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DIARRÉIA AGUDA

 Diarréia aguda (DA), ou gastroenterite, pode ser conceituada como a alteração do hábito intestinal carcaterizada por
aumento da freqüência ou da fluidez das fezes que dura menos de 2 semanas.
 Caracteriza-se por uma modificação quase sempre brusca do hábito intestinal, com fezes líquidas, ou semilíquidas, e pelo
número aumentado de evacuações e pode vir acompanhada de vômito.
 É processo normalmente autolimitado, cuja duração varia de horas a dias, sem seu tratamento feito, de uma maneira geral,
apenas com medidas suportivas.
OBS.: Quando a duração é superior a duas semanas, com instabilidade hidroeletrolítica e comprometimento do estado
nutricional, a diarréia é considerada persistente.
 A DA é a segunda doença mais comum na prática médica, perdendo apenas apara as infecções das vias aéreas superiores.
 É considerada um problema de saúde pública pela elevada incidência, sendo uma das razões mais comuns de falta ao
trabalho, e pela morbimortalidade que pode acarretar em populações especiais.
 As doenças diarréicas estão entre as 5 maiores causas de morte no mundo.

EPIDEMIOLOGIA
 A diarréia aguda é de ocorrência universal, atingindo todas as camadas sociais e, na dependência de sua etiologia e das
condições sanitárias do ambiente, pode revestir-se de aspectos endêmicos ou epidêmicos.
 Nos países desenvolvidos, a diarréia aguda representa, principalmente, um fator de morbidade, sendo responsável por,
aproximadamente, 200000 hospitalizações/ano nos EUA.
 Nas populações carentes, é responsável por altos índices de morbidade e de mortalidade, estando intimamente
relacionado com a desnutrição ambas prevalecendo em populações que vivem em condições subumanas - alta
promiscuidade, ausência de saneamento básico, condições precárias de higiene domiciliar e pessoal, renda insuficiente,
baixo índice educacional e disponibilidade alimentar reduzida.
 A desidratação, consequência da maior perda de água e de eletrólitos pelas fezes, é a repercussão clínica imediata mais
séria da diarréia aguda. A sucessão ou recorrência de episódios agudos, em particular nas populações em situações de
miséria, afeta negativamente o estado nutricional, constituindo-se um dos fatores contribuintes para a instalação e a
manutenção da desnutrição protéico-energética.
 Nessas situações de carência, comuns nas populações marginalizadas do Brasil, a diarréia aguda é, na grande maioria das
vezes, desencadeada por um agente infeccioso, quase sempre bactéria ou vírus. Esse agente, em contato com o hospedeiro
espoliado nutricionalmente, encontra um meio propício para proliferar e gerar desequilíbrios hidroeletrolíticos e
nutricionais.

ETIOLOGIA
 A DA pode ser classificada como infecciosa (85% dos casos) ou não-infecciosa (15%).
 As infecciosas podem ser virais (70%), bacterianas (25%) e parasitárias (5%).
 Os agentes infecciosos ainda podem ser caracterizados como aqueles que causam diarréia inflamatória por invadir a mucosa
colônica ou como os que causam diarréia secretória pela produção de citotoxinas.
 As DA não-infecciosas são causadas por uma grande variedade de condições clínicas:

Quadro 3.1. Causas de DA aguda não-infecciosa


Condutas primeira pág

 As causas infecciosas da DA tem maior importância clínico-epidemiológica e tem maior prevalências. Os agentes mais
importantes são:
 Staphylococcus – é a principal causa de intoxicação alimentar por enterotoxinas pré-formadas. O período de incubação é
tipicamente curto (1 a 6h) e os sintomas predominantes são vômitos (76%) e diarréia (77%). Febre é incomum (23%). A
condição é autolimitada, com duração média de 1 a 3 dias. Os alimentos mais frequentemente envolvidos nesses surtos são
aqueles com elevado conteúdo protéico, como presunto, aves, maionese e folhados recheados com creme. A contaminação
ocorre durante o preparo do alimento e não é raro o achado de lesões cutâneas purulentas no pessoal de cozinha.
 Shigella – é a causa da chamada disenteria bacilar, embora muitos pacientes apresentem apenas diarréia aquosa pela ação
da toxina no intestino delgado. Porém, 48 a 72 h após a ingestão do inócuo bacteriano pode ocorrer a invasão da mucosa
colônica, desencadeando uma colite expressa clinicamente por diarréia com grande número de evacuações de pequeno
volume, contendo muco, sangue e pus, associada a tenesmo, cólicas abdominais e febre. Vômitos são raros. A disseminação
é feita pela via fecal-oral e requer um pequeno inoculo bacteriano.
 Salmonella – período de incubação de 6 a 48 h, iniciando com náuseas e vômitos e seguindo com cólicas e diarréia, que
duram de 5 a 7 dias. Febre pode ser observada em 50% dos casos. O envolvimento geralmente é entérico com diarréia
aquosa, mas pode também ser colônico com forma disentérica. Alguns grupos de pacientes apresentam risco elevado para
formas graves com infecções extra-intestinais, são eles: crianças menores de 3 meses, imunocomprometidos, portadores de
HIV, neoplasias e hemoglobinopatias.
 Campylobacter – germe tão comum na gênese da DA quanto a Salmonella e Shigella. A maioria dos casos parece advir da
ingestão de alimentos de origem animal mal cozidos, principalmente aves e leite não pasteurizado. O período de incubação
é de 24 a 72 h, sendo freqüentes febre (90%), dor abdominal (70%) e sangue nas fezes (50%). Duração média dos sintomas
de 1 semana, com evolução para cura espontânea na maioria dos casos. Alguns pacientes podem desenvolver complicações
imunomediadas durante a fase de convalescência, como artrite reativa, síndrome de Reiter e de Guillain-Barré.
 Escherichia coli – componente normal da flora intestinal humana. Algumas cepas possuem fatores de virulência associados
ao desenvolvimento de sintomas diarréicos. E. coli enteropatogênica: promove destruição das microvilosidades intestinais,
principalmente em crianças, com diarréia geralmente autolimitada. E. coli enterotoxigênica: produz toxina que ativa a
adenilciclase, promovendo secreção de fluidos e eletrólitos para a luz intestinal; é a principal causa de diarréia dos viajantes,
por ingestão de água ou alimentos contaminados; tem duração de 1 a 5 dias. E. coli enteroinvasiva: causa rara síndrome
disentérica, com clínica semelhante à shigelose. E. coli êntero-hemorrágica ou produtora de Shiga-toxina: é a cepa
0157:H7, mais comum em países desenvolvidos, adquirida por ingestão de alimentos contaminados, principalmente
hambúrguer mal cozido; o quadro se inicia com diarréia líquida, que se torna sanguinolenta e pode complicar-se com a
síndrome hemolítico-urêmica ou púrpura trombocitopênica trombótica, principalmente em crianças abaixo dos 5 anos,
quando atinge elevada letalidade.
 Yersinia enterocolitica – tem o poder de invadir as placas de Peyer, proliferando nos folículos linfóides e daí partindo para a
invasão da lâmina própria. A doença pode persistir por várias semanas, quando é comum a confusão com doença
inflamatória intestinal, principalmente doença de Crohn, devido ao acometimento preferencial do íleo terminal. Em crianças
abaixo de 5 anos, adenite mesentérica e ileíte são frequentes, simulando apendicite aguda. Poliartrite reativa pode ocorrer
em cerca de 2% dos adultos, 2 a 3 semanas após o episódio diarréico, assim como eritema nodoso.
 Clostridium difficile – é a principal causa de DA nosocomial, geralmente associada a uso de antibióticos. Os antibióticos mais
frequetemente envolvidos nesses casos são as cefalosporinas, ampicilina e clindamicina. Não há associação entre a dose
utilizada e os sintomas podem persistir ou mesmo inciar-se após a suspensão da droga. O espectro clínico pode variar desde
casos assintomáticos até quadros graves como megacólon tóxico e risco de perfuração. Nos casos mais graves, observam-se
diarréia aquosa profusa, cólicas abdominais, febre, leucocitose e hipoalbuminemia. A doença se desenvolve em pacientes
portadores da bactérias (o que é visto em 15 a 30% dos hospitalizados sem diarréia) que sofrem uma alteração na flora
intestinal (geralmente secundária ao uso de antibióticos), permitindo um rápido crescimento da mesma e produção de
toxinas A (enterotoxina) e B (citotoxina), que provocam inflamação da mucosa.
 Vibrio cholerae – tornou-se um grave problema de saúde pública em virtude de importantes surtos epidêmicos iniciados em
1991, com registro de 60000 casos em 1993. Trata-se de doença de transmissão hídrica e associada a precárias condições de
saneamento básico. O V. cholerae compreende diversos grupos sorológicos, mas apenas o sorotipo 01 é capaz de causar
doença. A cólera é uma doença típica de transmissão hídrica: água poluída (contaminada) por fezes e vômitos dos doentes,
sem tratamento adequado, e, em menor proporção, pelas fezes dos portadores ou por alimentos (raízes, vegetais folhoso e
frescos, frutas adubadas com fezes humanas, leite e derivados, verduras, moluscos, mexilhões, camarão, ostras, mariscos,
etc.). É o protótipo da diarréia secretória mediada por toxina. O período de incubação é de 12 a 48 h. A clínica pode variar
desde uma gastroenterite simples até casos graves. Nos casos típicos ou clássicos, o início é súbito, explosivo, com diarréia
aquosa, não-dolorosa, com fezes volumosas, descoradas, contendo pequenos focos de epitélio intestinal descamado,
podendo chegar a 15-20 L/dia, com letalidade podendo alcançar 50% em casos não tratados. Inicialmente, as dejeções são
biliosas, mas depois se tornam mucóides, sem sangue, cinzentas, com odor peculiar de peixe. A diarréia é acompanhada de
vômitos violentos em jato e câimbras fortes na panturrilha devido a hipocalemia.
 Rotavírus – disseminação por via fecal-oral. As manifestações clínicas são mais freqüentes em crianças; os adultos podem
ser portadores assintomáticos. O período de incubação varia de 1 a 3 dias e a duração da doença é de 5 a 7 dias, mas
quadros persistentes podem ser observados em imunodeprimidos. O quadro se inicia com vômitos seguidos por diarréia
aquosa profusa, que pode provocar sérios distúrbios hidroeletrolíticos.
 Vírus Norwalk – identificado como causa crescente de DA em todo o mundo, podendo ser transmitido por via fecal-oral ou
através de água e alimentos contaminados, sendo freqüente o surgimento de surtos. O período de incubação é curto
(menos que 2 dias) e provoca doença autolimitada (1 a 3 dias).

FISIOPATOLOGIA

FISIOLOGIA NORMAL
 Aproximadamente 8 a 9 L de líquido penetram no intestino delgado diariamente; 1 a 2 L originam-se da ingesta dietética,
enquanto o restante representa as secreções salivar, gástrica, pancreática, biliar e intestinais normais.
 O intestino delgado absorve a maior parte deste líquido, de modo que apenas 1 a 1,5 L passa para dentro do cólon. No
cólon, uma recuperação adicional de água resulta em um débito final nas fezes de apenas 100 a 200 mL/dia.
 Os intestinos delgado e grosso são revestidos por tipos diferentes de células epiteliais especializadas. No entanto, todas as
células epiteliais possuem:
 Polaridade, pois elas apresentam regiões apicais (que defrontam o lúmen) e basolaterais (que defrontam o sangue)
distintas;
 Junções intercelulares “estreitas” que se unem nos seus pólos apicais;
 Uma bomba de Na+-basolateral (Na+, K+-ATPase) que mantém um grandiente eletroquímico.
 Entre os diferentes segmentos de intestino delgado e grosso, as células epiteliais medeiam uma variedade de diferentes
processos ativos, exigem energia, enquanto a água movimenta-se por gradientes osmóticos passivos.
 O movimento dos íons através do epitélio pode ser passivo, relacionado aos gradientes eletroquímicos e de concentração,
ou ativo, precisando de um gasto energético.
 O transporte ativo dos íons através do epitélio sempre é transcelular, isto é, ocorre através das células. Devido a suas
cargas, os íons não penetram com facilidade a dupla camada lipídica e atravessam a membrana plasmática de um modo
regular, via proteínas especializadas, caracterizadas como bombas, carreadoras e canais.
 As bombas são transportadores que precisam de energia (ATP) capazes de mobilizar os íons e os solutos contra um
gradiente eletroquímico.
 A bomba mais importante no epitélio intestinal é a Na+, K+-ATPase, que remove Na+ de dentro das células através da
membrana basolateral contra gradientes eletroquímicos.
 Com cada ciclo da bomba, 3 íons de Na+ são excretados enquanto 2 íons de K+ são absorvidos, criando um interior celular
pobre em Na+, eletronegativo, que por fim, impulsiona a absorção transepitelial de Na+ e de água.
 A secreção de líquidos ao longo do intestino depende da secreção eletrogênica de Cl-.
 A secreção de Cl- é predominantemente mediado por células dentro das criptas que possuem padrões predeterminados
para a captação basolateral e a saída apical de Cl-.
 Os mecanismos de captação basolaterais de Cl- são acoplados aos do gradiente de Na+, mantendo, deste modo, uma
concentração intracelular de Cl- acima do equilíbrio eletroquímico. Como resultado, uma permeabilidade aumentada ao Cl-
apical provoca uma saída de Cl- da célula para dentro do lúmen, resultando na secreção de cloreto e de água.
 Apesar de o intestino delgado e o cólon compartilharem muitos mecanismos básicos no que concerne ao transporte iônico,
existem diferenças. Como resultado, o líquido do intestino delgado que penetra no cólon tem uma composição eletrolítica
semelhante à do plasma, enquanto o líquido fecal contém duas vezes mais de K+ do que Na+. Em momento algum o
intestino delgado ou o grosso mantém gradientes osmóticos padrões.

