Você está na página 1de 8

Tutoria: Anemia Carencial Ferropriva e Diarreia – Prof.

Léa

Caso Clínico
Mariana traz seus filhos, Luca e Heitor, 30 meses e 4 anos, respectivamente, para uma consulta médica pediátrica com a dra. Yara. Luca
apresenta cansaço e hiporexia há 6 meses. Se preocupa, pois está bastante irritado e não dorme bem. Conta em seu recordatório
alimentar, a ingestão de 5 mamadeiras de leite de vaca fluido ao dia, e que almoça e janta na casa de sua avó. Come vegetais folhosos
diariamente e não gosta de carnes. Usou leite materno exclusivo até os oito meses de idade, quando iniciou leite de vaca, pois precisava
trabalhar (SIC). Nega uso de suplementos vitamínicos atualmente. Nos antecedentes, a mãe refere que seu filho nasceu de 34 semanas
gestacionais com peso de 2.100 g. Ao exame físico, apresenta-se em BEG, ativo, acianótico, anictérico, afebril, hidratado e com
moderada palidez cutânea, descorado ++/4+, peso de 12 Kg e comprimento de 90 cm. Sem demais alterações ao exame físico.
Em seu prontuário, a médica compara seu eritrograma atual (2022) e contagem de reticulócitos com o de um ano atrás (janeiro 2021).
Ferritina e PCR em andamento.

Mariana, pergunta para a médica quais as causas desta situação e por quê os exames mudaram tanto. Diz que ao pesquisar “no Google”
observou que outros exames laboratoriais poderiam ser realizados, que este quadro se instala em fases, questionando sobre a
terapêutica completa. Mariana faz as explicações necessárias e a conduta para Luca.
Sobre Heitor a queixa era outra... Heitor apresenta há 5 dias história de diarreia. Este quadro teve início com tosse seca discreta e coriza
hialina por 2 dias, logo após, apresentou picos de febre elevada (38,5°C a 40°C) que duraram cerca de 2 dias. Refere dois episódios de
vômito no primeiro dia de aparecimento da febre. Poucas horas depois, a diarreia se instalou, sendo em grande volume, 5 a 10 episódios
ao dia, líquidas ou semilíquidas, fétidas, sem sangue e sem muco. Seus testes RT-PCR para covid-19 e Influenza A e B foram ambos
negativos. Não apresenta mais o quadro febril e os vômitos. Alimenta-se bem, está ativo, diurese adequada. Nega doenças anteriores.
Sobre o quadro vacinal não foram observadas a realização da vacina para Rotavírus e a de Febre Amarela. O exame físico revela a
criança em BEG, hidratada e afebril. Abdome: Semi globoso, distensão abdominal, RHA aumentados, indolor a palpação superficial e
profunda sem visceromegalias, e hiperemia perianal discreta. Mariana, muito preocupada com o filho, novamente “deu um Google” e
faz vários questionamentos para Dra. Yara, dentre elas: “Há prevenção para este quadro por meio de vacinas?” Será que o quadro do
Heitor pode persistir?” e ainda a questionou sobre a necessidade do uso de zinco, vitamina A, probióticos e antibióticos. E ao final,
contou que deixou o Heitor em jejum “para não forçar o estômago e intestino”. Foi uma longa conversa. Foram necessários vários
esclarecimentos.

Objetivos
Anemia Carencial Ferropriva
• Definição: de síndrome anêmica e de anemia carencial ferropriva
• Anemia fisiológica - citar (definição, período e causas)
• Epidemiologia: detalhamento sobre: sexo, faixa etária, nível de escolaridade e socioeconômico, regiões de maior prevalência
no brasil, com fonte em todos os dados
• Fatores predisponentes ou fatores de risco para anemia ferropriva
• Fisiopatologia: descrever as alterações da hematopoese na anemia ferropriva (revisão breve sobre hematopoese) e
metabolismo do ferro (a importância do ferro no organismo). Explicando-as
• Detalhamento em ordem de evolução das 3 fases da instalação da anemia ferropriva
• Manifestações clínicas: descrição em todos os sistemas e exame físico completo. Explicando-as com relação a fisiopatologia
• Diagnóstico laboratorial: interpretação do eritrograma (eritrócitos, hemoglobina, hematócrito, VCM, HCM, CHCM, RDW),
ferritina sérica, transferrina (CTLF), índice de saturação de transferrina, protoporfirina eritrocitária livre e ligada ao zinco, ferro
sérico e reticulócitos, Hb do reticulócito. Entender as alterações laboratoriais e a sequência destas alterações na evolução da
doença. Incluindo PC reativa
• Saber os valores normais de referência de Hb (hemoglobina) nas faixas pediátricas do recém-nascido até início da adolescência
Sugestão: tabela OMS/WHO - detalhamento em ordem de evolução (3 fases da instalação da anemia ferropriva) serão
cobrados apenas os valores de referência para: ferritina e hemoglobina em todas as faixas etárias pediátricas
• Prognóstico, evolução clínica e laboratorial (apenas citar)

