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DIARREIA AGUDA E DESIDRATAÇÃO

DEFINIÇÃO

Diarreia: perda excessiva de água e eletrólitos através das fezes, resultando em aumento do volume e frequência das
evacuações e diminuição da consistência das fezes, de forma diferente do padrão habitual ( não há um número de
evacuações por dia, é um padrão evacuatório diferente do habitual da pessoa)

 Recém-nascido que são amamentados exclusivamente ao seio possuem fezes líquidas e evacuam várias vezes ao
dia, não sendo classificado como diarreia

EPIDEMIOLOGIA

 Diarreia aguda – Principais causas de mortalidade e morbidade nos países em desenvolvimento,


especialmente em menores de 6 meses.
 OMS:
o 1 bilhão casos/ano
o 3 milhões de óbitos/ano
 País em desenvolvimento: crianças menores de 5 anos podem apresentar cerca de 3 a 5 episódios/ano.
 Região nordeste o risco de morte por diarreia é 4 a 5x maior que na região sul   devido a aglomeração
nas casas, falta de saneamento, falta de atendimento
  É normal/comum devido a fase oral da criança

CLASSIFICAÇÃO

 Diarreia aguda: é normal a duração de até 14 dias. As crianças menores de 2 anos têm quadros mais
prolongados de diarreia, devido a imaturidade do sistema digestivo, imunodeficiência funcional
 Diarreia persistente dura de mais de 14 dias a 1 mês: são crianças que após um episódio de diarreia aguda,
por algum fator do indivíduo, o enterócito acaba por não se regenerar (ex. anemia, desnutrição, má
alimentação)
 Diarreia crônica: doenças infecciosas ou sistêmicas
 Disenteria: pode ocorrer na diarreia aguda, persistente ou crônica
1. Diarreia aguda aquosa: diarreia que pode durar até 14 dias e determina perda de grande volume de fluidos e pode
causar desidratação. Pode ser causada por bactérias e vírus, na maioria dos casos. A desnutrição eventualmente pode ocorrer
se a alimentação não é fornecida de forma adequada e se episódios sucessivos acontecem.
2. Diarreia aguda com sangue (disenteria): é caracterizada pela presença de sangue nas fezes. Representa lesão na
mucosa intestinal. Pode associar-se com infecção sistêmica e outras complicações, incluindo desidratação. Bactérias do
gênero Shigella são as principais causadoras de disenteria.
3. Diarreia persistente: quando a diarreia aguda se estende por 14 dias ou mais. Pode provocar desnutrição e desidratação.
Pacientes que evoluem para diarreia persistente constituem um grupo com alto risco de complicações e elevada letalidade2,6.
Assim, doença diarreica aguda pode ser entendida como um episódio diarreico com as seguintes características: início
abrupto, etiologia presumivelmente infecciosa, potencialmente autolimitado, com duração inferior a 14 dias, aumento no
volume e/ou na frequência de evacuações com consequente aumento das perdas de água e eletrólitos 17. Apesar da definição
de diarreia aguda considerar o limite máximo de duração de 14 dias, a maioria dos casos resolve-se em até 7 dias.
A doença diarreica na maior parte das vezes representa uma infecção do tubo digestivo por vírus, bactérias ou
protozoários e tem evolução autolimitada, mas pode ter consequências graves como desidratação, desnutrição
energético-proteica e óbito. Nem sempre é possível identificar o agente causador do episódio diarreico.

DIARREIA AGUDA
ETIOLOGIA DA DIARREIA AGUDA DE ACORDO COM A FAIXA ETÁRIA

 Lactentes (são menores de 2 anos): superalimentação (alimentos que a criança não está pronta para fazer uma
digestão correta  produtos industrializados, frituras

 Em todas as faixas etárias a principal causas é infecciosa

GASTROENTEROLOGIA INFECCIOSA

Provocada por:

