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Distúrbios

Eletrolíticos
e Alterações
medicamentosas
SUMÁRIO
1. Revisão........................................................................................................................... 3

2. Introdução...................................................................................................................... 4

3. Distúrbios do potássio................................................................................................. 5
3.1. Hipocalemia............................................................................................................ 5
3.2. Hipercalemia.......................................................................................................... 7

4. Distúrbios do cálcio.................................................................................................... 12
4.1. Hipercalcemia...................................................................................................... 12
4.2. Hipocalcemia........................................................................................................ 14

5. Alterações medicamentosas..................................................................................... 17
5.1. Digitálicos............................................................................................................. 17

Referências bibliográficas.............................................................................................. 21

Bibliografia consultada................................................................................................... 22
1. REVISÃO

Inicialmente para entendermos os distúrbios eletrolíticos do eletrocardiograma (ECG),


precisamos revisar alguns pontos. Neste contexto, o potencial de ação ele possui 5
fases, sendo elas: fase 4, fase 0, fase 1, fase 2 e fase 3. Além disso, precisamos lem-
brar que os principais eletrólitos envolvidos na despolarização são o sódio, potássio e
cálcio, sendo que os 2 últimos pela maior permeabilidade da membrana, os distúrbios
que acontecerem nestes geram maiores repercussões no ECG.

Se liga!  A fase 4 do potencial de ação corresponde ao repouso, no


qual a membrana plasmática da célula muscular cardíaca é muito mais permeável
do potássio, pois há mais canais deste eletrolítico abertos. A fase 0 corresponde
a despolarização rápida, onde com a chegada do estímulo elétrico desencadeia
o potencial de ação e os canais de sódio são ativados, resultando em influxo de
sódio. A fase 1 do potencial de ação corresponde a repolarização parcial rápida,
sendo causada pela abertura de um tipo de canal de potássio, de modo que este
inativa-se rapidamente, sem causar grandes alterações no potencial da membrana.
Por sua vez, a fase 2 corresponde ao platô, caracterizada por uma estabilização
do potencial de membrana. Por fim, a fase 3 corresponde a repolarização rápida,
onde ocorre o término do potencial de ação, o qual depende da abertura dos ca-
nais de potássio.

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Legenda:
Fase 1
Fase 2 • Fase 0 – Despolarização;
• Fase 1 – Repolarização inicial;
• Fase 2 – Platô;
• Fase 3 – Repolarização rápida;
• Fase 4 – Repouso.

Fase 0 Fase 3

Fase 4

Complexo QRS Segmento ST Onda T Onda U

Figura 1. Potencial de ação cardíaca.


Fonte: asia11m/shutterstock.com1.

2. INTRODUÇÃO

Os eletrólitos plasmáticos são mantidos no organismo dentro de uma faixa estreita


de variação. Quando há um desequilíbrio entre concentração sérica e intracelular desses
íons, podem ocorrer modificações no sistema de condução ardíaco traduzidos no ECG.
Essa correlação se torna mais evidente quanto maior for esse desequilíbrio, podendo
variar desde alterações eletrocardiográficas discretas até padrões característicos de
cada distúrbio.

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3. DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO

O potássio representa o principal cátion intracelular, com uma concentração muito


superior à encontrada no plasma. Essa diferença entre a concentração intra e extra-
celular, isto é, o gradiente de potássio transmembrana, é importante para que ocorra
a despolarização da célula e consequentemente contração do músculo cardíaco. Seu
valor sérico normal varia entre 3,5 mEq/L e 5,0 mEq/L, considerado aumento crítico
quando superior a 6,5 mEq/L.
Importante lembrar-se da homeostase renal do potássio. Nesse sentido, o potássio
é livremente filtrado pelo glomérulo e praticamente todo potássio dessa filtração é
reabsorvido pelo túbulo proximal e pela alça de Henle, independentemente da ingesta.
Logo, a excreção urinária de potássio representa 95% da retirada de potássio ingerido,
sendo 5% restantes pelo intestino grosso, que pode ser maior em pacientes com insu-
ficiência renal crônica.
Esses distúrbios ocorrem com maior frequência em pacientes com insuficiência
renal aguda, podendo levar a arritmias ventriculares complexas ou, até mesmo, parada
cardíaca.

