porque este também o institui herdeiro, ou
nomeia legatário [ORLANDO GOMES].

Nota: Admite-se, até, que faça o testamento com o propósito de retribuir favores
recebidos. O que a legislação não consente é que a causa da retribuição seja o
testamento de quem os fez. [ORLANDO GOMES]

* É negócio jurídico gratuito ou benéfico, vez que se trata de uma liberalidade do testador,
não se estabelecendo contraprestação decorrente. Por essa razão, incide o disposto no
seguinte dispositivo do CCB:

Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.

§ 50. Capacidade testamentária ativa

* De rigor, toda pessoa com capacidade de exercício, por óbvio, pode testar.

Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus
bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.

* No entanto, observe-se que:

a) Especificamente em relação a esse tipo de negócio, admite o CCB seja realizado por
sujeito maior de dezesseis anos que, como sabido, não detém tal capacidade;

b) A capacidade jurídica, por si só, não é bastante para a validade do testamento, que exige,
ainda, o pleno discernimento do ato praticado. Assim, é possível que a pessoa tenha

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capacidade jurídica, mas lhe falte discernimento e, por isso, esteja impedida de testar.
Vejamos:

Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não
tiverem pleno discernimento.

Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos.

c) A capacidade do testador é aferida no ato da realização do testamento:

Art. 1.861. A incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento,


nem o testamento do incapaz se valida com a superveniência da capacidade.

IDADE AVANÇADA, ISOLADAMENTE, NÃO SIGNIFICA INCAPACIDADE PARA FIRMAR


TESTAMENTO

A ação foi ajuizada pelo sobrinho do idoso, que o excluiu do rol de beneficiários de seu
testamento.

A 7ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios negou provimento a


recurso de sobrinho e manteve sentença da 2ª Vara de Órfãos e Sucessões de Taguatinga,
que negou pedido para anular testamento que o excluiu do rol de beneficiários, feito por seu
tio em idade avançada.

O autor ajuizou ação na qual narrou que em testamento lavrado em 2008, seu tio o
contemplou como beneficiário de 30% de seu patrimônio. Todavia, após conviver com nova
companheira, alega que o tio foi influenciado a excluí-lo, razão pela qual novo testamento foi
lavrado no ano de 2014. Segundo o autor, na data do segundo testamento, seu parente já
não dispunha de discernimento, fato que seria comprovado por pedido de interdição feito
pela companheira, 4 meses antes do segundo testamento.

Ao proferir a sentença, a magistrada esclareceu que apesar das limitações de fala e audição,
decorrentes da idade, não restou comprovado nenhum prejuízo ao discernimento do tio, que
o tornasse incapaz de testar. Pelo contrario, restou atestado pelo tabelião, que antes de
lavrar o novo testamento, o testador confirmou, novamente, que aquela era sua vontade.

Inconformado, o autor interpôs recurso. Contudo, os desembargadores entenderam que a


sentença não merecia reparos, pois não restou comprovada a incapacidade do testador, e
registraram: “Dessa maneira, constatado que o testador detinha capacidade para exprimir,
livre e conscientemente, sua vontade de dispor do próprio patrimônio, que o documento lhe
foi lido pelo Tabelião na presença de testemunhas e que não restaram comprovados
quaisquer elementos nos autos que possam desconstruir a vontade manifestada no segundo
testamento, lavrado em 26/02/2014, o referido testamento deve ser considerado válido ”.

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Processo: 0015941-41.2016.8.07.0007
Com informações do TJDFT.
Fonte: Jornal Jurid (31/03/2020)

Mantida nulidade de testamentos por debilidade mental da testadora


(segunda-feira, 12 de março de 2018)

Por unanimidade, a Terceira Turma confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
(TJMG) que declarou a nulidade de quatro testamentos firmados por idosa que, de acordo
com os autos, apresentava quadro de debilidade mental à época da confecção dos
documentos públicos. Para o colegiado, o tribunal mineiro aplicou corretamente as
disposições do artigo 1.627 do Código Civil de 1916, que estabelece as hipóteses de
incapacidade para testar. Por meio de ação de nulidade de testamento, as netas afirmaram
que a avó fez seis testamentos públicos – dois quando seu marido ainda estava vivo e mais
quatro após a sua morte. Segundo as autoras, os quatro últimos documentos seriam nulos,
já que a avó sofria de demência à época desses testamentos. Elas também alegaram que um
dos herdeiros teria se aproveitado da debilidade mental da avó para assumir os negócios e
bens da família. De acordo com os autos, o último testamento determinava que metade do
patrimônio disponível seria destinado à Santa Casa de Misericórdia, e outra metade ficaria
com o herdeiro contestado pelas netas.

Dificuldades

O pedido de anulação foi julgado procedente em primeira instância, com sentença mantida
pelo TJMG, que entendeu que a testadora tinha perdido a capacidade mental para praticar
atos da vida civil, inclusive a produção de testamentos. A relatora do recurso especial da
Santa Casa de Misericórdia, ministra Nancy Andrighi, lembrou que a importância da
preservação da última vontade do testador foi objeto de normatização pelo Conselho
Nacional de Justiça, por meio do Provimento 56/16. O documento impõe a obrigatoriedade
de consulta ao Registro Central de Testamentos On-line para o processamento de inventários
e partilhas. “É inegável a relevância que o ordenamento jurídico pátrio emprega em favor de
se preservar a vontade de disposição patrimonial dos sujeitos que assim desejarem fazer. Por
outro lado, questão de alta indagação na doutrina e na jurisprudência se coloca acerca da
demonstração inequívoca de que o testador, ao testar, se encontrava ou não em perfeito
juízo, isto é, se tinha pleno discernimento da formalidade que o testamento encerra”,
apontou a ministra ao lembrar que as dificuldades são ainda maiores quando o testador é
falecido ou não é possível realizar provas técnicas.

Relatos médicos

No caso analisado, a ministra apontou que o TJMG, ao confirmar a sentença, concluiu que a
testadora, após a morte do marido, não reconhecia os próprios membros da família. Além

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disso, o tribunal mineiro registrou o relato de médicos que acompanharam a senhora e a
diagnosticaram com demência já à época dos últimos testamentos registrados.
“Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e fundamentado
suficientemente o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há
como alterar a conclusão obtida mediante análise aprofundada de fatos e provas acerca da
ausência de perfeito juízo da testadora na lavratura dos quatro últimos testamentos”,
concluiu a ministra ao manter a declaração de nulidade.
Processo: REsp 1694965

§ 51. Preservação da legítima como limitação geral à liberdade de testar

* Possuindo, o testador, herdeiros necessários [ascendente, descendente e cônjuge], sua


liberdade de testar é limitada, na medida em que deverá respeitar a legítima.

Art. 1.857. Caput.

§ 1º. A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento.

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens
da herança, constituindo a legítima.

* Na hipótese de a disposição testamentária superar a quota hereditária disponível, a


consequência é a sua redução até o limite legal, nos termos do artigo seguinte:

Art. 1.967. As disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão aos


limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

§ 1o Em se verificando excederem as disposições testamentárias a porção


disponível, serão proporcionalmente reduzidas as quotas do herdeiro ou herdeiros
instituídos, até onde baste, e, não bastando, também os legados, na proporção do
seu valor.

§ 2o Se o testador, prevenindo o caso, dispuser que se inteirem, de preferência,


certos herdeiros e legatários, a redução far-se-á nos outros quinhões ou legados,
observando-se a seu respeito a ordem estabelecida no parágrafo antecedente.

Art. 1.968. Quando consistir em prédio divisível o legado sujeito a redução, far-se-
á esta dividindo-o proporcionalmente.

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§ 1o Se não for possível a divisão, e o excesso do legado montar a mais de um quarto
do valor do prédio, o legatário deixará inteiro na herança o imóvel legado, ficando
com o direito de pedir aos herdeiros o valor que couber na parte disponível; se o
excesso não for de mais de um quarto, aos herdeiros fará tornar em dinheiro o
legatário, que ficará com o prédio.

§ Dito de modo mais simples. Verificado o excesso do legado, deve-se, em


primeiro lugar, aferi-lo, definindo-o matematicamente. Caso o valor
correspondente ao excesso seja superior a ¼ ou 25% do imóvel, este
deverá ser incorporado ao monte partilhável na sucessão legítima, ficando
os herdeiros obrigados a pagar ao legatário o valor que lhe for legalmente
devido, isto é, o valor do imóvel menos o excesso. Caso o excesso não
ultrapasse ¼ ou 25% do imóvel legado, a lógica se inverte e, nesse caso, o
legatário deverá devolver aos herdeiros legitimários o valor que exceder a
quota disponível. Duas situações para que fique claro:

Situação 1

§ Patrimônio considerado: R$ 2.000.000,00


§ Quota disponível em razão da presença de herdeiros necessários: R$
1.000.000,00
§ Valor do imóvel legado indiviso: R$ 1.200.000,00
§ Excesso: R$ 200.000,00 = 1/6 ou 16,66% do valor do imóvel.
§ Solução: Legatário deve ficar com o imóvel e pagar aos herdeiros legítimos o
valor de R$ 200.000,00, correspondente ao excesso do legado.

Situação 2

§ Patrimônio considerado: R$ 2.000.000,00


§ Quota disponível em razão da presença de herdeiros necessários: R$
1.000.000,00
§ Valor do imóvel legado indiviso: R$ 1.500.000,00
§ Excesso: R$ 500.000,00 = 1/3 ou 33,33% do valor do imóvel.
§ Solução: Imóvel deve retornar ao monte partilhável da sucessão legítima e os
herdeiros legítimários devem pagar ao legatário o valor de R$ 1.000.000,00.

§ 2o Se o legatário for ao mesmo tempo herdeiro necessário, poderá inteirar sua


legítima no mesmo imóvel, de preferencia aos outros, sempre que ela e a parte
subsistente do legado lhe absorverem o valor.

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§ Dessa forma, o legislador, seguindo a mesma lógica verificada em outras
regras7, evita a constituição de condomínio [co-domínio/co-propriedade,
i.e, pluralidade de donos/proprietários de um mesmo bem], por ser uma
situação potencialmente litigiosa.

* A contrario sensu, caso o testador não possua herdeiros necessários, nenhuma limitação se
verifica em relação à sua liberdade de testar, de sorte que poderá dispor de todo o seu
patrimônio para depois de sua morte.

* Caso não disponha da totalidade da quota hereditária disponível, prevê o CCB o seguinte:

Art. 1.966. O remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, quando o testador


só em parte dispuser da quota hereditária disponível.

§ 52. Prazo decadencial para a impugnação do testamento

* Nos termos do CCB:

Art. 1.859. Extingue-se em cinco anos o direito de impugnar a validade do


testamento, contado o prazo da data do seu registro.

Art. 1.909. São anuláveis as disposições testamentárias inquinadas de erro, dolo ou


coação.

Parágrafo único. Extingue-se em quatro anos o direito de anular a disposição,


contados de quando o interessado tiver conhecimento do vício.

7 No mesmo sentido podem ser indicados os artigos 504; 1.322; 1.724, todos do CCB.

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11 DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS

§ 53. Considerações Gerais

* Segundo GISELDA HIRONAKA: O assunto em pauta versa, como se vê, exatamente sobre o
conteúdo dos testamentos, quer dizer, sobre a abrangência e o claro teor daquilo que
informou a vontade do testador, ao tempo da facção do instrumento testamental.

§ 54. Instituição de herdeiro ou legatário

* A regra é a seguinte:

Art. 1.897. A nomeação de herdeiro, ou legatário, pode fazer-se pura e simplesmente,


sob condição, para certo fim ou modo, ou por certo motivo.

§ Segundo a mesma autora:

Se a disposição testamentária for pura e simples, significa isso que sua


eficácia irrompe no momento exato da abertura da sucessão, não ficando
atrelada ao implemento de uma condição, nem pendente do cumprimento
de encargo, admitindo-se, assim, aos beneficiados a pronta investidura em
seus direitos testamentariamente constituídos.

Se a disposição testamentária for condicional, significará isso que a eficácia


da instituição estará vinculada à ocorrência de um evento futuro ou incerto,
quer dizer, a uma condição. Essa condição será suspensiva se a produção dos
efeitos estiver atrelada ao implemento, no futuro, daquele evento futuro e
incerto; ou será resolutiva caso a eficácia, já estampada desde a abertura da
sucessão, deixe de ser produzida pela ocorrência do mencionado evento,
resolvendo-se, então, a restrita propriedade.

Se, por outro lado, tratar-se de disposição testamentária modificada pela


imposição de encargo [modal] a herdeiro instituído ou a legatário [hipótese
em que estará atrelada à imposição de cumprimento de um ônus], não
ocorrerá a suspensão da aquisição do direito ou de seu exercício, mas, ao
contrário, estes efeitos produzir-se-ão tão logo se abra a sucessão do autor
da herança. Assim, se o herdeiro instituído ou o legatário falecerem antes do
cumprimento de tal encargo, prevalecerá a instituição, transferindo-se, por
razão da morte, a herança ou o legado aos herdeiros do beneficiado morto,
herdeiros estes que estarão, agora, obrigados ao cumprimento do encargo.

