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O Direito Processual Penal constitui (direito adjectivo), em certo sentido uma parte do direito penal (direito
substantivo), isto é, o direito processual penal pode ser entendido como sendo o conjunto de normas que
concretiza a execução das penas do direito penal. Assim sendo, as normas do direito criminal só se aplicam
com o concurso do direito processual penal.
O direito penal na sua essência cumpre uma função específica de protecção dos bens fundamentais de uma
comunidade, que directamente se prendem com a livre realização da personalidade ética do homem e cuja
violação constitui o crime. Como quer que se concebam os poderes do Estado e a articulação destes com a
preservação da esfera de liberdade pessoal dos cidadãos, e por melhor que se cumpram os esforços de uma
política social preventiva e profilática, é seguro não poder o Estado demitir-se do seu dever de perseguir e
punir o crime e o criminoso, ou sequer negligenciá-lo, sob pena de minar os fundamentos em que assenta a
sua legitimidade. Daquela função de protecção da ordem social (de protecção da vida comunitária do
homem) advém por conseguinte ao Estado o dever de administração e a realização da justiça penal.
Este dever é o corolário da necessidade, pelo Estado sentida, de tomar sobre os seus ombros, de forma
exclusiva, a tarefa de investigar, esclarecer, perseguir e sentenciar os crimes cometidos dentro da sua
“jurisdição”; é só, por diferentes palavras, a outra face do princípio da exclusão da autodefesa ou princípio
do monopólio estadual da função jurisdicional, que constitui uma exigência irrenunciável das sociedades
modernas, fundado como é por valores tão essenciais como os da realização da justiça, da unidade do
Estado e da paz jurídica e social.
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Gilberto Luciano Alfazema
Escrivão de Direito
luciano.alfazema@gmail.com
Aulas de Direito Processual Penal II GWAZA-2024
Só́ num estádio ulterior da evolução surge o instituto jurídico da arbitragem, primeiro com caracter
facultativo e privado (o arbitro não é um órgão do Estado, mas uma pessoa privada), depois obrigatória,
quando o Estado a favorece, disciplina e se reconhece suficientemente forte para a impor. Mais tarde a
arbitragem, que já era obrigatória, passa também a ser pública, abrangendo inicialmente – mesmo no
domínio da justiça penal – só os casos jurídicos que mais directamente punham em causa a existência do
Estado, depois a maioria deles, finalmente todos. Neste momento pode começar a falar-se, com sentido, do
monopólio estadual da administração da justiça, passando paralelemente a reconhecer-se aos particulares a
faculdade de recorrer a órgãos do Estado para defesa dos seus direitos.
O princípio do monopólio estadual da função jurisdicional constitui hoje um alicerce inatacável de todas as
sociedades, o que não significa, no entanto, total exclusão da autodefesa, mas o reconhecimento da sua
admissibilidade só em casos muito excepcionais, rigorosamente delimitados pela lei e subordinados a ideia
da impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática
do direito conforme se pode ler do artigo 336 do Código Civil.
De acordo com as palavras do Professor Figueiredo Dias o direito penal serve a aludida função de proteger
os bens e valores fundamentais da comunidade através da prevenção de lesões que sejam de recear no
futuro (função preventiva) e da punição de lesões que tiveram já lugar (função repressiva). “Repressão” das
lesões não significa porém que se parta de um juízo de valor moral absoluto sobre a conduta e o seu agente,
ou sequer que a ele se aspire, mas apenas a utilização de um meio necessário para alcançar, de forma justa,
a protecção intentada a imposição e execução de uma pena justa é um instrumento imprescindível da
colectividade para a manutenção da paz e da ordem sociais. Deste modo, já a partir da função do direito
penal total se deixam perspectivar os três “sectores de um idêntico ordenamento jurídico” em que aquele se
divide: o direito penal substantivo (material); o direito processual penal (adjectivo ou formal); o direito de
execução das penas.
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O direito penal substantivo “estabelece, por forma geral e abstracta, quais os factos que devem ser
considerados crimes e quais são e quais as penas que lhes correspondem”. Ele contém nos seus “tipos” a
tipificação (individualização) do ilícito e da culpa de cada crime, e nas suas estatuições a consequência
jurídica que se liga à realização do tipo. Porém, a concretização do direito penal substantivo exige uma
regulamentação complementar que discipline a investigação e esclarecimentos do crime concreto e permita
a aplicação da consequência jurídica àquele que, com a sua conduta, realizou um tipo de crime.
É o conjunto de normas jurídicas que associam factos penalmente relevantes uma determinada
consequência jurídica, uma sanção jurídica ou, conjunto de normas jurídicas que fazem corresponder a uma
descrição de um determinado comportamento uma determinada consequência jurídica desfavorável.
A esses factos penalmente relevantes correspondem determinadas sanções jurídico-penais, que são
basicamente: As penas, e as principiais são; Prisão; Multa; As medidas penais, e as principiais são;
Medidas de segurança; Medidas de correcção, todas estudadas de forma cabal na cadeira de Direito Penal
ou Direito Criminal, conforme for o caso.
Esta regulamentação complementar é constituída pelo direito processual penal, que, implicando a fixação
das “condições e dos termos do movimento processual destinados a averiguar se um certo agente praticou
um certo facto e qual a reacção que lhe deve corresponder”, se pode funcionalmente definir como a
regulamentação jurídica da realização do direito penal substantivo, através da investigação e valorização do
comportamento do acusado da prática de um facto criminoso. Do exposto deriva que a relação entre direito
penal e direito processual penal é, sob diversos pontos de vista, uma relação mútua de complementaridade
funcional que, só ela, permite também concebê-los como participantes de uma mesma unidade, isto
significa que o direito processual penal visa a materialização do direito penal, aqui encontrando-se a
instrumentalidade estritamente funcional daquele perante este atendendo-se que o processo penal é
autónomo relativamente ao direito substantivo.
A estrutura do sistema processual penal vigente em Moçambique é basicamente acusatória, se bem que
integrada por um princípio de investigação. Isso implica que o tribunal só possa intervir quando solicitado
por uma acusação formulada por entidade dele distinta e independente (o Ministério Público), e que o
conteúdo da acusação delimite a própria actividade processual do tribunal.
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Existe assim uma identidade essencial entre o conteúdo da acusação, a pronúncia e a sentença final, que
constitui importante garantia para o arguido, na medida em que só terá de defender-se do que é acusado (e
pronunciado) e só pelo que é acusado poderá ser julgado.
Disto resulta que a sentença final, salvo casos excepcionais que a lei expressamente prevê, só pode
condenar por factos constantes do despacho de pronúncia ou equivalente. É o que dispõe o art. 447 do
C.P.P: “O tribunal poderá condenar por infracção diversa daquela por que o réu foi acusado, ainda que seja
mais grave, desde que os seus elementos constitutivos sejam factos que constem do despacho de pronúncia
ou equivalente.
No comentário a este preceito legal, BELEZA DOS SANTOS escreve: ‘’Este limite imposto ao tribunal de
julgamento representa uma justa garantia para o réu e tem uma justificação fácil de ver. O réu não deve
ser surpreendido por uma imputação de factos feita na audiência de julgamento e tomada em consideração
na sentença, quando por tais factos não foi anteriormente pronunciado e não pode, por isso, organizar e
deduzir a sua defesa a tal respeito. A lei ordena a notificação do despacho de pronúncia ou equivalente ao
réu, sob pena de nulidade (...) precisamente para que ele possa ter conhecimento dos factos que lhe são
imputados, e com tempo necessário prepare a sua defesa. Por isso, haveria uma flagrante incoerência e
um manifesto contra-senso na lei se ela permitisse que o réu fosse condenado por factos diversos daquelas
que constassem da acusação de que foi notificado e de que lhe deram cópia, por factos de que ela
desconhecia e que lhe viriam a ser imputados na audiência de julgamento e na sentença”.
