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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL

DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA:

Autos de origem: 5002539-40.2021.8.24.0011

Paciente: GABRIEL DE OLIVEIRA

GASPARINO CORRÊA, advogado inscrito na OAB/SC sob o nº


53.085, e ANDERSON MUNIZ, advogado inscrito na OAB/PR sob o nº 95.793,
vêm, à presença de Vossa Excelência, impetrar ordem de HABEAS CORPUS
com fulcro no artigo 5º, LXVIII, da Carta da República, e artigos 647 e 648, I e
VI, ambos do Código de Processo Penal, em favor de GABRIEL DE OLIVEIRA,
atualmente recolhido na Unidade Prisional Avançada de Brusque, contra ato
ilegal do magistrado da vara criminal da comarca de Brusque, pelas razões de
fato e de direito a seguir expostas:

I. DOS FATOS.

O paciente Gabriel, 19 anos, primário, foi detido em 06 de


março, como suspeito pelo cometimento do crime descrito no art. 33, da Lei
nº. 11.343/06. Em sua posse foi encontrada apenas 1,5g de cocaína (destinada
ao consumo pessoal) e R$110,00 (cento e dez reais). Após “autorização do
paciente” os milicianos invadiram sua residência e no pátio encontraram
porções de maconha com peso aproximado de 376g.

A conversão da prisão em flagrante em preventiva foi


consubstanciada em argumentos absolutamente genéricos e abstratos, que
não se coadunam com os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal.

Nesta oportunidade, portanto, impetramos o presente Habeas


Corpus com o intuito de reverter a decisão, especialmente tendo em vista que
o paciente é primário, nunca havia sido preso por qualquer motivo, possui
residência fixa no distrito da culpa e ocupação remunerada lícita – tudo
devidamente documentado.

Brevíssimo, é o relatório.
II. DAS CONDIÇÕES PESSOAIS DO PACIENTE.
Excelência, existem elementos a serem pontuados a fim de se
aferir a inexistência de fundamentos para manutenção da prisão cautelar.

Conforme demonstrado pela documentação anexa, o


paciente possui residência fixa no distrito da culpa, sendo que reside com sua
avó, a Sra. Itacir, a qual, inclusive, depende da ajuda financeira do neto.

O paciente também possui ocupação laboral lícita, atuando


como auxiliar de produção na empresa Santo Óleo, na cidade vizinha de
Gaspar/SC, há cerca de um ano, percebendo renda média mensal de
R$1.500,00, de onde vem seus meios de subsistência e auxílio aos familiares.

Ademais, Excelência, é imperioso frisar a AUSÊNCIA DE


ANTECEDENTES CRIMINAIS do paciente, o qual jamais foi preso, processado ou
condenado por qualquer fato, conforme consta nas certidões anexas.

Oportuno salientar, por fim, que, quando da sua prisão, o


paciente não ofereceu qualquer resistência à abordagem policial. Ademais,
em caso de deferimento do presente pleito, o acusado regressará para sua
atividade laborativa, bem como ao mencionado domicílio, onde
permanecerá à disposição das autoridades.

III. DO MÉRITO.

III.I. DA DESNECESSIDADE DA DECRETAÇÃO DA PRISÃO


PREVENTIVA. PERICULUM IN LIBERTAIS NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE
PERIGO GERADO PELO ESTAO DE LIBERDADE DO AGENTE.

Primeiramente, Excelência, deve-se registrar que a custódia


preventiva exige não só a prova da existência do crime e indícios suficientes
de autoria (fumus comissi delicti), mas, principalmente, a existência do
periculum in libertatis, que significa eventual risco causado pela liberdade do
agente, conforme recente atualização do art. 312, trazida pela Lei
13.964/2019.
No presente caso, a defesa insurge contra alegação que esse
risco existe.

Primeiro porque o custodiado (I) não possui condenações


pretéritas em seus antecedentes, (II) nunca havia sido preso e não responde a
qualquer outro processo, (III) os bens apreendidos não apresentam
exacerbada periculosidade, (IV) não apresenta qualquer indício de
habitualidade ou vínculo com organização criminosa, (V) possui residência fixa
no distrito da culpa e (VI) possui ocupação laboral lícita, tudo devidamente
documentado.