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Ainda a respeito da instituição modal, deve-se observar, juntamente com
ORLANDO GOMES, que não se deve confundir o modo ou encargo com
nudum praeceptum, constituindo-se este em uma simples recomendação
sem relevância jurídica, ao passo que aquele [o encargo/modo], é uma
limitação imposta à liberalidade do sujeito.

§ Controvérsia a respeito das implicações do descumprimento do encargo:

A doutrina majoritária opina no sentido da permanência eficacial do direito do


herdeiro ou do legatário, ainda que não cumprido o encargo que acompanhava a
deixa testamentária, tendo em vista inexistir regra específica a respeito.

Contudo, o professor David filia-se à corrente minoritária, tendo em vista que o


encargo – elemento eficacial ralacionável aos negócios jurídicos benéficos, é dizer,
gratuitos – tem natureza jurídica de ônus e seu descumprimento provoca,
necessariamente, a ineficácia da disposição.

§ 55. Vedação de instituição de herdeiro a termo: regra e exceção

* Segundo NERY JR, a nomeação de herdeiro a termo é irregularidade que implica na ineficácia
legal da disposição. A esta regra fazem exceções as disposições fideicomissárias, podendo o
testador determinar quando se iniciará o direito do fideicomissário, assim como por termo
a ele.

Art. 1.898. A designação do tempo em que deva começar ou cessar o direito do


herdeiro, salvo nas disposições fideicomissárias, ter-se-á por não escrita.

§ 56. Interpretação das cláusulas testamentárias

* A vontade do testador, declarada por meio de formas solenes impostas pela lei, deve ser
respeitada. Para tanto, prevalece sempre o “fator subjetivo, cogitando-se antes do mais da
vontade, expressa ou presumida, do estipulante”.

Art. 1.899. Quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações


diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador.

NOTÍCIA CORRELATA

PROCEDIMENTO ESPECIAL DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. REQUERIMENTO DE


CUMPRIMENTO DE TESTAMENTO PARTICULAR. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DE
TESTEMUNHAS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. 1. O STJ vem mitigando a
exigência da observância estrita dos requisitos legais do testamento, sob o

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fundamento de que a formalidade do ato não pode se sobrepor ao seu conteúdo,
devendo, portanto, prevalecer a vontade do testador, quando, em hipóteses
excepcionais, as circunstâncias específicas levem à conclusão de inexistirem
dúvidas sobre o que foi por ele desejado. 2. No presente caso, ainda que se leve em
consideração que o testador era advogado militante, provável conhecedor da
matéria, não se pode desprezar o contexto em que os fatos se deram, ressaltando-
se, nesse sentido, a sua enfermidade, que, muito provavelmente, preponderou,
significativamente, na decisão de tirar a própria vida. 3. Conjunto probatório
indicativo de que um dos filhos reconheceu a intenção do pai e cumpriu a
disposição de vontade por ele expressada, no que lhe cabia, doando à autora 1/3
do apartamento da Rua Travessa Faria, além de quantia em dinheiro. Os demais
filhos, nada obstante não tenham cumprido, assumiram, em uma cláusula
específica de escritura pública declaratória de partilha de bens, o compromisso de
doar à ora requerente, o imóvel mencionado. 4. Cumprimento por todos os
herdeiros das demais disposições de vontade manifestadas pelo finado no
instrumento, como abertura de conta-corrente para pagamento de despesas de
imóvel habitado pelas suas irmãs. 5.Reconhecimento pelos herdeiros da higidez da
manifestação de vontade do pai. Alegações que se limitaram à ausência dos
requisitos legais do ato. 6. Princípio da conservação do negócio jurídico. 7. Ao se
examinar o ato de disposição de última vontade, deve-se sempre privilegiar a busca
pela real intenção do testador a respeito de seus bens, feita de forma livre,
consciente e espontânea, atestada sua capacidade mental para o ato. (AgRg no
REsp 1401087/MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 13/08/2015) 8. Sentença
recorrida que privilegiou a interpretação literal dos dispositivos legais, em
detrimento da ratio essendi da declaração de vontade, indo assim em direção
contrária à jurisprudência e à solução razoável do caso. RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO.

TJ/RJ – 0042062-25.2015.8.19.0002 – APELAÇÃO. DÉCIMA PRIMEIRA CÂMARA


CÍVEL. Des(a). FERNANDO CERQUEIRA CHAGAS - Julg: 08/05/2019 - Data de
Publicação: 09/05/2019.

§ 57. Nulidade das disposições testamentárias

Art. 1.900. É nula a disposição:

I - que institua herdeiro ou legatário sob a condição captatória de que este disponha,
também por testamento, em benefício do testador, ou de terceiro;
II - que se refira a pessoa incerta, cuja identidade não se possa averiguar;
III - que favoreça a pessoa incerta, cometendo a determinação de sua identidade a
terceiro;
IV - que deixe a arbítrio do herdeiro, ou de outrem, fixar o valor do legado;
V - que favoreça as pessoas a que se referem os arts. 1.801 e 1.802.

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Art. 1.901. Valerá a disposição:

I - em favor de pessoa incerta que deva ser determinada por terceiro, dentre duas ou
mais pessoas mencionadas pelo testador, ou pertencentes a uma família, ou a um
corpo coletivo, ou a um estabelecimento por ele designado;
II - em remuneração de serviços prestados ao testador, por ocasião da moléstia de que
faleceu, ainda que fique ao arbítrio do herdeiro ou de outrem determinar o valor do
legado.

§ 58. Disposições testamentárias filantrópicas

Art. 1.902. A disposição geral em favor dos pobres, dos estabelecimentos particulares de
caridade, ou dos de assistência pública, entender-se-á relativa aos pobres do lugar do domicílio
do testador ao tempo de sua morte, ou dos estabelecimentos aí sitos, salvo se manifestamente
constar que tinha em mente beneficiar os de outra localidade.

Parágrafo único. Nos casos deste artigo, as instituições particulares preferirão sempre às
públicas.

§ 59. Erro quanto à designação de herdeiro testamentário/legatário ou à coisa


legada

Art. 1.903. O erro na designação da pessoa do herdeiro, do legatário, ou da coisa legada anula
a disposição, salvo se, pelo contexto do testamento, por outros documentos, ou por fatos
inequívocos, se puder identificar a pessoa ou coisa a que o testador queria referir-se.

§ Seria o caso de o testador designar pessoa como seu filho e lhe faltar essa
qualidade. Nesse caso, a declaração errada do testador, quando se refere a pessoa ou
qualidade do herdeiro, ou legatário, não vicia disposição, se das demais expressões
contidas no testamento se pode auferir a intenção do testador

§ 60. Disposição em favor de dois ou mais herdeiros

Art. 1.904. Se o testamento nomear dois ou mais herdeiros, sem discriminar a parte de cada
um, partilhar-se-á por igual, entre todos, a porção disponível do testador.

Art. 1.905. Se o testador nomear certos herdeiros individualmente e outros coletivamente, a


herança será dividida em tantas quotas quantos forem os indivíduos e os grupos designados.

§ Assim, se a deixa for em favor dos sujeitos “A”, “B” e das duas filhas de “C”, a herança
deverá ser dividida em três quotas.

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§ 61. Patrimônio remanescente

Art. 1.906. Se forem determinadas as quotas de cada herdeiro, e não absorverem toda a
herança, o remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, segundo a ordem da vocação
hereditária.

§ 62. Distribuição do patrimônio testado residual entre quinhões não definidos

Art. 1.907. Se forem determinados os quinhões de uns e não os de outros herdeiros, distribuir-
se-á por igual a estes últimos o que restar, depois de completas as porções hereditárias dos
primeiros.

§ 63. Especificação de bens não destináveis ao herdeiro testamentário

Art. 1.908. Dispondo o testador que não caiba ao herdeiro instituído certo e determinado
objeto, dentre os da herança, tocará ele aos herdeiros legítimos.

§ 64. Anulabilidade das disposições testamentárias por erro, dolo ou coação.


Prazo prescricional

Art. 1.909. São anuláveis as disposições testamentárias inquinadas de erro, dolo ou coação.

Parágrafo único. Extingue-se em quatro anos o direito de anular a disposição, contados de


quando o interessado tiver conhecimento do vício.

§ 65. Ineficácia de disposições testamentárias e sua extensão

Art. 1.910. A ineficácia de uma disposição testamentária importa a das outras que, sem aquela,
não teriam sido determinadas pelo testador.

§ 66. Estipulações testamentárias acessórias: inalienabilidade,


impenhorabilidade e incomunicabilidade.

Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica
impenhorabilidade e incomunicabilidade.

Parágrafo único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua alienação, por


conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autorização judicial, o produto
da venda converter-se-á em outros bens, sobre os quais incidirão as restrições apostas aos
primeiros.

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§ Tais cláusulas, que podem ser vitalícias ou temporariamente impostas, retiram do
beneficiário de disposições mortis causa (testamentos) ou inter vivos (contratos), a
faculdade de alienação voluntária, restringindo a propriedade do gratificado. São elas:
a) Inalienabilidade: retira do beneficiário a faculdade de alienação voluntária do
bem;
b) Impenhorabilidade: proíbe que o bem possa ser excutido pelo credor em
execução por dívidas;
c) Incomunicabilidade: impede que o bem gravado componha comunhão conjugal
de bens.
§ No entanto, a cláusula de incomunicabilidade e impenhorabilidade não implica nas
demais. Somente a de inalienabilidade atrai as outras.

STJ – QUARTA TURMA


REsp 1.155.547-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, por unanimidade, julgado em
06/11/2018, DJe 09/11/2018

DESTAQUE

A melhor interpretação do caput do art. 1.911 do Código Civil de 2002 é aquela que
conduz ao entendimento de que: a) há possibilidade de imposição autônoma das
cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, a critério
do doador/instituidor; b) uma vez aposto o gravame da inalienabilidade,
pressupõe-se, ex vi lege, automaticamente, a impenhorabilidade e a
incomunicabilidade; c) a inserção exclusiva da proibição de não penhorar e/ou não
comunicar não gera a presunção da inalienabilidade; d) a instituição autônoma da
impenhorabilidade não pressupõe a incomunicabilidade e vice-versa.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em definir a interpretação jurídica a ser dada ao caput do


art. 1.911 do Código Civil de 2002 diante da nítida limitação ao pleno direito de
propriedade, para definir se a aposição da cláusula de impenhorabilidade e/ou
incomunicabilidade em ato de liberalidade importa automaticamente, ou não, na
cláusula de inalienabilidade. Nesse sentido, cumpre salientar que da simples leitura
do artigo de lei anteriormente mencionado, depreende-se que o legislador
estabeleceu apenas um comando, isto é, que a imposição da inalienabilidade
resume a impenhorabilidade e incomunicabilidade. Em outras palavras, a lei civil
não estabeleceu, prima facie, que a impenhorabilidade ou a incomunicabilidade,
gravadas de forma autônoma, importaria na inalienabilidade. A doutrina esclarece
que "o art. 1.911 do Código Civil estabelece que a cláusula de inalienabilidade
gravada sobre bens que compõem a herança implica, automaticamente, nas
cláusulas de 'impenhorabilidade e incomunicabilidade'. Ou seja, basta gravar o
patrimônio transmitido com a cláusula de inalienabildiade para que as demais
decorram de pleno direito. A recíproca, entretanto, não é verdadeira. Por isso, as

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cláusulas de impenhorabildiade e de incomunicabildiade podem ser impostas
isoladamente, produzindo efeitos únicos. A cláusula de inalienabilidade, porém, se
apresenta mais larga e profunda, trazendo consigo, a reboque, as demais". Dessa
forma, sendo a inalienabilidade de maior amplitude, é decorrência natural que
implique na proibição de penhorar e comunicar, tudo isso seguindo a lógica da
antiga máxima de que in eo quod plus est semper inest et minus (quem pode o
mais, pode o menos). Porém, o contrário não se verifica. A impenhorabilidade e a
incomunicabilidade possuem objetos mais limitados, específicos. A primeira se
volta tão somente para os credores e a segunda impõe-se ao cônjuge do
beneficiário (donatário ou herdeiro). Nessa seara, é consectário lógico que a
previsão de cláusula mais restritiva não possa abranger objeto mais extenso. Esse
é o sentido jurídico pelo qual o legislador do Código Civil de 2002 limitou-se a
estabelecer, no caput do art. 1.911, uma única direção para a norma proibitiva, isto
é, que a inalienabilidade implica automaticamente na impenhorabilidade e na
incomunicabilidade, restrigindo a tanto a vedação.

§ Mesmo a cláusula vitalícia só produz efeito enquanto viver o beneficiário. Com a


morte deste, seu cônjuge poderá concorrer nos termos da lei.