FIOSOPATOLOGIA
 Numerosos mecanismos podem causar diarréia. No entanto, a maior parte dos estados diarréicos é causada por absorção
inadequada de íons, solutos e de água ou por secreção aumentada de eletrólitos, o que resulta em acúmulo de água no
lúmen.

Diarréia secretória
 É causada por um transporte iônico anormal através do epitélio intestinal, o que resulta em absorção diminuída, aumento
na secreção ou em ambos.
 As diarréias secretórias são tipicamente causadas por mediadores neuro-humorais e/ou toxinas bacterianas que afetam os
níveis intracelulares de AMPc, GMP cíclico e/ou cálcio. Níveis elevados destes segundos mensageiros intracelulares, por sua
vez, tipicamente inibem a absorção eletroneural de cloreto de sódio e induzem à secreção de cloreto, sendo o resultado
líquido um aumento no acúmulo de água no lúmen do intestino.
 Um exemplo clássico de diarréia secretória é a cólera.
 Uma toxina produzida pelo organismo liga-se aos receptores da membrana nos enterócitos, ativando de modo irreversível
uma proteína ligadora do nucleotídeo guanina (proteína G), que leva a uma produção aumentada de AMPc.
 O AMPc intracelular aumentado inibe a absorção de NaCl eletroneural apical e, simultaneamente induz a secreção de Cl-
por meio da ativação dos canais apicais de Cl-. Esses eventos resultam em diarréia maciça, perda de volume intravascular, e,
sem reposição hídrica, em um eventual colapso circulatório.
 A marca registrada das diarréias secretórias toxigênicas e mediadas por hormônios é que não existe nenhuma lesão epitelial
associada, deixando intactos os transportadores de nutrientes apicais acoplados ao Na+ que não são inibidos pelos
segundos mensageiros intracelulares.
 Clinicamente, as diarréias secretórias:
o Apresentam alto débito (frequentemente > 1 l/dia);
o Persistem durante o jejum;
o Apresentam uma lacuna osmótica mínima (< 50mOsm) nas fazes, pois somente a secreção do sal está causando a
diarréia.
OBS.: Apesar de essas características serem clássicas para os casos de diarréia secretória pura, pode haver um quadro clínico
mais complexo, quando existem mecanismos mistos, por exemplo, nas síndromes disabsortivas como a doença celíaca.

Diarréia osmótica
 O movimento de água e de solutos é acoplado ao longo do trato GI, e nenhum gradiente osmótico sustentado é mantido
através da mucosa. Como resultado, a diarréia osmótica é simplesmente causada por níveis excessivos de solutos
osmoticamente ativos, mal absorvidos, dentro do lúmen.
 Existem 2 características clínicas importantes da diarréia osmótica:
1. A diarréia pára quando o paciente jejua, pois ele não está mais ingerindo os agentes osmóticos pouco absorvíveis
ou os nutrientes que ele absorve mal.
2. A análise das fezes revela uma lacuna osmótica aumentada devido à presença nas fezes de agentes osmoticamente
ativos e/ou não absorvíveis.

Motilidade intestinal anormal


 A motilidade GI alterada pode causar diarréia por meio de 2 mecanismos:
1. Motilidade aumentada, resultando em trânsito intestinal rápido e tempo de contato diminuído entre os conteúdos
luminais e as células epiteliais absortivas. O tempo de trânsito diminuído e as contrações propulsivas intensificadas
contribuem para as diarréias pós-vagotomia, pós-gastrotectomia, por carcinóide, pelo hipertireoidismo e pelas
diarréias diabéticas.
2. Motilidade diminuída, causada por doenças como a esclerodermia ou o diabetes; estas doenças promovem estase
no intestino delgado, que pode resultar em crescimento excessivo de bactérias, na sua maior parte anaetóbicas,
que desconjugam os ácidos biliares, causando esteatorréia e diarréia.

Diarréia exsudativa
 Condições inflamatórias ou infecciosas que resultam em danos à mucosa intestinal podem causar diarréia por numerosos
mecanismos.
 O sangue, o muco e as proteínas séricas são perdidos em uma quantidade que depende, em grande parte, do grau da lesão.
No entanto, o dano mucoso e a inflamação associada podem interferir com a absorção, induzir secreção e afetar a
motilidade, todas contribuindo para a diarréia.

