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Na terceira fase da dosimetria, fundamentou que o paciente já era

conhecido dos meios policiais, eis que respondeu a processo por ato infracional
análogo ao tráfico, entre outros, tendo cumprido medidas sócio educativa. Antes
de tudo, é preciso lembrar que os atos infracionais não podem ser considerados
como antecedentes penais já que ato infracional não é crime e medida
socioeducativa não é pena.

Dessa forma, a imposição dessas medidas não pode, na


qualidade de maus antecedentes, influenciar a aplicação
da pena-base em infração penal cometida após a
maioridade, pois, não obstante o ato cometido pelo
inimputável seja correspondente (semelhante) a um ilícito
penal, as medidas impostas a ele têm sobretudo o
propósito educativo, não se inserem nas clássicas
finalidades da pena criminal.

Conforme o entendimento firmado no âmbito na Terceira


Seção, a prática de ato infracional não justifica a
exasperação da pena-base, por não configurar infração
penal, não podendo, portanto, ser valorada negativamente
na apuração da vida pregressa do réu a título de
antecedentes, personalidade ou conduta social.
Precedente.” (HC 364.532/SP, j. 07/12/2017)

Assim, o paciente, em que pese primário, não recebeu a causa de


diminuição da pena, justamente por ter respondido a ato infracional.

Equivocou-se o juízo a quo ao não aplicar dispositivo redutor previsto


na Lei de Drogas, tendo agido, inclusive, de forma contrária à lei.

Isto porque, o supracitado dispositivo impõe ao beneficiário alguns


requisitos para a sua aplicação, quais sejam: a) primariedade; b) bons
antecedentes; c) não-dedicação a atividades criminosas; e d) não-integração a
organização criminosa.

Marcos Antônio Dos Santos Soares - marcosantosoares@hotmail.com - IP: 45.188.30.2


Tendo em vista que o coacto atende a todas as exigências
impostas pelo dispositivo legal – visto que o contrário não ficou comprovado
durante a instrução processual –, não pode a ele ser negada tal benesse, e caso
assim se proceda, a decisão que for prolatada nesse sentido estará frontalmente
em violação ao que prevê a lei. Não sendo o referido benefício mera faculdade
conferida ao magistrado, tratando-se de uma imposição legal e, mais que isso,
um direito constitucional conferido ao réu.

De modo a repisar o que já fora dito, o paciente é primário, possui


bons antecedentes, não se dedica a atividades criminosas e também não
integra qualquer tipo de organização criminosa, negar-lhe o redutor do
parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas é renunciar aos princípios da
legalidade e da individualização da pena, pois trata de um direito subjetivo do
coacto.

Temos, no presente caso, flagrante ofensa à dosimetria da pena,


pois ao deixar de aplica o redutor previsto em Lei, haja vista todos os requisitos
estarem preenchidos, perpetrou o magistrado em inequívoco constrangimento
ilegal em face do paciente, sendo merecedor do redimensionamento da
reprimenda.

Percepção semelhante é o do Superior Tribunal de Justiça que tem


entendimento pacificado nesse sentido. Vejamos:

"[...] verifico que o fundamento utilizado pelas instâncias de


origem para afastar o reconhecimento do tráfico
privilegiado foi a presunção de que pessoas que agem
como o acusado estão envolvidas de maneira segura
com o tráfico porque um neófito ou pessoa comum não
consegue acesso a entorpecente de tal proporção sem
que participe de maneira profunda no tráfico de drogas
(e-STJ fl. 79), sem, contudo, haver a demonstração, por
meio de elementos concretos, de que o paciente se
dedicava a atividades criminosas, ou mesmo, que
integrasse organização criminosa. Dessa forma, tendo
em vista a primariedade, os bons antecedentes e a
ausência de demonstração de que o paciente se
dedique a atividades criminosas ou integre