Ana Luiza Ohata – T70


1
• Complicações (apenas citar)
• Tratamento dietético e medicamentoso (profilático e terapêutico) – importante! (em
• Todas as faixas etárias da pediatria - do nascimento até 10 anos de idade)

Diarreia
• Conceituar diarreia e classificar quanto à duração (aguda, persistente e crônica) e rever brevemente os mecanismos de ação
(secretor, motor, exsudativo, osmótico)
• Discutir: as etiologias das diarreias agudas infecciosas.
• Diferenciar etiologia viral da bacteriana – principalmente, Escherichia coli (diagnóstico diferencial de etiologia bacteriana). O
caso é provavelmente viral por rotavírus
• Descrever a etiopatogenia da diarreia aguda viral por rotavírus
• Descrever a fisiopatologia da diarreia aguda infecciosa por rotavírus (mecanismo secretor e osmótico)
• Esquematizar o quadro clínico e o exame físico e lembrar as possíveis complicações
• Conhecer métodos diagnósticos (para confirmar intolerância a lactose secundária ao quadro infeccioso), incluindo todos os
exames citados no caso
• Esquematizar o tratamento (não estudar terapêutica para desidratação oral ou parenteral)
• Prevenção: revisar a vacinação contra o rotavírus e febre amarela, estabelecida no PNI (Programa Nacional de Imunização)
desde 2006

Anemia
Definição
• Anemia (OMS): concentração de hemoglobina abaixo do segundo desvio-padrão da média de distribuição do valor da Hb para
a população de mesma idade, sexo e vivendo na mesma altitude – importante também considerar a etnia
o Uma criança pode ter uma perda volêmica importante e sua Hb estar normal, porém, após a expansão, a anemia
aparece
• Etiologia multifatorial: processos infecciosos, medicações, sangramentos, mas sua principal etiologia é a deficiência de ferro
(mais de 60% dos casos)

Epidemiologia
• Pico de incidência da anemia ferropriva: 6 aos 18 meses ® as reservas de ferro provenientes da mãe no RNT se esgotam aos
6 meses (RNPT podem apresentar anemia antes dos 6 meses por não terem a reserva completa)
• A prevalência em meninos e meninas é a mesma durante a infância, porém, na adolescência esta incidência sofre mudança
devida perda de sangue pelo fluxo menstrual
• A anemia ferropriva tem prevalência de 40-50% das crianças, com maior incidência em crianças menores de 3 anos e
acometendo principalmente famílias com condições socioeconômicas e culturais mais desfavorecidas
• Atualmente: discreta melhora na prevalência da anemia por aumento da prevalência do aleitamento materno, uso de fórmulas
enriquecidas, melhoria do acesso às fontes alimentares, programas de fortificação e enriquecimento de alimentos, campanhas
educativas e modificações ambientais

Anemia Fisiológica
• Causa mais comum de anemia no período neonatal (6 a 12 semanas)
• Não requer extensa avaliação ou tratamento
• Anemia normocítica-normocrômica em RNT e RNPT por processos fisiológicos normais
• Recém-nascido: queda na concentração da hemoglobina nos 2 a 3 primeiros meses (9-11 g/dl) por dois fatores principais
o A oxigenação por meio da respiração causa uma queda abrupta dos níveis de oxigênio em todos os tecidos, reduzindo
a produção de eritropoetina por feedback negativo, consequentemente, reduzindo a eritropoiese
o O menor tempo de meia vida da Hb (90 dias) quando comparada a do adulto (120 dias)
• Prematuro: anemia mais precoce e com um nadir (ponto mais baixo da curva de contagem de células sanguíneas) mais baixo
o Mecanismo semelhante a do RNT, mas com uma meia vida da Hb ainda mais reduzida (35-50 dias), crescimento
rápido e flebotomia
o Afeta RNPT com menos de 32 semanas