AVALIAÇÃO CLÍNICA
 Por ser uma condição extremamente comum, torna-se necessário racionalizar a avaliação de um paciente com DA, a fim de
evitar procedimentos onerosos e dispensáveis.
 A avaliação clínica baseada na anamnese e exame físico vai orientar a condução do caso.
OBS.: A DA geralmente é uma condição de baixa morbimortalidade, em que a maioria dos pacientes acometidos não
chega a procurar assistência médica. É importante reconhecer os fatores que estão associados a casos mais graves com
pior prognóstico para que a esses seja dedicada uma atenção especial.
 Um dos principais fatores de mau prognóstico na DA é a idade avançada. O fenômeno de imunossenescência (declínio
global na função imune decorrente da idade avançada) justifica, em parte, essa maior letalidade, com redução do número e
da função dos linfócitos T-helper, menor produção de IgA secretória pela mucosa do trato digestivo, alteração da flora
intestinal com maior concentração de coliformes e redução do potencial de síntese de anticorpos.
 É importante também, pesquisar a existência de outras condições que levem ao comprometimento da função imune, como
AIDS, uso de corticóides, imunossupressores ou quimioterápicos, deficiência de IgA e outras imunodeficiências congênitas
ou adquiridas. Esses pacientes estão mais suscetíveis a infecções convencionais, assim como a infecções oportunistas.
 A investigação epidemiológica também é essencial para guiar o raciocínio de diagnóstico diferencial. São pontos
importantes a serem investigados:
 Uso prévio de antibióticos ou hospitalização nos últimos 2 meses – pode sugerir diarréia por Clostridium difficile,
que é a principal causa de diarréia em pacientes hospitalizados. São fatores preditivos de positividade na pesquisa
da toxina do C. difficile: início de diarréia após 6 dias de uso de antibióticos, hospitalização maior que 15 dias e uso
de cefalosporina ou clindamicina.
 Orientação sexual – homossexuais masculinos estão sob maior risco de adquirir patógenos entéricos de
transmissão oral-fecal como Shigella, Salmonella e Campylobacter, assim como sob risco de desenvolver proctite
por inoculação direta do gonococo, Herpes e Chlamydia.
 Ingestão de alimentos suspeitos ou existência de outros casos em familiares ou contactantes – surtos de
intoxicação alimentar são muito comuns, e o tipo de alimento ingerido, assim como o período entre a ingestão do
alimento e o desenvolvimento dos sintomas, pode sugerir o agente etiológico.
 Na avaliação sintomatológica são informações importantes: número e volume de evacuações, presença de sangue ou pus
nas fezes, febre, dor abdominal, tenesmo, vômitos.
 Pacientes com fezes sanguinolentas e dor abdominal importante, mas sem febre ou leucócitos fecais, devem ser
investigados para infecção por E. coli êntero-hemorrágica.
 O objetivo principal do exame físico é avaliar o grau de desidratação. A avaliação do turgor e elasticidade da pele é pouco
sensível, com baixa especificidade para a avaliação de desidratação em idosos. Alterações posturais na pressão arterial
(queda de 10 mmHg) e na FC (aumento de 10 bpm) sugerem depleção do volume intravascular. O débito urinário e a razão
uréia/creatinina auxiliam na melhor avaliação do grau de desidratação.
 São também importantes a avaliação da temperatura e o exame abdominal à procura de distensão, dor à palpação e sinais
de irritação peritoneal, principalmente em idosos, quando a colite isquêmica pode se apresentar como diarréia aguda.
AVALIAÇÃO LABORATORIAL
 O objetivo principal consiste em distinguir uma diarréia benigna e autolimitada de uma grave. A avaliação deve ser
cuidadosa, visando 4 tópicos principais: a gravidade da doença, a duração da diarréia, o local onde foi adquirida e o estado
geral e imunológico do hospedeiro. A integração desses dados orienta o diagnóstico e a terapêutica, pois, na maioria da
vezes, a diarréia é autolimitada, não se necessitando aprofundar a propedêutica nem realizar uma terapêutica específica,
além de reposição das perdas hidroeletrolíticas.
 Como a maioria dos casos de DA são autolimitados, devem-se selecionar os pacientes que requerem investigação
laboratorial complementar.
 Critérios de indicação de investigação laboratorial:
 Idosos;
 Imunocomprometidos;
 Desidratação importante;
 Febre;
 Disenteria;
 Dor abdominal intensa, principalmente em pacientes com mais de 50 anos;
 Curso prolongado não-responsivo às medidas conservadoras.

Lâmina direta das fezes para pesquisa de hemácias e leucócitos


 Exame simples, rápido e de baixo custo, cuja positividade sugere colite com perda da integridade da mucosa intestinal.
OBS.: A Associação Americana de Gastroenterologia, em seu consenso sobre DA, considerou a pesquisa de leucócitos
fecais o exame de triagem para indicação de antibioticoterapia empírica em um paciente febril com diarréia.

Lactoferrina fecal
 É um marcador de leucócitos fecais, sendo mais precisa e menos vulnerável a erros de processamento da amostra que a
lâmina direta.
 Estudos têm demonstrado sensibilidade e especificidade de 92% e 79% para o diagnóstico de diarréia inflamatória.

Coprocultura
 O uso indiscriminado de cultura em pacientes com DA não se justifica.
 Em pacientes que desenvolvem diarréia após 3 dias de hospitalização, a positividade da cultura para os germes habituais é
ainda menor, sendo desaconselhada sua realização nesses casos.
 Sua realização deve ser reservada para pacientes com leucócitos fecais ou fezes disentéricas, imunodeprimidos, idosos,
portadores de doença inflamatória intestinal e diarréia persistente. Nesses casos deve ser feita pesquisa de Shigella,
Salmonella, Campylobacter, Aeromonas e Yersinia. Para a coleta do material utilizamos o swab retal, que é inoculado em
meio transparente de Cary-Blair.

Pesquisa de antígenos virais


 Atualmente disponível na rotina para pesquisa de rotavírus e adenovírus.

Pesquisa da toxina do Clostridium difficile


 Indicada na avaliação de pacientes com DA hospitalizados ou que fizeram uso de antibióticos nas últimas 3 semanas.

Parasitológico de fezes
 A maioria das parasitoses causam diarréia persistente ou crônica, mas o achado de trofozoíto de Giárdia lamblia ou
Entamoeba histolytica suporta o diagnóstico de DA de causa parasitária.

Hemograma, ionograma, uréia, creatinina


 Para pacientes muito desidratados, om quadro toxêmico, idosos e com co-morbidades.
Radiografia simples de abdome
 Para pacientes toxemiados, com dor e distensão abdominais, a fim de avaliar a presença de íleo ou megacólon tóxico.