3.1. Hipocalemia
A hipocalemia ou hipopotassemia é definida como valor sérico de potássio abaixo de
3,5 mEq/L, tendo como etiologia principal aumento da excreção renal desse íon, devido
ao uso de diuréticos, além da perda gastrointestinal por meio de vômitos e diarreia.
Essa alteração sérica geralmente é associada à hipomagnesemia.
Geralmente a hipocalemia é sintomática somente com o nível de potássio < 3 mE-
q/L. Como são sintomas inespecíficos, é difícil pensar neste distúrbio como causa de
sinais e sintomas. Estes, por sua vez, estão relacionados com a crescente resistência
de repolarização, ou seja, a hiperpolarização celular, devido à redução da concentração
de potássio no espaço extracelular. Portanto, o conjunto de achados está geralmente
ligado a alterações de função neuromuscular, sendo elas:

• Distúrbios acidobásicos: acidose ou alcalose metabólica;


• Poliúria;
• Fraqueza;
• Cãibras;
• Paresia;
• Rabdomiólise em hipocalemias severas;
• Constipação;

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• Falência respiratória;
• Resistência insulínica;
• Alterações eletrocardiográficas.
Nesse contexto, as principais alterações eletrocardiográficas são:

• Presença de onda U patológica, de amplitude aumentada;


• Diminuição da amplitude da onda T, até inversão desta nos casos mais graves.
• Essa alteração ocorre devido a um alargamento da fase 3, gerando uma onda
T mais achatada.

• Infradesnivelamento do segmento ST em alguns casos mais graves;


• Apiculamento da onda P e aumento da duração do complexo QRS → Em casos
mais graves, não sendo tão frequentes;

• Torsades de Pointes ou torção das pontas, a qual corresponde a uma arritmia


complexa → não muito frequente.

FLUXOGRAMA 1. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS DA HIPOCALEMIA.

Alterações
eletrocardiográficas
da hipocalemia

Onda U patológica, Diminuição da amplitude Infradesnivelamento


de amplitude da onda T, ou inversão do segmento ST em
aumentada em casos mais graves casos mais graves

Apiculamento da onda P
Torsades de Pointes ou
e aumento da duração do
torção das pontas
complexo QRS (menos
(arritmia complexa)
frequente em casos graves)

Fonte: Elaborado pelo autor.

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Hipocalemia

Onda T Onda U

Hipocalemia
Onda U de amplitude aumentada

Figura 2. Hipocalemia em ECG: Onda U de amplitude aumentada.


Fonte: asia11m/Shutterstock.com2.

O tratamento da hipocalemia tem 4 alvos:

• Avaliação do risco da hipocalemia;


• Reposição do estoque de potássio;
• Redução da perda de potássio;
• Determinação das possíveis causas e suas correções.
De maneira geral, a correção da hipocalemia é feita via oral, durante as refeições
com generosa oferta de líquidos. A suplementação oral de potássio é geralmente feita
com KCl.

3.2. Hipercalemia
A hipercalemia é definida como potássio sérico maior que 5 mEq/L, sendo importante
lembrar que há uma distribuição assimétrica no líquido intracelular (98%) e extracelular
(2%), devido a presença do transporte ativo da bomba de sódio e potássio.

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Os principais mecanismos envolvidos na hipercalemia são:

• Diminuição da excreção urinária:


• Doença renal crônica (DRC);
• Lesão renal aguda: principalmente quando ocorre oligúria, pois há menor
filtração glomerular e, devido à lesão das células tubulares, menor secreção
tubular do íon;
• Hipoaldosteronismo ou resistência à ação da aldosterona: a aldosterona age
na célula tubular estimulando a bomba de sódio e potássio e aumentando a
quantidade de canais epiteliais de sódio. A deficiência deste hormônio resulta
em menor excreção urinária de potássio.