Depois do que ficou dito acerca das relações entre direito penal e direito processual penal, aceitar-se-á sem
custo ser o fim do processo penal o elemento que opera a relacionação funcional e teleológica daqueles
dois ramos de direito, ou seja, numa fórmula propositadamente neutral e incolor, a afirmação (realização)
do direito substantivo que corresponde ao objecto do processo. Com o que pouco se terá adiantado, no
entanto, relativamente ao que logo decore da mera consideração da função do direito processual penal.
Quando se pergunta pelo “fim” do processo penal pretende-se alguma coisa mais: obter um critério de valor
(ou, se preferirmos, um modelo axiológico) adequado à interpretação teleológica das singulares normas e à
solução dos concretos problemas jurídico-processuais. Importa portanto ver-se, em que medida e com que
sentido ele se deixa determinar.
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Não se intenta legitimar assim a solução de problemas jurídicos concretos por deduções lógicas
retiradas da consideração do fim do processo: isso seria mero dedutivismo conceitualista, mesmo
que merecesse então o cognome de “teleológico”. Pretende-se, antes, a revelação das grandes
relações (enquadramentos) funcionais entre as singulares normas e problemas jurídico-processuais
e a totalidade da ordem jurídica; o que, se não serve para dar ao juiz a solução que lhe falte para
um certo problema concreto, ajuda ao esclarecimento dos pressupostos últimos, na base dos quais
hão-de ser encontrados os critérios básicos de solução dos problemas concretos. Só neste quadro
amplo se torna compreensível, por forma justa, a querela à volta do fim do processo penal.
Um marco fundamental na questão foi posto por alguns autores ao assinalar como fim do
processo, fosse penal ou civil, a obtenção de uma sentença com força de caso julgado. Deste
modo, todavia, não só se opera uma insuportável cisão entre direito substantivo e direito
processual, como, sobretudo, acaba por impedir-se a obtenção de qualquer critério de valoração
das normas e problemas processuais. O juiz possuiria, através da força de caso julgado cabida à
suas decisões, poder e legitimidade bastante para impor uma espécie de “segundo ordenamento”
que, pairando sobre o direito material, nunca poderia ser falso, injusto ou inválido: o caso julgado
constituiria, digamos, a última palavra e a última ratio da juridicidade. Além de que a tradução
deste fim no plano ideal conduziria a uma terminante acentuação do valor da segurança jurídica,
em completo detrimento do outro valor que com ele necessariamente conflitua no processo: o da
justiça.
Deixando fora de consideração concepções como é sobretudo o caso da que vê o fim do processo
na afirmação, exercício ou execução dos direitos subjectivos materiais que só são defensáveis em
processo civil e não num processo, como o penal, em que não pode falar-se de um direito
subjectivo do Estado à aplicação da pena”. Afirma-se correntemente que esta questão tem de
perspectivar-se relativamente a um fim ideal, perante o qual quaisquer categorias intraprocessuais
vêm a revelar-se meros “meios” de o realizar. E assim se criou o consenso, praticamente unânime
e de que a nossa jurisprudência se faz eco, de que o verdadeiro fim do processo penal só pode ser a
descoberta da verdade e a realização da Justiça (ou mesmo desta última, já que também perante ela
surge a descoberta da verdade como mero pressuposto).
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A justiça é, por certo, fim do processo penal, no sentido de que este não pode existir validamente
se não for presidido por uma directa intenção ou aspiração de justiça. Isso não obsta, porém, a que
institutos como o do “caso julgado”, ou mesmo princípios como o in dúbio pro reo,
indiscutivelmente de reconhecer em processo penal, possam conduzir, em concreto, a condenações
e absolvições materialmente injustas. Continuar a afirmar, perante hipóteses destas, que a justiça
foi, em absoluto fim do processo penal respectivo, pode ser ainda ideal e teoricamente justificável
– v. g. porque se argumente que as exigências de segurança surgem ainda como particular modus
de realização do Direito e, por conseguinte, do “justo”, quando este se lança no contexto amplo de
todos os interesses sociais conflituantes, mas é também, seguramente, renunciar à obtenção de um
critério prático adequado de valoração das normas e problemas processuais.
Também a segurança é como acabamos de verificar um fim do processo penal. O que não impede
que institutos como o do “recurso de revisão” (artigo 673 CPP e seguintes) contenham na sua
própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce
que só dificilmente se poderia exigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do
processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a
justiça; e, prevalecendo sempre os sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança
do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança
aparente e ser só, no fundo, a força da tirania.
Na determinação do fim ideal do processo há ainda, por conseguinte, de subir mais um degrau
relativamente aos puros valores da “justiça” e da “segurança”, não cedendo à tentação fácil de os
absolutizar: é um facto comprovado nada haver de mais perigoso que a absolutização de valores
éticos singulares, pois, ai se inscreverá a tendência irresistível para uma santificação dos meios
pelos fins. Importa sim reconhecer que se está aqui, como em toda a autêntica “questão-de-
direito”, mesmo no cerne de uma ponderação de valores conflituantes, cujo resultado há-de
corresponder ao ordenamento axiológico do Direito, há-de constituir a síntese das antinomias entre
justiça e segurança encontrada no degrau mais elevado da ordem jurídica.
Vimos acima que o processo penal visa a aplicação do direito penal substantivo aos casos
concretos. Essa função instrumental que lhe é característica exprime-se de forma simples nestas
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duas máximas latinas: impunitum non relingui facinus (nenhum criminoso deve ficar sem
punição) e innocentum non condemnari (nenhum inocente deve ser condenado).
De acordo com uma certa maneira de encarrar o direito, e o processo penal em particular, a
aludida natureza instrumental impõe a este, como fim a prosseguir, a ideia de realização da justiça,
que só é possível obter com a descoberta da verdade material e o restabelecimento da paz jurídica
violada.
A função essencial do direito processual penal cumpre-se, na decisão jurisdicional de saber se foi
praticado um crime e, em caso afirmativo, qual a consequência jurídica que dai deriva.
Formalmente considerado, o direito processual penal surge como o conjunto das normas jurídicas
que orientam e disciplinam o processo penal. A função essencial deste cumpre-se na decisão sobre
se, na realidade, se realizou em concreto um tipo-legal de crime, em caso afirmativo, na decisão
sobre a consequência jurídica que dali deriva.
Quanto à concreta execução da consequência jurídica decretada no processo penal, tem-se dito que
a sua índole é inteiramente administrativa, pelo que o direito que a regula e a que por vezes se
chama “direito penitenciário”, mas cuja designação exata será a de direito de execução das penas
(ou das reacções criminais), não sendo assunto respeitante à administração da justiça, não poderia
nunca pertencer ao direito processual penal: este terminaria com o trânsito em julgado da sentença.
Esta concepção peca, ao que nos parece, por demasiado estrita. Como por demasiado ampla pecará
a uma concepção que integre no direito processual penal todo o direito de execução das penas; não
tanto por se tratar aqui de matéria não integralmente jurisdicionalizada, como porque a sua
regulamentação revela, em larga medida, características jurídico-substantivas.
Exacta nos parece ser a distinção, dentro do direito de execução das penas, da regulamentação
directamente atinente à determinação prática do conteúdo da sentença condenatória e, portanto, à
realização concreta da reacção criminal naquela imposta: aqui tratar- se-á de matéria substantiva; e
da regulamentação imediatamente respeitante ao efeito executivo da sentença (num sentido
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análogo àquele em que, no processo civil, se fala da “exequibilidade da sentença”) e, portanto, aos
preliminares e ao controlo geral da execução (neste compreendidos os chamados “incidentes da
execução”: aqui estaremos perante matéria processual, que cabe intrinsecamente ao direito
processual penal e que só por razões meramente técnicas dele pode ser distraída.
Neste sentido, certos autores entendem que o seu âmbito de aplicação se esgota com o trânsito em
julgado da sentença, já não abrangendo a fase de execução da pena, que teria índole puramente
administrativa. Outros, pelo contrário, sustentam que o direito processual penal, pese embora a
circunstância de à administração penitenciária estar reservada uma esfera de actuação própria, que
pode dizer-se “livre da jurisdição”.
