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DOI: https://doi.org/10.25110/akropolis.v29i1.7915
Com base nas informações acima citadas, comportamento humano (MOREIRA; MEDEIROS,
o presente artigo tem como objetivo compreender 2007; ANDERY, 2001).
o conceito de felicidade na visão analítico- A teoria dos três níveis de seleção propõe
comportamental, mais especificamente, na visão que “o comportamento humano precisa ser
da Terapia de Aceitação e Compromisso. Para explicado considerando a interação de variáveis
tanto os objetivos específicos deste estudo, que são filogenéticas, ontogenéticas e culturais”
abarcarão: 1) descrever o que é sentimento (ANDERY, p. 200, 2001). Essa teoria separa Skinner
para Análise do Comportamento; 2) apresentar do mecanicismo. Não há mais um efeito para
as contingências envolvidas no sentimento de uma causa, mas sim, um combinado de varáveis
felicidade; 3) descrever a compreensão da Terapia sutis e adaptativas que cercam o comportamento,
da Aceitação e Compromisso do conceito de que podem ser continuamente selecionadas e
felicidade; 4) apresentar intervenções da Terapia de reproduzidas de acordo com suas consequências.
Aceitação e compromisso para contribuir para uma Ou seja, o ambiente não é mais o total responsável
vida mais feliz. Os dados foram coletados a partir pela direção dos comportamentos da espécie, ao
de referências bibliográficas distintas, compostas contrário, ele se torna palco para que as espécies
por artigos científicos e livros, dispostos em sites selecionem os comportamentos mais adaptativos
como: Scielo, Pepsic, e revistas da área. Esta às suas necessidades de acordo com suas
pesquisa tem como abordagem nuclear a Análise experiências (ANDERY, 2001).
do Comportamento com enfoque na Terapia de
No primeiro nível de seleção, a Filogênese,
Aceitação e Compromisso.
estão todas as características biológicas do
indivíduo já selecionadas pela espécie para manter
A ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E A sua sobrevivência (LEÃO; NETO, 2016). No entanto,
COMPREENSÃO DOS SENTIMENTOS este primeiro nível de seleção atua somente na
carga genética, preparando o organismo para
viver apenas em ambiente semelhante ao qual a
A Análise do Comportamento tem sua
seleção ocorreu (ANDERY, 2001). No segundo
origem com o estudioso Burrhus Frederic Skinner
nível, a Ontogênese, se encontra o comportamento
(1904-1990), que, preocupado em buscar novas
operante, que são as habilidades aprendidas
vertentes para a psicologia, alcança através
pelo sujeito em contato com o ambiente e seus
do Behaviorismo Radical estudos que eram
membros, trata-se da aprendizagem de novos
contrários às explicações “mentalistas” da época.
repertórios que são desenvolvidos ao longo da
Essas explicações propunham que fatores
vida. Aqui, são ampliados comportamentos que
“mentais” eram responsáveis pelas inadequações
permitem a obtenção de consequências que são
“comportamentais”, indicando uma patologia
reforçadoras para o próprio indivíduo e não mais
(MOREIRA; MEDEIROS, 2007).
para a sobrevivência da espécie. Neste nível, os
Skinner nega o mentalismo ao considerar organismos passam a se comportar de acordo
os sentimentos como manifestações físicas com o que lhes é reforçador e funcional, tornando-
do organismo. O que uma pessoa sente não os cada vez mais flexíveis e maleáveis para
poderia mais ser tratado como a “causa” de responderem a um mundo de constantes mudanças.
um comportamento “desajustado”, mas como Essa capacidade permite ao indivíduo não mais
consequência deste, originário do contato direto apenas sobreviver ao meio, mas comportar-
do organismo com variáveis ambientais (RICO, se no sentido de modificá-lo e ser, neste ciclo,
GOLFETO; HAMASAKT, 2012). novamente modificado (ANDERY, 2001). A medida
Ao olhar para o sujeito desta forma, a teoria que as pessoas nas suas experienciais individuais
desenvolvida por Skinner visava descobrir como descobrem comportamentos mais adaptativos,
determinados comportamentos ocorriam e porque ou seja, funcionais, passam a ser imitadas e
permaneciam ocorrendo mesmo que as emissões seus comportamentos tornam-se modelos para
de tais ações acarretassem em mais prejuízos outros membros da espécie, fazendo surgir o
do que benefícios. Isto é, procurava o cerne da último nível de seleção: a Cultura. Neste nível os
origem da variabilidade comportamental. Para isto, comportamentos operantes seriam selecionados a
Skinner, embasado na teoria da Seleção Natural partir do momento que garantissem contribuições
de Charles Darwin, desenvolveu a lógica dos três para o grupo, é o que dá origem aos costumes,
níveis de seleção por consequências, aplicada ao práticas e regras (LEÃO; NETO, 2016).