Ana Luiza Ohata – T70


2
Metabolismo do Ferro
• O ferro é o metal mais importante do corpo humano, estando envolvido com a síntese proteica, sistema respiratório, oxidativo
e anti-infecção
• A maior fonte de ferro do corpo humano se dá pela reciclagem de hemácias, sendo o restante proveniente da dieta
o Fontes vegetais ou inorgânicas: ferro não hemínico
o Fontes animais (carne e ovos): ferro hemínico ou orgânico
• A absorção do ferro não heme sofre influência de fatores antinutricionais no processo absortivo, enquanto o ferro não heme
independe de mecanismos inibidores ou facilitadores da dieta
o O ferro heme é transportado para o interior dos enterócitos pela enzima HCP1
o A forma não heme é mais difícil de ser absorvida, dependendo de uma série
de fatores e proteínas – apenas cerca de 10% do Fe consumido da dieta é
absorvido
• O ferro encontrado nos vegetais está na forma Fe+3, é reduzido em Fe+2 pela enzima
DcytB e então é transportado pela enzima DMT1 ® o HCl é necessário para a
solubilização do mineral e sua manutenção na forma Fe+2
• Uma vez no interior da célula, o ferro pode ser armazenado pela ferritina ou prosseguir
para a membrana basolateral e alcançar o plasma (ferroportina ou hefaestina) ®
quando no plasma, o ferro se liga a transferritina e ao entrar na célula, este complexo
ferro-transferritina é endocitado pela clatrina que por fim leva a ligação com a
protoporfirina, para então ser usado na síntese do agrupamento heme
• Armazenamento do ferro
o Ferritina: se encontra na maioria das vezes no citoplasma celular, mas uma
parte pode ser liberada no plasma, podendo se correlacionar com o ferro total
do corpo ® importância da dosagem de ferritina sérica para o diagnóstico da
anemia ferropriva!
o Hemossiderina: formada a partir da digestão de hemácias e outras células senescentes por macrófagos do fígado,
baço e medula óssea

Hematopoiese
• Nas primeiras semanas de gestação, o saco vitelínico é um local transitório de hematopoiese, sendo a hematopoiese definitiva
derivada de uma população de células tronco observada na região aorta-gônadas-mesonefros (AGM) – a placenta também
contribui para a hematopoiese no período fetal
• Entre a 6ª semana ao 7º mês, o fígado e o baço são os principais órgãos hematopoiéticos e continuarão contribuindo para tal
até a 2ª semana após o nascimento
• Nos primeiros 2 anos toda a medula óssea é hematopoiética, mas com o passar dos anos, este tecido acaba sendo substituído
por gordura ® no adulto, a hematopoiese regular se restringe ao esqueleto central e as extremidades proximais do fêmur e
úmero
• O início da hematopoiese se dá com uma célula-tronco pluripotente que sofre divisão assimétrica e pode se autorrenovar ou
formar linhagens celulares distintas ® as células-tronco hematopoiéticas são escassas e tem potencial de desenvolvimento
restrito
o A seleção da linhagem da diferenciação se dá tanto por alocação aleatória como por sinais externos recebidos (sinais
de transcrição externos)
• A medula de um indivíduo saudável tem capacidade de autorrenovação, permitindo que a celularidade geral permaneça
constante
• Os fatores de crescimento hematopoiéticos são hormônios glicoproteicos que regulam a proliferação e a diferenciação de
células progenitoras hematopoiéticas e a função das células já maduras, causando proliferação ® diferenciação ® maturação;
além da prevenção de apoptose e afetando as funções das células maduras
o A eritropoetina é sintetizada nos rins (90%) e a trombopoetina no fígado ® não agem no estroma
o A eritropoetina tem papel essencial na maturação e apoptose dos precursores da linhagem eritroide, sendo sua
produção regulada pelo teor de oxigênio arterial que irriga as células peritubulares no córtex renal
• Após 120 dias, os macrófagos do baço, fígado e medula fazem a fagocitose e degradam os eritrócitos

