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A Injustiça na Legal Aplicação das

Penas: A Discrepância no Tratamento


Estatal dispendido ao Ofendido e ao
Autor de Ilícitos Penais e a Ausência
de Reparação do Dano à Vítima
01/12/2015

Resumo: O atual sistema carcerário pátrio, alvo de insatisfações jurídico-políticas,


demonstra-se defasado e inadequado ao escopo de prevenir a reincidência. Há vasta
(des)informação alardeada pelos meios de comunicação brasileiros, de que “cadeia”
(conotativamente chamado o sistema carcerário) é sinônimo de justiça. Neste cenário,
enquanto cresce o debate quanto à proteção aos direitos dos encarcerados, parcos são os
debates a cerca da reparação (ou ao menos minoração) dos efeitos dos ilícitos sob a
ótica dos ofendidos. Deste modo, a louvável luta de proteção ao encarcerado é
prioridade, enquanto perecem sem qualquer acompanhamento público, os direitos dos
ofendidos, gerando a descrença no poder judiciário, a marginalização dos egressos do
sistema carcerário e o aumento da sensação de impunidade, o qual finda na reincidência
da prática de ilícitos.

Palavras-chave: Pena; Aplicação; Legalidade; Justiça; Igualdade.

Abstract: The current parental prison system, subject to legal and political


dissatisfaction shows up outdated and inadequate to the scope of preventing recurrence.
There is wide (mis) information vaunted by the Brazilian media, that "chain"
(connotatively called the prison system) is synonymous with justice. In this scenario,
while growing debate about protecting the rights of prisoners, meager are the debates
about the repair (or at least reduction) of the effects of illegal from the perspective of the
victims. Thus, the laudable protection fight the imprisoned is priority while perish
without any public monitoring, the rights of the victims, creating disbelief in the judicial
power, the marginalization of graduates of the prison system and the heightened sense
of impunity, which ends the recurrence of illegal practice.

Keywords: Feather; Application; Legality; Justice; Equality.

Sumário: 1. Introdução; 2. Das penas e da aplicação do cumprimento de sentença; 2.1.


Das penas; 2.2. O atual sistema de aplicação das penas; 2.3. A sentença; 2.4. Do
sincretismo; 2.5. Os efeitos das sentenças condenatórias; 2.6. A possibilidade de
reparação civil; 3. Dos direitos dos detentos e a atual política de assistência carcerária;
4. Dos direitos das vítimas e seus familiares; 5. as discrepâncias assistenciais ao
condenado e à vítima; 6. Conclusão; 7. Referências.

1. Introdução
A justiça por vezes é confundida como a aplicação pura da lei, quando na realidade a
mera aplicação dos preceitos normativos, nada mais é do que a legalidade.

O cotidiano hodierno faz entender que a aplicação da lei cabe à justiça, assim
vulgarmente chamado o Poder judiciário, enquanto cabe ao cidadão meramente
acompanhar aquele, fiscalizando-o para saber se o poder judiciário, por seus servidores,
vem cumprindo os prazos prescritos em lei, e assim fazendo justiça embasados
meramente na aplicação da norma friamente posta.

Conquanto a vida em sociedade é regida tanto por normas legais quanto por aquelas
que, nas palavras de Jean-Jacques Rousseau, compõe o contrato social ao qual todos os
seres humanos aderem compulsoriamente ao nascerem.

Ora, por certo o ordenamento jurídico tende a deixar uma sociedade órfã por com o
passar do tempo, não mais adequar-se aos ideias para qual a norma foi criada,
inexistindo inclusive os fatos que outrora foram tidos como ilegais.

Doutra banda persistem os ideais de justiça, os quais transpassam a sociedade, sendo de


caráter universal e existentes ainda quando não há norma positivada, pois este liga-se
mais intimamente ao indivíduo, somente nele existindo, enquanto a legalidade é exterior
aquele, necessitando dele para possuir um fim, uma utilidade.

2. Das penas e da aplicação do cumprimento de sentença

Tido como ineficiente, o sistema carcerário brasileiro vem sendo considerado como
sistema falido, pois por vezes fomenta uma desigualdade de tratamento entre o infrator e
a vítima, gerando discrepâncias legais que chegam a ser afronta ao estado democrático
de direito, pois põe a vítima com  menos assistência estatal que o próprio infrator.