Nesta última corrente se situa FIGUEIREDO DIAS, para quem no entanto, é necessário distinguir
a regulamentação respeitante à determinação prática do conteúdo da sentença condenatória e, por
conseguinte, à realização concreta da pena imposta, da regulamentação referente ao efeito
executivo da sentença (num sentido análogo àquele em que, no processo civil, se fala da
exequibilidade da sentença) e, consequentemente, aos preliminares e ao controlo geral da
execução (incluindo os incidentes da execução). No primeiro caso, tratar-se-á de matéria
substantiva e, no segundo, de matéria processual.
Ao se referir que o direito penal centra o seu estudo nas condutas sociais penalmente relevantes e
consequentemente aplicar uma sanção devida, em processo penal os factos que são o pressuposto
da aplicação da lei penal constituem o fundamento de facto da sentença, e determinam a
graduação da responsabilidade. As provas em processo penal constituem grandes instrumentos
para a realização do fim do processo. No nosso ordenamento jurídico encontramos vários tipos de
provas, bem como ciências que auxiliam o processo penal para a sua efectivação. Neste contexto,
para garantir a segurança dos meios de prova necessários à prossecução do processo e assegurar a
exequibilidade da decisão final, a lei prevê a aplicação de medidas coercitivas que restringem a
esfera jurídica individual daqueles a quem se dirigem. Através destas medidas, aos órgãos
competentes lhes são atribuídas competências legais para actuarem nos devidos termos para
assegurar a realização do Direito. Desde já, deve-se salientar que quando um cidadão passa a ter o
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Referiu-se a propósito do objecto do processo penal que el se destina a aplicar o direito ao caso
concreto. E esta actividade de aplicação do direito tem por objecto realidades de facto. Na
verdade, a lei prevê em abstracto uma hipótese e, seguidamente, indica qual o seu tratamento
jurídico. Assim, a aplicação da norma pressupõe a verificação da hipótese de facto prevista.
Dispõe o artigo 341 do Código Civil que “as provas têm por função a demonstração da realidade
dos factos”. Demonstrar a verdade dos factos é alcançar um juízo de certeza sobre os mesmos
factos.
Objectivos específicos
A decisão judicial – meta que o processo visa a alcançar consta de duas partes: a verificação dos
factos que condicionam a aplicação da lei, e a própria aplicação da lei. Não basta, assim, o
conhecimento da ciência jurídica para proferir uma boa sentença, mesmo que erudita. É necessário
algo mais. A justeza da decisão assenta primordialmente na verdade dos factos admitida como
pressuposto da aplicação do direito.
Ao fazer referência sobre o juízo de certeza, é necessário considerar duas realidades distintas: o
juízo lógico e o juízo histórico. O juízo lógico respeita à exactidão dum raciocínio, duma operação
mental, conduz necessariamente a uma certeza absoluta. O juízo histórico reporta-se à verificação
de um facto e, por essa razão, pode não conduzir a um resultado seguro. Não acarreta uma certeza
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absoluta, mas relativa; não mera certeza objectiva, mas uma opinião de certeza que não está,
todavia, isenta de falhas. Tanto assim é que o juízo histórico pode ter por simples resultado a
dúvida.
O juízo lógico é hipotético, dá como verificadas certas premissas (os pressupostos do facto) e
incide sobre as relações daquelas com a conclusão.
O juízo histórico é um juízo real, tem por objectos aquelas premissas, não incide sobre uma
relacionação abstracta, mas sobre uma realidade concreta.
De um modo geral, a distinção entre juízo lógico e histórico corresponde à distinção entre o juízo
de direito e o juízo de facto. O juízo de facto é um juízo histórico.
Do que ficou dito, extrai-se que a prova não conduz à certeza objectiva, à certeza absoluta. Na
verdade, ela não está ao alcance dos meios inseguros de que o homem dispõe. A única meta
possível é a certeza moral, a presunção de verdade, ou seja, a verdade relativa.
Deste modo, impõe-se, na busca da verdade material a adopção de uma postura de humildade, pois
que o homem não logra alcançar totalmente o fundo das coisas, no reino da verdade. Por isso, o
esforço na sua busca nunca é desmesurado. Assim, a convicção terá de obter- se por um caminho
de prudência já que o risco de erro está sempre presente acompanhando a certeza humana
subjacente ao juízo histórico.
Temos, assim que o fim da prova é a demonstração da verdade dos factos, alicerce da convicção
sobre a sua existência que, por sua vez são o pressuposto da aplicação da lei.
Em processo penal os factos que são o pressuposto da aplicação da lei penal constituem o
fundamento de facto da sentença, quer absolutória, quer condenatória, e determinam a graduação
da responsabilidade. São, numa palavra, o crime, nos seus elementos constitutivos essenciais, quer
positivos, quer negativos ou impeditivos; e nas suas circunstâncias, a personalidade do agente do
crime, na medida em que o facto criminoso não é algo de separável, nem mesmo em abstracto, do
seu autor.
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Espécies de prova
A prova pode ser de distinta natureza. A prova é pessoal quando resulta de um acto da pessoa (o
testemunho, a declaração pericial). É real quando resulta da observação de coisas (o documento, o
instrumento do crime).
Na prova pessoal, o meio de prova é o homem, enquanto na prova real, uma coisa. Quando o
homem é tomado como objecto de observação ou exame, não é meio de prova pessoal, mas real.
Tanto as testemunhas como os declarantes narram no processo, por conhecimento dos sentidos,
factos jurídicos relevantes. É comum o conhecimento de tais factos ser obtido através da visão ou
audição mas é igualmente testemunho o que provenha dos demais sentidos, desde que se revele
apropriado para a prova dos factos. O testemunho pode ser directo ou indirecto, consoante se
reporta imediatamente aos factos probandos, ou aos meios de prova destes factos (testemunho de
vista, de ouvir dizer, em gíria popular).
A declaração das testemunhas, por mais objectiva que ela seja, não está isenta de induções ou
juízos da própria testemunha; os factos passam pela consciência da testemunha e são reproduzidos
ou narrados por ela. O relato é naturalmente a expressão do modo como a testemunha os pode
compreender, daí resultando as dificuldades que acompanham a apreciação da prova testemunhal.
Em processo penal não há prova pré-constituída. A prova tem de buscar-se onde ocasionalmente
se encontre. Os delinquentes procuram normalmente evitar a existência de qualquer prova, donde
a impossibilidade de excluir da instrução qualquer meio probatório. Por isso, podem ser ouvidas
no processo todas as pessoas, até os anormais não interditos. No entanto, a apreciação da prova
terá de ter em linha de conta a maior ou menor credibilidade das várias declarações.
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incapazes para depor são os interditos por demência e os menores com absoluta incapacidade
natural (artigo 216, nos 1 e 2, e § 2 do mesmo artigo do C. P. Penal).
Declarantes são, além dos menores de 7 anos, todas as pessoas referidas nos nos 3 a 6 e § 1 e 2 do
artigo 216. Os declarantes só são ouvidos quando o juiz assim i entender.
São os seguintes deveres que a lei impõe às testemunhas e declarantes: o dever de comparência, o
de depor e o de prestar juramento ou compromisso de honra.
a) Dever de comparência
b) Dever de depor
Os artigos 241 e 238 do C. P. Penal impõem às testemunhas e declarantes o dever de depor em
conformidade com a verdade. A recusa é, no entanto, permitida em relação a todo o depoimento,
tratando-se das pessoas referidas no artigo 216 § 2, e em relação a parte do depoimento, por
respeito ao segredo profissional ou segredo do Estado, tratando-se das seguintes pessoas:
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- Funcionários púbicos, sobre factos que possam constituir segredo do Estado ou que, segundo a
Lei, não puderam ser revelados sem autorização superior (artigo 217 n2). O chefe do Estado
poderá usar do meio de declarar que não tem conhecimento dos factos (art. 625 n. 2, do C. P.