Retossigmoidoscopia ou colonoscopia
 Reservados para diarréias sanguinolentas com mais de 10 dias de duração que não responderam a antibioticoterapia
empírica ou com cultura negativa.
 Outras indicações seriam a suspeita clínica de doença inflamatória intestinal, colite isquêmica ou pseudomemntanosa.
 Nos pacientes com AIDS, prefere-se a colonoscopia porque um grande número de infecções oportunistas e linfomas podem
localizar-se apenas no cólon direito.

TRATAMENTO
 O risco imediato da diarréia aguda é a desidratação e sua correção ou prevenção devem ser medidas terapêuticas iniciais.
 Considerando-se os efeitos negativos que a diarréia pode ter sobre o estado nutricional, a abordagem terapêutica visa,
também, a procurar diminuir esses efeitos, a fim de impedir o início de um processo de desnutrição ou o seu agravamento,
quando este já existir.
 Pilares para o tratamento adequado da gastroenterite aguda:
I. Usar solução de reidratação oral
II. Fazer reidratação rápida, em, no máximo, 3-4 horas
III. Tentar realimentação rápida, com alimento habituais
IV. Não usar fórmulas especiais
V. Não usar formulas diluídas
VI. Manter o uso do leite materno em todas as fases de tratamento
VII. Usar SRO para reposição das perdas adicionais, após a reidratação
VIII. Não usar medicamentos rotineiramente.

 HIDRATAÇÃO
 O objetivo principal no tratamento de qualquer tipo de DA são restaurar as perdas e prevenir a desidratação.
 A hidratação deve ser feita preferencialmente pela VO em pacientes com diarréia leve a moderada e que não estejam com
vômitos incoercíveis.
 Em pacientes com DA de leve intensidade, a reposição hídrica pode ser feita com sucos, água de coco, refrigerantes ou
líquidos isotônicos.
 A terapia de reidratação oral (TRO) é o método padrão para o manejo eficaz e rentável da
gastroenterite aguda.
 A solução de reidratação oral (SRO) é o líquido desenvolvido especificamente para a TRO.
 A TRO consiste em:
o Reidratação — administram-se água e eletrólitos para repor as perdas.
o Terapia líquida de manutenção (acompanhada por uma nutrição apropriada).
 O uso da TRO pode estar contra-indicado em crianças em choque hemodinâmico ou com íleo
abdominal.
 A OMS demonstrou que a utilização de soluções de reidratação oral de menor osmolaridade reduz o débito fecal, a
ocorrência de vômitos e a duração da diarréia, sendo as seguintes concentrações atualmente preconizadas (tabela acima).
 Quando o paciente não tolera a SRO por via oral (vômitos pertinazes), pode usar-se a via nasogástrica para administrar a
SRO. Deve-se escolher o Ringer lactato para hidratação e fazer avaliação de parâmetros bioquímicos como uréia, creatinina
e eletrólitos.
 Pacientes idosos, imunodeprimidos ou com instabilidade clínica devem ser internados.
 A SRO à base de arroz é superior à SRO padrão para adultos e crianças com cólera e pode ser utilizada para tratar os
pacientes onde sua preparação for conveniente.
 A SRO de arroz não é superior à SRO padrão no tratamento de crianças com diarréia aguda não-colérica, especialmente
quando são administrados alimentos pouco depois da reidratação, tal como é recomendado para evitar a desnutrição.

 DIETA
 Não convém interromper a alimentação durante mais de 4horas, porque piora a diarréia e agrava a desidratação; o aporte
nutricional adequado é importante para a renovação dos enterócitos.
 Recomenda-se oferecer alimentos 4 horas após o início da TRO ou dos líquidos intravenosos.
 Administrar:
o Uma dieta apropriada para a idade —independentemente do líquido utilizado para TRO/manutenção;
o Nos lactentes aumentar a freqüência do aleitamento materno ou mamadeira — fórmulas ou diluições especiais não
são necessárias;
o As crianças mais velhas deveriam receber mais líquidos de maneira apropriada;
o Refeições freqüentes e leves distribuídas ao longo do dia (seis refeições /dia) ;
o Alimentos ricos em energia e micronutrientes (grãos, carnes, frutas e verduras);
o Depois do episódio diarréico, e dependendo da tolerância, ir aumentando a ingestão energética.
 Evitar:
o Bebidas contendo cafeína, porque aumentam a quantidade de AMPc e podem causar uma diarréia secretória.
o Leite e derivados, pois agentes virais e bacterianos podem provocar intolerância à lactose transitória.
o Alimentos com alto teor de gorduras podem retardar o esvaziamento gástrico e também devem ser evitados.

 ANTIDIARRÉICOS
 Nenhum destes medicamentosatacaascausassubjacentesda diarréia.
 Na prática, os antidiarréicos não resultam benéficos para as crianças com diarréia aguda/persistente. Os antieméticos são
geralmente desnecessários no manejo da diarréia aguda.
 Antimotilidade:
 A loperamida é o agente de escolha para os adultos (4–6 mg/dia; 2– 4 mg /dia para as crianças > 8 anos).
 Deve ser utilizada principalmente para a diarréia do viajante leve a moderada (sem sinais clínicos de diarréia invasora).
 Age retardando o fluxo intraluminal de líquidos, facilitando a absorção intestinal.
 Geralmente reduz o número de evacuações em até 80%.
 Contra indicações:
o Na diarréia sanguinolenta ou naquela suspeita de apresentar componente inflamatório (pacientes febris), como em
pacientes com shigelose, pois aumenta o tempo de febre. (Presença de dor abdominal intensa sugere também diarréia
inflamatória)
o Em pacientes com colite pseudomembranosa, pois induz megacólon e aumenta o risco de síndrome hemolítico-urêmica
em crianças infectadas com E. coli produtora de Shiga-toxina.
o Crianças menores de 2 anos.

 Agentes anti-secretores:
 O subsalicilato de bismuto pode diminuir a produção de fezes em crianças bem como os sintomas de diarréia, náuseas, e
dor abdominal na diarréia do viajante.
 O racecadotril é um inibidor da encefalinase intestinal com atividade anti-secretora. Tem resultado eficaz na diarréia
infantil, mas não em adultos com cólera. Reduz duração da diarréia e dor abdominal, com menor perda líquida e menos
indução de constipação.