Ora, na esteira de incontáveis precedentes do Superior


Tribunal de Justiça e do próprio Supremo Tribunal Federal, a prisão cautelar é
excepcionalizada, isto é, condicionada à efetiva demonstração de
imprescindibilidade de segregação, à luz dos fatos concretos trazidos ao
feito, não bastando para sua manutenção a mera percepção do julgador a
respeito da gravidade abstrata do tipo penal, sob pena de configurar abuso
de poder e coação ilegal, por manifesta ausência de justa causa na
manutenção do aprisionamento cautelar.

Nesta perspectiva, a presunção do cometimento de um


delito, de per si, não evidencia a alegada "periculosidade" do agente ou
"abalo da ordem pública", que demandem sua segregação antes de
qualquer condenação definitiva transitada em julgado.

Em outras palavras, para submeter alguém à prisão cautelar,


resta imprescindível a fundamentação concreta, sob as balizas do art. 312 do
Código de Processo Penal, pois a mera invocação da gravidade abstrata do
delito ou da necessidade de garantir a ordem pública não são suficientes
para legitimar o aprisionamento precoce, que mais parece uma execução
antecipada de pena.

A necessidade de segregação do acusado com vistas à


garantia da ordem pública, com fundamento em uma probabilidade de que
este volte a delinquir, por si só, não embasam tal prisão, tendo em vista a
inexistência de riscos concretos de reiteração criminosa, caso a liberdade do
paciente seja restabelecida, posto que, não há motivos que indiquem
possível reiteração, especialmente porque ostenta trabalho lícito, que é de
onde vêm os recusrsos de seu sustento.

Por conseguinte, a primariedade do paciente deve militar em


seu favor, não podendo-se presumir que, em liberdade, voltará a delinquir,
sendo que jamais foi preso, investigado ou processado.

Excelências, não basta a mera alegação de aumento do


delito de tráfico na comarca, que este atormenta a sociedade e gera abalo
na ordem pública. É imprescindível que se demonstre de maneira clara e
concreta, como a conduta imputada ao paciente se reveste de tamanha
gravidade ante seu modus operandi.

Observe-se, portanto, Excelência, que a prisão cautelar deve


ser revogada, ante a desnecessidade de aplicação da medida mais gravosa
prevista na legislação processual.

Nesse exato sentido, recentíssimo julgado proferido pelo


Supremo Tribunal Federal:

Agravo regimental em habeas corpus. 2. Tráfico de drogas


(art. 33, caput, da Lei 11.343/2006). 3. Liberdade provisória.
Possibilidade. [...] Na linha da jurisprudência deste Tribunal,
porém, não basta a mera explicitação textual dos requisitos
previstos, sendo necessário que a alegação abstrata ceda à
demonstração concreta e firme de que tais condições se
realizam na espécie. Dessarte, a tarefa de interpretação
constitucional para análise de excepcional situação jurídica
de constrição da liberdade exige que a alusão a esses
aspectos esteja lastreada em elementos concretos,
devidamente explicitados. 4. Réu primário, sem antecedentes.
Ausência de alteração fática. 5. Inexistência de argumentos
capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo
regimental desprovido. (HC 195990 AgR, Relator(a): GILMAR
MENDES, Segunda Turma, julgado em 24/02/2021, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-038 DIVULG 01-03-2021 PUBLIC 02-03-2021)
Some-se a isso o fato de que o julgador utilizou em sua
argumentação para a insuficiência de aplicação das medidas cautelares
diversas da prisão ao acusado, o princípio da proibição da proteção
deficiente.

Ora, cabe frisar aqui, Excelência, que a não aplicação das


medidas cautelares do art. 319 do Código de Processo Penal é medida
desproporcional.

Em que pese a reprovabilidade social das condutas, não se


verifica exacerbada gravidade ou periculosidade do paciente que
recomendem a manutenção da prisão cautelar.

Dito isso, entendemos que não são suficientes as razões


invocadas pelo juízo de primeiro grau para embasar a prisão preventiva do
paciente, uma vez que não foram expostos de forma concreta nos autos os
argumentos que indicam o periculum libertatis, uma vez que a quantidade
de drogas apreendida, por si só, não deve ser suficiente para manutenção
da prisão cautelar do paciente, que, frise-se, é primário e nunca teve
qualquer condenação ou investigação em seu desfavor.
Por derradeiro, Excelência, deve-se registrar que, ainda que
condenado pelo delito em análise, é muito provável que seja beneficiado
pelo denominado tráfico privilegiado, razão pela qual sequer teria que
cumprir pena privativa de liberdade, tendo em vista eventual pena aplicável
e a possibilidade de substituição da pena de prisão, o que torna a prisão
cautelar desnecessária e mais gravosa, em afronta ao princípio da
homogeneidade.
Neste sentido, entendemos que a revogação da prisão
cautelar é a medida mais justa e adequada neste momento.