• Desvio do potássio do líquido intracelular (LIC) para o extracelular (LEC):


• Acidose metabólica;
• Deficiência de insulina: a insulina é um estimulante da bomba de sódio e po-
tássio, por isso sua deficiência dificulta a entrada de potássio no LIC;
• Hiperosmolaridade: o potássio é arrastado junto com a água do LIC para o LEC,
como na hiperglicemia ou uso de contraste iodado;
• Bloqueio dos receptores beta-2-adrenérgicos: as catecolaminas estimulam a
bomba de sódio e potássio. Portanto, o uso de betabloqueadores não seletivos
pode contribuir para aumento sérico de potássio;
• Destruição celular maciça: ocorre hipercalemia súbita por liberação e uma alta
carga de potássio que estava no LIC. Por exemplo: rabdomiólise, síndrome de
lise tumoral, hemólise maciça, hipotermia grave e grande queimado.

Quase sempre é possível encontrar as causas da hipercalemia a partir da história


clínica, exame físico e exames complementares (ureia, creatinina, hemograma, gaso-
metria arterial ou venosa, glicemia e sumário de urina). Além disso, quando há aumento
dos níveis séricos de potássio, ou seja, hipercalemia ou hiperpotassemia, encontramos
algumas alterações no ECG, sendo elas:

• Onda T apiculada, com baixa estreita em formato de tenda → alteração mais


precoce no ECG e corresponde a níveis séricos de potássio maior que 5,5 mEq/L.
• Essa alteração ocorre por um encurtamento da fase 3 do potencial de ação,
de modo que o potássio está mais elevado, deixando o potencial de repouso
menos negativo, mais próximo do 0.
• Alargamento do complexo QRS, podendo a onda S se fundir com a onda T, con-
ferindo ao ST um formato sinusoidal → corresponde a níveis séricos de potássio
maior que 6,5 mEq/L.
• Essa alteração ocorre devido uma menor velocidade ascensão da fase 0, ou
seja, despolarização ventricular mais lenta.

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Se liga!  Lembre-se que o complexo QRS corresponde a despolari-
zação ventricular e varia 80-110 ms, ou seja, maior que 2 quadradinhos e menor
que 3 quadradinhos.

• Redução do intervalo QT;

Se liga!  Lembre-se que o intervalo QT corresponde ao início da


despolarização ventricular até o final da repolarização ventricular, de modo que
seu valor é variável, uma vez que é alterada de acordo com a idade e sexo. Desse
modo, utilizamos fórmulas de QT corrigido por meio de aplicativos de celulares.

• Ausência de onda P ou diminuição da amplitude da onda P.


• Associado a essa alteração podemos encontrar um alargamento do intervalo PR,
o que nos faz lembrar-se de um bloqueio atrioventricular (BAV) ou até mesmo
levar a uma bradicardia extrema.
• Elevação do segmento ST.
• Essa alteração pode nos confundir com situações de isquemia.
• Assistolia e fibrilação ventricular.
Importante salientar que as alterações eletrocardiográficas permitem que façamos
correlações com os níveis séricos de potássio, de modo que é de extrema importância
realizar eletrocardiogramas seriados e dosar os níveis de potássio do paciente.

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FLUXOGRAMA 2. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS DA HIPERCALEMIA.

Alterações
eletrocardiográficas
da hipercalemia

Onda T apiculada, Assistolia


Redução do Elevação do
com base estreita em e fibrilação
intervalo QT segmento ST
formato de tenda ventricular

Alargamento do complexo QRS,


Ausência de onda
podendo a onda S se fundir com
P ou diminuição da
a onda T, conferindo ao ST um
amplitude da onda P
formato sinusoidal

Fonte: Elaborado pelo autor.