Civil). Os Ministros não depõem sobre segredo de Estado, o que deve ser invocado, pois que, por
maioria de razão, devem ser compreendidos na disposição relativa a funcionários;
- Quaisquer outras pessoas obrigadas a guardarem segredo profissional sobre os factos a que este
respeita (artigo 217 n. 3) ou sobre factos puníveis ou desonrosos por elas praticados ou por seus
descendentes ou ascendentes, irmãos, afins nos mesmos graus, marido ou mulher (artigo 218 e §
único.
Parece, porém, não ser de perfilhar a possibilidade de o falso testemunho ser punido
independentemente de ajuramentação prévia. Na verdade, o juramento é elemento essencial dos
depoimentos. A recusa de jurar equivale à recusa de depor (artigo 559, n. 3, do C. P. Civil).
Quanto às falsas declarações, o artigo 242 do C. P. Penal estabelece que podem ser prestadas com
juramento ou sem ele, fórmula que não existe no artigo 238 daquele diploma legal. Com efeito, a
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inaplicabilidade do artigo 238 aos depoimentos sem juramento tem sido sustentada por diversos
autores.
Nos depoimentos em corpo de delito, o artigo 231 é omisso quanto a sua exigência. Todavia, o § 1
do artigo 96 é positivo nesse sentido.
Quanto aos direitos das testemunhas e declarantes, não são de destacar o direito de audiência, o
direito à correcção do tribunal e o direito à indemnização.
a) Direito de audiência
Nos termos do artigo 231 do C. P. Penal, “as testemunhas serão perguntadas (...) acerca de todos
os elementos e circunstâncias da infracção, tempo, lugar e modo como foi cometida, fim com que
foi praticada, causa que a determinou, dano moral e material por ela produzidos e ainda sobre o
carácter, antecedentes, conduta e situação económica e social do arguido e do ofendido ...”. Deste
modo se enuncia, com bastante amplitude, o tema da inquirição em corpo de delito. Com isso,
pretende a lei evitar que seja desvirtuado o conhecimento da testemunha, mediante a fixação de
limites mais estreitos ao depoimento do que o efectivo conhecimento da testemunha.
Através dos artigos 236 e 436 salvaguarda-se a natureza pessoal do depoimento, ao conferir à
testemunha o direito de o redigir ou ditar para a acta.
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Não obstante o artigo 435 limitar a incidência da prova testemunhal aos factos alegados, essa
limitação só vale totalmente em relação ao objecto da acusação, pois que podem ser provados
factos dirimentes ou atenuantes, embora não tenham sido alegados (art. 446 § único);
Ao tribunal compete a protecção da honra e consideração das testemunhas, que são direitos de
personalidade. Daí a conservação dos segredos pessoais, de tal sorte que, nos casos em que
revelação se mostre conveniente para a prova do objecto do processo, se justifica a decisão da
audição da testemunha em audiência secreta. Assim se satisfarão os diversos interesses em jogo, e
ao mesmo tempo se obterá um depoimento mais livre e, porventura, mais sincero;
c) Direito a indemnização
As testemunhas (com exclusão dos declarantes) podem pedir uma indemnização, quando
chamadas a depor em audiência de julgamento (artigo 157 e § 1 do artigo 450 do C. P. Penal)
segundo o qual só têm direito a indemnização as testemunhas que depõem na fase de julgamento).
O depoimento das testemunhas e as declarações são actos pessoais. Não podem ser prestadas por
procurados (artigo 229). Também não podem ser prestadas perante qualquer pessoa, ou perante
autoridade diferente da que legalmente deve tomar o depoimento (artigo 230). Por outro lado, o
depoimento, além de ser pessoal, é um acto isolado (artigos 230 e 432). Inicia-se pela
ajuramentação (artigo 434); segue-se a identificação da testemunha (artigo 231); em seguida, o
artigo 233 regula o depoimento sobre os factos.
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Prova documental
Nos termos do artigo 245 do C. P. Penal “serão juntos aos autos todos os documentos que possam
servir para a instrução do processo, salvo o disposto no artigo 194”.
Estes documentos, que podem ser obtidos por apreensão (artigo 203 e 208), requisição (artigo 92 e
§ único do artigo 619) ou por apresentação (artigos 234 e 246), admitem a possibilidade de
substituição do original por fotocópia com o mesmo valor probatório, desde que tenha sido com
ele devidamente identificada nesse ou noutro processo (artigo 249). Se cifrados, observar-se-á o
disposto no artigo 248 e, se escritos em língua estrangeira ou pouco legíveis, o disposto no artigo
247.
Pelo que respeita ao valor probatório dos factos constantes dos documentos, haverá que distinguir
os documentos particulares dos autênticos ou autenticados. Se os factos constantes dos primeiros
estão submetidos ao princípio da livre e íntima convicção do julgador, os constantes dos segundos
constituem uma excepção a tal princípio, pois, nos termos do § único do artigo 468, “os factos
constantes de documentos autênticos ou autenticados consideram-se provados e sobre eles não
haverá quesitos, salvo o caso de falsidades”.
A prova legal constituída por tais documentos, em que a verdade formal se sobrepõe à material,
tem de ser entendida, caso o documento seja uma sentença, no sentido de apenas estarem
subtraídos à apreciação do juiz as comprovações que caibam no âmbito do caso julgado. Tal
relevará, sobretudo, em matéria de decisão sobre questões prejudiciais em processo penal.
O C. P. Penal trata dos peritos a propósito dos exames (artigo 175 e segts.). Os exames são uma
prova real. Os peritos elaboram um relatório e conclusões e prestam mesmo, quando necessário,
declarações. Daí uma certa confusão com as testemunhas, que se incluem na prova pessoal.
Os peritos não são prova real, intervêm na apreciação da prova. As coisas, vestígios, documentos
ou mesmo pessoas podem ser valorados como prova. A apreciação desta prova pode requerer
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conhecimentos fora do alcance directo do julgador. É aí que intervém a perícia, a qual se
manifesta na formulação de juízos de valor sobre a prova.
A perícia não é verdadeiramente um meio de prova, nem pessoal nem real. Ela visa auxiliar o
julgador ou o instrutor do processo na função que lhe cabe de desvendar o dignificado de provas
preexistentes ou de apreciar o seu valor. A apreciação da prova é função judicial, as conclusões a
tirar são conteúdo do juízo do julgador.
O perito, tal como o juiz extrai conclusões de certa matéria de facto, aprecia o significado e valor
de meios de prova. Aprecia ou qualifica os factos à luz de conhecimentos científicos e técnicos.
As conclusões dos peritos não tomam nunca a natureza de decisões, mas somente de pareceres. O
C. P. Penal não esclarece devidamente quando é obrigatória a intervenção de peritos (v. artigos
179 e 175 e segts.).
Os exames abrangem, no sentido lato, aquilo que o C. P. Civil se designa por avaliação, vistoria e
exame, mas também a inspecção judicial. Neste último caso, o exame é feito directamente pelo
juiz (ou pelo Ministério Público na instrução preparatória): v.g., inspecção ao local do crime
(artigos 176 e 177 do C. P. Penal).
A lei prevê casos em que a nomeação de peritos é obrigatória. Trata-se do que dispõem os artigos
191 e 181, § 2, para os exames cadavéricos ou autópsias; os artigos 192, 125 e segts., e 498 para
os exames de sanidade, de doença ou impossibilidade de trabalho; e para os exames de alienação
mental (§ 2 do artigo 181).
Em geral, todos os exames forenses devem ser feitos por peritos e bem assim os exames de
reconhecimento de letra ou falsificação de documentos. Em princípio, a realização de exames por
peritos depende da sua necessidade para a instrução ou para a apreciação da prova. Todavia, há
exames que só devem ser efectuados quando absolutamente indispensáveis, designadamente os
que possam ofender o pudor das pessoas (§ único do artigo 178).
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Como auxiliares que são da justiça, os peritos devem ter os conhecimentos técnicos necessários
para a realização proveitosa do exame e, bem assim, a honestidade e a imparcialidade que são o
suporte válido duma criteriosa apreciação.