DIREITO CIVIL. HERANÇA DE BEM GRAVADO COM CLÁUSULA DE


INCOMUNICABILIDADE.
A cláusula de incomunicabilidade imposta a um bem transferido por doação ou
testamento só produz efeitos enquanto viver o beneficiário, sendo que, após a
morte deste, o cônjuge sobrevivente poderá se habilitar como herdeiro do referido
bem, observada a ordem de vocação hereditária. Isso porque a cláusula de
incomunicabilidade imposta a um bem não se relaciona com a vocação hereditária.
Assim, se o indivíduo recebeu por doação ou testamento bem imóvel com a
referida cláusula, sua morte não impede que seu herdeiro receba o mesmo bem.
São dois institutos distintos: cláusula de incomunicabilidade e vocação hereditária.
Diferenciam-se, ainda: meação e herança. Ressalte-se que o art. 1.829 do CC
enumera os chamados a suceder e define a ordem em que a sucessão é deferida.
O dispositivo preceitua que o cônjuge é também herdeiro e nessa qualidade
concorre com descendentes (inciso I) e ascendentes (inciso II). Na falta de
descendentes e ascendentes, o cônjuge herda sozinho (inciso III). Só no inciso IV é
que são contemplados os colaterais. Pode-se imaginar, por exemplo, a hipótese em
que um bem é doado ao cônjuge (ou legado a ele) com cláusula de inalienabilidade.
Dá-se o divórcio e o bem, em virtude daquela cláusula, não compõe o monte a ser
partilhado. Outra hipótese, bem diferente, é a do cônjuge que recebe a coisa
gravada com aquela cláusula e falece. O bem, que era exclusivo dele, passa a
integrar o monte que será herdado por aqueles que a lei determina. Monte, aliás,
eventualmente composto por outros bens também exclusivos que, nem por isso,
deixam de fazer parte da herança. Não se desconhece a existência de precedente
da 4ª Turma, no qual se decidiu, por maioria, que "estabelecida, pelo testador,

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cláusula restritiva sobre o quinhão da herdeira, de incomunicabilidade,
inalienabilidade e impenhorabilidade, o falecimento dela não afasta a eficácia da
disposição testamentária, de sorte que procede o pedido de habilitação, no
inventário em questão, dos sobrinhos da de cujus" (REsp 246.693-SP, DJ
17/5/2004). Ressalte-se, contudo, que a jurisprudência mais recente do STJ,
seguindo a doutrina e a jurisprudência do STF, voltou a orientar-se no sentido de
que "a cláusula de inalienabilidade vitalícia tem vigência enquanto viver o
beneficiário, passando livres e desembaraçados aos seus herdeiros os bens objeto
da restrição" (REsp 1.101.702-RS, Terceira Turma, DJe 9/10/2009). Por outro lado,
a linha exegética segundo a qual a incomunicabilidade de bens inerente ao regime
de bens do matrimônio teria o efeito de alterar a ordem de vocação hereditária
prevista no CC/2002 não encontra apoio na jurisprudência atualmente consolidada
na Segunda Seção (REsp 1.472.945-RJ, Terceira Turma, DJe 19/11/2014; REsp
1.382.170-SP, Segunda Seção, DJe 26/5/2015; AgRg nos EREsp 1.472.945-RJ,
Segunda Seção, DJe 29/6/2015). REsp 1.552.553-RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti,
julgado em 24/11/2015, DJe 11/2/2016.

§ Ademais, os bens gravados recebidos pelo beneficiário, quando transmitidos aos


herdeiros deste em razão de sua morte, o serão livres de qualquer restrição.
§ Sobre a impenhorabilidade há discussão acerca da sua extensão aos frutos do bem
gravado. A esse respeito, três teses: 1ª) Impenhorabilidade não alcança os frutos;
2ª) Impenhorabilidade alcança os frutos; e 3ª) admite a impenhorabilidade quando
houver previsão expressa na cláusula testamentária de impenhorabilidade.
§ Há antigo julgado do STF no sentido de que “a inalienabilidade dos bens não
importa necessariamente a dos frutos e rendimento. Nada obsta a que, porém, por
vontade expressa do testado, a impenhorabilidade dos frutos acompanhe a
impenhorabilidade dos bens” (STF, RE 12.478, 1ª Turma, Rel. Min. Barros Barreto,
j. 03.11.1950, DJU 04.08.1952).
§ Não obstante a cláusula de impenhorabilidade, em homenagem ao princípio da
função social da propriedade, o STJ vem admitindo a penhora de imóvel clausulado,
diante de dívida de condomínio.

§ 67. Estipulações testamentárias acessórias em relação aos bens da legítima

Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador
estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os
bens da legítima.

§ Quando pretender instituir estipulação testamentária acessória sobre bens que


compõem a legítima, o testador deverá justificar. Mas a causa há de ser justa. Assim,
justa causa é conceito jurídico indeterminado a ser preenchido caso a caso. A
dificuldade de se averiguar sobre a legitimidade de tal causa está em que a discussão
se dará após a morte do testador.

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OBSERVAÇÃO

O CCB/1916 não previa essa obrigação, de modo que o testador podia clausular bens
da legítima sem estar obrigado a justificar.

Ocorre que o CCB/2002 estabeleceu – em relação aos testamento feitos sob a égide
do CCB/1916 – que se, no prazo de um ano a contar de sua vigência, o testador não
aditasse o testamento para declarar a justa causa de cláusula aposta à legítima, essa
cláusula perderia sua eficácia. Vejamos:

Art. 2.042. Aplica-se o disposto no caput do art. 1.848, quando aberta a sucessão no
prazo de um ano após a entrada em vigor deste Código, ainda que o testamento tenha
sido feito na vigência do anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916; se, no prazo,
o testador não aditar o testamento para declarar a justa causa de cláusula aposta à
legítima, não subsistirá a restrição.

§ A ausência de justa causa provoca nulidade ou ineficácia da cláusula? Discussão


doutrinária e jurisprudencial opostas. Professor entende tratar-se de nulidade
absoluta, tendo em vista que, se o texto legal proíbe o testador de estabelecer a
cláusula sem o critério da justa causa, impõe-se a aplicação do art. 166, VII do CCB.
Verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


[...]
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

Imóvel doado aos filhos. Cláusula de inalienabilidade. Morte dos doadores. Ausência de justa
causa para a manutenção da restrição ao direito de propriedade. Cancelamento da cláusula.
Possibilidade. REsp 1.631.278-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade,
julgado em 19/03/2019, DJe 29/03/2019

O Superior Tribunal de Justiça, ainda sob a vigência do CC/1916, teve a oportunidade de


interpretar o art. 1.676 do referido Código com ressalvas, admitindo-se o cancelamento da
cláusula de inalienabilidade nas hipóteses em que a restrição, no lugar de cumprir sua função
de garantia de patrimônio aos descendentes, representava lesão aos seus legítimos
interesses. Nesse sentido, a imobilização do bem nas mãos dos donatários poderá não lhes
garantir a subsistência, seja porque a própria função social do imóvel objeto do negócio a
título gratuito resta por todo combalida, assumindo-se uma posição "antieconômica", com a
sua retirada do mercado por dilargadas décadas, cristalizando-o no patrimônio de quem dele
não mais deseja ser o seu proprietário. Assim, o atual Código Civil, no art. 1.848, passou a
exigir que o instituidor da inalienabilidade, nos casos de testamento, indique expressamente
uma justa causa para a restrição imposta, operando verdadeira inversão na lógica existente
sob a égide do CC de 1916. Há de se exigir que o doador manifeste razoável justificativa para

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a imobilização de determinado bem em determinado patrimônio, sob pena de privilegiarem-
se excessos de proteção ou caprichos desarrazoados. Segundo a doutrina, "o que determina
a validade da cláusula não é mais a vontade indiscriminada do testador, mas a existência de
justa causa para a restrição imposta voluntariamente pelo testador. Pode ser considerada
justa causa a prodigalidade, ou a incapacidade por doença mental, que diminuindo o
discernimento do herdeiro, torna provável que esse dilapide a herança". Nesse contexto, o
ato intervivos de transferência de bem do patrimônio dos pais aos filhos configura
adiantamento de legítima e, com a morte dos doadores, passa a ser legítima propriamente
dita. Não havendo justo motivo para que se mantenha congelado o bem sob a propriedade
dos donatários, todos maiores, que manifestam não possuir interesse em manter sob o seu
domínio o imóvel, há de se cancelar as cláusulas que o restrigem.

§ Discussão a respeito da extensão do art. 1.848 à doação. Divergência doutrinária e


jurisprudencial. Duas correntes antagônicas. Professor entende que não se aplica, haja
vista tratar-se de cláusula restritiva da autonomia privada, que não admite
intepretação extensiva ou analógica.

Art. 1.848. Caput


§ 1º. Não é permitido ao testador estabelecer a conversão dos bens da legítima em outros de
espécie diversa.

§ Não pode o testador determinar a transformação dos bens em outros de espécie


diferente, ainda a pretexto de serem melhor administrados. Assim, nãos e permite que
se determine sejam os imóveis alienados e convertidos em dinheiro ou vice-versa.

§ 2º. Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser alienados os bens
gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que ficarão sub-rogados nos ônus dos
primeiros.

§ Valem as mesmas observações feitas ao caput.


§ Correlação desse dispositivo com a função social da propriedade, segundo a
jurisprudência do STJ.
§ Além disso, o dispositivo em questão também se estende às cláusulas de
incomunicabilidade e impenhorabilidade.

Jurisprudência correlata

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. PRETENSÃO DE NULIDADE DE CESSÃO DE


DIREITOS HEREDITÁRIOS. ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA DE
INALIENABILIDADE SOBRE O IMÓVEL. AUSÊNCIA DE REGISTRO. INEFICÁCIA PERANTE
TERCEIROS DE BOA-FÉ. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
1. Cuida-se de ação declaratória de nulidade de escritura de cessão de direitos
hereditários.

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2. A sentença julgou improcedentes os pedidos, ao fundamento de que a cláusula de
inalienabilidade não fora levada à registro, que a torna ineficaz perante terceiro de
boa-fé.
3. Verifica-se que a autora inventariante e os espólios de seu pai e avô paterno
objetivam a nulidade da cessão de direitos hereditários firmada por seu genitor e sua
avó, ambos já falecidos, com os réus, tendo como objeto o lote 2, do loteamento
Jardim Iguassu, em Teresópolis, de propriedade de seu avô e sua avó paternos, em
virtude de referido bem ter sido gravado com cláusula de inalienabilidade em
testamento.
4. Sabe-se que a proteção ao direito das sucessões encontra arrimo na Constituição
Federal (art. 5º, XXX, CF) e no Código Civil (art. 1.848).
5. O direito à herança possui como regra principal a intangibilidade, comportando
algumas exceções.
6. É incontroverso que a cessão de direitos hereditários foi firmada por partes capazes
e amparada em lei, com o pagamento do preço pelos ora apelados.
7. Sustentam os recorrentes que o imóvel em questão fora doado por seu avô ao seu
pai, por meio de testamento, possuindo gravação de cláusula de inalienabilidade,
conforme cláusula sétima.
8. Ademais, asseveram os autores que aludida cessão não poderia ocorrer, uma vez
que não houve a outorga uxória da esposa do cedente, mãe da inventariante.
9. A cláusula de inalienabilidade é um limite da liberdade de testar, prevista na norma
inserta no art. 1911 do Código Civil, recebendo o herdeiro o domínio limitado da
herança.
10. Ocorre que para referido gravame ter eficácia perante terceiros de boa-fé é
necessária averbação do Registro de Imóveis, na forma do art. 167, II, nº 11 da lei
6015/1973.
11. O registro de qualquer cláusula restritiva dos direitos hereditários é imprescindível
para produzir efeitos perante terceiros, uma vez que é a via regular de conhecimento
pelos compradores da situação real do bem que se pretende adquirir.
12. In casu, em não tendo sido devidamente registrada no RGI a cláusula de
inalienabilidade do imóvel em tela, não há como impô-la aos apelados, terceiros de
boa-fé que adquiriam onerosamente a cessão de direitos hereditários há mais de
quatorze anos, firmada com o pai e avó paterna da inventariante apelante.
13. De certo que eventual má-fé de terceiros deve ser comprovada pelo arguente, o
que não ocorreu na presente hipótese.
14. A par da controvérsia existente nos autos acerca do estado civil do herdeiro
Roberto, cedente, no momento da celebração da cessão de direitos, uma vez que
ausente a outorga uxória, fato é que a mesma leva à anulação se requerida pelo outro
cônjuge até o prazo de dois anos após o casamento, na forma do art. 1.649 do Diploma
Civil, o que não restou demonstrado nestes autos.
15. Sentença de improcedência mantida.
16. Majoração dos honorários sucumbenciais.
17. Desprovimento do recurso.

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(0004977-69.2015.8.19.0207 - APELAÇÃOOITAVA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – Des(a). MÔNICA MARIA COSTA DI PIERO – Julg:
30/01/2018)
Disponível em:
http://www1.tjrj.jus.br/gedcacheweb/default.aspx?UZIP=1&GEDID=00041697630B26
20C990ACAED53118A82C7DC507434F1B3F&USER=

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12 DIREITO DE ACRESCER ENTRE HERDEIROS E LEGATÁRIOS

§ 68. Noção geral

* Como sabido, é dado ao testador instituir mais de um herdeiro testamentário sem


especificar as quotas de cada um, assim como é possível àquele instituir vários legatários
sobre o mesmo bem. Ocorre que, não raras vezes, parte dos herdeiros ou legatários
instituídos acaba por não exercer o seu direito sucessório. Nesses casos, é preciso dar um
destino à quota hereditária não herdada. As regras que solucionam essas questões
designam-se direito de acrescer e se aplicam apenas, caso o testador não haja estabelecido
previsão expressa a respeito do tema.