Já não existiria uma origem ou explicação que deixa a entender que para evitar a raiva e o
mental das falhas no comportamento humano, comportamento descrito, a conversa precisaria dar-
e nem uma causa determinada como sugere o se de outra maneira (RICO, GOLFETO; HAMASAKI,
mecanicismo. A explicação estaria diretamente 2012).
ligada ao ambiente característico e a história Apesar dos sentimentos serem colocados
de variação e seleção comportamental de cada como emergentes da relação com o ambiente,
indivíduo, ou seja, as pequenas alterações é necessário salientar que a maneira como o
comportamentais que se mostrassem funcionais, organismo os manifesta publicamente também
seriam selecionadas. Os aspectos mentais passam pode influenciar e modificar novamente esse
a ser vistos como comportamentos como todas mesmo meio. Isto quer dizer que o homem produz
as outras práticas do sujeito (ANDERY, 2001; as consequências que mais tarde serão seus
MOREIRA; MEDEIROS, 2007). próprios determinantes. Skinner colocou o homem
Skinner dividiu os comportamentos em como produto e produtor do seu próprio espaço.
comportamentos públicos e privados. Tanto os O homem opera, age e modifica através de seus
comportamentos públicos (falar, cantar, gritar) comportamentos (MICHELETTO; SÉRIO, 1993).
quanto os privados (pensar, sentir) poderiam, Logo, “os sentimentos não são entidades
segundo o Behaviorismo Radical, ser igualmente mentais e abstratas, mas sim manifestações
analisados, diferenciando-se apenas pelo acesso, corporais, concretas, do organismo” (GUILHARDI,
pois, enquanto o comportamento público pode 2002, p. 1). Quando evocados, os sentimentos
ser facilmente acessado pelo ambiente externo, aparecem publicamente através das manifestações
os comportamentos privados só podem ser comportamentais. Como quando uma pessoa vive
acessados a partir do relato verbal. A análise do algo que a deixa alegre e feliz (comportamento
comportamento passa a se ocupar também com privado), por exemplo, ela pode sorrir mais, falar
a relação entre o homem e seu ambiente interno, mais alto e abraçar (comportamento público)
o que torna importante entender, como os eventos (GUILHARDI, 2002).
privados ocorrem, emergem e também influenciam
Desse modo, os sentimentos assumem
nos comportamentos e decisões diárias das
papel importante na escolha do modo de se
pessoas (RICO, GOLFETO; HAMASAKI, 2012).
comportar do organismo, os eventos privados
Um bom exemplo é relatado por Skinner em 1991,
não são mais vistos apenas como respondentes
quando escreve o artigo “O lugar dos sentimentos
ou resultados de uma ocorrência do meio, mas
na análise do comportamento”. Nele Skinner
também como eliciadores de respostas públicas
retrata brevemente que não há como justificar o
operantes e conscientes do homem. O homem vai
comportamento de chorar unicamente com “estar
se apropriando dos sentimentos e utilizando-os em
triste”. Para ele, o choro pode até ser de tristeza,
seu dia a dia. Aprende a nomeá-los e identificá-los
mas a tristeza não ocorre espontaneamente, ela é
em suas relações (GUILHARDI, 2002).
