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DIREITO DE VIZINHANÇA – APLICAÇÃO EM CASO CONCRETO

1- DESCRIÇÃO DO CASO
O fato exposto abaixo trata sobre um caso real, no qual, eu, como concluinte do curso
de Direito, como comumente acontece a todos nessa fase, fui consultado sobre o
posicionamento jurídico acerca do problema demonstrado.
O proprietário do imóvel urbano, construiu um prédio de cinco andares fazendo
limitação com ambos os confrontantes vizinhos.
Durante a construção do mesmo, tiveram problemas em proceder com o acabamento
externo da edificação em um dos lados confrontante por conta do vizinho não permitir o
ingresso dos trabalhadores em seu terreno para efetuar a execução dos serviços.
A construção seguiu suas fases de execução, porém, nunca conseguiram efetuar tal
acabamento, como pode-se observar na foto, in loco, abaixo.

1
O prédio encontra-se acabado, faltando somente as obras de conclusão da parede
lateral que não pode ser feito por conta da negativa sobre a permissão de entrada dos
construtores, no terreno vizinho.
O acabamento compreende o reboco, a impermeabilização e a pintura. A falta destes
componentes da obra permitem a infiltração de água da chuva, provocando a umidade e a
deterioração do acabamento interno do prédio. Dessabores que o proprietário já vem
experimentando e arcando com o prejuízo da reforma na parte interna.

2- ANÁLISE TEÓRICA E SOLUÇÃO DO CASO


2.1 DIREITO DE VIZINHANÇA
O Direito de Vizinhança vem para regular as restrições surgidas através da
necessidade de conciliar o uso da propriedade em relação aos proprietários confinantes. Em
tal relação deve imperar a solidariedade, a boa-fé e o atendimento à função social.1
Carlos Roberto Gonçalves, em sua obra, explica que:
As regras que constituem o direito de vizinhança destina-se a evitar conflitos
de interesses entre proprietários de prédios contíguos. Tem sempre a mira a
necessidade de conciliar o exercício do direito de propriedade com as
relações de vizinhança, uma vez que sempre é possível o advento de
conflitos entre os confinantes.2
Washinton de Barros Monteiro esclarece que:
[...] os direitos de vizinhança constituem limitações impostas pela boa
convivência social, que se inspira na lealdade e na boa-fé. A propriedade
deve ser usada de tal maneira que se torne possível a coexistência social. Se
assim não se procedesse, se os proprietários pudessem invocar uns contra os
outros seu direito absoluto e ilimitado, não poderiam praticar qualquer
direito, pois as propriedades se aniquilariam no entrechoque de suas várias
faculdades.3
Pode-se dizer ainda que os direitos de vizinhança são propter rem, pois vinculam os
confinantes acompanhando a coisa.
O rol de direitos e obrigações referentes ao tema encontram-se elencados no Capítulo
V do Título III do Livro III do Código Civil Brasileiro que apresentam-se como:
a) Restrições ao direito de propriedade quanto à intensidade de seu exercício,
regulando o seu uso anormal – Arts. 1.277 a 1.281;

1
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, vol. 4, direto das coisas. 27ª ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 292
2
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 5, direito das coisas. 6ª ed. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 349
3
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, vol. 3. 37 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
135. Apud. GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit. p. 350
2
b) Limitações legais ao domínio similares às servidões, tratando das questões sobre
árvores limítrofes, passagem forçada, passagem de cabos e tubulações e águas –
Arts. 1.282 a 1.296;
c) Restrições oriundas das relações de contiguidade entre dois imóveis, versando
sobre os limites entre prédios, direito de tapagem e direito de construir – Arts.
1.297 a 1.313
Dentre estes, mais intimamente ligado ao caso mencionado no item 2, pode-se destacar
as obrigações referentes ao uso do prédio vizinho. O Art. 1.313, inciso I, traz importante
normatização a qual observa-se no texto legal, como segue:
Art. 1.313. O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o
vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para:
I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação, construção,
reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;
II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem
casualmente.
§ 1o O disposto neste artigo aplica-se aos casos de limpeza ou reparação de
esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos, poços e nascentes e ao aparo de cerca
viva.
§ 2o Na hipótese do inciso II, uma vez entregues as coisas buscadas pelo
vizinho, poderá ser impedida a sua entrada no imóvel.
§ 3o Se do exercício do direito assegurado neste artigo provier dano, terá o
prejudicado direito a ressarcimento.4
Muitas vezes é necessário que o proprietário entre no imóvel vizinho para proceder aos
serviços mencionados no texto legal. Tem direito de fazê-lo, desde que avise previamente o
vizinho que, quando muito, poderá fazer restrições quanto a horário, disciplinando-os.
Contudo, o proprietário que necessita penetrar no imóvel fica obrigado a reparar qualquer
dano que por ventura causar.5
A situação fática supra mencionada enquadra-se especificamente neste entendimento,
restando ao proprietário, após infrutíferas tentativas amigáveis com o confinante, valer-se do
serviço jurisdicional para assegurar seu direito e concretizar sua obra.
Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, procedeu:
APELAÇÃO. DIREITO DE VIZINHANÇA. ART. 1.313, INCISO I, DO
CÓDIGO CIVIL. Deve ser confirmada a sentença que resultou na
procedência do pedido dos autores para que o condomínio demandado
tolerasse sua entrada nas dependências condominiais com o escopo de
realizar os reparos necessários na parede externa da casa dos autores, que
ficava na divisa entre as duas propriedades. Demonstrada a resistência
injustificada por parte do condomínio e a necessidade de ingresso na área
condominial para realizar os consertos. Incidência do art. 1.313, inciso I do
CCB/02. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70057584856,
4
BRASIL, Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil Brasileiro, Art. 1.313
5
Carlos Roberto. op. cit. p. 380.
3
Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elaine
Harzheim Macedo, Julgado em 19/12/2013)6
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE VIZINHANÇA. AÇÃO
COMINATÓRIA. O Código Civil expressamente tutela a pretensão do autor
em seu artigo 1.313, quando outorga ao proprietário confinante que,
mediante acordo prévio, ingresse no imóvel vizinho para os reparos da
parede divisória. Sendo clara a perícia ao mencionar que a instalação da
calha no imóvel da demandada constitui-se em medida eficaz para reduzir o
volume de água que atinge a parede da casa do autor e, portanto, para
diminuir, de alguma forma, os danos decorrentes do contato da água com a
edificação, a procedência da ação é medida que se impõe. NEGARAM
PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº
70064407877, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Walda Maria Melo Pierro, Julgado em 29/07/2015).7

6
BRASIL, TJ-RS - AC: 70057584856 RS, Relator: Elaine Harzheim Macedo, Data de Julgamento: 19/12/2013,
17ª Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/01/2014
7
BRASIL, TJ-RS - AC: 70064407877 RS, Relator: Walda Maria Melo Pierro, Data de Julgamento: 29/07/2015.
20ª Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 04/08/2015
4
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, vol. 4, direto das coisas. 27ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2012.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 5, direito das coisas. 6ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2011.

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