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Questão 4 – Desafios do mercado de trabalho português/Impactos das medidas da pandemia

Mª Inês Silva, a91049 Economia Portuguesa e


Europeia

O mercado de trabalho português, como qualquer outro mercado, enfrentou sempre desafios que
colocavam à prova a sua eficácia, o seu correto funcionamento, o seu crescimento e desenvolvimento.
Esses desafios, alguns foram mitigados, outros, apesar do combate, permaneciam e eventualmente,
cresciam. Mas Portugal caminhava positivamente e antes da chegada da crise pandémica, o nosso país
apresentava uma grande e significativa recuperação do período da crise de 2008: em termos de
mercado de trabalho e de remunerações, o “emprego total tinha aumentado em cada trimestre desde o
final de 2013; a taxa de desemprego estava no nível mais baixo desde 2002 (6,5%); os salários reais
tinham crescido cerca de 2,7% em 2018 e 2% em 2019, depois de uma década de quase estagnação; o
índice de Gini foi de 31,9 em 2018, abaixo dos 34,5 de 2013”. Claro que ainda persistiam os salários
baixos, as grandes desigualdades dos rendimentos, níveis de desemprego elevados, pouca qualificação
dos trabalhadores, baixa competitividade e envelhecimento do mercado de trabalho, pouca proteção
em relação aos trabalhadores, entre outros fatores estruturais. Mas Portugal, como disse, caminhava
em direção à correção dessas fragilidades – no início de 2020, o “desemprego registado teve uma queda
de 8,6% em janeiro e de 7,9% em fevereiro face ao mês homólogo do ano anterior”.

Os Desafios
Na minha opinião, os três principais desafios que se verificam no mercado de trabalho português
são: as desigualdades salariais, o desemprego e o envelhecimento.

Portugal sempre apresentou uma elevada taxa de desemprego em relação aos seus companheiros
europeus, com especial atenção para o desemprego jovem que sempre foi o mais significativo no nosso
país. Segundo a Pordata, no final da crise, em 2013, a taxa de desemprego juvenil tinha atingido o valor
de 38%, traduzindo também que os jovens constituem a faixa etária com os vínculos laborais mais
precários. A nível de escolaridade, verifica-se que o desemprego é maior nos trabalhadores qualificados
com apenas o ensino básico e significativamente menor naqueles com o ensino superior (informa a
mesma fonte).

Não consigo deixar de pensar que estes desafios se encontram de certa forma relacionados. Pois
com um elevado desemprego jovem é inevitável que um mercado de trabalho se torne envelhecido. Um
mercado de trabalho envelhecido acarreta aspetos penalizadores para um país, por exemplo a falta de
inovação, de novos conhecimentos, perspetivas, recursos, ideias, falta de produtividade. Este é um
desafio que o mercado de trabalho português sempre enfrentou e que o torna menos competitivo
relativamente aos mercados laborais dos restantes países europeus. No contexto português, prevalece
muito a mentalidade de que os jovens não são contratados devido à falta de experiência; porém, estes
continuarão inexperientes até que alguma entidade empregadora os empregue. O que se verifica
também no nosso mercado de trabalho é a existência de dois terços de trabalhadores com menos de 25
anos com relações de trabalho temporárias (estágios, períodos experimentais, contratos a termo etc.) e
empregues, maioritariamente, no setor da restauração e alojamento – o que os torna expostos a
períodos de quebra na procura de mão-de-obra.

As desigualdades remunerativas são outro desafio enfrentado. Um trabalhador com baixa


formação escolar recebe o salário mínimo, enquanto um trabalhador com uma licenciatura, por
exemplo, aufere de um salário maior. Porém, com o elevado desemprego dos pouco qualificados – ou
seja, com a mentalidade de que as empresas optam por contratar indivíduos melhor qualificados em
retorno de uma maior produtividade – as diferenças salariais agravam-se. Tal que contribuem para um
mercado de trabalho desigual, desfavorável, injusto, de certo modo “duro”, na medida em que não
protegem e descartam os indivíduos mais necessitados e que, devido ao seu portefólio pouco
qualificado, é-lhes negado oportunidades. Isto tem levado a uma maior pressão na população ativa
portuguesa para uma maior qualificação e competitividade, para que trouxessem às empresas bons
níveis de produtividade e assegurassem o seu lugar no mundo do trabalho e os seus salários.

A Pandemia e os seus Impactos


A verdade é que Portugal vinha a combater estes desafios e a registar melhorias significativas.
Porém, veio a pandemia (em março) e os efeitos que esta provocou na economia foram dramáticos. As
fragilidades do mercado de trabalho português foram exacerbadas. O governo português, de modo a
proteger os trabalhadores e empregadores, aprovou de imediato um conjunto de medidas
extraordinárias destinadas à manutenção dos postos de trabalho. Para conter o desemprego, sobretudo
o jovem que resultasse ainda num maior envelhecimento do mercado de trabalho, e as desigualdades
de rendimento, adotaram-se medidas como:

 Regime de lay-off simplificado (apoio extraordinário à manutenção dos contratos de trabalho


em situação de crise empresarial) para as empresas que vejam a sua atividade severamente
afetada devido à epidemia (quebra de vendas superior a 40%);
 Teletrabalho;
 Regime excecional de faltas justificadas;
 Trabalhadores que fiquem em situação de isolamento profilático terão direito a receber 100%
da remuneração de referência;
 Apoio aos trabalhadores independentes e empresários em nome individual (atividade
comercial e industrial);
 Apoio a Start-ups;
 Sistema de incentivos à adaptação da atividade das microempresas e das PME;
 Etc.

Concluo afirmando que, apesar da ação imediata do governo, foram inevitáveis os impactos que se
fizeram sentir. No âmbito do Desemprego, no início de maio, registavam-se mais 52 mil desempregados
que no final de março; num estudo efetuado com cinco mil empresas, “1% encerrou definitivamente”
(desses 1%, 5% correspondiam ao setor da restauração e alojamento) e “13% indicou já ter efetuado
despedimentos ou pensar fazê-lo nos próximos seis meses”. Ainda, os trabalhadores mais afetados
foram os mais jovens (devido aos seus contratos temporários e ao facto do setor da restauração e
alojamento ser, previsivelmente, o mais afetado).

No âmbito das Desigualdades Salariais, num inquérito em abril, pela Associação da Hotelaria,
Restauração e Similares de Portugal, “30% das empresas inquiridas não conseguiu pagar salários em
março, 63% das empresas dizia não conseguir pagar salários em abril e 80% das empresas estimavam
uma ausência total de faturação em abril em maio”; para além de que “57% das empresas do sector da
restauração e alojamento apresentaram a candidatura a lay-off”. E, mais uma vez, os mais
desfavorecidos têm sido os mais afetados pela crise: “uma em cada quatro pessoas que auferiam
salários abaixo dos 650 euros perderam rendimento; e 43 por cento das famílias que ganham até 1 000
euros mensais tiveram perda de rendimento, o que compara com 32,6 por cento das que ganham entre
1 001-2 500 euros e com 23,4 por cento das que recebem acima de 2 500 euros mensais”.

Referências
Comunicação: Governo adota medidas para mitigar impacte económico da epidemia Covid-19 junto das
empresas e trabalhadores. (9 de março de 2020). Obtido de Web site de A República
Portuguesa: https://www.portugal.gov.pt

Mamede, R. P., Pereira, M., & Simões, A. (Junho de 2020). Portugal: Uma análise rápida do impacto da
COVID-19 na economia e no mercado de trabalho. Organização Internacional do Trabalho, p.
29.

Programa de Estabilidade 2020. (maio de 2020). p. 70.

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