* Segundo Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka: Consiste no direito de o herdeiro ou


legatário também receber, respeitada a proporção do número de contemplados no
testamento, a parte que caberia a um outro herdeiro ou legatário que não pôde ou não quis
receber sua herança ou legado.

* Para Paulo Lôbo, “o direito de acrescer é aquele mediante o qual um coerdeiro ou


colegatário recebe proporcionalmente a parte do outro, nomeado conjuntamente, que não
pôde aceitá-la ou a ela renunciou”.

§ 69. Hipóteses

Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem
conjuntamente chamados à herança em quinhões não determinados, e qualquer deles não
puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à dos co-herdeiros, salvo o direito do
substituto.

STJ: TODOS HERDEIROS LEGÍTIMOS FAZEM JUS À PARTILHA IGUALITÁRIA DE COTA


TESTAMENTÁRIA REDISTRIBUÍDA DEVIDO AUSÊNCIA DO DIREITO DE ACRESCER

Nas hipóteses de testamento que fixa cotas determinadas para divisão da herança, e em caso
de um dos herdeiros testamentários morrer antes da abertura da sucessão (a chamada “pré-
morte”), o valor da cota-parte remanescente deverá ser redistribuído entre todos os
herdeiros legítimos, conforme a ordem legal de preferência estabelecida no Código Civil, não
havendo impedimento legal para que herdeiros testamentários participem também como
herdeiros legítimos na mesma sucessão hereditária.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou
provimento ao recurso do irmão da testadora, que tentava excluir seus sobrinhos da partilha
da cota remanescente alegando que, por serem herdeiros testamentários, não poderiam
figurar novamente na sucessão na condição de herdeiros legítimos.

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No caso analisado, a testadora faleceu solteira e sem herdeiros necessários (pais ou filhos),
motivo pelo qual dispôs integralmente de seu patrimônio por meio de testamento público.
No testamento ela contemplou, igualmente, dez sobrinhos.

Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, relator, a testadora afastou da sucessão o herdeiro
colateral, seu irmão, recorrente no STJ. A questão a ser analisada é o que ocorre com a
quantia destinada a um dos sobrinhos que faleceu antes da morte da testadora.

Cota remanescente

As instâncias ordinárias entenderam que a partilha da cota remanescente dos bens testados
deveria ser feita de forma igualitária entre todos os herdeiros, incluindo novamente os
sobrinhos filhos dos irmãos falecidos, que, além de serem herdeiros testamentários,
ingressam na sucessão na condição de herdeiros legítimos.

O ministro lembrou que os sobrinhos da testadora, além de serem herdeiros testamentários,


são também herdeiros por estirpe, visto que receberão a cota-parte da herança que cabia à
falecida mãe ou pai, herdeiros legítimos, por representação.

“Na hipótese de quinhões determinados, não há falar no direito de acrescer. Se o herdeiro


testamentário pleiteado com cota fixa falecer antes da abertura da sucessão, sem previsão
de substituto, aquela parcela deve retornar ao monte e ser objeto de partilha com todos os
herdeiros legítimos”, disse o relator.

É inviável, de acordo com o relator, acolher a tese do recorrente de que ele seria o único
herdeiro legítimo na linha colateral, tendo direito ao montante integral deixado pelo
herdeiro testamentário falecido.

Entendimento correto

Segundo Villas Bôas Cueva, foi correta a conclusão do tribunal de origem no sentido de que
o recorrente e os demais representantes dos irmãos da testadora, por serem os herdeiros
legítimos na linha colateral, fazem jus a um décimo dos bens, em decorrência de não se
realizar o direito de acrescer.

“O direito de acrescer previsto no artigo 1.941 do Código Civil de 2002 representa uma forma
de vocação sucessória indireta e pressupõe (i) a nomeação dos herdeiros na mesma cláusula
testamentária; (ii) que o patrimônio compreenda os mesmos bens ou a mesma porção de
bens e (iii) a inexistência de cotas hereditárias predeterminadas”, explicou.

O ministro ratificou o entendimento do Ministério Público, que enfatizou a inexistência do


direito de acrescer entre os demais herdeiros nos casos em que o testador fixe a cota de
cada sucessor.

Nessas hipóteses, segundo parecer do MP e a conclusão do colegiado, quando há


determinação da cota de cada herdeiro, e não correspondendo estas ao total da herança, o
que remanescer pertencerá aos herdeiros legítimos, obedecendo à ordem exposta no artigo
1.829 do Código Civil.

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Fonte: STJ (21/11/2018)

Art. 1.942. O direito de acrescer competirá aos co-legatários, quando nomeados


conjuntamente a respeito de uma só coisa, determinada e certa, ou quando o objeto do legado
não puder ser dividido sem risco de desvalorização.

Art. 1.943. Se um dos co-herdeiros ou co-legatários, nas condições do artigo antecedente,


morrer antes do testador; se renunciar a herança ou legado, ou destes for excluído, e, se a
condição sob a qual foi instituído não se verificar, acrescerá o seu quinhão, salvo o direito do
substituto, à parte dos co-herdeiros ou co-legatários conjuntos.

Parágrafo único. Os co-herdeiros ou co-legatários, aos quais acresceu o quinhão daquele que
não quis ou não pôde suceder, ficam sujeitos às obrigações ou encargos que o oneravam.

Nota: Portanto, em sendo realizada a nomeação conjunta de legatários a respeito de um


mesmo bem, na hipótese de algum deles não receber a sua quota, esta será dividida entre
os demais colegatários.

Nota: Usando do mesmo exemplo apresentado por Flávio Tartuce, temos que se o autor
da herança deixar um imóvel para dois legatários, falecendo um deles, a metade do
imóvel do legatário morto será transmitida ao colegatário. Nessa hipótese os coerdeiros
ou colegatários, aos quais se acresceu a parte daquele que não quis ou pôde suceder,
ficam sujeitos às obrigações ou encargos que o oneravam, como ocorre em relação aos
impostos e obrigações de condomínio relativos ao imóvel legado.

Art. 1.944. Quando não se efetua o direito de acrescer, transmite-se aos herdeiros legítimos a
quota vaga do nomeado.

Parágrafo único. Não existindo o direito de acrescer entre os co-legatários, a quota do que
faltar acresce ao herdeiro ou ao legatário incumbido de satisfazer esse legado, ou a todos os
herdeiros, na proporção dos seus quinhões, se o legado se deduziu da herança.

Nota: em síntese: caso não haja sujeitos para exercer o direito de acrescer, a quota vaga
ou o bem legado passa a compor a sucessão legítima

Art. 1.945. Não pode o beneficiário do acréscimo repudiá-lo separadamente da herança ou


legado que lhe caiba, salvo se o acréscimo comportar encargos especiais impostos pelo
testador; nesse caso, uma vez repudiado, reverte o acréscimo para a pessoa a favor de quem
os encargos foram instituídos.

Nota: Não pode o beneficiário do direito de acrescer repudiá-lo separadamente da


herança ou legado que lhe caiba. Isso, salvo se o acréscimo comportar encargos especiais

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impostos pelo testador. Nesse caso, uma vez repudiado, reverte o acréscimo para a
pessoa a favor de quem os encargos foram instituídos. (FLÁVIO TARTUCE).

Art. 1.946. Legado um só usufruto conjuntamente a duas ou mais pessoas, a parte da que faltar
acresce aos co-legatários.

Nota: Para ilustrar, o autor da herança lega um usufruto para B, C e D, sem qualquer outra
estipulação de montante, fração ou percentual. Em regra, se D falece antes do testador,
a sua parte do usufruto é transmitida para B e C. (FLÁVIO TARTUCE).

Art. 1.946. Caput.

Parágrafo único. Se não houver conjunção entre os co-legatários, ou se, apesar de conjuntos,
só lhes foi legada certa parte do usufruto, consolidar-se-ão na propriedade as quotas dos que
faltarem, à medida que eles forem faltando.

Nota: Exemplificando, se a estipulação é feita no sentido de se estabelecer 50% do


usufruto para B e 50% do usufruto para C, se B falece, a sua quota não vai para C, mas
para o nu-proprietário, consolidando-se a propriedade. (FLÁVIO TARTUCE).

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13 DAS SUBSTITUIÇÕES

§ 70. Colocação do tema

* É disposição testamentária em que o disponente chama uma pessoa para receber, no todo
ou em parte, a herança ou o legado, na falta ou após o herdeiro ou legatário nomeado em
primeiro lugar, ou seja, quando a vocação deste ou daquele cessar por qualquer causa.
(DINIZ). É, por isso, instituição que se subordina a outra e, por isso, subsidiária e condicional,
pois fica na dependência de evento futuro e incerto. (DINIZ).

* As regras seguintes foram idealizadas para as hipóteses em que herdeiro testamentário ou


legatário, por qualquer razão, não suceda efetivamente. São três as espécies de substituição:

a) Substituição Vulgar (Ordinária);


b) Substituição Recíproca;
c) Substituição Fideicomissária;
d) Compendiosa (não prevista no CCB). A respeito dela, assinala Paulo Lobo (2019,
p.227):

A doutrina também se refere à substituição compendiosa, assim denominada porque


contém várias substituições sob forma de compêndio, isto é, resumo de palavras
(Orlando Gomes, 1973, p. 226). Era prevista nas Ordenações Filipinas (Liv. 4, Tít. 87,
12), mas desapareceu no direito contemporâneo.

* Vejamos as regras de cada uma delas:

§ 71. Da Substituições vulgar e recíproca

* Nessas modalidades, o próprio testador indica o substituto ao herdeiro ou legatário.


Observe que em todas as regras o legislador homenageia em primeiro plano a vontade do
testador, aplicando-se a disposição legal apenas quando aquele silenciar.

Art. 1.947. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao legatário nomeado,
para o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado,
presumindo-se que a substituição foi determinada para as duas alternativas, ainda que o
testador só a uma se refira.

Art. 1.948. Também é lícito ao testador substituir muitas pessoas por uma só, ou vice-
versa, e ainda substituir com reciprocidade ou sem ela.

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Nota: Para esclarecer melhor o conteúdo desse dispositivo, vale transcrever a seguinte
lição extraída da obra do professor Luiz Paulo Vieira de Carvalho, donde se extrai, inclusive,
as espécies de substituição recíproca. Vejamos;

A substituição vulgar apresenta-se de três modos, nos termos do art. 1948 do Código Civil:

(i) simples (art. 1.948, 1ª parte, do CC), quando há um só substituto para um ou muitos
herdeiros ou legatários instituídos, como ocorre, por exemplo, quando o testador estipula
a seguinte disposição testamentária: “Nomeio, como meus herdeiros, João e José; pela
falta de qualquer deles, herdará Maria”;

(ii) coletiva (art. 1.948, 2ª parte, do CC), quando existe mais de um substituto para um ou
uma pluralidade de substituídos, como ocorre, exemplificando, quando o testador estipula
a seguinte deixa testamentária: “Nomeio, como meus legatários, João e José; por morte
de qualquer um deles, recebem Pedro e Antônio”; e

(iii) recíproca (art. 1.948, 3ª parte, do CC), quando são designados dois ou mais herdeiros
ou legatários em nomeação não conjunta, estipulando o disponente que se substituam
reciprocamente, na parte do nomeado faltante, como, por exemplo, nomeio Pedro, Paulo
e José, como meus herdeiros, na proporção de 1/3 para cada um; se qualquer deles faltar,
o outro o substituirá.

Art. 1.949. O substituto fica sujeito à condição ou encargo imposto ao substituído,


quando não for diversa a intenção manifestada pelo testador, ou não resultar outra coisa
da natureza da condição ou do encargo.

Art. 1.950. Se, entre muitos co-herdeiros ou legatários de partes desiguais, for
estabelecida substituição recíproca, a proporção dos quinhões fixada na primeira
disposição entender-se-á mantida na segunda; se, com as outras anteriormente
nomeadas, for incluída mais alguma pessoa na substituição, o quinhão vago pertencerá
em partes iguais aos substitutos.

Mais uma vez, aproveitamos o magistério de Luiz Paulo Vieira de Carvalho:

Exemplificando, o testador poderá estipular a seguinte deixa testamentária: “Nomeio A,


B e C como meus herdeiros, cabendo ao primeiro 1/6 da disponível, ao segundo, 2/6 e,
ao terceiro, 3/6”. Acaso verificada a falta de A, de acordo com o dispositivo legal citado,
1/6 da herança líquida será dividida na proporção da parte determinada pelo testador
em relação aos titulares dos demais quinhões, ou seja, duas partes para B e três, para C.

No entanto, na esteira da segunda parte do artigo em comento, se, com outros


anteriormente nomeados, for incluído mais alguém na substituição, até por ausência de
meios de apuração da quota atribuída a esse alguém, o quinhão vago pertencerá em
partes iguais aos substitutos, a não ser que disponha em contrário o testador.