 Vírus  principal causa


 Bactérias
 Protozoários
ROTAVÍRUS

 Causa mais comum de diarreia em menores de 2 anos, tanto em países em desenvolvimento quanto em
países desenvolvidos.
 Possui 80 sorotipos.
 A gravidade do quadro clínico é maior na primeira infecção e decresce progressivamente a partir das
demais.
 Estima-se que todas as crianças até os 5 anos de idade já tenham sido infectadas por esse agente.
 Sazonalidade: período de inverno (países temperados) e todo o ano em países tropicais.
 Propagação via fecal-oral, surtos são comuns em creches  uma criança com rotavírus infecta a turma
inteira
 Período de incubação: 48-72h
 Quadro clínico: Febre, vômitos, seguidos de diarreia abundante e sinais de desidratação  é muito
comum a criança pequena iniciar o quadro apenas com febre e vomito, sem diarreia (esta pode iniciar 24
a 72 h depois do inicio dos primeiros sintomas). Pode ocorrer um quadro de apenas febre e vomito
 Diagnóstico: é clínico (devido a faixa etária). Mas na dúvida  pesquisa de Rotavírus em amostra fecal
(sensibilidade e especificidade 90%)
 Tratamento: Prevenção e tratamento da desidratação  medidas de suporte são o principal tratamento
o Nitazoxanida  diminui tempo de doença, não previne formas graves
 Vacina: Monovalente (SUS) X Pentavalente (privada) – como são 80 tipos a criança continua podendo
pegar rotavírus

 O rotavírus é a principal causa de mortalidade em menores de 5 anos, pois nesta faixa etária pode causar um
quadro de desidratação grave

 O rotavírus é a principal causa de gastroenterite viral. Sempre pensar em crianças menores de 2 anos, que
frequentam a escola, com vomito, febre

GASTROENTERITE BACTERIANA
 E. coli enterotoxigenica e enterohemorragica são as mais comuns e mais prevalentes no Brasil

 E. coli enteroagregativa: pode evoluir para quadros mais graves

 Sempre que o paciente apresentar diarreia com sangue e muco (disenteria), deve-se pensar em Shigella

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

 Na grande maioria dos casos de gastroenterite aguda, não tem necessidade de exames complementares.
 Casos selecionados: evolução grave, comprometimento do estado geral, crianças imunodeprimidas, surtos
em creches e berçários (para saber quem é o agente causador), desinteria.
o Hemograma  leucocitose (bem alta)
o Eletrólitos – potássio, sódio, cloro
o Creatinina, ureia (casos que são associados a SHU)
o EPF 3 amostras  excluir causa parasitária
o Pesquisa de rotavírus nas fezes
o Coprocultura de fezes e pesquisa de leucócitos fecais  principalmente casos de disenteria

TRATAMENTO
 O objetivo do tratamento da diarreia aguda é a prevenção da desidratação   quanto menor a criança
mais grave pode ser o quadro de desidratação, pois a criança tem volume sanguíneo circulante menor. A
criança por perder muito volume pode entrar em choque hipovolêmico
  O foco do tratamento é água

POLIVITAMINAS E SAIS MINERAIS NA DIARREIA AGUDA

  Os guias mandam dar zinco e hidratar


 Zinco: suplementação reduz a duração e a gravidade da doença e previne a recorrência da diarreia nos
próximos 2 a 3 meses.
 OMS recomenda suplementação de Zinco para todas as crianças com diarreia:
o 10 mg/dia menores 6 m
o 20 mg/dia maiores 6 m
o Mantendo 10 a 14 dias.

ANTIBIÓTICOS

  A maioria das gastroenterites é de origem viral, por isso não necessidade de utilizar antibiótico
 Reservado aos casos de disenteria (sangue e muco) e que, após a reidratação, o paciente mantém
comprometido o estado geral.
 Disenteria – usar ATB com cobertura de Shigella (microrganismo causador de 60% dos casos em nosso
meio)
 Ácido Nalidíxico 5 d e Sulfametoxazol - Trimetropin 40 mg/kg/dia 5 d (índices elevados de resistência no
Brasil)  não é primeira escolha
 Ciprofloxacino 3 d *Primeira escolha 30mg/kg/dia (diluir comprimido)
 Ceftriaxona 3 d (injetável)
 Diarreia por Shigella – Azitromicina 5d (quando houver certeza que for Shigella)
 Os antimicrobianos podem aumentar o risco de SHU e por isso, deve ser restrito as formas graves da
doença   por isso não é orientado usar sempre o ATB

PROBIÓTICOS

 A OMS e o MS não mencionam a possibilidade do uso de probióticos no tratamento da diarreia aguda.