Tal como os juízes, os peritos não podem funcionar quando se verifiquem causas de impedimento
ou suspeição (artigos 206, com referência aos nos 1 a 4 do artigo 104, e 113, com referência ao
artigo 112).
Os peritos não podem recusar a colaboração que lhes é pedida. Têm, no entanto, a faculdade de
escusar-se, quer por não possuírem os conhecimentos indispensáveis para fazer o exame, quer por
falta de material apropriado (artigo 183).
Os peritos não são escolhidos pelo juiz (na instrução preparatória, pelo Ministério Público) e são,
normalmente, em número de dois. só em caso de extrema urgência, simplicidade do exame, ou
pequena gravidade da infracção, é admissível um so perito (artigo 179). Os peritos devem ter
sempre as habilitações necessárias (artigo 180).
Nem sempre, porém os peritos são da escolha do juiz. Casos há em que os exames são feitos por
organismos apropriados e oficiais (artigo 181). Trata-se de casos em que os exames são feitos
pelos serviços de Medicina Legal, ou quando são feitos em laboratórios oficiais especializados.
Tais factos, no entanto, não veda a possibilidade de o juiz ordenar que os exames sejam feitos em
laboratórios ou estabelecimentos científicos apropriados (artgo 182), quando os exames exijam
conhecimentos extremamente especializados.
Tal como as testemunhas, os peritos também estão sujeitos a deveres: o dever de comparência (art.
185), o dever de formular o parecer com as conclusões devidamente fundamentadas (artigo 189) e
o dever de prestar juramento ou compromisso de honra (artigo 97).
Assiste-lhes, porém, o direito de informação para a adequada execução das suas obrigações de
peritos. Porém, por isso, solicitar diligências ou esclarecimentos para a conveniente realização do
exame (artigo 187).
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O exame por peritos desdobra-se em duas partes, sendo a primeira a observação dos objectos
sujeitos a exame e a segunda as conclusões inferidas daquela observação, fundamentadas em
regras científicas ou técnicas adequadas.
Nos exames efectuados nos organismos oficiais (serviços de Medicina Legal, estabelecimentos
hospitalares, laboratórios e institutos científicos), prescinde-se da presença do juiz e é proibida a
presença do arguido, ofendidos ou assistentes).
Provas reais
Provas reais são coisas cuja apreciação permite tirar ilações sobre factos juridicamente relevantes.
As coisas, como prova, são objeto de observação e também de conhecimento do seu conteúdo. É o
caso da prova por documento.
A prova documental tem idêntico valor probatório em processo penal e em processo civil. Os
documentos autênticos ou autenticados fazem prova plena, salvo alegacão de falsidade (v. artigos
362 e seguintes e 369 e seguintes do Código Civil). A prova por documentos autênticos ou
autenticados é, mesmo em processo penal, uma prova legal, subtraída à livre apreciação da prova,
em contaste com o princípio da verdade material. Quanto aos documentos particulares, readquire
plenamente a sua eficácia o princípio gera da sua sujeição à apreciação judicial.
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As restantes coisas que constituem provas reais são objectos de observação, não são susceptíveis
de conhecimento do seu conteúdo. As coisas são observáveis pelos sentidos: vista, audição, tacto,
cheiro e gosto. É mais comum, no entanto, a percepção das coisas através da observação visual.
As coisas não são provas em si mesmas, mas só na medida em que se relacionam com os factos
probandos. Todavia, a própria assistência da coisa pode demonstrar um requisito essencial da
infracção: por exemplo, o cadáver (que é prova directa do evento mortal) nos crimes de homicídio.
Normalmente, a prova resulta de uma qualidade de coisa como, por exemplo, a arma que tenha
feito fogo recentemente ou a moeda falsificada. Do mesmo modo, a posição do objecto pode
revelar-se de interesse: a arma no local do crime ou o objecto material do crime na posse do
arguido.
A prova real pode ser directa ou indirecta, quando se reporta a factos juridicamente relevantes
como objecto do processo, ou a factos indiciantes. Pode ser mediata ou imediatamente observada,
consoante as próprias coisas estão presentes no processo ou na audiência, ou substituídos por
decalques, plantas, fotografias, cópias, etc. (artigo 175).
As coisas, enquanto prova, abrangem também as pessoas e os cadáveres. A pessoa, como prova
real, não age, suporta a observação ou o exame. Daí que a lei imponha certos cuidados na sua
realização, com vista a salvaguardar-se o respeito e a dignidade de vidas à pessoa humana.
Importância das provas reais - A criminalística
A falibilidade das provas pessoais não carece de ser realçada, donde a importância cada vez mais
frequente da utilização das provas reais. Toda a evolução da instrução criminal se caracteriza pelo
aproveitamento racional das provas reais.
Os vestígios, consoante a espécie dos crimes, são da mais variada natureza: manchas, pegadas,
impressões digitais, poeiras, objectos abandonados, vestígios de actividade (danos em coisas,
como no arrombamento), vestígios de instrumentos do crime.
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Os vestígios materiais são prova indirecta, mas objectiva. Permitem, por isso, fiscalizar os
resultados inseguros da prova pessoal e reconstituir mais seguramente a infracção ou algum
elemento dela.
O arguido presta declarações no processo. Elas têm grande importância na busca da verdade
material. Pois que, mesmo inverídicas, podem fornecer um ponto útil de partida para outras
averiguações. As declarações do arguido são a expressão livre da sua personalidade, não se
resumem a simples narrações de factos. Não há, assim, verdadeira declaração sem liberdade.
O arguido, enquanto declarante, não perde a sua qualidade de sujeito processual e, nesse sentido, a
liberdade da sua declaração tem um efeito mais amplo que a das testemunhas. A declaração do
arguido tem de ser feita livremente. Não pode ser obtida por coacção, nem automática (artigos
245, n. 3, e 425 do C. P. Penal). As perguntas não podem ser sugestivas, cavilosas nem capciosas,
nem acompanhadas de dolosas presunções, falsas promessas ou ameaças (artigo 437 do C. P.
Penal).
Como parte no processo e, tendo em conta o respeito pelos direitos ou interesses da defesa, o
arguido tem a faculdade prestar ou recusar as declarações ou de as prestar verídicas ou inverídicas.
Tal não acontece como os demais declarantes a quem se impõe a obrigação jurídica de declarar a
verdade (artigos 255 e 425, § 2, do C. P. Penal).
Vem em reforço desta ideia a proibição por lei do uso de processos ou métodos irregulares de
obter declarações comprometedoras do arguido, posto que esses métodos afectam a personalidade
do mesmo e diminuem a liberdade da declaração.
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Deste modo, todas as cautelas legais se reconduzem ao princípio geral da garantia da liberdade da
declaração. São, assim, irregulares todos os actos que se destinam a obter a confissão pela
violência física ou moral, ou pela fraude.
Em consequência, são inadmissíveis não apenas as torturas físicas, como também as simples
ameaças de violência física ou prisão. São, pois, proibidas por lei, a tortura, a narcoanálise, a
hipnose e outras formas de sugestão como meio de se obter declarações do arguido.
A confissão em processo penal não tem o valor duma prova legal. Pelo facto de tais declarações
serem comprometedoras, não determinam legalmente uma conclusão sobre a sua veracidade.
Devem ser, portanto, sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova.
A lei impõe uma averiguação concreta do conteúdo da confissão e o seu confronto com os demais
elementos de prova com vista a aquilatar-se da veracidade da confissão (artigos 174 e 256 do C. P.
Penal). Na verdade, a confissão que não é pormenorizada, que deixa inexplicados motivos
plausíveis do crime, é uma confissão suspeita.
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OS MEIOS DE COACÇÃO
A prossecução do processo penal, sem entraves, em especial aqueles colocados pelo arguido, bem
como a garantia de execução da decisão final, enquanto finalidades que se pretende alcançar no
processo penal podem exigir a tomada de medidas, gravosas para a esfera jurídica do arguido e
eventualmente para terceiros (quando atinjam coisas), para acautelar que tais finalidades, de
ordem processual, venham efectivamente a ser atingidas. Tais medidas constituem as medidas de
coação, as quais têm finalidade processual porque ditadas por fins de ordem processual
anteriormente referidas.