Tal anomalia é vista pela população como impunidade, injustiça. Aos mais legalistas é a
mera e correta aplicação da norma posta. Aos humanistas, é o dever do Estado, pois
cabe a este promover a salvaguarda dos direitos dos detentos, aos quais foi tolhido
somente o ir e vir.

Aos juristas mais atentos, tal assistência exacerbada a população carcerária em


detrimento de um tratamento público de serviços caótico, e a patente afronta aos direitos
fundamentais. De nenhum modo pode ser confundida a salvaguarda legal de direitos
inerentes ao ser humano, com o protecionismo, sob pena de em poucos anos, ser mais
vantajoso cometer crimes do que ser um cidadão que respeita todas as normas e leis
vigentes.

Nada de absurdo, somente a realidade.

2.1. Das Penas

A Pena é o poder dever do Estado para punir um infrator da norma posta, em linhas
gerais é o modo de repressão, pelo poder público, à violação da ordem social
normatizada.
Portanto consiste numa punição imposta pelo Estado ao transgressor de uma norma
positivada, não podendo o Estado agir penalmente quando não há tipificação do ato
considerado como crime por vedação do Artigo 1º do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal, e do inciso XXXIX, do artigo 5º da Constituição
Federal da República Brasileira de 1988 – CFRB/88.

Assim, para cada crime cometido há uma sanção prevista, a qual deve ser aplicada pelo
Estado, incumbindo ao Ministério Público o dever de promover a ação penal pública,
sendo este o titular daquela por força do inciso I, do artigo 129, da CFRB/88. Contudo
na ação penal privada o ofendido tem tal incumbência.

2.2. O atual sistema de aplicação das penas

Atualmente o Juiz fixa a pena seguindo o preceito do Artigo 59 do Código Penal, ou


seja, “atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do
agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao
comportamento da vítima” e estabelece, conforme seja necessário e suficiente para
reprovação e prevenção do crime, “as penas aplicáveis dentre as cominadas; a
quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; o regime inicial de
cumprimento da pena privativa de liberdade; a substituição da pena privativa da
liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível”.

Portanto o quantum da pena depende de diversos fatores, não havendo limite certo e
determinado para tal fixação. Contudo há prazo para o cumprimento da pena privativa
de liberdade, conforme disposição do artigo 75 do Código Penal esse limite é de 30
anos.

Tal limite existe para impossibilitar que um infrator passe toda sua vida encarcerado,
pois assim não se cumpriria o escopo educacional e de ressocialização que é dotado o
sistema prisional pátrio.

2.3. A sentença

Segundo o novo conceito, instituído pela Lei nº. 11.232/2005, sentença é o ato do juiz
que implica alguma das situações previstas nos artigos 267 e 269 da Lei nº Lei
No 5.869, de 11 de Janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, assim elas podem
determinar a extinção do processo com ou sem resolução do mérito.

Quando aplicado o artigo 267 do Código de Processo Civil – CPC, o processo é extinto
sem solução de mérito, ou seja, não põe fim ao processo, pois ainda caberá recurso
dessa decisão. Gera coisa julgada meramente formal, o que possibilita ingresso de nova
ação pretendendo o mesmo objetivo, sendo também chamada de terminativa.

Nos casos do artigo 269 do CPC são as que resolvem o litígio, adentrando no mérito da
questão e solucionando-o, gerando coisa julgada material, o que impossibilita ingresso
de nova ação para decidir o mesmo mérito. É também chamada de definitiva.

2.4. Do Sincretismo
O sincretismo processual traduz uma tendência do direito processual, de combinar
fórmulas e procedimentos, de modo a possibilitar a obtenção de mais de uma tutela
jurisdicional, simpliciter et de plano (de forma simples e de imediato), no bojo de um
mesmo processo, com o que, além de evitar a proliferação de processos, simplifica (e
humaniza) a prestação jurisdicional, assim define o renomado professor Carreira Alvim
(2011, p. 111).