 Antimicrobianos
 A terapia antimicrobiana não é geralmente indicada em crianças.
 Os antimicrobianos são confiáveis só na diarréia infantil sanguinolenta (quando o agente mais provável for a shigella),
suspeita de cólera com desidratação severa, e infecções não-intestinais graves (exemplo, pneumonia).
 Em adultos, o beneficio clínico deve ser contrabalançado com vários fatores: custo, risco de reações adversas, erradicação
nociva da flora intestinal normal, indução de produção de toxina Shiga e aumento da resistência antimicrobiana.
 Os antimicrobianos são considerados os medicamentos de escolha para tratamento empírico da diarréia do viajante e da
diarréia secretora adquirida na comunidade quando o patógeno é conhecido.
 Considerações sobre o tratamento antimicrobiano:
o Considerar tratamento antimicrobiano para:
o Infecções persistentes por Shigella, Salmonella, Campylobacter, ou produzidas por parasitas.
o Infecção nos pacientes idosos, imunocomprometidos, e pacientes com resistência diminuída, sepse, ou portadores
de prótese.
o Na diarréia do viajante moderada/severa ou diarréia febril e/ou com fezes sanguinolentas — quinolonas
(cotrimoxazol segunda opção).
 A nitazoxanida é um antiprotozoário que pode resultar apropriado para Cryptosporidium e outras infecções, incluindo as
provocadas por certas bactérias.
 A rifaximina é um agente antimicrobiano de amplo espectro que não se absorve e que pode ser de utilidade.

 O Campylobacter resistente à quinolona está presente em várias zonas do Sudeste Asiático (por exemplo, na Tailândia),
sendo então a azitromicina o tratamento apropriado.
 A escolha do antimicrobiano deve estar baseada nos padrões de sensibilidade das cepas de Vibrio cholerae O1 ou O139 ou
de Shigella recentemente isoladas na região.
 Recomenda-se utilizar antimicrobianos nos pacientes maiores de 2 anos com desidratação severa e naqueles suspeitos de
cólera.
 Os antimicrobianos alternativos para o tratamento do cólera em criançassão TMP-SMX (5 mg/kg TMP + 25 mg/kg SMX, 2
vezes ao dia durante 3das), furazolidona (1.25 mg/kg, 4 vezes ao dia durante 3 dias), e norfloxacina. A escolha final de um
antimicrobiano dependerá do padrão conhecido de resistência/sensibilidade de V. cholerae na região, que exige a
disponibilidade de um sistema de vigilância bem estabelecido e confiável.
 Para adultos com diarréia aguda do viajante há boa evidência que a administração de um ciclo ultracurto (uma ou duas
doses) de ciprofloxacina ou outra fluoroquinolona reduz a gravidade e encurta a duração da diarréia. Esta área ainda é
controvertida; o uso deve estar limitado a indivíduos de alto risco ou aqueles que precisam manter-se em forma durante
visitas curtas a áreas de alto risco.

 Terapia de zinco suplementar, multivitaminas e minerais


 Para todas as crianças com diarréia: 20 mg de zinco durante 14 dias.
 A deficiência de zinco é muito comum entre as crianças nos países em desenvolvimento.
 A suplementação de micronutrientes — tratamento suplementar com zinco (20 mg por dia até cessar a diarréia) reduz a
duração e gravidade dos episódios de diarréia infantil nos países em desenvolvimento.
 A suplementação com sulfato de zinco (2 mg por dia durante 10–14 dias) reduz a incidência de diarréia durante 2–3 meses.
Ajuda a reduzir as taxas de mortalidade infantil das crianças com doença diarréica persistente. A OMS recomenda
suplementação com sulfato de zinco às crianças com diarréia persistente.
 Todas as crianças com diarréia persistente deveriam receber suplementos multivitamínicos e suplementos minerais todos
os dias durante 2 semanas. As preparações comerciais disponíveis no mercado são freqüentemente convenientes; os
comprimidos que podem ser esmagados e administrados com alimentos são mais baratos. Elas devem fornecer a gama de
vitaminas e minerais mais ampla possível, incluindo pelo menos duas doses diárias recomendadas de folato, vitamina A,
zinco, magnésio e cobre (OMS2005).

DESIDRATAÇÃO:
Ocorre quando a perda de água e eletrólitos.
Na criança por sua maior hidrolabilidade, este processo é mais freqüente.

A desidratação ainda pode ser classificada de acordo com a osmolaridade que se correlaciona com os valores das
concentrações de sódio sérico.
PLANOS DE HIDRATAÇÃO

PLANO A
 Indicado para crianças com perdas hidroeletrolítcas, porém sem sinais de desidratação evidentes.
 Consiste no aumento da oferta de líquidos associados à manutenção da alimentação, com correção de eventuais erros
dietéticos e respeito à aceitação e tolerância.

PLANO B
Fase de reparação
 As crianças com desidratação leve a moderada devem receber a solução de reidratação oral.
 Na fase de reparação do déficit, a SRO deve ser oferecida em pequenos volumes, frequentemente, conforme a aceitação da
criança, até o desaparecimento dos sinais de desidratação da criança e presença de diurese abundante, o que
habitualmente, acontece num período de quatro a seis horas.
 Durante essa fase, se a criança estiver tolerando, deve ser mantido o aleitamento materno.
 A observação clínica determinará a necessidade de prolongamento da reidratação ou de mudança da conduta terapêutica.

Fase de manutenção
 Terminada a fase de reparação, que se identifica pela ausência de sinais de desidratação e pela presença de diurese franca,
passa-se à fase de manutenção.
 Recomenda-se o uso de líquidos de acordo com a aceitação da criança e a administração da SRO após cada episódio de
vômito ou de evacuação líquida.
 A alimentação habitual deve ser oferecida depois que a criança estiver hidratada, respeitando-se sua aceitação e tolerância.
 A terapia de reidratação oral apresenta limitações. Os vômitos costumam representar impedimento e tendem a regredir
com a reidratação.
 Algumas vezes pode ser necessário a redução do volume ingerido por vez ou a adm da SRO por infusão continua, através de
sonda nasogástrica, em volumes de até 30ml/kg/hora.
 Vômitos de difícil controle – mais de quatro em uma hora – íleo paralítico, choque, doenças graves associadas – meningite e
septicemia -, alterações do sensório e perdas fecais abundantes – mais de 15 ml/kg/hora – são indicações para a hidratação
venosa e a suspensão da terapia de reidratação oral.