“Durante qualquer das fases do processo o arguido poderá procurar frustrar-se à acção da justiça,
fugindo ou procurando esconder ou destruir meios de prova ou coagindo ou intimidando as
testemunhas e poderá continuar a sua actividade criminosa; poderá também dispor do seu património
em ordem a evitar o pagamento de enventuais indemnizações ou multas a quem venha a ser
condenado.”1
1
SILVA, Germano Marques da, CURSO DE PROCESSO PENAL II, 4ª Ediçao, Revista e Actualizada, VERBO, Lisboa, 2008, p.
287.
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Contra todos estes riscos, relativamente aos quais deve haver no processo elementos que os
comprove ou, pelo menos, indícios bastante, há que fazer face através dos meios de coação
(medidas cautelares) com finalidade processual que podem ter por objecto a pessoa do arguido ou
coisas.
No que se refere a medidas de reacção a ofensas de natureza disciplinar, para efeitos de assegurar
a ordem e disciplina dos actos processuais, a lei prevê medidas disciplinares, as quais traduzem
uma reacção a um comportamento ilícito do ponto de vista disciplinar. Por exemplo: a não
comparência a actos processuais em que deva participar-se, uma conduta que é punida com multa
e indemnização, quando a falta de comparência não seja justificada, artigo 91º.
Por outro lado, qualquer pessoa que tiver sido notificada a falta ao comparecimento sem
justificação (arguido, testemunha ou perito faltoso), se a sua comparência for julgada
indispensável, o juiz ou MP na instrução preparatória, pode ordenar a sua captura para comparecer
sob prisão, conforme o permite o § 3º, do artigo 91º, não ser uma prisão, se um acto coactivamente
imposto, uma comparência forçada.
A sanção de prisão pode ser aplica aos sujeitos ou participantes processuais, ou ainda a simples
assistentes aos actos processuais, neste caso em audiência de discussão e julgamento.
Permitindo a constituição nos seus artigos 59º, n.º 1 e 64º n.º 1, a prisão preventiva somente nos
casos previstos pela, fora os casos de flagrante delito, pode haver lugar a captura por ordem de
2
O regime disciplinar dos magistrados do MP regulado pelos artigos 128º e seguinte do EMMP, aprovado pela Lei n.º
22/2007, de 1 de Agosto, e o dos advogados pelos artigos 91º e seguintes do Estatuto da Ordem dos Advogados,
aprovado pela Lei n.º 28/2009, de 29 de Setembro.
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autoridade competente. Assim, a prisão fora de flagrante delito e sem culpa formada só pode ter
lugar, em conformidade com o artigo 293º, por ordem descrita, que deve emanar de autoridade
competente.
A ordem de prisão deve ser fundamentada 3, em atenção em atenção aos motivos que a legitimam
que encontram-se consagrado na lei que se traduzem em infracções ou estados de perigosidade
criminal, em razão da sua qualidade ou da sua gravidade, aferida em função da sua pratica com
dolo e punibilidade com pena de prisão superior a Um ano, e quando a liberdade provisória, que
tem em vista os mesmos fins da prisão preventiva, não se mostre suficiente para assegurar a
finalidade do processo.
Assim, teríamos reunidos os fundamentos que admitem a captura fora de flagrante delito, sem
culpam impor, a situação prevista pelo artigo 286º, n.º 2, com referencia ao artigo 291º, n.º 1, e
porque devem estar verificados os fundamentos para o efeito, em atenção as disposições
conjugadas dos artigos 286º, n.º 2 e 291º, n.º 1, als. a), b) e c), soa fundamentos cumulativos da
prisão fora de flagrante delito:
- O crime cometido o tenha sido com dolo e ao mesmo seja aplicável pena de prisao superior a 1
ano;
- Seja inadmissível a liberdade provisória ou a mesma se mostre insuficiente para a realização dos
seus fins.
3
A verificação dos fundamentos da captura não implica, automaticamente ordem, visto a constituição não impor a prisão
preventiva, senão permiti-la nos casos previstos pela lei o que equivale dizer que a captura sem culpa formanda, entendida como
prisão preventiva, nunca é obrigatório, como alias o reforçam os artigos 286 e 291, dos quais se depreende a possibilidade de se
autorizar a prisão preventiva sem culpa formada.
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formada a culpa do arguido, sempre justificada pelos fins processuais a que encontram
fundamento legal nas als. a), b) e c), do § 3º do artigo 291º.
Consoante o juízo aconselhe ou não a prisão preventiva, e desde que verificados os respectivos
requisitos nos termos do artigo 291º, poderá a autoridade judicial ordenar a mesma ou deixar de o
fazer, ou ainda alterar ou manter a prisão preventiva em que, entretanto, o arguido se encontrava
ao tempo da pronúncia.
Se acima ficou assente que, face ao acórdão n.º 04/CC/2013, de 17 de Setembro, proferido pelo
Conselho Constitucional no Processo n.º 03/CC/2013, o Juiz é única autoridade competente para
ordenar a prisão preventiva fora de flagrante delito, igualmente deverá ser somente a autoridade
judicial a ordenar a captura após a formação da culpa 4, ate porque compete somente aos tribunais a
formação da culpa em processo penal.
4
Sem, contudo, prejuízo de a mesma ter lugar mediante promoção do MP ou a requerimento da parte acusadora.
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A duração da prisão preventiva pode ir ate a decisão final em ultima instancia, e tendo em
conta que, em relação aos processos de Querela, nem o CPP nem qualquer outra lei
processual penal fixa o prazo dentro do qual a decisão final em primeira instancia deve ser
proferida, conclui-se que na espécie de processos em causa a duração da prisão preventiva
com culpa formada não se acha definida5.
A conclusão ou vista nos processos de réus presos deve ser feita de imediato pela secretaria
judicial, o que significa inexistirem prazos e, consequentemente, tanto a conclusão ou vista devem
ser feitas tão rápido quanto possível, em tais casos os actos da secretaria revestem carácter
urgente, artigo 95º, § 2º, de modo a permitir que, por exemplo, a pratica de um acto destinado à
soltura de réus presos possa ser praticado igualmente em férias, nos domingos e dias feriados. Tal
resulta do artigo 76º. De sublinhar que a lei prevê mecanismo de reacção face a prolongamento
indevido do processo após a formação da culpa, ultrapassados que estejam os prazos previstos no
§ 2º, artigo 337º e §§ 3º, 4º e 5º do mesmo artigo.
Durante a instrução, se o juiz concluir não subsistirem requisitos justificativos da captura, poderá
revogar a prisão preventiva sem culpa formada nos termos do artigo 273º, 1ª parte. Essa revogação
tem por base o seu próprio carácter precário durante a instrução, conforme resulta dos artigos
343º, 344º e 345º, o que de qualquer modo surge como consequência da alteração do objecto da
suspeita ou da redução da própria consistência, ou ainda do esclarecimento dos factos, que só é
possível após a instrução ou ainda que as mesmas ganhem maior consistência, poderá a prisão
preventiva não ser mantida, mas ser substituída por liberdade provisória enquanto meio alternativo
à prisão preventiva como um mal, desde que a referida liberdade provisória se mostre suficiente
para assegurar os fins visados pela prisão preventiva.
requisito da prisão preventiva fora de flagrante delito, em termos desta ser autorizada quando a
liberdade provisória se revele insuficiente para a realização dos seus fins, nomeadamente quando
haja comprovado receio de fuga, comprovado perigo de perturbação da instrução e receio fundado
de continuação da actividade criminosa6 (2ª parte, al. c), n.º 1 e als. a), b) e c), do § 3º, do artigo
291º)
Liberdade provisória mediante caução, disposições conjugadas nºs 3, 4 e 5, do artigo 269º, 270º e
274º corpo e artigos 275º e seguintes, formalidades.