Portanto o sincretismo é a possibilidade de um mesmo juízo decidir pelas questões


derivadas da causa inicial, em um mesmo procedimento, tal como ocorre a execução
cível imediatamente após o transito em julgado da condenação.

Importante destacar que o termo sincretismo processual ganhou maior conhecimento


após a alteração do artigo 273, parágrafo 7º, do Código de Processo Civil, pela
lei 10.444/02.

2.5. Os efeitos das sentenças condenatórias

A sentença condenatória julga o processo com resolução do mérito, assim faz coisa
julgada material, sendo atacada somente por ação rescisória, em caso de trânsito em
julgado.

Com a condenação penal, é cominada sanção, a qual segue os parâmetros fixados no


Código Penal, Processual Penal e na Constituição Federal.

A interpretação do Código Penal à luz da Constituição Federal revela os seguintes


princípios basilares: a legalidade, devido processo legal, culpabilidade, lesividade,
proporcionalidade, individualização, humanização e valor social da pena,
subsidiariedade, fragmentariedade. Enfim, a lei penal brasileira é uma barreira de defesa
do indivíduo em face do poder punitivo do Estado.

Conquanto quando exacerbada esta proteção finda por ser similar a impunidade, muitas
vezes sendo consequência de penas brandas e cautela desmedida, o que torna a
população descrente quanto ao caráter punitivo dado aos atos tidos como crime.

2.6. A possibilidade de reparação civil

A reparação civil é feita basicamente através da indenização (que tem natureza


compensatória) e da restituição do bem jurídico o tanto quanto possível ao estado
anterior ao evento danoso.

Hodiernamente, a reparação civil por ilícitos penais não é tida como sincrética, mas
somente como possível, conforme disposição do artigo 63 do Código de Processo Penal,
no qual resta prevista a possibilidade de ação civil que vise indenização pelos danos
experimentados pelo ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Conquanto, esta matéria é controvertida.

“O juiz criminal tem obrigação, por força de lei, de fixar um valor mínimo para reparar
os danos causados por uma infração”. A decisão é da 4ª Câmara Criminal do Tribunal
de Justiça de Minas Gerais[1], que, por maioria, entendeu que a indenização reparatória
à vítima, embora seja matéria cível, deve ser inserida na sentença penal condenatória
por conta do artigo 387, inciso 4º, do Código de Processo Penal. Por ser norma cogente,
ou seja, independe da vontade do indivíduo, o juiz não pode deixar de apurar o valor.

Conquanto haja o decisum, o julgamento dos embargos foi apertado. Ficaram vencidos


os desembargadores Eduardo Brum, relator, e Júlio Cezar Guttierrez. Eles votaram no
sentido de que, apesar da reforma do CPP, com a alteração do inciso 4º do artigo 387, é
necessário que a vítima peça a indenização no processo, para que não haja lesão aos
princípios da ampla defesa e do contraditório e que seja avaliado o dano causado.

De acordo com o dispositivo do Código de Processo Penal, o juiz “fixará valor mínimo
para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos
pelo ofendido”. A norma permite que a vítima, satisfeita com o piso fixado pelo juízo
criminal, proceda com a execução do valor, sem impedir que ela discuta,
posteriormente, o valor total da reparação na esfera cível, impetrando ação civil ex
delicto, de acordo com o artigo 63 do Código de Processo Penal.

Tal posicionamento parece ser mais coerente, uma vez que a restitucio in integro deve
ser máxima quando há possibilidade, ou ao menos ser facilitada a compensação pelo
fato lesivo provocado pelo infrator.

Conforme o voto do desembargador Hebert Carneiro, que citou Audrey Borges de


Mendonça, no livro Nova Reforma do Código de Processo Penal, que diz que não há
violação ao princípio da inércia quando o juiz criminal fixa o valor mínimo na sentença
independentemente de pedido explícito. “Isso porque é efeito automático de toda e
qualquer sentença penal condenatória transitada em julgado impor ao réu o dever de
indenizar o dano causado. Não é necessário que conste na denúncia ou queixa tal
pedido, pois decorre da própria disposição legal o mencionado efeito. (…) No âmbito
penal, a sentença penal condenatória será considerada título executivo. O mesmo se
aplica em relação ao valor mínimo da indenização: decorre da lei, é automático, sem
que seja necessário pedido expresso de quem quer que seja”.