subproduto de uma relação entre eventos ocorridos
no ambiente, eliciando esse sentimento e reação Porém, esse aprendizado só se dará a partir
(SKINNER, 1991). Desse modo, o Behaviorismo do contato com a cultura - terceiro nível de seleção- e
Radical não aceita as ideias tradicionais de que de suas experiências comportamentais. O processo
o sentimento é a explicação para o comportar-se, de nomear sentimentos não pode ser concretizado
por trás de toda ação, há elementos que envolvem sem a presença das contingências sociais. Se
sujeito e ambiente. Para melhor ilustrar, Skinner não discriminados pela comunidade verbal, todo
traz o exemplo de uma pessoa que “ao sentir raiva, e qualquer evento privado experimentado pelas
bate o telefone”. Pela lógica de outras abordagens, pessoas pode ser considerado apenas uma reação
a raiva seria a justificativa para a ação, mas para fisiológica. O amor, dor, depressão e outros só
a análise do comportamento, não. A explicação se dão em interação social (TOURINHO, 2001),
estaria diretamente na relação entre as pessoas por exemplo: se uma criança joga algo no chão
envolvidas, pois o comportamento de um indivíduo e imediatamente começa a gritar, certamente sua
torna-se também ambiente para a forma como o mãe perguntará o porquê de tanta raiva. Assim, a
outro responderá, assim, algo pode ter ocorrido criança acaba de aprender por meio de seu contato
durante a conversa que a tornou extremamente com a mãe que o que está sentindo chama-se
aversiva, eliciando tanto o sentimento de raiva, “raiva”. Esse mesmo processo ocorre com todas
quanto o comportamento de bater o telefone, o as outras manifestações do organismo e o sujeito
aprende a nomear os diferentes eventos privados “gostam do que estão fazendo”, em outras
(GUILHARDI, 2002). palavras, que estão felizes. Por outro lado, quando
Portanto, a visão do Behaviorismo Radical emitem comportamentos para remover algo
diferencia-se de outras concepções ao colocar sua aversivo no ambiente, as pessoas são reforçadas
proposta com relação aos sentimentos, afinal, se a negativamente, o que quer dizer, que a frequência do
tristeza profunda (sentimento) for a causa de uma comportamento que evita a situação desagradável
depressão, como se elimina este sintoma? Olhar aumenta, e a pessoa passa gradativamente a
para os sentimentos como consequência de eventos “viver evitando”, o que certamente traz alívio, mas
ambientais, permite ao psicoterapeuta identificar e não felicidade. Desta maneira, a felicidade é sim
prever variáveis que controlam o comportamento um estado subjetivo, mas que será despertado
do indivíduo, que não só desencadeiam emoções dentro de histórias de contingências reforçadoras
desagradáveis, mas que podem estar reforçando positivamente, relacionando-se também, aos níveis
atitudes de fuga e esquiva (RICO, GOLFETO; filogenético, ontogenético e cultural. Os sujeitos
HAMASAKI, 2012). passam a se comportar em acordo com o que é
selecionado, aceito e reforçado pela comunidade
em que vive (CHIPPARI, HAMASAKI; TOMANARI,
A ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E O 2016).
CONCEITO DE FELICIDADE
Deste modo, considerando que as pessoas
estão sob condições filogenéticas, ontogenéticas e
Segundo a perspectiva da análise do culturais distintas (MOREIRA; MEDEIROS, 2007), o
comportamento os sentimentos são entendidos que é felicidade para uns, não será para outros. Tal
como eventos privados ou encobertos que devem descrição sugere que as pessoas fazem e sentem
ser investigados seguindo as mesmas leis dos de acordo com as variáveis inseridas no contexto.
comportamentos públicos, ou seja, devem ser Skinner (1987), ao relatar sobre a sociedade
explicados a partir de um contexto e relação Ocidental, analisou que as pessoas estão infelizes
entre contingências (CHIPPARI, HAMASAKI; porque não gostam do que fazem e não fazem o
TOMANARI, 2016). Como a análise do que gostam, alegou que a felicidade ainda é um
comportamento estudaria então, o sentimento de problema fundamental, e que a análise experimental
felicidade? Segundo o dicionário Houaiss (2004) do comportamento ajudaria na busca das condições
felicidade é definida como um completo bem-estar, ideais da felicidade. Skinner destacou ainda, que a
incluindo contentamento, sucesso, bom êxito, cultura exerceria função significativa ao propiciar
sorte e ainda consciência plenamente satisfeita uma vida prazerosa ao grupo, prevenindo o
(FERRAZ; TAVARES; ZILBERMAN, 2007). Já para descontentamento e o abandono de seus membros
a análise do comportamento, felicidade significa (TAMURA; LAURENTI, 2017). Um exemplo de como
“estar em contato com reforçadores”. Nesta as variáveis ambientais podem intervir nos níveis
abordagem, reforçadores são entendidos como de felicidade é o estudo realizado com grandes
conseqüências que aumentam a probabilidade de amostras populacionais da União Europeia entre
um comportamento voltar a ocorrer. Existem as os anos de 1973 e 1998. Essa pesquisa mostrou
fontes de Reforço Positivo e Negativo. O Reforço que nações mais ricas costumam reportar maiores
Positivo aumenta a probabilidade de ocorrência índices de felicidade em relação a nações mais
de um comportamento através da adição de um pobres (FERRAZ; TAVARES; ZILBERMAN, 2007).