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Assim, pode ocorrer a seguinte cláusula: “Nomeio A, B e C como meus herdeiros, na
proporção de um terço para cada um. Se, contudo, qualquer deles vier a faltar, os outros
o substituirão juntamente com D.” Nesta hipótese, será irrelevante que os quinhões de
A, B e C sejam iguais ou desiguais, pois se deve, simplesmente, dividir a parte do que
faltar pelo número dos substitutos, que serão contemplados com partes rigorosamente
iguais.

§ 72. Da Substituição Fideicomissária

* Nessa modalidade de substituição o testador institui herdeiros ou legatários, estabelecendo


que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmitirá ao fiduciário,
resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor
de outrem, que se qualifica de fideicomissário.

* Nessa relação temos três sujeitos bem definidos:

a) Fideicomitente: Testador, autor da sucessão;


b) Fiduciário: 1º herdeiro a quem o patrimônio especificado é transmitido e deverá
permanecer até a sua morte, a superveniência de um termo ou até o implemento de
condição resolutiva.
c) Fideicomissário: 2º herdeiro que receberá o patrimônio diretamente do fiduciário,
segundo as regras previstas no testamento e na lei.

* Vejamos o que diz o CCB a respeito desse instituto:

Art. 1.951. Pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por
ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o
direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem,
que se qualifica de fideicomissário.

Art. 1.952. A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não


concebidos ao tempo da morte do testador.

Parágrafo único. Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário,


adquirirá este a propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o
direito do fiduciário.

Nota: Portanto, somente em favor de prole eventual pode ser instituído o presente
instituto. Inclusive, a doutrina majoritária entende aplicável ao caso presente o
disposto no art. 1.800, § 4º do CCB:
Art. 1.800, § 4º. Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido
o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador,
caberão aos herdeiros legítimos.

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Nota: Na opinião de Stolze e Pamplona Filho: “[...] nos dias de hoje, com a limitação
imposta pelo Código de 2002, no sentido de que a substituição somente será
permitida em favor da prole não concebida ao tempo da morte do testador –
vedação inexistente no diploma anterior –, é forçoso convir que a sua aplicação
torne-se muito mais frequente nos abstratos exercícios acadêmicos do que na
realidade da vida”.

Art. 1.953. O fiduciário tem a propriedade da herança ou legado, mas restrita e resolúvel.

Parágrafo único. O fiduciário é obrigado a proceder ao inventário dos bens gravados, e a


prestar caução de restituí-los se o exigir o fideicomissário.

Nota: A presente regra decorre daquilo que estabelece o art. 1.951 do CCB, vez que
o fiduciário sempre recebe os bens testados a título precário e transitório, já que
tais bens passarão necessariamente à titularidade do herdeiro fideicomissário, de
acordo com a disposição testamentária, que pode considerar a morte do fiduciário,
a superveniência de termo ou de condição resolutiva.

Art. 1.954. Salvo disposição em contrário do testador, se o fiduciário renunciar a herança


ou o legado, defere-se ao fideicomissário o poder de aceitar.

Nota: Dito de outro modo, se o 1º herdeiro (fiduciário) se manifesta no sentido de


não aceitar a herança ou o legado, caberá ao 2ª herdeiro (fideicomissário)
manifestar-se.

Art. 1.955. O fideicomissário pode renunciar a herança ou o legado, e, neste caso, o


fideicomisso caduca, deixando de ser resolúvel a propriedade do fiduciário, se não houver
disposição contrária do testador.

Nota: Obviamente se o 2ª herdeiro (fideicomissário) renunciar a herança ou legado,


o fideicomisso perde seus efeitos e a propriedade, antes exercida a título precário
pelo 1ª herdeiro (fiduciário) deixa de ser resolúvel, tornando-se plena.

Art. 1.956. Se o fideicomissário aceitar a herança ou o legado, terá direito à parte que, ao
fiduciário, em qualquer tempo acrescer.

Nota: Reportamo-nos às anotações feitas aos arts. 1.941 a 1.946 do CCB.

Art. 1.957. Ao sobrevir a sucessão, o fideicomissário responde pelos encargos da herança


que ainda restarem.

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Nota: Ao assumir a titularidade dos bens, o 2º herdeiro (fideicomissário) passa a
responder pelos encargos da herança ainda pendentes.

Art. 1.958. Caduca o fideicomisso se o fideicomissário morrer antes do fiduciário, ou


antes de realizar-se a condição resolutória do direito deste último; nesse caso, a
propriedade consolida-se no fiduciário, nos termos do art. 1.955.

Nota: O direito expectado do fideicomissário não se transmite aos seus herdeiros.

Art. 1.959. São nulos os fideicomissos além do segundo grau.

Nota: Encontramos na obra de Arnaldo Rizzardo a melhor explicação acerca do


presente artigo. Referido autor, baseado na obra de outro teórico de notória
capacidade, explica:

Temos a lição de Tito Prates da Fonseca, quanto ao conteúdo do art. 1.739 do


Código anterior, e, assim, do art. 1.959 do vigente, eis que iguais os textos: “O
fideicomisso supõe dois herdeiros: um do primeiro grau, que é o instituído, com o
encargo de entregar a herança à pessoa designada; e o outro do segundo grau, que
é a pessoa designada para receber a herança, e que deve recebê-la do instituído ou
de seus herdeiros. O fiduciário é herdeiro em primeiro grau, e o fideicomissário é
herdeiro em segundo grau. Além deste segundo grau não admite o Código
fideicomisso. A obrigação de entregar a herança não pode ser imposta ao
fideicomissário”.

Nota: Cite-se, ainda, a seguinte passagem da obra de Arnaldo Rizzardo:

Caio Mário da Silva Pereira já explicava em termos exatos: “Não é lícita a instituição
além do segundo grau. Nada obsta, todavia, a nomeação plúrima de
fideicomissários conjuntos, caso em que vigora entre eles o direito de acrescer. O
que se não tolera é a nomeação de substituto para o fideicomissário (...) A
contagem dos graus para o efeito desta limitação leva em conta o fato da
designação ou instituição: o fiduciário é o instituído em primeiro grau e o
fideicomissário em segundo. E aí termina a substituição fideicomissária”.

Art. 1.960. A nulidade da substituição ilegal não prejudica a instituição, que valerá sem o
encargo resolutório.

Nota: E quanto ao art. 1.740 do Código de 1916, ilustrava Carvalho Santos,


lembrando que tal dispositivo tem idêntica redação que o vigente art. 1.960: “Em
outras palavras, quer isto significar: a) será considerada como não escrita a cláusula
que estende o fideicomisso além do segundo grau, e, por isso mesmo; b) tal
cláusula não prejudicará a instituição, que valerá como instituição de um só grau;

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c) nem tampouco a nulidade do segundo fideicomisso prejudicará a validade do
primeiro”. A expressão do final do dispositivo “valerá sem o encargo resolutório”
encerra a validade da nomeação do substituto, embora o segundo substituto não
surta validade. (ARNALDO RIZZARDO)

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14 FORMAS ORDINÁRIAS DE TESTAMENTOS

§ 73. Testamentos ordinários

* São três as espécies de testamentos ordinários [comuns, não especiais], a saber:

Art. 1.862. São testamentos ordinários:


I - o público;
II - o cerrado;
III - o particular.

§ 74. Testamento público:

A) Definição

* Público é o testamento realizado perante tabelião.

B) Requisitos de validade

* Para ser válido, o testamento público requer:

Art. 1.864. São requisitos essenciais do testamento público:

I - ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de
acordo com as declarações do testador, podendo este servir-se de minuta, notas
ou apontamentos;

II - lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a duas
testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e
do oficial;

III - ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador, pelas


testemunhas e pelo tabelião.

Parágrafo único. O testamento público pode ser escrito manualmente ou


mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de vontade em
partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo
testador, se mais de uma.

C) Testador analfabeto ou impossibilitado de assinar

* Nesse caso, determina o CCB que:

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Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu
substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu
rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

D) Testador surdo

* A fim de conferir maior segurança ao ato, determina o CCB que, sendo o indivíduo
inteiramente surdo, este deverá ler o seu testamento e, se não o souber, deverá
indicar uma pessoa de sua confiança para que o faça na presença de testemunhas

Art. 1.866. O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e,
se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as testemunhas.

E) Testador cego

* Ao deficiente visual, somente se defere o testamento público, vedada, pois, qualquer


outra espécie de testamento. Determina a lei que seja o testamento lido duas vezes,
sendo uma pelo tabelião e outra por uma das testemunhas que forem designadas pelo
testador. Veja:

Art. 1.867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz
alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma
das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada
menção no testamento.

O descumprimento de exigência legal para a confecção de testamento público –


segunda leitura e expressa menção no corpo do documento da condição de cego –
não gera a sua nulidade se mantida a higidez da manifestação de vontade do
testador. [REsp 1.677.931-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado
em 15/8/2017, DJe 22/8/2017].

O propósito recursal volta-se para a análise da validade de testamento público, cujo


testador era cego e que não teria cumprido todas as formalidades legais exigidas.
Na hipótese, o testamento público, apesar de produzido em cartório, lido em voz
alta pelo tabelião na presença do testador e de duas testemunhas, suprimiu a
exigência legal de uma segunda leitura e da expressa menção no corpo do
documento da condição de cego do testador. Não é desconhecida a jurisprudência
do STJ no sentido de que o testamento confeccionado, não obstante a ausência de
algum elemento tido como indispensável, reproduz a manifestação de vontade do
testador. Esses julgados, não obstante a reiterada insurgência calcada no art. 166,
V, do CC/02 (for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a
sua validade), traduzem a ideia de primazia da manifestação da vontade, quando

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essa não colide com preceitos de ordem pública. Dessa forma, atendidos os
pressupostos básicos da sucessão testamentária – i) capacidade do testador; ii)
atendimento aos limites do que pode dispor e; iii) lídima declaração de vontade –
a ausência de umas das formalidades exigidas por lei, pode e deve ser colmatada
para a preservação da vontade daquele que fez o testamento. E diz-se assim, pois
as regulações atinentes ao instituto têm por fim teleológico, justamente, a garantia
do referido desígnio. Logo, se essa vontade fica evidenciada por uma sucessão de
atos e solenidades que coesamente a professam, inclusive, e principalmente,
quando já falecido o autor do testamento, não há razão para, em preciosismo
desprovido de propósito, exigir o cumprimento de norma que já teve o seu fim
atendido. Na hipótese em análise, é certo que as exigências de dupla leitura do teor
do testamento (pelo tabelião e por uma das testemunhas) e a confirmação, no
próprio instrumento, da condição de cegueira do testador têm por objetivo
assegurar, no momento de oposição da assinatura, o espelhamento da pretensão
do de cujus em relação aos seus bens. Mas, quanto à garantia de que o testamento
representa a efetiva declaração de vontade do testador, e que esse tinha plena
ciência do que fazia e do seu alcance, fica evidenciada, tanto a capacidade cognitiva
do testador quanto o fato de que o testamento, lido pelo tabelião, correspondia
exatamente à manifestação de vontade do de cujus.

§ 75. Do testamento cerrado

A) Formalização:

* É feito por instrumento particular, adquirindo e validade jurídica tão somente pelo
instrumento de aprovação, a cargo do notário.

Art. 1.868. O testamento escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo, e
por aquele assinado, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu substituto legal,
observadas as seguintes formalidades:

I - que o testador o entregue ao tabelião em presença de duas testemunhas;


II - que o testador declare que aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado;
III - que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas
testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e testemunhas;
IV - que o auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo
testador.

Parágrafo único. O testamento cerrado pode ser escrito mecanicamente, desde


que seu subscritor numere e autentique, com a sua assinatura, todas as páginas.

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B) Disposição em segredo

* Sua vantagem é ser secreto, levando em consideração que suas disposições somente
serão conhecidas após a morte do testador. Vejamos:

Art. 1.875. Falecido o testador, o testamento será apresentado ao juiz, que o abrirá
e o fará registrar, ordenando seja cumprido, se não achar vício externo que o torne
eivado de nulidade ou suspeito de falsidade.

C) A função das testemunhas no testamento cerrado

* Consiste em que assistam à entrega do escrito sigiloso ao oficial público, que o aprova
sem o conhecimento de seu conteúdo, e mediante declaração do testador de que
aquele é o seu testamento e que o tem por bom, firme e valioso. (NERY JR).

D) Formalidade do auto de aprovação

Art. 1.869. O tabelião deve começar o auto de aprovação imediatamente depois da última
palavra do testador, declarando, sob sua fé, que o testador lhe entregou para ser
aprovado na presença das testemunhas; passando a cerrar e coser o instrumento
aprovado.

Parágrafo único. Se não houver espaço na última folha do testamento, para início da
aprovação, o tabelião aporá nele o seu sinal público, mencionando a circunstância no
auto.

E) Possibilidade de o tabelião escrever a rogo o testamento e, ainda assim, aprova-lo.

Art. 1.870. Se o tabelião tiver escrito o testamento a rogo do testador, poderá, não
obstante, aprová-lo.

F) Possibilidade de ser escrito em língua estrangeira

Art. 1.871. O testamento pode ser escrito em língua nacional ou estrangeira, pelo próprio
testador, ou por outrem, a seu rogo.