Ana Luiza Ohata – T70


3
Anemia Carencial Ferropriva
• Privação de ferro dentro do organismo, causando uma redução da hemoglobina, sendo a etiologia mais importante a baixa
ingesta de ferro
• A deficiência de ferro ocorre de forma gradual e evolutiva, em 3 estágios
1. Esgotamento de reservas: baixa concentração de ferritina sérica, causando perda nos estoques de ferro em fígado, baço
e medula óssea (valores inferiores a 12 μg/L em crianças menores de 5 anos e 15 μg/L em maiores de 5 anos) – fase
assintomática
2. Eritropoiese da deficiência de ferro: elevação da capacidade de ligação de ferro e diminuição da concentração de ferro
sérico (< 30 mg/dl), promovendo queda da saturação da ferritina (transferrina + 2Fe = 16%) – sintomas: fadiga e cansaço
3. Anemia ferropriva: ferro insuficiente para a produção de hemoglobina, causando redução dos seus níveis – anemia
microcítica e hipocrômica
• Processos infecciosos podem alterar a ferritina de 8-10x

Manifestações Clínicas
• Mucosas: palidez cutânea e de mucosas, glossite atrófica, queilite angular
• Pele e fâneros: cabelos secos e quebradiços, enfraquecimento da camada ungueal, causando coinloníqua (“unha em colher”)
• PICA (perversão do apetite): desejo de ingerir algo (geralmente gelo), mas podendo ser substâncias que não são alimentos,
como terra, giz, areia
• Sistema cardiovascular: taquicardia compensatória, redução da viscosidade sanguínea, aumento da velocidade de fluxo,
causando turbilhonamento e sopros sistólicos
• Sistema digestório: redução da produção de HCl, FI e pepsina ® baixa digestão proteica, hipovitaminose de B12, disfagia,
anorexia, redução da acidez gástrica e sangramento da mucosa intestinal
• Sistema muscular: redução do aporte de oxigênio, ativando metabolismo anaeróbico ® miastenia, fadiga e intolerância ao
exercício

Fatores de Risco para a Anemia Carencial Ferropriva


• Baixa reserva materna: múltiplas gestações com curto intervalo de tempo, dieta materna deficiente em ferro, não
suplementação de ferro durante a gravidez e lactação e perda sanguínea
• Aumento da demanda metabólica: prematuridade, baixo peso ao nascer, crescimento acima do p90, atletas de competição e
meninas com grande perda menstrual
• Diminuição do fornecimento: clampeamento do cordão umbilical antes do 1º minuto de vida, aleitamento materno exclusivo
superior a 6 meses, alimentação complementar pobre em ferro ou com baixa biodisponibilidade, consumo de leite de vaca
antes do 1º ano de vida, consumo de fórmula com quantidade insuficiente de ferro, dietas restritivas sem acompanhamento
e baixa ou ausência da suplementação de ferro quando indicada
• Perda sanguínea
• Má absorção de ferro

Diagnóstico
• Rastreio aos 12 meses por meio dos exames: hemograma (avaliação de Hb, índices hematimétricos como VCM, HCM e RDW
e morfologia eritrocitária), ferritina sérica, proteína C reativa (avaliação de processos infecciosos) e contagem de reticulócitos
o Reticulócitos: hemácias imaturas, produzias pela medula óssea ® sua contagem é utilizada para determinar se a
medula óssea está respondendo corretamente às necessidades do corpo de produção de hemácias e esclarecer os
diferentes tipo de anemia – o volume de Hb presente representa o volume de ferro para eritropoiese, indicando
precocemente a anemia ferropriva (VR – crianças: 0,5-2% ou 25.000-85.000/mm3)

Ana Luiza Ohata – T70


4
• Hematócrito
o Crianças de 6-60 meses: 33%
o Crianças de 5-11 anos: 34%
• Ferritina
o Crianças menores de 5 anos > 12 μg/L
o Crianças entre 5 e 12 anos > 15 μg/L
• Outros achados
o Aumento do receptor de transferrina e zinco protoporfirina
o Leucopenia e plaquetose
o Infecção: aumento da PCR e redução da CTLF