Deste modo, cumpre ressaltar que a indenização por danos materiais corresponde ao
valor patrimonial atingido e danificado, fixada pelo juízo criminal, não pode ser
confundida com a possibilidade de indenização por danos morais que será verificada em
juízo cível, sendo esta ultima uma forma de compensação em dinheiro pela lesão à
personalidade, nome, imagem, privacidade, ânimo psíquico, moral e intelectual da
vítima do ato lesivo.

3. Dos direitos dos detentos e a atual política de assistência carcerária

O sistema carcerário pátrio hodierno busca dar “nova chance” aos egressos do sistema
prisional, sob o argumento de que assim tornaria menor o risco de retorno a
delinquência.

Instituído pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, o programa “Começar de Novo” é


um dos principais projetos do Brasil para reintegração de ex-detentos.

“Desde sua criação, em 2009, já empregou mais de 2 mil ex-presidiários em empresas


públicas e privadas. Os ex-presos têm acesso às vagas por meio dos tribunais locais ou
pelo Portal de Oportunidades, ferramenta do site do CNJ. Mais de 300 empresas
parceiras cadastradas disponibilizam trabalho para quem já deixou a prisão ou está no
regime semi-aberto.”[2]

Atualmente é exponencial o crescimento do número de vagas oferecidas e das empresas


conveniadas ao programa, havendo envolvimento inclusive do Sistema “S” (SENAI,
SENAC), os quais profissionalizam o detento para melhor colocação no mercado de
trabalho, já que se estima que 70% da população carcerária sequer tem o ensino
fundamental concluído[3].

O CNJ também realiza o cadastramento de parentes de pessoas presas. Muitas vezes, a


família fica desestruturada quando o pai ou mãe vai para a prisão. Com o levantamento,
os familiares são encaminhados para receber benefícios e para concorrer a vagas de
trabalho. O sistema já está funcionando nos estados do Maranhão e de Minas Gerais.

Ademais, o Governo Federal promove assistência psicológica, médica, jurídica e


nutricional para todos os detentos, conforme comunica em seu sítio eletrônico, sendo
este um dos grandes avanços humanitários contemporâneos de nosso sistema prisional
atual.

“Os presos carentes contam com assistência jurídica integral prestada por 271
advogados. Quem quer estudar tem acesso à alfabetização e pode cursar o ensino
fundamental e médio. Há ainda salas de leitura, palestras e oficinas.  A FUNAP
também oferece cursos profissionalizantes com certificação.

A oportunidade de aprender um oficio ainda no regime fechado é importante para que


o detento já ganhe a liberdade em condições de assumir uma nova profissão.

A ONG Bem Querer oferece cursos na área da construção civil para internos da


Fundação Casa, de São Paulo. Além de capacitar os jovens com aulas técnicas, o
programa Construtores do Amanhã tem palestras e debates sobre cidadania,
comportamento e voluntariado visando a formação global do aluno. Com a
qualificação, aumentam as chances de obter um emprego ao deixar a instituição.

A Pastoral Carcerária também tem papel importante na defesa dos direitos dos presos.
Em 1986, surgiu como serviço organizado da CNBB e passou a ter uma coordenação
nacional em 1988. Entre suas atividades estão visitas, apoio jurídico, assistência às
famílias e acompanhamento de denúncias de violação dos direitos humanos.”

A título de exemplo, em estudo já realizado e publicado, no Estado do Amazonas


estima-se que cada detento, mensalmente custa entre R$ 1,7 mil a R$ 2,3 mil reais[4],
sendo ainda assegurado auxílio Reclusão no valor de R$ 1.089,72 (um mil e oitenta e
nove reais e setenta e dois centavos) até R$ 4.663,75 (quatro mil seiscentos e sessenta e
três reais e setenta e cinco centavos), conforme portaria interministerial nº 13, de 9 de
janeiro de 2015[5], nos casos em que forem devidos tais pagamentos, conforme
legislação vigente.