estímulo apetitivo. Já o Reforço Negativo, aumenta Outro estudo realizado no Brasil, no Município
a probabilidade de um comportamento ocorrer de Campo Grande, MS, descobriu que variáveis
a medida que viabiliza a remoção de eventos como o desemprego alteram drasticamente o
aversivos para o sujeito; esses comportamentos nível de bem-estar, e que, mesmo não gostando
são caracterizados como fuga e esquiva. Tanto o do trabalho que executam, as pessoas alvo do
reforço positivo quanto o negativo são convenientes estudo que estavam empregadas relataram um
e funcionais, mas despertam sentimentos nível de felicidade mais satisfatório. Outra variável
completamente diferentes (MOREIRA; MEDEIROS, analisada pelo estudo em questão foi o estado civil,
2007). em que indivíduos solteiros foram considerados os
Segundo Skinner, quando as pessoas mais felizes. Os casados seriam 1,5% mais infelizes
emitem comportamentos que são reforçados que os solteiros, os divorciados 14,63% e os viúvos
positivamente, elas passam a verbalizar que 85% mais infelizes que os solteiros (AYDOS, NETO;
humano não consegue parar, controlar ou suprimir não existem formas eficazes para controlar os
seus hábitos mentais, pois estes são aprendidos e comportamentos privados hostis, ou seja, mesmo
vinculados com sua experiência de vida (HAYES; que a pessoa tente negá-los ou evitá-los eles
PISTORELLO; BIGLAN, 2008). Assim, em continuarão lá, ocasionando perturbações mentais
determinadas circunstâncias a esquiva experiencial (SABAN, 2015).
passa a ser fortemente utilizada, com o objetivo Desta forma, os comportamentos de esquiva
de evitar experiências privadas que são aversivas experiencial e fusão cognitiva interligados com a
para o indivíduo, pois o controle verbal passa a “inflexibilidade psicológica”, podem vir a motivar
dominar os seus eventos privados. Dessa forma, psicopatologias aos seres humanos. Por esse
o sujeito provavelmente passa a se esquivar de motivo, a Terapia de Aceitação e Compromisso
contextos que ele nunca tenha vivido, mas que em age com o intuito de auxiliar os indivíduos a
sua história de aprendizagem estão verbalmente conseguirem sua “flexibilidade psicológica” dando-
ligados a estímulos aversivos condicionados, lhes a oportunidade de lidar melhor com seus
ou seja, essas funções se relacionam. As eventos internos, com o auxílio de seis princípios
consequências da esquiva experiencial são considerados essenciais para a ACT (HARRIS,
visíveis, pois o ser humano tem o empobrecimento 2011).
de sua variabilidade comportamental, visto que
As etapas de intervenção da Terapia
deixa de agregar práticas em seu repertório de
de Aceitação e Compromisso, utilizam-se de
vida por imaginar que essas possam ser aversivas.
ferramentas como análises funcionais para
Portanto, a esquiva experiencial se relaciona com
identificarem quais seriam as problemáticas
a infelicidade, ao passo que o sujeito tende a evitar
do sujeito. Identificada a demanda, não se tem
atividades que poderiam lhe ocasionar prazer e
uma ordem exata dos princípios para seguir as
felicidade (SOUSA; FARIAS, 2018).
intervenções, elas se darão de acordo com a
Já a fusão cognitiva ocorre no momento necessidade do sujeito, como por exemplo, verificar
em que o sujeito passa a se identificar com seus se o conflito vem de uma falta de conhecimento
eventos privados, ou seja, seus comportamentos de valores do indivíduo, se há necessidade de
se tornam reféns de pensamentos, sentimentos, aceitar e lidar com sofrimentos ou se o conflito
sensações e assim por diante. Feito isso, as redes está presente na inflexibilidade das relações dele
verbais do ser humano se tornam inflexíveis e o (COSTA; SOARES, 2015).
indivíduo tem sua referência em eventos privados
Pensando nisso, uma das formas
aversivos, que se transformam em identidade, como
de intervenção da Terapia de Aceitação e
uma particularidade deste (HAYES; PISTORELLO;
Compromisso é chamada de “Aceitação” dos
BIGLAN, 2008).