Prognóstico
• Prognóstico excelente, desde que tratado
• Monitorização pela contagem de reticulócitos, hemograma a cada 30-60 dias e dosagem de marcadores de estoque como
ferro-ferritina a cada 30-90 dias
• Tratamento até a reposição dos estoques (cerca de 6 meses)

Complicações
• Lactentes: alterações comportamentais, ADNPM, diminuição da capacidade intelectual e queda do rendimento escolar
• Quadro crônico: maior susceptibilidade a infecções por comprometimento da imunidade celular, problemas cardiovasculares
e baixo desempenho cognitivo

Prevenção
• Educação alimentar e nutricional
o Aleitamento materno exclusivo até o 6º mês e complementado até os 2 anos
o Não oferecer leite de vaca para menores de 1 ano e limitar o consumo para maiores de 1 ano a 500 ml/dia
o Não oferecer leite de vaca após as refeições (pH alcalino e Ca+2 prejudica a absorção e causam micro hemorragias
intestinais)
o Na necessidade de FIP, fornecer aquelas enriquecidas
o Inserir carne na alimentação complementada (70-100 g/dia)
o Inserir facilitadores da absorção de Fe na alimentação complementada (cítricos)
o Não oferecer chá mate, chá preto ou café perto das refeições (fitatos e tanatos prejudicam a absorção)
• Controle de doenças infecciosas e parasitárias – saneamento básico e higiene pessoal
• Suplementação profilática dos 3 ou 6 meses até os 2 anos (início a depender dos fatores de risco) – 1 mg/kg/dia
o Início aos 30 dias se: RNPT ou peso ao nascer inferior a 2,5
kg

• Suplementação de ferro elementar em gestantes


o Não anêmicas: 40 mg/dia
o Anêmicas: 60-120 mg/dia
• Medicamentos
o Sulfato ferroso (25 mg/ml): 1 gota = 1,25 mg
o Hidróxido de ferro polimaltosado: 1 gota = 2,5 mg

Tratamento
• Ferro oral: 3-6 mg/kg/dia fracionado ou em dose única por 6 meses
ou até reposição dos estoques corporais
• A efetividade deve ser checada por meio de hemograma e
contagem reticulócitos em 30-45 dias, esperando melhora dos
níveis de reticulócitos e aumento da Hb em pelo menos 1 g/dl
• Importante que a suplementação seja feita antes das grandes
refeições (almoço e jantar), pois o pH ácido irá auxiliar na absorção
• Pode-se pedir uma contagem de reticulócitos em 10 dias (tempo
de produção a partir da célula pluripotente)

Ana Luiza Ohata – T70


5
Diarreia Aguda
Definição
• Ocorrência de 3 ou mais evacuações amolecidas ou líquidas nas últimas 24h – a diminuição da consistência habitual das fezes
é um dos parâmetros mais avaliados
• Desequilíbrio entre a absorção e secreção de líquidos e eletrólitos – geralmente é autolimitado

Quadro Clínico
• Início abrupto de etiologia presumivelmente infecciosa
• Aumento no volume e/ou na frequência de evacuação com perda de água e eletrólitos
• Potencialmente autolimitada com duração inferior a 14 dias, mas que geralmente resolve-se em até 7 dias
• Representa uma infecção do tubo digestivo por vírus, bactérias ou protozoários
• Pode se complicar em desidratação, desnutrição energético-proteica (alimentação fornecida de forma incorreta e episódios
muito sucessivos) e até óbito

Classificação
Diarreia aguda aquosa - Duração até 14 dias
- Perda de grande volume de fluidos
- Causas bacterianas ou virais
- Complicações: desidratação e desnutrição
Diarreia aguda com sangue - Presença de sangue nas fezes, indicando lesão de mucosa intestinal
(disenteria) - Causada principalmente por infecção bacteriana do gênero Shigella
- Complicações: desidratação, desnutrição e infecções sistêmicas
- No lactente, considerar como diagnóstico diferencial a invaginação intestinal
Diarreia persistente - Duração ≥ 14 dias
- Complicações: desidratação e desnutrição
- Alto risco para complicações
- Elevada letalidade
• Diarreia crônica
o Duração > 30 dias
o Altera o crescimento e desenvolvimento da criança, podendo levar à queda em percentis dos gráficos, desnutrição,
desidratação e anemia
o Diversas causas: intolerância à lactose, alergia à proteína do leite de vaca (APLV), doença intestinal inflamatória,
doença celíaca, síndrome do intestino irritável, entre outras
• Diarreia funcional do lactente
o 4 ou mais evacuações não formadas por dia – não dolorosas
o Duração dos sintomas por > 4 semanas
o Não possuem déficit de crescimento se o aporte calórico estiver adequado nem má absorção
o Geralmente se resolve antes dos 2 anos