Portanto um único detento no Estado do Amazonas pode custar ao erário o valor de R$


6.963,75 (seis mil novecentos e sessenta e três reais e setenta e cinco centavos) mensais.
4. Dos direitos das vítimas e seus familiares

Contracenso ao anteriormente narrado há a posição da vítima e seus familiares.

O atendimento público de saúde é dado pelo Sistema Único de Saúde – SUS, o qual
criado em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, tornou o acesso gratuito à
saúde direito de todo cidadão.

Até então, o modelo de atendimento era dividido em três categorias: os que podiam
pagar por serviços de saúde privados, os que tinham direito à saúde pública por serem
segurados pela previdência social (trabalhadores com carteira assinada) e os que não
possuíam direito algum.

Com a implantação do sistema, o número de beneficiados passou de 30 milhões de


pessoas para 190 milhões. Atualmente, 80% desse total dependem exclusivamente do
SUS para ter acesso aos serviços de saúde[6].

Ademais, o SUS responde não apenas pelos atendimentos médicos, mas clínicos,
psicológicos, e nutricionais da maior parte da população brasileira, conforme
anteriormente aferido.

Não obstante é o fato de que o sistema público de saúde não suporta o quantitativo de
atendimentos necessários a população, sendo frequentes os escândalos envolvendo
fraudes e até mesmo mortes por precariedade ou até ausência de atendimento.

Doutra banda, incumbe salientar o sistema público de ensino, o qual é incapaz de tirar
9,7 milhões de brasileiros do analfabetismo[7], demonstrando assim que ainda está
longe de ser um serviço adequado.

Igualmente seguem os índices de trabalho e emprego, devido a ausência de qualificação


da mão de obra.

Insta salientar que igualmente vexatórios os dados quanto a assistência pública dos
ofendidos e vítimas de crimes. Atualmente uma pessoa agredida fisicamente deve ser
submetida a exame de corpo de delito, pois por ser crime material, a ofensa a
integridade deve ser atestada por médico perito, sob pena de a ação ser arquivada.

Deste modo, há submissão do ofendido ao sistema público de saúde!

Fato pior ocorre nos casos onde há estupro, pois geralmente são crimes com violência
exacerbada, exigindo que as vítimas passem pelo constrangimento de contar em
depoimento o ocorrido. Após devem ser submetidas as avaliações periciais, narrando
novamente o ocorrido. Em seguida devem receber tratamento médico para evitar
contaminação por doenças sexualmente transmissíveis, e assim utilizam da rede pública
ineficiente para seu atendimento e tratamento posterior.

Assim, a vítima e toda sua família estão sempre a mercê dos atendimentos públicos, que
muitas vezes demonstram-se lentos, morosos, incompletos e atormentadores.
Outro fato que merece relevância é o tratamento dos direitos, pois quando o ofendido
sofre o ilícito, deve comunicar o ocorrido a autoridade policial, assim o Ministério
Público que tem a função de titular da ação penal pública, inicia a persecução penal.

Conquanto a vítima é tida como mero elemento dentro do contexto criminoso, sendo
ínfimo o tratamento aquela, pois apensar de poder, o parquet não encaminha as vítimas
para assistência médica, não realiza acompanhamento psicológico e nem da saúde do
ofendido.

De igual modo agem os direitos humanos, assim conhecidos os órgãos assistenciais


mantidos pelo Estado, os quais evocados para manifestarem acerca de um determinado
ilícito, geralmente tomam posição neutra, não agindo para a salvaguarda dos direitos da
vítima, a qual deve a todo instante buscá-los para ter atendimentos que aliviem o trauma
sofrido pelo evento penal.

5. As discrepâncias assistenciais ao condenado e à vítima

Inicialmente frisa-se o salário mínimo nacional é notoriamente incapaz de suprir


necessidades como alimentação, vestuário, educação, saúde, transporte e outras que são
tidas como essenciais para a salvaguarda da dignidade da pessoa.