Figura 3. Hipercalemia em ECG: Onda T apiculada.


Fonte: asia11m/Shutterstock.com3.

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NORMAL

HIPOCALEMIA

HIPERCALEMIA

Figura 4. Mudanças no ECG em hipocalemia e hipercalemia.


Fonte: Simple Deigns/Shutterstock.com4.

Acerca do tratamento da hipercalemia o primeiro passo é definir a gravidade da hiper-


calemia, além de fazer um manejo emergencial, com estabilização do cardiomiócitos,
desvio de potássio do LEC para o LIC e remoção corporal de potássio.

• A estabilização dos cardiomiócitos: é feita com gluconato de cálcio a 10%: 10


mL por via intravenosa em 2-3 minutos e repetir após 30 minutos se persistirem
alguma alteração no ECG;
• Desvio de potássio do LEC para o LIC: possui efeito transitório, porém são utili-
zadas de caráter emergencial enquanto as medidas de remoção corporal do íon
comecem a fazer efeito.
• Uso de uma solução polarizante: 10 a 20 UI de insulina regular e 25 a 50 g de
glicose por via intravenosa em bomba de infusão contínua infundida em menos
de 60 minutos;
• Uso de beta-adrenérgicos: Fenoterol 10 mg em 4 mL de NaCl 0,9% para neubi-
lização em 10 minutos;
• Bicarbonato de sódio.
• Remoção corporal de potássio:
• Uso de diuréticos de alça e/ou soro fisiológico a 0,9%;
• Resinas de troca: Poliestirenossulfonato de cálcio 30 g diluído em 100 mL de
Manitol a 20% por via oral/enteral;
• Diálise.

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4. DISTÚRBIOS DO CÁLCIO

Este eletrólito encontra-se na corrente sanguínea de duas formas: uma parte ligada
às proteínas plasmáticas, principalmente a albumina e a outra em sua forma livre. Esta
última, conhecida como cálcio iônico, não sofre influência em sua concentração quando
há variações do nível sérico de proteínas e por isso é preferível.
Importante lembrar que a homeostase do cálcio é fundamental para manter o fun-
cionamento adequado das atividades intracelulares. Por esse motivo, as concentrações
séricas do cálcio devem manter-se em uma faixa estreita de controle, dentro da qual
os diversos processos bioquímicos podem ser devidamente executados.

4.1. Hipercalcemia
A hipercalcemia corresponde a um valor iônico sérico maior que 1,3 mmol/L em
adultos. O paciente pode se apresentar com constipação, fadiga, depressão, poliúria,
anorexia, fraqueza muscular, déficit de concentração, confusão, torpor e coma.
Eletrofisiologicamente, a hipercalcemia diminui a velocidade de inscrição da fase 2 do
potencial de ação, de modo que promove as seguintes alterações eletrocardiográficas:

• Elevação do segmento ST em precordiais;


• Intervalo QT corrigido (QTc) curto → principal alteração nesta alteração.
• Essa alteração ocorre em um encurtamento da fase 2 do potencial de ação.
• Presença da onda J de Osborn, ou seja, entalhe no complexo de QRS → não é tão
frequente.

Se liga!  A onda J de Osborn é mais frequente em casos de hipotermia


e não de hipercalcemia.

• Intervalo PR alargado;
• Complexo QRS alargado e aumentado;
• Presença de BAV, arritmias e Parada cardiorrespiratória (PCR).

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FLUXOGRAMA 3. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS DA HIPERCALCEMIA.

Alterações
eletrocardiográficas
da hipercalcemia

Elevação do Intervalo QT Complexo QRS


Intervalo PR
segmento ST em corrigido (QTc) alargado e
alargado
precordiais curto aumentado

Presença da Onda J Presença de BAV,


de Osborn, ou seja, arritmias e Parada
entalhe no complexo cardiorrespiratória
de QRS (PCR)

Fonte: Elaborado pelo autor.