 ESPGHAN e Diretriz Ibero-latinoamericana – tratamento adjuvante nas diarreias agudas. Redução de
aproximadamente 24h na média da duração do quadro diarreico.
  Não é essencial e não está nos guias
 Cepas recomendadas:
o Sacharomyces boulardii – Floratil (sache para diluir em água)  mais utilizado
o Lactobacilus GG  não tem no Brasil
o L reuteri – Provance  comprimido mastigável
o L acdophilus LB – 20bi  comprimido para diluir

ANTIEMÉTICOS

 OMS e MS não recomendam o uso de antieméticos no tratamento da GEA. Consideram que os vômitos
tendem a desaparecer concomitante com a correção da desidratação.
 ESPGHAN e diretriz ibero-latinoamericana – uso ondansetrona para pacientes com GEA e vômitos
persistentes (com comprometimento do estado geral)
ANTIPERISTÁLTICOS E DROGAS ANTISSECRETORAS

 Nenhuma das drogas tem protocolo de uso rotineiro, nem indicação pela OMS e MS.
 Antiperistálticos (Loperamida - Imosec) – aumentam a gravidade da doença principalmente em diarreia
invasiva.
 Drogas antissecretoras (Racecadotrila - Tiorfan) – orientado pela ESPGHAN e diretriz Ibero-latinoamericana;
reduz a duração da diarreia e o volume das fezes. Dose: 1,5 mg/kg 8/8h até durar a diarreia.
  Paciente acima de 6 anos, em bom estado geral: fazer hidratação correta, zinco, probióticos  pode-se
utilizar Tiorfan para diminuir a duração da diarreia
  Nunca utilizar Tiorfan em menores de 6 anos
  Sempre hidratar quando usar o Tiorfan

DESIDRATAÇÃO
 Foco é água

AVALIAÇÃO HIDRATAÇÃO – Ministério da Saúde

 Primeiro passo é avaliar o estado o paciente: pontos importantes sede e lágrima

o A: não tem sinal de desidratação


o B: diarreia com sinais de desidratação
o C: desidratação grave
 Sinal da prega: apertar o abdome (se houver ingurgitamento é sinal de desidratação)

 Fontanela inferior abaulada

 Tempo de enchimento capilar é feito na planta do pé  aperta e solta

CONDUTA TERAPÊUTICA DA DESIDRATAÇÃO – Ministério da Saúde


PLANO A – criança sem sinal de desidratação
1. Recomendar o aumento da ingestão de líquidos (muita oferta hídrica)
2. Soro caseiro (usar na criança com diarreia, mas sem desidratação – é para prevenir desidratação): é
capaz de manter uma criança com diarreia aguda hidratada, porém ele não é capaz de reidratar
uma criança desidratada. Concentração de sódio 40 a 50 mEq/L (baixa concentração)
Oferecer após cada evacuação:
Até 12 meses: 50 a 100 ml // Acima de 12 meses: 100 a 200 ml
3. Manter alimentação habitual, em especial o aleitamento materno, aumentando a frequência das
mamadas.
4. Ensinar a família a reconhecer sinais de desidratação, caso piora do quadro retornar a unidade de
saúde  crianças pequenas desidratam rápido, mesmo com os cuidados
Preparo do soro caseiro

 200 ml de água limpa filtrada ou fervida


 1 medida pequena (uma pitada) de sal
 2 medidas grandes (um punhado) de
açúcar
Plano B – criança com desidratação moderada