G) Impossibilidade de o testamento cerrado ser realizado por quem não saiba ler ou não o
possa.

Art. 1.872. Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou não
possa ler.

H) Possibilidade de o testamento cerrado ser realizado por surdo-mudo: solenidade especial.

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Art. 1.873. Pode fazer testamento cerrado o surdo-mudo, contanto que o escreva todo,
e o assine de sua mão, e que, ao entregá-lo ao oficial público, ante as duas testemunhas,
escreva, na face externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja
aprovação lhe pede.

I) Devolução do testamento cerrado ao testador

Art. 1.874. Depois de aprovado e cerrado, será o testamento entregue ao testador, e o


tabelião lançará, no seu livro, nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi
aprovado e entregue.

J) Revogação do testamento cerrado em virtude de sua violação

Art. 1.972. O testamento cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for aberto ou
dilacerado com seu consentimento, haver-se-á como revogado.

Nota: Trata-se de uma forma específica de revogação do testamento cerrado que


também pode ser revogado ordinariamente e com os mesmos efeitos, nos termos
dos já mencionados artigos 1.969 a 1.971 do CCB.

§ 76. Do testamento particular

A) Definição

* Testamento particular ou ológrafo é forma privada de testar, elaborado pela mão do


próprio testador, na presença de, pelo menos, três testemunhas, que o devem
subscrever, dispensada a presença de oficial público. (NERY JR).

B) Possibilidade de ser manuscrito ou escrito por processo mecânico.

Art. 1.876. O testamento particular pode ser escrito de próprio punho ou mediante
processo mecânico.

Notícia Correlata

Validade de testamento escrito de próprio punho não é reconhecida

Por unanimidade de votos, a Terceira Turma manteve decisão que não reconheceu a
validade de um testamento escrito de próprio punho. Apesar da falta de assinatura de
testemunhas que deveriam ter presenciado a lavratura do documento, a parte alegava
que o requisito seria formalidade superável tendo em vista a inexistência de interesse
de incapazes ou de herdeiros necessários. De acordo com o processo, a testadora,

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viúva e sem herdeiros necessários, estabeleceu como ato de última vontade a
destinação de seu patrimônio a título de sucessão, distribuindo-o entre parentes na
linha colateral consanguínea e afins, na forma de herdeiros testamentários e
legatários. O documento não foi assinado pelas testemunhas que alegaram ter
presenciado a sua lavratura e que tiveram conhecimento direto da intenção da
testadora. Foi formulado, então, pedido de cumprimento de testamento particular
sob o fundamento de que o formalismo não poderia ceder ao desejo do autor da
herança, principalmente por não haver violação a dispositivo de ordem pública ou
prejuízo a terceiros.

Pedido rejeitado

O juízo de primeiro grau rejeitou o pedido em razão do descumprimento dos


requisitos legais. De acordo com a sentença, a presença das três testemunhas no caso
de lavratura de testamento particular escrito de próprio punho é requisito
indispensável nos termos do artigo 1.876, parágrafo 1º, do Código Civil de 2002, sob
pena de nulidade, tendo em vista que "ouvir a leitura do testamento e subscrevê-lo
faz parte do próprio conceito de testamento particular". O Tribunal de Justiça manteve
a invalidade do testamento. Segundo o acórdão, não foi explicado, de forma
inequívoca e incontroversa, a razão da ausência de assinaturas e o motivo pelo qual
as testemunhas, apesar de presenciarem a realização do testamento, não o assinaram
nem o levaram ao notário ou trouxeram o oficial até a residência da testadora, uma
vez que houve tempo para isso. “Houvessem os herdeiros testamentários e legítimos
apresentado, em conjunto, pedido de cumprimento ao testamento, demonstrando,
em uníssono, a concordância, aí sim poderíamos, ao arrepio da lei, determinar seu
cumprimento. Entretanto, se há reclamo quanto à inobservância de formalidade
essencial e legal, não pode preponderar a vontade sobre a forma, porque, neste caso,
a sucessão legítima predomina sobre a testamentária”, concluiu o tribunal de origem.

Súmula 7

No STJ, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, entendeu a decisão acertada. Ele
reconheceu a possibilidade de, em circunstâncias específicas, o juiz dispensar a
presença de testemunhas no ato de testar. No entanto, observou, as instâncias de
origem consignaram que o documento elaborado de próprio punho não seria válido e
que a alegação unilateral das testemunhas de que presenciaram o ato não seria
suficiente para tal comprovação. O relator salientou ainda que a ausência de
assinaturas não foi o único vício a ensejar a invalidade do testamento, pois não houve
a leitura e a assinatura do documento pelo testador na presença das testemunhas e
nem mesmo se observou a vontade expressa da testadora de que fosse realizado o
registro do ato em cartório. “Não pode ser confirmado o testamento particular
formalizado sem todos os requisitos exigidos pela legislação de regência, pois rever
todas essas conclusões demandaria o reexame de matéria fático-probatória, o que é

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inviável em recurso especial, nos termos da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça”,
concluiu o relator. Processo: REsp 1639021

Segunda Seção admite impressão digital como assinatura válida em testamento


particular

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão por maioria de


votos, admitiu ser válido um testamento particular que, mesmo não tendo sido
assinado de próprio punho pela testadora, contou com a sua impressão digital.

Para o colegiado, nos processos sobre sucessão testamentária, o objetivo a ser


alcançado deve ser a preservação da manifestação de última vontade do falecido, de
modo que as formalidades legais devem ser examinadas à luz dessa diretriz máxima.
Assim, cada situação deve ser analisada individualmente, para que se verifique se a
ausência de alguma formalidade é suficiente para comprometer a validade do
testamento, em confronto com os demais elementos de prova, sob pena de ser
frustrado o real desejo do testador.

A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, explicou que a jurisprudência do STJ


permite, excepcionalmente, a relativização de algumas das formalidades exigidas pelo
Código Civil no âmbito do direito sucessório.

"A regra segundo a qual a assinatura de próprio punho é requisito de validade do


testamento particular traz consigo a presunção de que aquela é a real vontade do
testador, tratando-se, todavia, de uma presunção juris tantum, admitindo-se a prova
de que, se porventura ausente a assinatura nos moldes exigidos pela lei, ainda assim
era aquela a real vontade do testador", afirmou.

Flexibilização

A controvérsia analisada pela Segunda Seção teve origem em ação para confirmar um
testamento particular lavrado em 2013 por uma mulher em favor de uma de suas
herdeiras.

Em primeiro grau, o juiz confirmou a validade do testamento, sob o argumento de que


não existia vício formal grave e que era válida a impressão digital como assinatura da
falecida, diante do depoimento de testemunhas do ato, inclusive em relação à lucidez
da testadora.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou a sentença sob o fundamento de que


a substituição da assinatura de próprio punho pela impressão digital faz com que o

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testamento não preencha todos os requisitos de validade exigidos pelo artigo 1.876
do Código Civil de 2002.

Ao analisar o recurso especial da herdeira beneficiária do testamento, a ministra


Nancy Andrighi comentou que o Poder Judiciário não deve se imiscuir nas disposições
testamentárias – com exceção apenas daquilo que for estritamente necessário para
confirmar que a disposição dos bens retratada no documento corresponde
efetivamente ao desejo do testador.

A ministra lembrou que, em processos analisados anteriormente pelo STJ, foram


abrandadas as formalidades previstas no artigo 1.876 do CC/2002, como no REsp
701.917, no qual se admitiu, excepcionalmente, a relativização das exigências legais
no tocante à quantidade de testemunhas para se reconhecer a validade do
testamento particular.

Vício formal

No caso em julgamento, a despeito da ausência de assinatura de próprio punho e de


ter sido o testamento lavrado manualmente, apenas com a aposição da impressão
digital, a relatora ressaltou que não há dúvida acerca da manifestação de última
vontade da testadora, que, embora sofrendo com limitações físicas, não tinha
nenhuma restrição cognitiva.

"A fundamentação adotada pelo acórdão recorrido para não confirmar o testamento,
a propósito, está assentada exclusivamente no referido vício formal. Não
controvertem as partes, ademais, quanto ao fato de que a testadora, ao tempo da
lavratura do testamento, que se deu dez meses antes de seu falecimento, possuía
esclerose múltipla geradora de limitações físicas, sem prejuízo da sua capacidade
cognitiva e de sua lucidez", observou.

Para Nancy Andrighi, uma interpretação histórico-evolutiva do conceito de assinatura


mostra que a sociedade moderna tem se individualizado e se identificado de
diferentes maneiras, muitas distintas da assinatura tradicional.

Nesse novo cenário, em que a identificação pessoal tem sido realizada por tokens,
logins, senhas e certificações digitais, além de sistemas de reconhecimento facial e
ocular, e no qual se admite até a celebração de negócios complexos e vultosos por
meios virtuais, a relatora enfatizou que "o papel e a caneta esferográfica perdem
diariamente o seu valor", devendo a real manifestação de vontade ser examinada em
conjunto com os elementos disponíveis.

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C) Número específico de testemunhas que devem presenciar a leitura do testamento.

Art. 1.876. Caput.

§ 1º Se escrito de próprio punho, são requisitos essenciais à sua validade seja lido e
assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos três testemunhas, que o
devem subscrever.

§ 2º Se elaborado por processo mecânico, não pode conter rasuras ou espaços em


branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido na presença de pelo
menos três testemunhas, que o subscreverão.

Nota: NERY JR observa, quanto ao dispositivo acima, que as testemunhas não


precisam estar reunidas todas, simultaneamente, para ouvir a leitura do
testamento, recordando o seguinte julgado: (STJ, 3.ª T., REsp 1422-RS, rel. Min.
Gueiros Leite, j. 2.10.1990, DJU 4.3.1991, p. 1983; RT 673/168).

Notícia correlata:

STJ. Terça-feira, 16 de outubro de 2018.

Falta de uma testemunha à leitura não basta para invalidar testamento

A leitura do testamento na presença de duas testemunhas, e não de três como


exige o Código Civil, é vício formal que pode ser relativizado, tendo em vista a
preservação da vontade do testador. Com esse entendimento, a Terceira Turma
deu provimento a um recurso para confirmar o testamento particular que havia
sido invalidado pela falta da terceira testemunha. A relatora do caso, ministra
Nancy Andrighi, destacou que a jurisprudência da corte permite a flexibilização de
algumas formalidades exigidas para a validade de um testamento, mas estabelece
uma gradação entre os vícios que podem ocorrer em tais situações. Os vícios de
menor gravidade, segundo a relatora, são puramente formais e se relacionam aos
aspectos externos do documento. São hipóteses diferentes de vícios como a falta
de assinatura do testador, os quais contaminam o próprio conteúdo do
testamento, “colocando em dúvida a sua exatidão e, consequentemente, a sua
validade”.

Ausência de dúvidas

Segundo a ministra, no caso analisado, o vício alegado foi apenas a ausência de uma
testemunha no momento da leitura. “O vício que impediu a confirmação do
testamento consiste apenas no fato de que a declaração de vontade da testadora
não foi realizada na presença de três, mas, sim, de somente duas testemunhas,

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espécie de vício puramente formal, incapaz de, por si só, invalidar o testamento,
especialmente quando inexistentes dúvidas ou questionamentos relacionados à
capacidade civil do testador, nem tampouco sobre a sua real vontade de dispor dos
seus bens na forma constante no documento”, afirmou. O pedido de confirmação
do testamento foi negado em primeira e segunda instâncias. No entanto, para
Nancy Andrighi, o fundamento adotado pelo acórdão recorrido se relaciona à
situação de testamento sem testemunha, hipótese do artigo 1.879 do Código Civil,
diferente do caso julgado.

D) Apresentação do testamento particular em juízo após a morte do testador. Citação de


todos os herdeiros legítimos.

Art. 1.877. Morto o testador, publicar-se-á em juízo o testamento, com citação dos
herdeiros legítimos.

E) Necessidade de concordância das testemunhas a respeito da manifestação de vontade do


testador, da leitura do testamento perante elas e de confirmação das assinaturas apostas
no documento.

Art. 1.878. Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou, ao menos,
sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como
a do testador, o testamento será confirmado.

Nota: Segundo NERY JR, “fato da disposição” significa o momento, a ocasião em


que lhes foi feita a leitura das determinações causa mortis contidas no testamento,
não sendo necessário que as testemunhas se recordem do teor das disposições, de
que elas podem estar deslembradas.

F) Caso de falta das testemunhas para confirmar o testamento particular

Art. 1.878. Caput.

Parágrafo único. Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma
delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver
prova suficiente de sua veracidade.

G) Excepcionalidade da confirmação de testamento particular sem testemunhas.


Necessidade de o testamento ser feito de próprio punho e de inserção de uma explicação
circunstanciada da excepcionalidade no testamento.

Art. 1.879. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular


de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a
critério do juiz.

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H) Testamento particular em língua estrangeira. Necessidade de as testemunhas
compreenderem o idioma.

Art. 1.880. O testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que
as testemunhas a compreendam.

§ 77. Dos codicilos

A) Definição

* Codicilo é negócio jurídico unilateral mortis causa, escrito, pelo qual o autor da
herança dispõe de bens de pouca monta ou de singular valor sentimental, de forma
menos solene e mais singela que o testamento, podendo com este conviver (NERY JR).
Em termos legais, os codicilos estão previstos nos arts. 1.881 a 1.885 do CCB. Vejamos.