Figura 5. Hipercalcemia em ECG: Segmento ST encurtado.


Fonte: asia11m/Shutterstock.com5.

A avaliação inicial de um paciente com hipercalcemia deve incluir história e exame


físico completos. Devem-se pesquisar sinais e sintomas mais comuns à hipercalce-
mia, bem como questionar o paciente sobre e presença de dor óssea, fraturas, cálculo
urinário, dor abdominal, perda de peso e rastrear câncer colorretal.
O próximo passo é a avaliação laboratorial com dosagens séricas de cálcio, fósfo-
ro, paratormônio (PHT) e creatinina. Deve-se também medir a concentração sérica de
25-OH-Vitamina D.

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No que tange ao tratamento da hipercalcemia, tem como metas:

• Baixar o nível sérico de cálcio: através do aumento da excreção urinária, di-


minuição da reabsorção óssea, diminuição da absorção intestinal e quelação
do cálcio.
• Ressuscitação volêmica: depende da gravidade da hipercalcemia, da idade
do paciente e da presença de comorbidades, mas de forma geral, inicia-se
com 1 ou 2 L de solução salina isotônica em bolus e, em seguida, infusão
de 150 a 300 mL/hora, para manter o débito urinário maior que 100 a 150
mL/hora;
• Diuréticos de alça: até recentemente eram utilizados, no entanto, essa
prática não demonstrou ser benéfica, principalmente após a introdução
dos bisfosfonatos e também por levar a anormalidades eletrolíticas, como
hipocalemia e hipomagnesemia;
• Bisfosfonatos: se ligam avidamente à superfície óssea e são internaliza-
dos pelos osteoclastos, promovendo apoptose, diminuição da migração e
a maturação osteoclástica e aumentam a expressão da osteoprotegerina.
Os mais utilizados são: pamidronato e o ácido zoledrônico;
• Calcitonina: geralmente é feito na dose de 4 a 8 U/Kg Intramuscular ou sub-
cutâneo de 12 em 12 horas. Causa inibição da atividade osteoclástica, com
efeito hipocalcemiante bastante rápido, deste modo está indicada para os
pacientes muito sintomáticos;
• Corticoesteroides: são utilizados na hipercalcemia uma vez que aumenta
a absorção do cálcio intestinal, além de inibir a enzima 1-alfa-hidroxilase, a
qual catalisa a conversão da vitamina D para calcitriol.
• Tratar a causa básica.

4.2. Hipocalcemia
Este distúrbio ocorre quando o nível sérico de cálcio iônico se torna inferior a 1,15
mmol/L, sendo causado principalmente por afecções que diminuem a produção do pa-
ratormônio (PTH) por comprometimento da paratireoide, por deficiência ou resistência
da vitamina D, por sequestro de cálcio, entre outras.
O primeiro passo na avaliação de um paciente com suspeita de hipocalcemia é a
confirmação laboratorial dos valores de cálcio sérico.
A hipocalcemia aumenta da permeabilidade da membrana celular ao sódio tornando
os tecidos hiperexcitáveis, responsável por sinais e sintomas como: câimbras, pares-
tesia periférica, laringoespasmos, convulsões e crises de tetania.

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Se liga!  O sinal de Trousseau corresponde a um espamo do carpo
levando a flexão do punho após insuflar o manguito do esfigmomanômetro aci-
ma da pressão arterial sistólica por 3 minutos. Já o sinal de Chvostek representa
a contração do músculo facial, após estimulo do nervo facial próximo à região
auricular ipsilateral ao estimulo.

Além disso, ocorre um aumento da velocidade de inscrição da fase 2 do potencial


de ação, gerando as seguintes alterações eletrocardiográficas:

• Aumento da duração do segmento ST;


• Alargamento do QT, contudo, diferentemente da hipocalemia, a hipocalcemia não
altera onda T e habitualmente não provoca taquicardia ventricular do tipo Torsade
de pointes.