Etiologia
• A maior parte dos quadros de diarreia aguda são causados por vírus, bactérias, parasitas e fungos
o Vírus: rotavírus, coronavírus, adenovírus, calicivírus (norovírus) e astrovírus
o Bactérias: E. coli (enteropatogênica clássica, enterotoxigênica, enterohemorrágica, enteroinvasiva ou
enteroagregativa), Aeromonas, Pleisiomonas, Salmonella, Shigella, Campylobacter jejuni, Vibrio cholerae e Yersinia
o Parasitas: Entamoeba histolytica, Giardia lamblia, Cryptosporidium e Isospora
o Fungos: Candida albicans
• Pacientes imunodeprimidos podem ter diarreia causada por outros agentes como Klebsiella, Pseudomonas, Aerobacter, C.
difficile, VIH
• Outras causas podem levar à diarreia: intolerância a lactose, APLV, apendicite aguda, uso de medicamentos e intoxicação por
metais pesados
• A etiologia da diarreia não é de investigação obrigatória, deve ser realizada em casos graves e em pacientes hospitalizados

Ana Luiza Ohata – T70


6
• Etiologia viral x bacteriana
o Diarreias bacterianas costumam apresentar sangue ou pus e febre mais frequentemente, enquanto diarreias virais
se resolvem mais rapidamente e são mais aquosas

Mecanismos de Ação
• Diarreia secretora: aumento do AMPc nas células intestinais, causando migração de água e eletrólitos para o lúmen, mesmo
sem lesão na mucosa
o Causas: medicamentos, toxinas bacterianas e viroses
o Quadro clínico: febre, desidratação, astenia, cólica abdominal e flatulência
o Não melhora com jejum
• Diarreia motora ou funcional: não há lesão, mas uma hipermotilidade, causando urgência de evacuação
o Causas: medicamentos, causas psicológicas, hipertireoidismo e substâncias irritantes
o Não melhora com o jejum
• Diarreia exsudativa: aumento da permeabilidade com lesão da mucosa intestinal, apresentando muco e pus
o Presença de sangue = desinteria
o Causas: inflamatórias (doença de Crohn ou retro colite ulcerativa), linfomas, tumores e patogênicas
o Pode cursar com febre e não melhora com o jejum
• Diarreia osmótica: aumento de substâncias não absorvíveis no lúmen, fazendo o líquido migrar para ele ou retardando a
absorção de água
o Diarreia volumosa com grande quantidade de restos alimentares
o Causas: má absorção, aumento da ingesta de fibras, ingesta de alimentos que superam a capacidade absortiva,
intolerância à lactose, doença celíaca ou deficiência pancreática
o Melhora com o jejum

Fisiopatologia da Diarreia por Rotavírus


• Ingesta do vírus via fecal-oral por água ou alimentos contaminados ® o vírus resiste à acidez estomacal e se dirige para células
diferenciadas (período de incubação de 2-4 dias)
• Ocorre então um desequilíbrio entre absorção e secreção intestinal
• Os rotavírus penetram os enterócitos que se rompem e são substituídos por células absortivas imaturas que apresentam
redução na quantidade de microvilosidades, mas mantém sua capacidade secretora
o Redução da Na+/K+ ATPase, reduzindo a absorção de glicose e de água
o Redução da atividade das enzimas apicais (lactases), aumentando a osmolaridade do lúmen
• O quadro é autolimitado, pois o rotavírus é restrito às células apicais
• Não há alteração dos níveis de AMPc, mas há liberação de NSP4 (enterotoxina) que determina secreção de água e eletrólitos
para o lúmen ® mecanismo secretório da diarreia