PLANO C
 Nos casos graves de desidratação ou nos casos em que a TRO é inviável ou ineficaz, é necessária a infusão venosa rápida de
solução hidroeletrolítica, visando-se a restabelecer as condições circulatórias e a função renal.

Fase de reparação
 Crianças graves com torpor ou em coma, pulso débil e enchimento capilar muito lento devem receber soluções cristalóides
– soro fisiológico ou Ringer Lactato – por via endovenosa em bolus – até p restabelecimento das condições circulatórias.
 Passada a fase de maior risco, inicia-se a administração endovenosa de uma solução de soro fisiológico e soro glicosado
isotônico em partes iguais, num volume de 50 ml/kg em uma hora.
 O mesmo esquema deve ser repetido em uma ou duas horas, se necessário, até o desaparecimento dos sinais de
desidratação e a presença de diurese franca – urina clara por duas a três vezes.

Fase de manutenção
 Nesta fase, deve-se utilizar a via oral como descrito para a fase de manutenção do Plano B.
 Quando for necessária a manutenção da via parenteral, recomenda-se a infusão da solução de manutenção.
 O volume calculado para 24 horas deve ser dividido em partes iguais para administração a cada seis ou oito horas.
 Havendo necessidade, conforme a avaliação clínica, os volumes infundidos devem ser alterados.

VÔMITOS

 Ao lado da febre, tosse, inapetência e da diarréia, o vômito constitui um dos mais freqüentes e importantes motivos de
consulta na prática pediátrica.
 Embora as náuseas e os vômitos possam ocorrer isoladamente, estão em geral tão intimamente associados que se
presume serem mediados pela mesma via neural e, desta maneira podem ser estudados em conjunto.
 A náusea é uma sensação desagradável, referida no epigástrio ou na garganta, de um desejo iminente de vomitar.
Freqüentemente precede ou acompanha o vômito.
 A ânsia de vômito é caracterizada pelos mesmos eventos que acontecem durante o vômito sem, entretanto, ocorrer a
eliminação de conteúdo gástrico.
 O vômito é a expulsão violenta e forçada de conteúdo gástrico pela boca, acompanhada de contração do diafragma e
musculatura abdominal, com relaxamento da cárdia e contração do piloro. Deve ser diferenciado de regurgitação,
eructação, ruminação e da vômica.
 A regurgitação é a volta de alimentos ou secreções do esôfago, estomago ou mesmo do duodeno à cavidade oral.
Difere do vômito porque não é precedida de náusea e não tem participação tão ativa das musculaturas abdominal e
diafragmática.
 A eructação é a devolução retrógrada do conteúdo gasoso do estômago de maneira ruidosa.
 A ruminação ou mericismo é a volta à boca de alimentos deglutidos e, em sua forma completa, não só inclui a
regurgitação, como também a remastigação e nova deglutição dos alimentos. É um fenômeno passivo, não seguido de
náusea.
 A vômica é a eliminação pela boca de material purulento proveniente do pulmão.
 O vômito nem sempre tem significado clínico importante. Existem pessoas que, ao menor estimulo emocional ou
sensorial desagradável, referem náuseas ou mesmo vômitos.

 Mecanismo do vômito
 Os mecanismos que provocam as náuseas e os vômitos são complexos, envolvem um grande numero de estruturas e
são controlados por dois centros bulbares funcionalmente distintos – o centro do vômito e a zona quimiorreceptora de
gatilho.
 O centro do vômito
 Localizado na porção dorsal da formação reticular lateral, responde a estímulos aferentes provenientes do sistema
nervoso central, a estímulos periféricos, assim como da zona quimiorreceptora de gatilho.
 Zona quimiorreceptora de gatilho
 É incapaz por si mesma de desencadear o ato vômito, mas daí partem impulsos eferentes para o centro do vômito que,
então, integram e iniciam o processo do vômito.
 Vários estímulos podem ser responsáveis pela sua ativação, como a apomorfina, opiáceos, levodopa, digitálicos,
toxinas bacterianas, radiação e distúrbios metabólicos.
 As vias eferentes de importância no vômito são os nervos frênicos, os nervos espinhais e o nervo vago.
 O ato de vomitar é complexo, envolvendo várias estruturas, e os sintomas, na maioria das vezes, seguem uma
cronologia que se inicia por anorexia mais ou menos intensa.
 Imediatamente antes do vômito, ocorre uma seqüência de eventos que pode ser assim resumida:
 Contração retrograda do duodeno, com regurgitação do conteúdo duodenal para o estômago.
 Contração espasmódica do piloro e dos músculos abdominais, provocando a suspensão da respiração e
forçando o conteúdo gástrico contra o diafragma contraído.
 Relaxamento do esfíncter inferior do esôfago, com projeção do conteúdo gástrico para o esôfago.
 Fechamento da glote, protegendo as vias aéreas. Elevação do palato mole fechando a via nasal e direcionando
o conteúdo para ser eliminado pela boca.
 Como o centro do vomito está próximo anatomicamente de outros centros medulares, o vomito pode vir
acompanhado de outros sintomas de estimulação autonômica, como bradicardia, salivação, sudorese, palidez,
hipotensão, etc.

 Classificação
 Não existe uma classificação ideal para náuseas ou vômitos. Didaticamente podem ser divididos em agudos e crônicos,
orgânicos e funcionais, centrais e periféricos.
 Os vômitos centrais, em geral, não são precedidos por náuseas, sendo referido como jato ou projétil. Em geral, são
secundários a processos expansivos intracranianos ou processos inflamatórios das meninges ou encéfalo.
 Já os vômitos periféricos são precedidos e acompanhados de sintomas de estimulação autônoma.

 Causas
 Infecções diversas
 Infecções que ocorrem no aparelho digestivo, tanto viróticas como bacterianas ou parasitárias, assim como infecções
fora do aparelho digestivo, tanto sistêmicas como localizadas, podem provocar náuseas e vômitos.
 O mecanismo agiria pela estimulação da zona quimiorreceptora de gatilho, pelas toxinas ou metabólitos anormais.