III.II DAS MEDIDAS CAUTELARES QUE SÃO SUFICIENTES PARA O


PRESENTE CASO.

Por fim, Excelência, a prisão preventiva só deve ser decretada


quando as medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP se mostrarem
insuficientes, pois a prisão cautelar – que não deve se confundir com a prisão-
pena – não detém o objetivo de atribuir punição ao agente.

A finalidade específica do cárcere cautelar deve ser


justamente a de possibilitar o desenvolvimento válido e regular do processo
penal. Vale dizer, somente há de ser decretado quando houver nos autos
elementos concretos que indiquem a real possibilidade de obstrução na
colheita de provas ou quando o agente demonstre uma intenção efetiva de
não se submeter à aplicação da lei penal.

Assim, afirmações genéricas e abstratas sobre a gravidade do


delito não são bastante para justificar a custódia preventiva, principalmente
diante da existência de condições pessoais favoráveis ao paciente, como a
primariedade, endereço fixo no distrito da culpa e renda lícita.

Alternativamente, portanto, a Defesa requer a concessão de


liberdade provisória com aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.

Assim, apenas a título de exemplo, a Defesa entende que são


suficientes as medidas de comparecimento periódico em juízo (inciso I),
proibição de ausentar-se da comarca sem autorização (inciso IV),
recolhimento domiciliar (inciso V) e monitoramento eletrônico (IX), previstas no
art. 319 do CPP.

Além disso, a aplicação de medidas cautelares diversas terá


total eficácia, tendo em vista que (I) essas medidas poderão ser devidamente
monitoradas pelas autoridades locais, (II) o paciente permanecerá
devidamente representado nos autos por procuradores que zelarão pelo
devido andamento processual e (III) o paciente poderá participar de todos os
atos processuais inclusive de forma remota.

III.III. DA RECOMENDAÇÃO 62 DO CNJ.

Por fim, como se sabe, o CNJ recomendou que as prisões


cautelares sejam ainda mais excepcionais nesse momento de pandemia,
restringindo-se aos casos que envolvam grave ameaça ou violência, nos
termos do art. 8º, §1º, inciso, alíneas b e c, da referida recomendação.
Ademais, a Recomendação n. 62 foi renovada por mais seis
meses, conforme decisão do Ministro Fux, através da Recomendação n. 78, e
embora em sua decisão, a autoridade coatora, cite a estrutura para
atendimento médico periódico e controle epidemiológico na Unidade
Prisional Avançada de Brusque, é sabido por todos que neste momento, não
só o estado de Santa Catarina, mas todo o país passa por um aumento nos
casos de COVID-19, o que reforça ainda mais aplicação de tal
recomendação.

Em razão disso, por não se tratar de delito que envolva


ameaça ou violência, a Defesa reitera o pedido de concessão de liberdade
provisória, sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares que Vossa
Excelência entender necessárias para garantir a aplicação da Lei Penal.

IV. DOS DOCUMENTOS QUE ACOMPANHAM O WRIT.


Acompanham o presente Habeas Corpus os documentos a
seguir discriminados:
Ordem dos documentos Conteúdo
01 Inicial do Habeas corpus
02 Procuração
03 Antecedentes Santa Catarina
04 Antecedentes Paraná
05 APF
06 Decisão
07 Comprovante de renda
08 Comprovante de residência

V. DOS REQUERIMENTOS.
Ante o exposto, requer:

a) A concessão da ordem, de forma liminar, para que o


paciente possa usufruir do seu direito de responder ao processo em liberdade,
tendo em vista a ausência de justa causa para manutenção da prisão
cautelar; e
b) no mérito, que seja concedida a ordem de habeas corpus,
a fim de ratificar a medida liminar, revogando-se a prisão cautelar, sem
prejuízo da aplicação de medidas cautelares diversas.

Termos em que pede e espera deferimento.

Balneário Camboriú/SC, segunda-feira, 15 de março de 2021.

Assinado digitalmente por Gasparino Corrêa, OAB/SC 53.085.

Anderson Muniz, OAB/PR 95.793.

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