A liberdade provisória pode ser concedida não só mediante caução como também mediante TIR,
sendo que quanto ao tribunal perante o qual pode ser requerida regula o artigo 275º, e no que se
refere as formas e seu processamento há que considerar as disposições do artigo 277º e seguintes.
E o arguido fica sujeito às obrigações prescritas pelo artigo 269º e obrigações adicionais mediante
caução, indicadas no artigo 270º, § 2º, nºs 1 a 8.
Pressuposto para inicio da fase de instrução é a notícia do crime ou “notitia criminis”, que se
traduz numa informação suficiente para alicerçar uma suspeita sobre um facto de natureza
criminal.
6
Condicionantes da prisão preventiva
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Não é relevante o desconhecimento do autor do facto criminoso, que não haja presunção mínima
sobre o autor deste, visto que o objecto respectivo não abarca necessariamente a imputação do
facto a determinada pessoa.
Neste particular aspecto de o facto suspeito dever ser subsumível à lei penal, resulta dai que o
conhecimento do MP mediante denúncia, esta “…não deve originar qualquer investigação se o
objecto da suspeita não pode, em qualquer dos seus aspectos, constituir crime… assim, tendo
havido lugar a investigação e, por conseguinte, instrução preparatório, tratando-se de processo
que a comporta, terminada a mesma haverá inevitavelmente lugar à abstenção de acusação7”.
7
Cavaleiro de FERREIRA (1954-1955:163) aponta a tarefa que incumbe ao MP da fiscalização, através da instrução preparatória,
das denuncias inconsistentes, dada a tendência de alguns denunciantes para encher os tribunais criminais de querelas apaixonadas,
sem viabilidade penal, tendo apontando o caso de Alemanha onde, segundo informação de v. hippel (citando Grunau), as
estatísticas terem atingindo uma percentagem de abstenções na ordem dos 50%, correspondentes a outras tantas denuncias
manifestamente infundadas.
As denuncias manifestamente infundadas, ou seja, denuncias de ma fé, no ordenamento jurídico moçambicano são punidas, quando
reúnem elementos que configurem o tipo legal de crime de “denuncia caluniosa” previsto e punido pelo artigo 245° CPP, a que
corresponde pena de prisão de um mês a um ano, sem prejuízo de condenação do denunciante a pagar uma indemnização nos
termos do artigo 30° do DL 35.007 mediante promoção do MP.
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Para garantir a segurança dos meios de prova necessários à prossecução do processo e assegurar a
exequibilidade de prova necessária à prossecução do processo e assegurar a exequibilidade da
decisão final, a lei prevê a aplicação de medidas coercitivas que restringem a esfera jurídica
individual daqueles a quem se dirigem.
Tais medidas coercitivas, ou meios de coacção, traduzem-se, pois, numa garantia do fim do
processo; tem natureza eminentemente processual. Por isso, não devem confundir-se com outros
medidas de natureza substantiva, que surgem como reacção a ofensas de carácter disciplinar ou
penal à ordem jurídica (exemplos: as medidas previstas nos artigos 91º e 93º CPP e as medidas de
segurança provisórios a que aludem os artigos 50º e 51º do Decreto-Lei n.º 35.007, de 13 de
Outubro de 1945).
Os meios de coacção podem afectar diferentes direitos individuais, incluindo a liberdade, em caso
de prisão preventiva; o corpo humano, em caso da sujeição a exames médico forense; o domicílio,
em caso das buscas; a propriedade ou posse, em das apreensões8.
8
(TRINDADE, 1995: 85-86)
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Ao juiz cabe, por isso, um poder geral de disposição sobre o arguido e sobre as provas. Este poder
cabe também em certa média, ao Ministério Publico na instrução preparatória, embora
condicionado a validação judicial.
O poder de disposição, cujo exercício cabe tanto ao juiz como ao Ministério público, pode
portanto, ser pessoal (quando incide sobre pessoas, designadamente o arguido, as testemunhas e
declarantes) ou real (quando incide sobre coisas ou seja sobre provas reais).
O poder de disposição pessoal traduz-se, assim, na captura do arguido e na condução coerciva das
testemunhas e declarantes ao tribunal, e afecta o direito à liberdade. Por sua vez, o poder de
disposição real compreende a faculdade de aprender coisas ou objectos necessários à instrução do
processo e restringe o direito de propriedade.
Para manter à disposição do tribunal, tanto o arguido como as provas, o tribunal terá por vezes, de
os procurar e descobrir. O poder de disposição implica, consequentemente, a faculdade de busca,
apreensão e captura.
Ora a busca é precisamente o primeiro dos meios de coacção processuais que iremos em seguida
abordar. (TRINDADE, 1995:86).
3.3 As Buscas
Busca é um meio de obtenção de prova. A busca é uma diligência a que se procede quando há
indícios de que os objectos relacionados com o crime ou que possam servir de prova se encontram
em lugar reservado ou não livremente acessível ao público9.
Quando se trate de buscas domiciliares, às exigências contidas neste preceito legal acrescem as
indicadas nos artigos 210º, 212º, 300º, 301º e 302º do mesmo Código.
9
Vide FORTES, Henriques Guilermina, Dicionario de Direito Penal e Processo Penal, p.104.
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Se a busca tiver de ser efectuada em casa da própria pessoa a capturar (arguido), ou em qualquer
lugar que lhe pertença ou esteja na sua posse, a entrega é sempre permitida durante o dia, quando a
captura é motivada por crime punível com pena maior, artigo 300º CPP.
Pelo contrário, efectuando-se busca em casa alheia, seja ou não habitada, ou suas dependências
fechadas, qualquer que seja o crime, ou em casa do arguido, tratando-se do crime punível com
pena correccional, a entrada, mesmo de dia, só será permitida com a autorização dos próprios
moradores ou donos, ou quando o mandado de captura expressamente o ordenar, § 1º, do mesmo
preceito.
Na falta de autorização dos moradores ou donos da casa ou de ordem especial contida no mandado
de captura, os executores de mandado deverão proceder nos termos do § 2º, do citado preceito,
submetendo ao juiz a questão da eventual convivência de conceder a autorização especial de busca
em novo mandado de captura.
Se a busca se realizar de noite, o regime o mesmo, quer se trate da casa do arguido, quer da casa
alheia: só será permitida com consentimento dos moradores, artigo 301º CPP. Diferentemente
sucedera, como vimos, nas casas e lugares sujeitos por lei à fiscalização especial da polícia,
relativamente aos quais a entrada é livre, por não estarem abrangidas na tutela da inviolabilidade
de domicílio.
Quando a entrada em qualquer casa ou suas dependências fechadas for legalmente permitida, a
autoridade ou agente da autoridade devera mostrar, antes do início da diligência. A ordem o
mandado de captura, sempre que lhe seja pedida. Se a entrada for recusada sem fundamento legal,
poderá usar da força para a efectivar, passando nesse caso, certidão da ocorrência, § único, do
artigo 301º CPP.
10
(TRINDADE, 1995: 86-88)
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O artigo 203º CPP, permite a apreensão do objecto, em poder de qualquer pessoa, que constituam
provas reais da sua infracção. O artigo 178º CPP, determina a obrigatoriedade 11, de sujeita a
exame ou de facultar qualquer coisa que deve ser examinada para descoberta da verdade material.
A competência para ordenar ou autorizar buscas para apreensão, quer em pessoas, quer em lugares
cujo acesso não seja livre, cabe ao juiz. A competência cabe ao Juiz da Instrução Criminal na fase
da Instrução Preparatória, al. c), n.º 2 do artigo 1º, da Lei n.º 2/93 de 24 de Junho. E cabe ao juiz
da causa na fase da Instrução Contraditória, artigo 330º CPP e artigo 37º DL n.º 35.007.
As buscas para captura podem ser mandadas efectuar por quem tem autoridade para ordenar a
prisão preventiva fora de flagrante delito, o que pode ser feito pelo Juiz de Instrução Criminal ou
Procurador no âmbito da instrução preparatória. Sendo assim, segundo o artigo 6º da Lei n.º 2/93
de 24 de Junho, têm competência para ordenar busca para captura, por escrito, o Juiz, o Ministério
Público e as demais autoridades de polícia da SERNIC, descritos no § único, do mesmo preceito
legal.