eventos encobertos. Monteiro et al. (2015)
A terapia de Aceitação e Compromisso menciona sobre a utilização dessa técnica em um
acredita que as doenças relacionadas a mente grupo de pessoas diagnosticadas com transtorno
(cujo cunho não seja orgânico) surgem por efeitos por abuso de substancia, objetivando a redução
de situações aversivas que ocorrem em processos do sentimento de estigma entre os dependentes.
comportamentais normais e se associam a um A ACT, partindo do princípio de aceitação, age
evento aversivo, tornando-o problemático. As no intuito de ensinar que o sujeito não precisa
principais influências que podem desencadear controlar ou lutar contra o que está sentindo, ele
psicopatologias relacionadas ao termo felicidade, pode e tem o direito de estar envolvido ativamente
são as crenças e práticas baseadas nas culturas e de forma consciente com seus eventos internos,
mundiais. Na maioria dos ensinamentos, desde em outras palavras, ele tem “permissão” para sentir
que o bebê nasce ele não aprende que a felicidade o que está sentindo, fazendo com que ele aprenda
e tristeza fazem parte da vida, em vez disso, ele a lidar de forma acolhedora com a experiência que
aprende que a felicidade deve ser almejada, e que está vivenciando. Ou seja, o sujeito aprende a viver
o correto é que ela esteja sempre presente em seu apesar da dor, tendo mais chances de encontrar
cotidiano, enquanto a tristeza deve ser rejeitada. outros reforçadores (MONTEIRO et al., 2015).
Acaba-se entendendo a tristeza e todos os outros
Outro princípio da Terapia de Aceitação
eventos privados aversivos como sinônimos de
e Compromisso é conhecido como “Desfusão
problema, os quais precisam ser solucionados
Cognitiva”, e seu objetivo é clarificar o significado
e eliminados o mais rápido possível, gerando
real de um pensamento, ajudando o indivíduo a
comportamentos de fuga e esquiva. Entretanto,
reconhecer que pensamentos são apenas eventos pensariam dela. Isto a limitava em suas decisões
encobertos, e que estes não estão fundidos sobre sua vida profissional e pessoal, pois tinha
com a realidade. As pessoas ao passarem por muito receio de críticas e julgamentos em relação
determinadas vivências, passam a se fundir com as suas escolhas. Logo, a cliente citada estava
determinadas experiências, e esta fusão contribui em sofrimento por andar em direção contrária ao
para a esquiva experiencial. Por exemplo, um que considerava importante (valores), pois era
homem de 31 anos buscou terapia com a queixa de governada por regras de sua cultura e controlada
crise de pânico e por esta condição acreditava que pelas consequências sociais (FONSECA; NERY,
não conseguiria mais trabalhar, pois apresentava 2018). Na perspectiva da Terapia de Aceitação
o pensamento recorrente de repetir tal crise e Compromisso, a intervenção partiria do
(FONSECA; NERY, 2018). Neste caso, a desfusão reconhecimento de valores com a cliente. Os
cognitiva seria uma alternativa para elucidar com valores são subjetivos, ou seja, eles são escolhidos
este cliente a veracidade de seus pensamentos, de forma individual, influenciados pela cultura em
podendo utilizar a técnica de “pensamentos que este indivíduo está exposto e também pela
musicados”. Nesta técnica, o cliente é orientado sua história de vida. Nesse sentido, a cliente em
a cantar o pensamento aversivo que está tendo questão começaria a tomar decisões em direção
(vou ter uma crise de pânico), observando se o ao que acredita, mesmo correndo o risco de não
pensamento mantém o mesmo efeito original. ser reforçada socialmente, mas o fato de estar
Com treinamento e passar do tempo, o sujeito seguindo seus valores já seria seu próprio reforçador
entende que o pensamento se trata apenas de positivo, ocasionando sentimentos de felicidade
palavras, em vez de uma verdade ou referência. (MONTEIRO et al., 2015). Um exemplo em respeito
Como consequência da prática desse princípio, os a valores é explorado no livro de Harris (2011),
sentimentos e crenças aversivas tendem a diminuir ao qual diz sobre um psicólogo que presenciou a
de frequência, já que não são mais valorizados vida em um campo de concentração nazista. Tal
como eram anteriormente, fazendo com que psicólogo relatou que diferente do previsto, as
gradativamente, o sujeito consiga retornar ao pessoas que sobreviviam mais tempo não eram as
trabalho e aumentar sua qualidade de vida (HAYES; mais fortes fisicamente e nem as mais adaptadas,