FLUXOGRAMA 4. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS DA HIPOCALCEMIA.

Alterações eletrocardiográficas
da hipocalcemia

Aumento da Alargamento do QT, sem alterar onda T e,


duração do habitualmente, não provoca taquicardia
segmento ST ventricular do tipo torsade de pointes

Fonte: Elaborado pelo autor.

Figura 6. Hipocalcemia em ECG: Prolongamento do segmento ST.


Fonte: asia11m/Shutterstock.com6.

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A decisão terapêutica depende da presença de sintomas de gravidade, como tetania,
convulsões, espasmos ou manifestações cardiovasculares, bem como a velocidade
de instalação do quadro. A sugestão de tratamento, de forma geral, é baseada em
experiência clínica.

• A hipocalcemia sintomática aguda deve ser tratada inicialmente com 10 mL de


gluconato de cálcio a 10% diluídos em 50 mL de soro glicosado a 5% ou soro
fisiológico a 0,9%, infundidos de forma intravenosa, por 10 minutos;
• Em pacientes com hipocalcemia leve e sem sintomas de gravidade: a suplemen-
tação de cálcio oral costuma ser o tratamento inicial de escolha, com doses de
1500 a 2000 mg de cálcio elementar;
• Todos os pacientes devem ter os níveis de magnésio investigados e corrigidos;
• A reposição de cálcio é mantida até que a causa da hipocalcemia seja identificada
e corrigida;
• Em pacientes com hipoparatireoidismo, o uso de calcitriol na dose de 0,25 a 0,5
mcg até 2x/dia e uso de cálcio oral na dose de 1 a 4 g de carbonato de cálcio
podem ser indicados.

DISTÚRBIOS ELETROLÍTICOS

NORMAL
Onda U
proeminente

HIPOCALEMIA
Onda T
apiculada

HIPERCALEMIA

QT prolongado

HIPOCALCEMIA

Segmento ST
encurtado

HIPERCALCEMIA

Figura 7. Diferença dos distúrbios eletrolíticos no ECG.


Fonte: Umi Kaltsum/Shutterstock.com7.

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5. ALTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS

As alterações medicamentosas podem estar presentes com uso de diversos medi-


camentos, a exemplo do uso de antibióticos, antidepressivos, antiemético e sedativos.
Neste contexto, podemos nos deparar com um ECG com intervalo QT aumentado e
diante disso, precisamos revisar as medicações que o paciente faz uso.

5.1. Digitálicos
Os digitálicos são utilizados na cardiologia há muito tempo, de modo que promovem
uma melhora da força de contração, sem reduzir mortalidade.
Logo, suas principais indicações são: pacientes com fração de ejeção menor que
45% com sintomas provocados por esta redução e para controle da frequência cardíaca
em pacientes com fibrilação atrial.
Em contrapartida, o uso exacerbado desta medicação ou até mesmo o uso sem
intoxicação digitálica, pode gerar as seguintes alterações eletrocardiográficas:

• Infradesnivelamento do ponto J e ST;


• Diminuição da amplitude da onda T;
• Diminuição do intervalo QT corrigido.
Essas 3 condições associados remete a famosa alteração de “colher de pedreiro”.
As principais manifestações clínicas da intoxicação digitálica são:

• Náuseas e vômitos;
• Hipoxemia;
• Hipo/anorexia;
• Alterações visuais: escotomas coloridos;
• Vertigem;
• Insônia;
• Confusão mental.
A correção dessa situação é feita através de:

• Descontinuação do uso da digoxina, bem como administração de potássio e


magnésio. Contudo, é preciso manter o efeito inotrópico positivo, então podemos
lançar mão de catecolaminas e dopamina;
• Caso esse primeiro passo não der certo e o sujeito estiver apresentando fibrila-
ções, podem-se utilizar anticonvulsivantes, como a fenitoína;
• Caso a intoxicação e os sintomas não cessem, podemos utilizar uma substância
biológica com ação antígeno-anticorpo, a antidigoxina.