Avaliação Clínica
• Anamnese: duração, quantidade diária de evacuações, presença de sangue nas fezes, se é acompanhado de vômito, febre ou
outras manifestações clínicas, práticas alimentares e quadros semelhantes ® avaliar dieta, consumo de líquidos,
medicamentos em uso, medicações, diurese, vacinação e peso recente
• Maior risco de complicação nos casos de baixo peso ao nascer, imunocomprometidos, RNPT, lactentes menores de 2 meses,
doença grave de base, insuficiência renal ou hepática, doenças crônicas, vômitos persistentes, perdas diarreicas volumosas e
frequentes (mais de 8 episódios por dia) e percepção de desidratação pelos pais
• Febre e vômitos aparecem no início do quadro (12-24h), seguidos pela diarreia que dura de 5 a 7 dias ® a fermentação da
lactose libera H+, produzindo fezes acidificadas
• Exame físico: estado geral, presença de lágrimas, nível de consciência, sinal da prega cutânea, pulso, enchimento capilar,
hidratação, nutrição, estado de alerta, diurese e peso
o Os RHA estarão aumentados e muitas vezes podem ser ouvidos sem o estetoscópio
• Sinais graves de desidratação: fontanela baixa, saliva espessa, alteração do padrão respiratório, taquicardia, pulso débil,
aumento do tempo de enchimento capilar, extremidades frias, perda de peso, turgência de pele e sede
o Perda de peso de até 5% representa desidratação leve (reposição de 5 ml/kg)
o Perda de peso de 5-10% representa desidratação moderada (reposição de 50-100 ml/kg)

Ana Luiza Ohata – T70


7
o Perda de peso acima de 10% representa desidratação grave (repor 100 ml/kg)

Diagnóstico
• Clínico
• Casos crônicos, graves, atípicos, quadros de desinteria, diarreia em menores de 4 meses e imunodeprimidos devem ser
acompanhados por exames laboratoriais
o Coprocultura: baixa sensibilidade e dificuldade técnica
o PCR multiplex: mais sensível, rápido e testa vários agentes etiológicos ao mesmo tempo, porém é de alto custo
• Intolerância secundária à lactose
o Alguns microrganismos podem lesar o intestino delgado, causando deficiência de lactase, mas que retorna ao normal
após períodos variáveis, uma vez que o fator desencadeante seja removido
o Diagnóstico clínico: retira-se os alimentos com lactose e observa-se a reação do organismo, teste respiratório para
verificar a presença de hidrogênio, teste de tolerância a lactose (elevação de mais de 20 mg/dl de glicemia após a
ingestão de lactose) e teste genético
o Dosagem de substâncias redutoras: detecta presença de carboidratos, como a lactose, nas fezes
o pH das fezes (acidificação)
§ Crianças em aleitamento materno exclusivo: pH < 4,5
§ Crianças sem aleitamento materno exclusivo: pH < 5,5

Tratamento
• Manutenção do aleitamento materno
• Avaliar recomendação de jejum durante o período de expansão volêmica com retorno à alimentação quando a revisão da
desidratação acabar
• Alimentação no mesmo esquema habitual do paciente ® não diluir fórmulas nem recomendar fórmulas sem lactose para
pacientes ambulatoriais, apenas pacientes com diarreia aguda que necessite hospitalização ou que seja muito persistente
• Critérios de recuperação
o Redução das perdas diarreicas
o Recuperação nutricional
o Retomada do peso
• O uso de probióticos não tem comprovação científica!
• Suplementação
o Zinco: suplementação por 10 dias para regeneração da mucosa intestinal
§ Abaixo de 6 meses: 10 mg/dia
§ Acima de 6 meses: 20 mg/dia
o Vitamina A: suplementação em casos de hipovitaminose A
§ 6-12 meses: 100.000 UI/dia
§ 12-72 meses: 200.000 UI/dia
• Vacinação
o Rotavírus – administrar somente até 7 anos e 29 dias
§ SUS: VRH1 (1ª dose aos 2 meses e 2ª dose aos 4 meses)
§ Particular: VRH 5 – a partir de 6 semanas, com intervalos de 4 semanas (esquema 2-4-6)
o Febre amarela: 1ª dose aos 9 meses e reforço aos 4 anos

Ana Luiza Ohata – T70


8

Você também pode gostar