PISTORELLO; BIGLAN, 2008). mas sim seres humanos que tinham um propósito
Outra forma de intervir nesse caso, seria de vida. Ou seja, eles possuíam uma ligação com
a utilização do princípio “Eu como contexto”. seus propósitos, que se transformavam em razões
Nesse procedimento o sujeito é induzido a se para viver. Logo, é de extrema importância que o
colocar em um momento presente “eu/aqui/ sujeito tenha clareza e conexão com seus valores,
agora”, desconsiderando que ele se descreva por dessa maneira ele conseguirá dar sentido a sua
aspectos psicológicos, vendo a situação tal como vida, visto que os valores são reflexos do que
ela é, ou seja, durante a crise de pânico o cliente as pessoas sentem de forma mais significativa e
poderia tomar consciência e mudar o foco de seu relevante, além de serem guias e estimulantes para
pensamento observando os objetos a sua volta e o cumprimento de objetivos (HARRIS, 2011). Agir
o que realmente está acontecendo no ambiente conforme os valores pode ser desafiador, visto que
(MONTEIRO et al., 2015). O processo pode ser em alguns momentos o indivíduo precisará encarar
complementado pelo princípio “Estar presente”, seus medos para prosseguir. Mas ao mesmo
sendo o objetivo envolver-se ativamente com a tempo é realizador e gratificante, obtendo como
tarefa que estava produzindo, mas, se por acaso consequência sentimentos de felicidade. As ações
o indivíduo notar que sua mente está focando são o ponto de partida para uma vida significativa,
em seus eventos privados, ele deve aos poucos porém para que esta ação seja eficaz, o ideal é
encaminhar-se novamente para o presente, até que esteja conectada, orientada e motivada pelos
que tal comportamento se torne um hábito (HAYES; valores de uma pessoa (HARRIS, 2011).
PISTORELLO; BIGLAN, 2008; MONTEIRO et al., Neste viés, é extremamente importante que
2015). o cliente assuma uma “Ação de Compromisso”,
Por fim, a ACT conta com os princípios de visto que o fato de correr o risco de não ser sempre
“Valores” e “Ação de Compromisso”, que podem reforçado pode levá-lo a desistir. Ou seja, diz
ser ilustrados através do caso a seguir: Uma cliente respeito ao comprometimento referente à ação, a
buscou terapia com a queixa de excesso de timidez mudança de comportamentos que levariam à direção
e grande preocupação acerca do que as pessoas desejada, gerando um repertório comportamental
flexível e padronizado com os interesses do é uma forte ferramenta dentro das abordagens
indivíduo. Essa ação se torna efetiva quando ligada comportamentais, que não só direciona a
e orientada pelos valores (MONTEIRO et al., 2015). descoberta dos determinantes da infelicidade,
A ACT propõe ao ser humano não controlar mas ensina métodos para enfrentá-los e construir
seus pensamentos, sentimentos e emoções, pois modos mais assertivos de lidar com esses
quando se tem um pensamento perturbador, o eventos. Pensamentos, sentimentos e emoções
sujeito até consegue evitá-lo por alguns momentos são condições humanas, mais do que isso, são
com estratégias temporárias, causando-lhe uma comportamentos que representam o estado atual
sensação de alívio momentâneo, porém depois de subjetivo de cada sujeito. A ACT vem para mostrar
um tempo, esse pensamento voltará a atormentá- que dentro de um indivíduo cabem todas as suas
lo, causando uma grande frustração para a pessoa, experiências, sejam elas boas ou ruins, elucidando
além de consumirem tempo e esforço (HARRIS, que estar no controle nem sempre é a melhor
2011). solução, e que, aceitar ou não as adversidades e
os eventos internos que elas despertam, pode ser
Portanto, com o auxílio da Terapia de
decisivo para o processo de uma vida mais feliz.
Aceitação e Compromisso, o indivíduo compreende
que a felicidade não é um bem eterno, mas é
possível senti-la quando o sujeito está ligado de REFERÊNCIAS
forma direta a seus valores e em direção ao que
almeja, fazendo isso com comprometimento e ANDERY, M. A. O modelo se seleção pelas
compreendendo que existem muitas variáveis que consequências e a subjetividade. In: BANACO,
não estão a seu controle, cabendo a ele aceitar R. A. (org.). Sobre Comportamento e cognição:
os desafios que a vida propõe e aprimorando sua aspectos teóricos, metodológicos e de formação
flexibilidade psicológica. em análise do comportamento e terapia cognitivista.
Santo André: ESETec Editores Associados, 2001.
CONSIDERAÇÕES FINAIS v.1.