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Por fim, precisamos entender que a digoxina, é um medicamento que pode levar
também a bradiarritmias e taquiarritmias, devido seu mecanismo de ação. Este cor-
responde ao aumento intracelular de cálcio, através da inibição da bomba de sódio e
cálcio e modulação dos canais lentos de cálcio, além do aumento do tônus vagal. Dessa
forma, temos um aumento do automatismo, o que pode induzir a taquiarritmias e por
aumento do tônus vagal pode ocorre indução de bradiarritmias.

Se liga!  A hipomagnesemia, a hipocalemia e a hipercalcemia geram


aumento do risco de intoxicação digitálica.

FLUXOGRAMA 5. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS POR USO DE DIGITÁLICOS.

Alterações
eletrocardiográficas
por uso de digitálicos

Infradesnivelamento Diminuição Diminuição


do ponto da amplitude da do intervalo
J e ST onda T QT corrigido

Fonte: Elaborado pelo autor.

Figura 8. Eletrocardiograma com alterações por uso de digitálicos.


Fonte: Videoaula Sanar.

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MAPA MENTAL 1. DISTÚRBIOS ELETROLÍTICOS E ALTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS.

Distúrbios eletrolíticos

Cálcio

Hipocalcemia (< 1,15 mmol/L) Hipercalcemia (> 1,3 mmol/L

• Aumento da duração do segmento ST; • Elevação do segmento ST em precordiais;


• Alargamento do QT sem alteração da • Intervalo QT corrigido (QTc) curto;
onda T e sem provocar taquicardia
ventricular do tipo torsade de pointes.
• Presença da onda J de Osborn;
• Intervalo PR alargado;
• Complexo QRS alargado e aumentado;
• Presença de BAV, arritmias e parada
cardiorrespiratória (PCR).

Tratamento

• Baixar o nível sérico de cálcio.


• Aumento da excreção urinária;
• Diminuição da reabsorção óssea;
• Diminuição da absorção intestinal;
• Quelação do cálcio.
• Tratar a causa básica.

Potássio

Hipocalemia (< 3 mEq/L) Hipercalemia (> 5 mEq/L)

• Presença de onda U patológica, de • Onda T apiculada, com base estreita em


amplitude aumentada; formato de tenda;
• Diminuição ou inversão da amplitude da • Alargamento do complexo QRS, podendo
onda T; a onda S se fundir com a onda T, conferindo
• Infradesnivelamento do segmento ST em ao ST um formato sinusoidal;
alguns casos mais graves; • Redução do intervalo QT;
• Apiculamento da onda P e aumento da • Ausência de onda P ou diminuição da
duração do complexo QRS; amplitude da onda P;
• Torsades de pointes ou torção das pontas. • Elevação do segmento ST;
• Assistolia e fibrilação ventricular.
Tratamento
Tratamento

• Avaliação do risco da hipocalemia;


• Reposição do estoque de potássio; • Definir gravidade da hipercalemia;
• Redução da perda de potássio; • Estabilização dos cardiomiócitos;
• Determinação das possíveis causas e • Desvio de potássio do LEC para o LIC;
suas correções. • Remoção corporal de potássio.

Distúrbios Eletrolíticos e Alterações medicamentosas   19


Alterações medicamentosas

Intervalo QT aumentado

Antibióticos Antidepressivos Antieméticos Sedativos

Digitálicos

• AInfradesnivelamento do ponto J e ST;


• Diminuição da amplitude da onda T;
• Diminuição do intervalo QT corrigido

Colher de pedreiro

Fonte: Elaborado pelo autor.

Distúrbios Eletrolíticos e Alterações medicamentosas   20


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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