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organização criminosa, reconheço o constrangimento
ilegal em virtude da não incidência da minorante, razão
pela qual a dosimetria da sua pena deve ser refeita.
[...]
Na espécie, tendo em vista o montante da nova pena
imposta, a primariedade do paciente e, por outro lado, a
existência de circunstância judicial desfavorável, qual seja,
a quantidade do entorpecente apreendido – um tablete de
maconha pesando 836,66 gramas –, deve ser-lhe conferido
o regime inicial semiaberto, a teor do disposto no art. 33,
§§ 2º, "b", e 3º, do Código Penal, e no art. 42, da Lei n.
11.343/2006.
[...]
Ante o exposto, com fulcro no art. 34, XX, do RISTJ, não
conheço do habeas corpus. Contudo, concedo a ordem
ex officio para fixar a pena do paciente em 1 ano, 11
meses e 10 dias de reclusão, além de 194 dias-multa, no
regime inicial semiaberto, mantidos os demais termos da
condenação.".
(STJ, HC nº 489.043/SP, Rel. Min. REYNALDO SOARES
DA FONSECA, 6ª T., DJe 06.03.2019).

Não sendo apenas daquela Corte Superior, este também é o


entendimento do Supremo Tribunal Federal, que em decisão prolatada no mês
passado, agosto de 2020, deliberou o que segue:

"De início, ressalto que são requisitos para concessão da


causa de diminuição de pena, segundo os termos do art.
33, § 4º, da Lei 11.343/2006: (i) ser o agente primário; (ii)
possuir bons antecedentes; (iii) não se dedicar a atividades
criminosas e (iv) não integrar organização criminosa.
[...]
Tudo indica que a intenção do legislador, ao inserir a
redação contida no § 4º do artigo 33, foi distinguir o
traficante contumaz e profissional daquele iniciante na vida
criminosa, bem como do que se aventura na vida da
traficância por motivos que, por vezes, confundem-se com
a sua própria sobrevivência e/ou de sua família. Daí,
acredito essencial, para legitimar o afastamento do redutor,
fundamentação corroborada em elementos capazes de
afastar um dos requisitos legais, sob pena de desrespeito

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ao princípio da individualização da pena e de
fundamentação das decisões judiciais.
Conforme assentado na doutrina: “A habitualidade e o
pertencimento a organizações criminosas deverão ser
comprovados, não valendo a simples presunção. Não
havendo prova nesse sentido, o condenado fará jus à
redução de pena” (QUEIROZ, Paulo; LOPES, Marcus.
Comentários à Lei de Drogas . 2016. p. 50).
Assim, a quantidade e natureza da droga são
circunstâncias que, apesar de configurarem elementos
determinantes na modulação da causa de diminuição
de pena, por si sós, não são aptas a comprovar o
envolvimento com o crime organizado ou a dedicação
à atividade criminosa, devendo o juízo condenatório
obter outros elementos hábeis a embasar tal
afirmativa.
[...]
Tecidas as considerações pertinentes, verifico que o
paciente preenche os requisitos legais previstos no art. 33,
§ 4º, da Lei 11.343/2006, de forma que faz jus ao redutor.
Ante o exposto, concedo a ordem de habeas corpus
para determinar que o juízo de origem refaça a
dosimetria com a aplicação do redutor previsto no art.
33, § 4°, da Lei 11.343/2006, em fração a ser
motivadamente determinada, nos autos da Ação Penal n.
0000115- 61.2018.8.26.0593.".
(STF, RHC nº 187.966/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES,
Dec. Monocrática., DJe 06.08.2020).

Em vista disso, imperioso se faz que o redutor de que trata o tráfico


privilegiado, previsto no artigo 33, parágrafo 4º da Lei 11.343/2006, seja aplicado
no presente caso, reduzindo a pena erroneamente aplicada de forma elevada ao
coacto, indo ao encontro do que prevê a Lei, bem como observando os princípios
constitucionais visceralmente ligados à aplicação deste dispositivo, de modo que
a pena seja adequadamente aplicada, não incorrendo em equivocada
desproporcionalidade durante a dosimetria.

Marcos Antônio Dos Santos Soares - marcosantosoares@hotmail.com - IP: 45.188.30.2

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