 Reidratação oral com Soro de Reidratação oral (SRO)   sache no posto de saúde
 SRO Ministério da Saúde:
o  Trata a desidratação da criança. Tem maior osmolaridade (maior concentração de sódio)
o  Tem uso reservado nos postos e em ambiente hospitalar
o Osmolaridade 245 mOsm/L
o Concentração de sódio (75 mEq/L)
o Concentração de glicose (75 mmol/L)
 50 a 100 ml/kg de SRO, no período de 4 a 6 horas.
 Deve ser oferecida em quantidades pequenas, várias vezes.
 Criança amamentada ao seio deverão continuar recebendo
o LM junto com o SRO. Não amamentados recebem apenas
o SRO.
 Se o paciente vomitar, o volume deverá ser reduzido e a
frequência aumentada.
 Deverão permanecer na unidade de saúde até reidratação
completa
 Reavaliação com frequência, caso término do volume
inicial e sinais de desidratação persistirem, repete o volume
inicial.
 A fase de reidratação termina, quando desaparecem os
sinais de desidratação.
 Na alta: SRO após cada evacuação liquida, nas próximas
48h.
 Reavaliação 24-48h, orientar os pais sinais de piora
procurar atendimento imediatamente.
 GASTRÓCLISE:  lembrar que hidratação endovenosa não é
primeira opção na desidratação moderada
o Administração de SRO através de uma sonda
nasogástrica, de modo contínuo e gradual.
o Indicações: perda de peso após as duas primeiras horas de tratamento adequado com SRO
(nesse caso a perda fecal é maior que a quantidade de líquidos ingeridos); vômitos
persistentes (quatro ou mais em um período de 1h); distensão abdominal acentuada;
dificuldade de ingestão do SRO
o 20 a 30 ml/kg/h até reidratação.

Plano C – criança com desidratação grave

 Indicação de hidratação endovenosa:


o Desidratação grave
o Quando a criança não ganha ou perde peso após as primeiras 2h de hidratação por sonda
nasogástrica
o Paciente com alteração do estado de consciência –  criança torporosa, Glasgow diminuído
o Após uso de sonda nasogástrica criança persiste com vômitos
o Íleo paralítico (distensão abdominal e ausência de ruídos hidroaéreos)

Hidratação endovenosa
1. Fase de expansão rápida (criança está em choque hipovolêmico):
o Menores 5 anos: SF0.9% 20 ml/kg correr em 30 min,  ou seja, rapidamente. Se conseguir 2
acessos venosos é melhor  SFO (soro fisiológico)
o RN e cardiopatas graves – SFO 10 ml/kg.
o Maiores 5 anos: SF0.9% 30 ml/kg correr em 30 min OU Ringer lactato 70 ml/kg correr em
2h30min
o Repetir a fase de expansão rápida até a criança estiver hidratada   pode-se fazer quantas
vezes necessário
o  Choques refratários  drogas vasoativas
2. Fase de manutenção e reposição:
o A fase de manutenção é para cobrir as necessidades hídricas diárias.
o A fase de reposição é para compensar as perdas anormais decorrentes de diarreia e
vômitos.
o O volume administrado é a soma da fase de manutenção e da fase de reposição.
o O paciente deve ser alimentado conforme aceitação e receber o SRO, conforme tolerância
oral.
o A quantidade administrada endovenosa deverá ser reduzida progressivamente à medida
que for aumentando a ingesta dos alimentos e do SRO.
Volume de manutenção:

 Utiliza-se uma solução 1:4  Para cada 100 ml de líquidos teremos SG5% (soro glicosado) 80 ml +
SF0,9% 20 ml.
 Acrescenta-se KCl 10% 2ml ou KCl 19% 1ml, para cada 100 ml de manutenção

Volume de reposição:
o Não é possível avaliar as perdas, pelo número de evacuações.
o No primeiro dia, acrescenta-se ao volume de manutenção 50 ml/kg/dia de perdas.

EX.
PACIENTE 5 KG COM DESIDRATAÇÃO GRAVE:
1. Fase de reposição rápida (push):
20 ml/kg – SF0.9%  100 ml correr em 30 min.

2. Fase de manutenção e reposição:


100 ml/kg/24h (manutenção) + 50 ml/kg/24h (reposição)  750 ml/24h
SG5% 400ml manutenção + 125 ml reposição = 525 ml
SF0,9% 100 ml manutenção + 125 ml reposição = 225 ml
KCl 10% 15 ml
Total 765 ml/24h = 31.8 ml/h em bomba de infusão

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