 Distúrbios gastrointestinais
 Doenças orgânicas e funcionais freqüentemente provocam náuseas e vômitos.
 O vomito da obstrução pilórica, geralmente ocorre algumas horas após a alimentação e é constituído de restos
alimentares. O volume do vomito depende da quantidade do volume retido, que por sua vez, depende do grau da
obstrução. Outra característica da obstrução pilórica é a ausência de bile no vomito.
 Na obstrução intestinal alta ele é mais precoce e vem acompanhado de dor abdominal, desidratação e freqüentemente
de odor fétido, devido a estagnação e degradação do conteúdo intestinal pelas bactérias.
 Doenças esofágicas, como obstrução, acalasia e divertículo de Zenker, podem também se manifestarem por vômitos
alimentares não digeridos.
 Já na obstrução intestinal baixa, ele é mais tardio, predominando a distensão abdominal.
 Nos casos de bulimia os vômitos costumam ocorrer durante ou logo após as refeições.
 Pancreatites, colecistites e apendicites podem provocar vômitos por estimulo originado no peritônio, ativam as vias
neurais aferentes.
 Os distúrbios funcionais de motilidade são causas freqüentes de náuseas e vômitos, como na gastroparesia pós-
vagotomia, diabética ou idiopática.

 Diagnóstico
 O sistema de classificação de Roma II estabelece os seguintes critérios para o diagnóstico de Vomito funcional:
 Pacientes com os seguintes sintomas durante pelo menos 12 semanas (não necessariamente consecutivas) nos últimos
12 meses:
 Vômitos freqüentes (pelo menos 3 vezes por semana).
 Ausência de outros distúrbios alimentares, de ruminação e de doença psiquiátrica.
 Ausência de vômitos auto induzidos ou provocados por medicamentos.
 Ausência de alteração orgânica no tubo digestivo ou no sistema nervoso central ou de distúrbios metabólicos
que pudessem justificar o vomito. A dor abdominal que precede o vomito em geral indica lesão orgânica.

 Exame físico
 Um exame completo deve ser sempre realizado, não só para avaliar possíveis complicações, como pode ser a chave do
diagnóstico.
 Sinais de desidratação, perda de peso e desnutrição devem ser sempre pesquisados.
 A avaliação da cavidade oral pode evidenciar erosões dentárias, sugestivas de bulimia ou doenças do refluxo
gastroesofágico.
 Um exame detalhado da cavidade abdominal deve ser feito à procura de distensão abdominal , movimentos
peristálticos, massas, viscero megalias e etc.

 Exames Complementares
 Sangue: hemograma, VHS, uréia, creatinina, glicose e eletrólitos, provas de função hepática e tireoidiana; nas
mulheres férteis exame de gravidez.
 Urina: rotina e cultura.
 Fezes: parasitológico com pesquisa de sangue oculto.
 RX simples do abdome, estudo contrastado do esôfago, estomago, duodeno, intestinos delgado e grosso – podem
sugerir obstrução orgânica, pseudo obstrução intestinal crônica idiopática, lesões ulceradas ou elevadas das mucosas,
neoplasias benignas ou malignas, compressões extrínsecas.
 US e TC podem fornecer informações no caso de doenças hepatobiliares, pancreáticas, da vesícula biliar e intestinais.
A TC possui alta sensibilidade (93%), especificidade (100%) e acerácia (94%).
 Ressonância magnética: exame importante nas doenças do SNC e especialmente nas patologias da fossa posterior.

 Tratamento
 O vomito deve ser sempre encarado como um sintoma, procurando-se entender sua fisiopatologia, diversidade de
causas e complicações.
 A conduta inicial é a suspensão da dieta por um período breve – 3 a 6 horas - , de acordo com a intensidade dos
vômitos, oferecendo-se líquidos para manter uma hidratação adequada: inicialmente 10 a 15 ml de uma solução
glicossalina ou solução hidratante preconizada pelo MS a cada 15 minutos e, a seguir, se houver boa tolerância iniciar
a dieta, smepre começando com pequenos volumes – 30 a 50 ml oferecidos a cada duas ou três horas.
 A terapêutica medicamentosa raramente está indicada no controle de episódios agudos de vômitos, devido a seus
efeitos colaterais e pela possibilidade de mascarar a causa básica, atrasando o tratamento definitivo.
 Situações de intolerância a hidratação oral e em que existem dificuldades para a hidratação venosa ou se a criança
ainda não se apresenta em um estado muito comprometido, pode-se optar pelo emprego de antimiméticos por via
parenteral ou retal quando possível.

 Antimiméticos
 O medico deve obter uma história meticulosa ao abordar um paciente com queixa de náusea e vomito r ter em mente
que a expulsão do conteúdo gástrico pode ser um ato de defesa do organismo, não necessitando, em grande numero
de ocasiões, de complicadas e desgastantes propedêuticas.
 Devemos lembrar que os vômitos, dependendo da sua duração e intensidade, podem levar a complicações
importantes, como desnutrição, distúrbios metabólicos hidroeletrolíticos, aspiração pulmonar, rotura do esôfago e
hemorragia digestiva.

 Antagonistas dos receptores 5-HT3


 É um grupo de drogas que tem ação promissora nos vômitos induzidos por quimioterapia.
 São eles o ondansetron, granísetron e o dolasetron.

 Fenotiazidas
 Atuam antagonizando principalmente os receptores dopaminérgicos na área postrema, mas também bloqueando os
efeitos musacarínicos e histamínicos.
 Os efeitos colaterais como hipotensão e as manifestações de hipersensibilidade (icterícia colestática e efeitos
dopaminérgicos) são limitadores importantes do seu uso.

 Butirofenonas
 Tem ação e efeitos adversos semelhantes aos das fenotiazidas.
 O haloperidol tem sido reservado para pacientes terminais com náuseas induzidas por medicamentos ou uremia.

 Benzamidas – metoclopramida e domperidona


 São antagonistas dos receptores da dopamina com ação predominante na zona quimiorreceptora de gatilho e com
ação procinética no tubo digestivo.
 Em doses habituais não tem efeito nas náuseas e vômitos induzidos pela quimioterapia; para que sejam eficazes
devem-se usar doses elevados o que aumenta o risco de efeitos colaterais.

 Corticóides
 A dexametasona tem sido usada nas náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia, isoladamente ou associada à
metoclopramida ou aos agonistas dos receptores 5-HT3, provavelmente pela redução na formação de
prostaglandinas.

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