Conforme indicadores do IBGE cerca de 16,2 milhões de pessoas estão abaixo linha de
pobreza[8], ou seja, sequer recebem o valor de um salário mínimo mensal, já que assim
são considerados aqueles brasileiros que tem renda per capta igual ou inferior a R$
70,00 (setenta reais).

Ainda mais preocupante é saber que no caso de um trabalhador, que labora em regime
celetista e percebe um salário mínimo (R$ 788,00 em 2015), ao praticar um crime e ser
conduzido à cadeia, passa a perceber auxílio-reclusão no mesmo valor do mínimo
nacional. De certo que tal benefício é destinado a seus familiares, conquanto resta um
paradoxo de difícil entendimento.

Assim, verifica-se a diferença econômica entre o detento e o cidadão que não pratica ato
ilícito, sendo ainda tratado este tema como tabu pelos magistrados, os quais não exaram
decisões contrárias ao texto de lei, sendo meramente legalistas e não operadores do
direito.

Isto pelo fato de que ao ofendido, assim como à sua família, não são assistidos in
totum os direitos que lhes são conferidos por justiça, como a reparação material pela
ofensa, sendo esta pela retromencionada fixação de quantum indenizatório já em juízo
criminal.

Além disto, há diferença quanto ao atendimento dispensado ao infrator e à vítima e seus


familiares, pois enquanto a comunidade carcerária tem sistema de proteção para seus
interesses, inclusive dezenas de Organizações Não Governamentais, o Estado mantém
somente os sistemas públicos de atendimento para minimizar os efeitos danosos
causados às vítimas de ilícitos penais, os quais cada vez mais se demonstram ineficazes.

Ora, se os órgãos de atendimento e salvaguarda de direitos humanos buscam o melhor


atendimento das pessoas humanas, por qual motivo atendem primordialmente, por vezes
somente, a população carcerária? Deveriam então denominar “direitos dos detentos
humanos”

Os esforços governamentais se demonstram cada vez menos eficazes no combate a


criminalidade, sendo patente que maiores investimentos na população carcerária não são
uma saída plausível para a realidade que afronta a sociedade.

6. Conclusão

Por todo o exposto, cumpre salientar que os esforços penais para ressocialização dos
detentos não ocorre com eficácia, mas constituem mecanismos legais que tutelam a
discrepância de atendimento pós crime entre o agente infrator e o ofendido, pois ao
infrator há toda uma malha governamental que salvaguarda seus direitos e interesses,
inclusive de seus familiares, enquanto ao ofendido resta o atendimento público
judiciário, de saúde, educação, e outros necessários a reparação do ilícito sofrido.

Ora, a sociedade brasileira cresce e avança rumo a uma política carcerária


assistencialista, pois as normas legais, friamente aplicadas podem sugerir que ao
trabalhador que, recebendo um salário mínimo, queira aumentar os rendimentos mensais
de sua família, basta cometer crime e solicitar auxílio-reclusão, sendo majorado o valor
de seus rendimentos mensais em quase metade.

Por certo que todos os seres humanos merecem dignidade de atendimento dos seus
direitos e proteção de seus interesses, todos! Contudo a atual atenção dispensada pelo
Estado nas causas criminais demonstram esforços em um sentido de proteção
exacerbada ao infrator em detrimento ao ofendido e seus familiares.

Logo, o mais aceitável nesta conjuntura, seria a reparação pelo ilícito praticado, onde o
infrator fosse compelido a ressarcir aquilo que lesionou, sempre sendo assegurado o
direito a reparação por danos morais ao ofendido, quando couber.

Contudo a mera aplicação das leis demonstra-se obstáculo ainda maior aos problemas
narrados, sendo necessária a interpretação também em favor do ofendido, rompendo
assim com a mera legalidade, a qual hodiernamente é empecilho que obsta o vislumbre
de justiça, quando vista a aplicação da lei sob a ótica do ofendido.

Referências
BITTENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão – Causas e alternativas. 2ª
Ed. Saraiva. Rio de Janeiro. 2001
MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. 4ª Ed. Ver. Atual. Ed. Saraiva. São Paulo
2007.
REALE JUNIOR, Miguel. Novos rumos do sistema prisional. Forense. Rio de Janeiro.
1983
HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Có

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