B) Legitimidade ativa, forma e objeto do codicilo.

Art. 1.881. Toda pessoa capaz de testar poderá, mediante escrito particular seu, datado
e assinado, fazer disposições especiais sobre o seu enterro, sobre esmolas de pouca
monta a certas e determinadas pessoas, ou, indeterminadamente, aos pobres de certo
lugar, assim como legar móveis, roupas ou joias, de pouco valor, de seu uso pessoal.

C) Possibilidade de coexistência com testamento

Art. 1.882. Os atos a que se refere o artigo antecedente, salvo direito de terceiro, valerão
como codicilos, deixe ou não testamento o autor.

Nota: Observa NERY JR que o codicilo poderá integrar o testamento, completá-lo e


até modificá-lo.

D) Possibilidade de nomeação e substituição de testamenteiros

Art. 1.883. Pelo modo estabelecido no art. 1.881, poder-se-ão nomear ou substituir
testamenteiros.

Nota: Recorde-se que testamenteiro é o sujeito indicado pelo de cujus para dar
cumprimento às suas disposições de última vontade [CCB, art. 1.976].

E) Revogação dos codicilos. Hipóteses: a) por outro codicilo; b) em havendo testamento


posterior, se não for confirmado; c) em havendo testamento posterior, o codicilo for
modificado.

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Art. 1.884. Os atos previstos nos artigos antecedentes revogam-se por atos iguais, e
consideram-se revogados, se, havendo testamento posterior, de qualquer natureza, este
os não confirmar ou modificar.

F) Codicilo fechado/cerrado. Abertura segundo as regras do testamento cerrado

Art. 1.885. Se estiver fechado o codicilo, abrir-se-á do mesmo modo que o testamento
cerrado.

Nota: Forçoso recordar o disposto no art. 1.875, CCB.

Art. 1.875. Falecido o testador, o testamento será apresentado ao juiz, que o


abrirá e o fará registrar, ordenando seja cumprido, se não achar vício externo
que o torne eivado de nulidade ou suspeito de falsidade.

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15 DOS TESTAMENTOS ESPECIAIS

§ 78. Tipos de testamentos especiais

* São três as espécies de testamentos especiais/extraordinários/privilegiados [porque postos


à disposição de quem não se encontra em condições de se valer da forma ordinária de
testar]. Vejamos:

Art. 1.886. São testamentos especiais:


I - o marítimo;
II - o aeronáutico;
III - o militar.

Art. 1.887. Não se admitem outros testamentos especiais além dos contemplados neste
Código.

§ 79. Do testamento marítimo

■ Previsão legal

Art. 1.888. Quem estiver em viagem, a bordo de navio nacional, de guerra ou mercante,
pode testar perante o comandante, em presença de duas testemunhas, por forma que
corresponda ao testamento público ou ao cerrado.

Parágrafo único. O registro do testamento será feito no diário de bordo.

■ Requisito fatual

* Observa NERY JR que a forma de confecção do testamento marítimo será pública, se


o testamento for redigido pelo comandante; ou privada, se escrito pelo próprio
testador, reclamando, neste último caso, para que seja válido, a aprovação do
comandante ou do escrivão de bordo, perante duas testemunhas. É fundamental, para
a validade dessa espécie de testamento, que o testador não tenha podido
desembarcar e testar na forma ordinária. Inclusive, nesse sentido prevê o CCB que:

Art. 1.892. Não valerá o testamento marítimo, ainda que feito no curso de uma
viagem, se, ao tempo em que se fez, o navio estava em porto onde o testador pudesse
desembarcar e testar na forma ordinária.

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§ 80. Testamento aeronáutico
■ Previsão legal

Art. 1.889. Quem estiver em viagem, a bordo de aeronave militar ou comercial, pode
testar perante pessoa designada pelo comandante, observado o disposto no artigo
antecedente.

§ 81. Disposições comuns aos testamentos marítimo e aeronáutico

■ Custódia do testamento e providências ulteriores a serem adotadas pelo responsável.

Art. 1.890. O testamento marítimo ou aeronáutico ficará sob a guarda do comandante,


que o entregará às autoridades administrativas do primeiro porto ou aeroporto nacional,
contra recibo averbado no diário de bordo.

■ Hipóteses de caducidade automática dos testamentos marítimo e aeronáutico

Art. 1.891. Caducará o testamento marítimo, ou aeronáutico, se o testador não morrer


na viagem, nem nos noventa dias subsequentes ao seu desembarque em terra, onde
possa fazer, na forma ordinária, outro testamento.

§ 82. Do testamento militar

* Observa NERY JR que, diferentemente do que ocorre com o testamento particular, o


testamento militar é testamento com oblação, ou seja, é necessária aquilo que a doutrina
denomina de unitas actus, isto é, a copresença de quem serve de oficial público, do testador
e das testemunhas. A esse respeito:

A) Requisitos

Art. 1.893. O testamento dos militares e demais pessoas a serviço das Forças Armadas
em campanha, dentro do País ou fora dele, assim como em praça sitiada, ou que esteja
de comunicações interrompidas, poderá fazer-se, não havendo tabelião ou seu substituto
legal, ante duas, ou três testemunhas, se o testador não puder, ou não souber assinar,
caso em que assinará por ele uma delas.

§ Sintetizando: a) militar em campanha/praça sitiada/sem comunicação; b)


inexistência de tabelião ou seu substituto legal; c) duas ou três testemunhas; d)
testador não saber assinar ou estar impossibilitado de fazê-lo.

B) Autoridades competentes para escrever o testamento, caso o testador não saiba ou esteja
impossibilitado de fazê-lo.

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Art. 1.893. Caput

§ 1º Se o testador pertencer a corpo ou seção de corpo destacado, o testamento será


escrito pelo respectivo comandante, ainda que de graduação ou posto inferior.

§ 2º Se o testador estiver em tratamento em hospital, o testamento será escrito pelo


respectivo oficial de saúde, ou pelo diretor do estabelecimento.

§ 3º Se o testador for o oficial mais graduado, o testamento será escrito por aquele que
o substituir.

C) Testamento militar de próprio punho. Solenidade

Art. 1.894. Se o testador souber escrever, poderá fazer o testamento de seu punho,
contanto que o date e assine por extenso, e o apresente aberto ou cerrado, na presença
de duas testemunhas ao auditor, ou ao oficial de patente, que lhe faça as vezes neste
mister.

Parágrafo único. O auditor, ou o oficial a quem o testamento se apresente notará, em


qualquer parte dele, lugar, dia, mês e ano, em que lhe for apresentado, nota esta que
será assinada por ele e pelas testemunhas.

D) Caducidade do testamento militar

Art. 1.895. Caduca o testamento militar, desde que, depois dele, o testador esteja,
noventa dias seguidos, em lugar onde possa testar na forma ordinária, salvo se esse
testamento apresentar as solenidades prescritas no parágrafo único do artigo
antecedente.

E) Testamento militar nuncupativo [feito oralmente]

Art. 1.896. As pessoas designadas no art. 1.893, estando empenhadas em combate, ou


feridas, podem testar oralmente, confiando a sua última vontade a duas testemunhas.

F) Caducidade do testamento militar nuncupativo

Art. 1.896. Caput.

Parágrafo único. Não terá efeito o testamento se o testador não morrer na guerra ou
convalescer do ferimento.

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Nota: Segundo NERY JR, o testamento militar nuncupativo é forma de exceção e
extraordinária, dentro do testamento militar, porque formulado oralmente, em
estado de extrema necessidade. Se o testador não morrer na guerra e convalescer
do ferimento, o testamento nuncupativo perde sua eficácia. A nuncupação supõe
que o testador confie a sua última vontade a duas testemunhas. A copresença das
testemunhas e do testador é indispensável. As testemunhas devem vê-lo e ouvi-lo
dizer, solenemente, o que quer.

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16 DOS LEGADOS

§ 83. Legado: considerações primeiras

* O legado pressupõe, no mínimo, duas pessoas: a do legante ou autor da herança, a pessoa


que transmite a liberalidade, e a do legatário, a pessoa que recebe; em alguns casos, pode
existir, ainda, uma terceira, a do onerado, a pessoa que deverá entregar o legado ao
legatário, a suas expensas, ou retirando os meios suficientes do acervo, dependendo da
disposição testamentária.

§ 84. Legado: objeto

* Numa palavra, tudo que tenha valor patrimonial pode ser objeto de legado que, assim, deve
ser material e juridicamente possível. Em se tratando de coisas, a impossibilidade jurídica
resulta de estarem fora do comércio. (ORLANDO GOMES).

§ 85. Legado: aquisição

* O legado adquire-se ipso jure, por efeito da abertura da sucessão, ainda que o legatário não
tenha conhecimento da aquisição. Quem adquire de logo o domínio da coisa legada está
fora de toda dúvida, porquanto pode reivindicá-la antes de investido na sua posse, e
somente pode reivindicar quem dono é. O ônus de pedi-la ao herdeiro instituído é apenas
condição para a execução do direito, nunca para a sua aquisição. (ORLANDO GOMES). No
entanto: a aquisição da posse depende de sua efetiva entrega, que incumbe ao herdeiro.
(ORLANDO GOMES).

* Nesse sentido, o CCB:

Art. 1.923. Desde a abertura da sucessão, pertence ao legatário a coisa certa, existente
no acervo, salvo se o legado estiver sob condição suspensiva.

§ 1º. Não se defere de imediato a posse da coisa, nem nela pode o legatário entrar por
autoridade própria.

§ 86. Legados não exigíveis

* Há situações em que o legado tem sua exigibilidade suspensa. São elas: (i) validade
questionada judicialmente; (ii) legados condicionais; (iii) legados a termo. Vejamos:

Art. 1.924. O direito de pedir o legado não se exercerá, enquanto se litigue sobre a
validade do testamento, e, nos legados condicionais, ou a prazo, enquanto esteja
pendente a condição ou o prazo não se vença.

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§ 87. Legado: aceitação e renúncia

* Aceitação: A aquisição do legado independe de aceitação. (ORLANDO GOMES).

* Renúncia: A renúncia não se pode dar antes da abertura da sucessão, nem se justifica, no
legado condicional, antes de realizada a condição, eis que se renuncia a simples expectativa
de direito. Uma vez feita, torna-se irrevogável. (ORLANDO GOMES).

Nota: Consumada a renúncia, chama-se substituto, se houver; não havendo, o herdeiro


legítimo ou o testamentário, ou, conforme o caso, acresce o direito do colegatário.
(ORLANDO GOMES).

§ 88. Incumbência do legado

Art. 1.934. No silêncio do testamento, o cumprimento dos legados incumbe aos herdeiros e,
não os havendo, aos legatários, na proporção do que herdaram.

Parágrafo único. O encargo estabelecido neste artigo, não havendo disposição testamentária
em contrário, caberá ao herdeiro ou legatário incumbido pelo testador da execução do legado;
quando indicados mais de um, os onerados dividirão entre si o ônus, na proporção do que
recebam da herança.

Nota: Verifica-se primeiramente, pois, a vontade expressa do testador. Na hipótese de


omissão deste, aplica-se a regra acima.

Art. 1.935. Se algum legado consistir em coisa pertencente a herdeiro ou legatário (art. 1.913),
só a ele incumbirá cumpri-lo, com regresso contra os co-herdeiros, pela quota de cada um,
salvo se o contrário expressamente dispôs o testador.

Nota: O presente artigo se refere ao herdeiro ou legatário a quem o testador ordena que
entregue bem seu a outra pessoa instituída. Com toda a evidência, o herdeiro ou legatário
obrigado, para efetuar a entrega de um bem seu a outra pessoa, também deverá ser
beneficiado pelo testamento. (ARNALDO RIZZARDO).

§ 89. Riscos e despesas com o cumprimento do legado

Art. 1.936. As despesas e os riscos da entrega do legado correm à conta do legatário, se não
dispuser diversamente o testador.

§ 90. Acessórios do legado o lugar de seu cumprimento

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Art. 1.937. A coisa legada entregar-se-á, com seus acessórios, no lugar e estado em que se
achava ao falecer o testador, passando ao legatário com todos os encargos que a onerarem.

§ 91. Legado com encargos e a aplicação das regras referentes à doação modal

Art. 1.938. Nos legados com encargo, aplica-se ao legatário o disposto neste Código quanto às
doações de igual natureza.

* Pressupõe, assim, a lei que as coisas legadas sejam presentes, mas nada impe de que sejam,
também, legadas coisas futuras. (CATEB).

§ 92. Legado de coisa alheia

* A coisa legada, não pertencendo ao testador ao testar, pode, no decorrer do tempo, até a
data de sua morte, pois o testamento só produz efeitos após a morte, vir a ser adquirida por
ele, e não será mais alheia. (CATEB).

* Segundo o CCB:

Art. 1.912. É ineficaz o legado de coisa certa que não pertença ao testador no momento
da abertura da sucessão.

Art. 1.913. Se o testador ordenar que o herdeiro ou legatário entregue coisa de sua
propriedade a outrem, não o cumprindo ele, entender-se-á que renunciou à herança ou
ao legado.

Nota: O herdeiro, ou o legatário, deve entregar coisa sua para ter direito ao legado
deixado pelo testador; se preferir ficar com o que é seu, implica renúncia da
liberalidade. Note-se que, nessa hipótese, o encargo, ou condição, não pode ser
imposto ao herdeiro necessário, porque o testador não tem ação limitadora sobre
a legítima, salvo as exceções previstas em lei. (CATEB).

Art. 1.914. Se tão-somente em parte a coisa legada pertencer ao testador, ou, no caso do
artigo antecedente, ao herdeiro ou ao legatário, só quanto a essa parte valerá o legado.

§ 93. Legado de coisa que se determine pelo gênero

* Segundo o CCB:

Art. 1.915. Se o legado for de coisa que se determine pelo gênero, será o mesmo
cumprido, ainda que tal coisa não exista entre os bens deixados pelo testador.

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Nota: Nesse caso, o testador poderá incumbir alguém, o onerado, ou o monte, de
adquirir a coisa e entregá-la ao legatário. (CATEB).

§ 94. Escolha do legado de coisa que se determine pelo gênero

* A respeito da escolha da coisa legada definida pelo gênero, temos que esta pode ser
conferida ao herdeiro incumbido de dar cumprimento ao legado; a terceiro indicado pelo
testador; ao Juízo competente; ou mesmo ao próprio legatário, devendo prevalecer o que
for determinado no testamento. Senão vejamos:

Art. 1.929. Se o legado consiste em coisa determinada pelo gênero, ao herdeiro


tocará escolhê-la, guardando o meio-termo entre as congêneres da melhor e pior
qualidade.

Art. 1.930. O estabelecido no artigo antecedente será observado, quando a escolha


for deixada a arbítrio de terceiro; e, se este não a quiser ou não a puder exercer, ao
juiz competirá fazê-la, guardado o disposto na última parte do artigo antecedente.

Art. 1.931. Se a opção foi deixada ao legatário, este poderá escolher, do gênero
determinado, a melhor coisa que houver na herança; e, se nesta não existir coisa
de tal gênero, dar-lhe-á de outra congênere o herdeiro, observada a disposição na
última parte do art. 1.929.

Nota: Diversamente do estabelecido nos dois artigos antecedente, verifica-


se que neste, o legislador concedeu favor especial ao legatário. Quando a
escolha for deixada legatário e existirem no acervo hereditário bens do
gênero especificado no legado, aquele poderá escolher a melhor coisa que
houver na herança. Do contrário, não existindo no acervo hereditário bens
com as características definidas no legado, o princípio será o mesmo dos
artigos anteriores, podendo o herdeiro incumbido de cumprir o legado, dar
ao legatário bem com qualidade média.

§ 95. Legado de coisa singularizada

* Segundo o CCB:

Art. 1.916. Se o testador legar coisa sua, singularizando-a, só terá eficácia o legado se, ao
tempo do seu falecimento, ela se achava entre os bens da herança; se a coisa legada
existir entre os bens do testador, mas em quantidade inferior à do legado, este será eficaz
apenas quanto à existente.

Nota: Esse dispositivo legal guarda relação com o disposto no art. 1.939, II do CCB,
segundo o qual:

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Art. 1.939. Caducará o legado:
[...]
II - Se o testador, por qualquer título, alienar no todo ou em parte a coisa legada; nesse
caso, caducará até onde ela deixou de pertencer ao testador

§ 96. Legado de coisa localizada


* Prevê o CCB:

Art. 1.917. O legado de coisa que deva encontrar-se em determinado lugar só terá
eficácia se nele for achada, salvo se removida a título transitório.

Nota: O legado constitui-se da quantidade que for encontrada, mesmo que tiver
sido reduzida ou alienada pelo testador; prevalece aqui o que foi encontrado na
data do óbito. (CATEB).

§ 97. Legado de crédito e de quitação de dívida

* Segundo o CCB:

Art. 1.918. O legado de crédito, ou de quitação de dívida, terá eficácia somente até a
importância desta, ou daquele, ao tempo da morte do testador.

Nota: Portanto, vale observar, conforme lição de Orlando Gomes, que o legado
considera a obrigações existentes quando da elaboração do testamento, não
assegurando o pagamento do crédito. Dito de outro modo, “o testador não
assegura o mau ou o bom adimplemento a obrigação” (VENOSA. Código Civil
Interpretado). Trata-se, pois de negócio jurídico essencialmente aleatório.

Art. 1.918. Caput

§ 1º. Cumpre-se o legado, entregando o herdeiro ao legatário o título respectivo.

Nota: Assim, opera-se mediante a entrega do título representativo do crédito do


legante ao legatário, que passará a ser o novo credor.

§ 2º Este legado não compreende as dívidas posteriores à data do testamento.

Nota: Envolve, pois, dívidas do legatário que o testador, seu credor, quer beneficiar.
(CATEB).

Nota: Pode ocorrer, também, de o legatário ter uma dívida para com terceiros e o
testador queira beneficiá-los; nessa hipótese, o herdeiro onerado ficará

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responsável pelo cumprimento da disposição, pagando a dívida – objeto do legado
–, retirando da porção disponível o valor necessário. (CATEB).

Art. 1.919. Não o declarando expressamente o testador, não se reputará compensação


da sua dívida o legado que ele faça ao credor.

Nota: Nesse caso, o testador é o devedor e o legado não significa compensação de


sua dívida, salvo se o testador declarar expressamente a compensação. (CATEB).

Parágrafo único. Subsistirá integralmente o legado, se a dívida lhe foi posterior, e o


testador a solveu antes de morrer.

Nota: Ora, se a dívida do testador for posterior à facção do testamento, não resta
dúvida de que a compensação está fora de dúvidas, e é despicienda a discussão,
porque o testador não poderia mencionar uma dívida até então inexistente.
(CATEB).

§ 98. Legado de alimentos

* Segundo o CCB:

Art. 1.920. O legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa,


enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor.

Nota: Evidentemente devem condizer com a capacidade da herança. (CATEB).

Nota: Pela sua própria natureza e pelo fim a que se destina, o legado de alimentos,
ou pensão alimentícia, é inalienável e, como tal, impenhorável. (CATEB).

* Aplica-se a essa modalidade de legado a seguinte regra:

Art. 1.928. Sendo periódicas as prestações, só no termo de cada período se poderão


exigir.

Parágrafo único. Se as prestações forem deixadas a título de alimentos, pagar-se-ão no


começo de cada período, sempre que outra coisa não tenha disposto o testador.

§ 99. Legado de usufruto

* Segundo o CCB:

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Art. 1.921. O legado de usufruto, sem fixação de tempo, entende-se deixado ao legatário
por toda a sua vida.

Nota: Cabe ao testador, no caso, fixar qual a duração do usufruto. (CATEB).

Nota: Importa relembrar, aqui, as regras do usufruto estudadas na disciplina de


Direito das Coisas, especialmente o seguinte:

Nesse caso, o testador lega [em favor de pessoa natural ou jurídica] o direito
de usufruto, deixando a nua-propriedade para herdeiro ou outrem. Se não se
define a quem cabe essa nua-propriedade, entende-se que esta caberá os
herdeiros. Ademais, usufrutuários podem ser vários concomitantemente. Se
não foi estipulado prazo e o legado foi instituído em favor de pessoa natural,
entende-se que se extingue com a morte do usufrutuário; se instituído sem
prazo em favor de pessoa jurídica, usufruto se encerrará no prazo fixado no
art. 1.410 do CCB, ou seja, 30 anos. Nesse sentido, VENOSA (in. Código Civil
Interpretado).

§ 100. Legado de imóvel

* Segundo o CCB:

Art. 1.922. Se aquele que legar um imóvel lhe ajuntar depois novas aquisições, estas,
ainda que contíguas, não se compreendem no legado, salvo expressa declaração em
contrário do testador.

Parágrafo único. Não se aplica o disposto neste artigo às benfeitorias necessárias, úteis
ou voluptuárias feitas no prédio legado.

Nota: Isso porque tais benfeitorias são acessórios, e integram a propriedade legada,
formando, dessa forma, um só todo. (CATEB).

§ 101. Legado em dinheiro


* Segundo o CCB:

Art. 1.925. O legado em dinheiro só vence juros desde o dia em que se constituir em mora
a pessoa obrigada a prestá-lo.

Art. 1.926. Se o legado consistir em renda vitalícia ou pensão periódica, esta ou aquela
correrá da morte do testador.

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Art. 1.927. Se o legado for de quantidades certas, em prestações periódicas, datará da
morte do testador o primeiro período, e o legatário terá direito a cada prestação, uma
vez encetado cada um dos períodos sucessivos, ainda que venha a falecer antes do termo
dele.

Art. 1.928. Sendo periódicas as prestações, só no termo de cada período se poderão


exigir.
Parágrafo único. Se as prestações forem deixadas a título de alimentos, pagar-se-ão no
começo de cada período, sempre que outra coisa não tenha disposto o testador.

§ 102. Legado alternativo

* Ocorre na hipótese de o testador constituir legado de duas ou mais coisas alternativamente.


Nesse caso a lógica é a mesma das obrigações alternativas. Vejamos:

Art. 1.932. No legado alternativo, presume-se deixada ao herdeiro a opção.

Art. 1.933. Se o herdeiro ou legatário a quem couber a opção falecer antes de exercê-la,
passará este poder aos seus herdeiros.

§ 103. Extinção do legado

* As causas gerais de extinção dos negócios jurídicos aplicam-se aqui, tais como: a prescrição,
a decadência, a frustração da condição e a incapacidade do legatário, a invalidade do
testamento ou da própria disposição testamentária concernente ao legado. (ORLANDO
GOMES).

§ 104. Caducidade do legado

* Motivos supervenientes ao testamento impedem a eficácia da disposição que institui o


legado. Tais motivos são objetivos, se afetam o objeto do legado, como o perecimento da
coisa, ou subjetivos, se tocantes à pessoa do legatário, como sua premorte. (ORLANDO
GOMES). De acordo com o CCB:

Art. 1.939. Caducará o legado:

I - se, depois do testamento, o testador modificar a coisa legada, ao ponto de já não ter
a forma nem lhe caber a denominação que possuía;

Nota: Segundo Orlando Gomes, seria um caso de adenção, isto é, por tornar o
legado ineficaz.

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II - se o testador, por qualquer título, alienar no todo ou em parte a coisa legada; nesse
caso, caducará até onde ela deixou de pertencer ao testador;

Nota: Segundo Orlando Gomes, seria um caso de adenção, isto é, por tornar o
legado ineficaz.

III - se a coisa perecer ou for evicta, vivo ou morto o testador, sem culpa do herdeiro ou
legatário incumbido do seu cumprimento;

Nota: Segundo VENOSA: Como é o herdeiro quem normalmente deve entregar o


legado, este caducará se o perecimento ocorrer sem sua culpa. Pode não ser o
herdeiro o encarregado de entregar a coisa, mas sim outro legatário. A situação de
culpa se aplica ao legatário. Se o legado pereceu por culpa de terceiro não há
caducidade. Legado houve. O legatário poderá promover ação de indenização
contra o terceiro.

Nota: Ainda segundo VENOSA: [...] no tocante à evicção, caduca o legado porque o
testador não tinha direito à coisa legada. O herdeiro também pode ser
responsabilizado por perdas e danos, no caso de evicção, se não defendeu
devidamente os direitos do testador (no caso, o espólio, cabendo também a defesa
ao inventariante e ao testamenteiro) sobre a coisa na ação movida por terceiro, ou
não tomou medida legal alguma na apreensão administrativa. Sua culpa será
apurada no caso concreto.

IV - se o legatário for excluído da sucessão, nos termos do art. 1.815;

Nota: Aqui o legislador faz expressa menção às hipóteses de indignidade

V - se o legatário falecer antes do testador.

Nota: Aqui o legislador faz expressa menção à premorte do legatário.

Art. 1.940. Se o legado for de duas ou mais coisas alternativamente, e algumas delas
perecerem, subsistirá quanto às restantes; perecendo parte de uma, valerá, quanto ao
seu remanescente, o legado.

Nota: Essa é uma regra suplementar da vontade do testador, aplicável à hipótese


de legado alternativo e tem por objetivo a preservação dos efeitos do legado.

* Na sucessão testamentária, sendo vários os herdeiros instituídos, aplica-se a seguinte regra:

Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem
conjuntamente chamados à herança em quinhões não determinados, e qualquer deles

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não puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à dos co-herdeiros, salvo o
direito do substituto.

* Sendo assim, há de se analisar o teor da disposição testamentária, de modo que se herdeiros


forem instituídos com a designação de substitutos [art. 1.947, CCB], estes herdarão caso
herdeiro instituído não possa herdar ou não aceite a herança. Caso não seja designado
substituto, a parte que seria destinada ao herdeiro que não pode ou não aceitou herdar
passará aos demais co-herdeiros.

Art. 1.947. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao legatário nomeado,
para o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado,
presumindo-se que a substituição foi determinada para as duas alternativas, ainda que o
testador só a uma se refira.

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