O artigo 288º define flagrante delito como “…todo o facto punível que se está cometendo ou que
se acabou de cometer. Reputa-se também flagrante delito o caso em que o infractor é, logo após a
infracção, perseguido por qualquer pessoa, ou foi encontrado a seguir à prática da infracção com
objectos ou sinais que mostrem claramente que a cometeu ou nela participou”;
Da análise desta disposição resulta que a lei distingue entre flagrante delito (em sentido estrito),
quase flagrante delito e presunção legal de flagrante delito: no primeiro caso, o infractor é
surpreendido durante a execução do crime; no segundo caso, é surpreendido no local do crime, no
momento em que acabou de o cometer, evidenciando a surpresa, a existência e a autoridade da
infracção; no último caso, que corresponde ao segundo período do texto legal, o infractor é
perseguido logo após a prática do crime ou encontrado com objectos ou sinais que mostrem ter
acabado de o praticar.
Em flagrante delito, a prisão preventiva é sempre autorizada, desde que ao crime corresponda pena
de prisão. Em tal caso, todas as autoridades ou agentes da autoridade devem, e qualquer pessoa do
povo pode prender os infractores, conforme determina o artigo 287º CPP. Se ao facto punível não
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Sabido que só devem praticar diligências indispensáveis, e que não é lícito praticar actos inúteis.
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corresponder a pena de prisão (mas, por hipótese, simples pena de multa), o infractor só poderá ser
detido por qualquer autoridade ou agente da autoridade, § único do mesmo artigo 187º.
Fora de flagrante delito, a prisão preventiva só é autorizada nos casos referidos no artigo 291º
CPP, ou seja, quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
Assim nos termos da alínea a) do n.º 1, o crime tende ser doloso (e não meramente culposo) e a
pena aplicável terá de ser a de prisão superior a um ano (ou seja, terá de corresponder-lhe processo
de policia correccional ou de querela; relativamente à alínea b), há que ter em conta que, conforme
o estabelecimento no § 1º, do mesmo preceito (artigo 291º), só há forte da prática da infracção
quando se encontre comprovada a sua existência e se verifiquem indícios suficientes da sua
imputação ao arguido, sendo sempre ilegal a captura destinada a obter esses indícios (não se trata,
pois de qualquer suspeita, mas de uma suspeita devidamente fundamentada); no que se refere à
alínea c), há que distinguir os casos de inadmissibilidade da liberdade provisória (a que se reporta
o § 2º, da disposição em referencia) dos de insuficiência da liberdade provisória para a realização
dos seus fins (a que se reporta o §3º).
Quanto ao n.º 2, incumprimento das condições a que ficar subordinada a liberdade provisória,
vejam-se os artigos 269º, 270º e ainda, o § 4º do mesmo artigo 291º.
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Basta a existência de um dos pontos acima referidos em conjunto com os requisitos especiais de
cada uma das medidas de coacção, para se aplicar a mesma (com excepção do Termo de
Identidade e Residência).
A prisão preventiva não se cumula com qualquer outra medida (com excepção do TIR) porque o
arguido está não está em liberdade e, consequentemente não pode cumprir nenhuma outra
obrigação.
A caução (e a caução económica), e, a obrigação de apresentação são cumuláveis (artigo 185º n.º 3
e artigo 208º n.º 2) porque têm natureza e objectivos distintos.
Regime
Termo de Identidade e Residência – artigo 186º
O termo de identidade e residência é uma medida de coacção a aplicar quando existe a
qualificação jurídica de alguém como arguido, isto é, logo que ocorre a constituição de arguido no
processo – artigo 186º, n.º 1.
- No inquérito, é aplicável pelo Ministério Público e autoridade policial - artigo 184º n.º 1.
- O despacho de aplicação desta medida é o único que não admite recurso - artigo 204º.
- Esta medida de coação implica o cumprimento dos deveres constantes do n.º 2 Alíneas a) a d) do
artigo 186º e, para que o arguido se recorde dos seus deveres e direitos ao mesmo é entregue cópia
do TIR, artigo 186º, n.º 3.
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O TIR extingue-se quando se verificam as condições do artigo 203º (extinção das medidas de
coação).
Para crimes punidos com pena de prisão de máximo superior a 1 ano, o juiz pode ordenar que o
arguido se apresente perante uma autoridade judiciária (no Ministério Público ou no Tribunal)
ou entidade policial.
- Esta apresentação tem sempre em consideração a actividade laboral e residência do arguido.
- O não comparecimento do arguido tem de ser informado ao Tribunal depois de ultrapassado o
prazo de cinco dias – artigo 191º n. 3.
Proibição de ausência – artigo 192º
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É aplicável ao crime, praticado a título de dolo, punido com pena de prisão até três anos.
Existem dois tipos de proibição:
- O arguido não se ausentar para o estrangeiro, ou não se ausentar sem autorização, apreendendo-
se o passaporte;
- O arguido não ausentar do local onde vive, ou não se ausentar sem autorização.
- Esta medida extingue-se normalmente logo que estejam verificados os pressupostos do art. 203º.
Também se extingue quando desde o início da sua execução, tiverem decorrido os prazos
máximos de prisão preventiva, elevados ao dobro - artigo 195º, nº 4.
- Estamos assim perante diversos prazos, nomeadamente:
- 2 anos sem que haja acusação;
- 4 anos sem que tenha havido condenação em primeira instância;
- 6 anos sem que haja condenação com trânsito em julgado
- 7 anos sem que haja condenação com trânsito em julgado nos casos em que haja recurso sobre
questões de constitucionalidade.
E extingue-se ainda se, desde o início da sua execução tiverem decorrido os prazos máximos de
prisão preventiva, elevados ao dobro (artigo 195º, n.º 4):
- 2 anos sem que haja acusação;
- 4 anos sem que tenha havido condenação em primeira instância;
- 6 anos sem que haja condenação com trânsito em julgado
- 7 anos sem que haja condenação com trânsito em julgado nos casos em que haja recurso sobre
questões de constitucionalidade.
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O juiz deve, sempre que possível, ouvir o arguido dando oportunidade deste contraditar os
pressupostos da aplicação da medida de coação - artigo 194º, n.º 3.
- A duração da medida de coação depende;
- Prática de determinados actos processuais (acusação, julgamento);
- Complexidade do processo;
- Haver ou não recurso por questões de constitucionalidade;
- Temos então que, os prazos de duração máxima da prisão preventiva são;
- 1 (um) ano até à dedução da acusação;
- 2 (dois) anos até à condenação em primeira instância;
- 3 (três) anos até à condenação com trânsito em julgado;
- 3 (três) anos e 6 (seis) meses até à condenação com trânsito em julgado quando existir recurso
sobre questões de constitucionalidade;
- Estes prazos são elevados de 6 (seis) meses (quando o processo se revelar de excepcional
complexidade), ficando então;
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- Um ano e meio,
- Dois anos e meio,
- Três anos e meio,
- Quatro anos.
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- Para inimputável na situação do 194º, n.º 4, cuja doença mental não se manifeste continuamente
(artigo 199º, n.º 1),
- Quando ocorra uma atenuação das exigências cautelares (art. 199º, n.º 2)
- Em caso de violação das obrigações impostas por aplicação de uma medida de coacção podem
impor-se outras ou outra, ou substituir-se a inicial, consoante as circunstâncias - art. 202º n 2º -
Pode existir nesta situação um agravamento das medidas de coacção.
O art. 37º desta lei prevê a possibilidade de o juiz sujeitar o arguido à medida de afastamento
coercivo do local da residência da familia quando:
- Hajam indícios de violência que, razoavelmente,
- Façam prever que os actos de agressão se possam vir a repetir
- De forma a criar perigo para a vida ou para a integridade fisica, psíquica ou sexual da vítima.
Nestes casos, se necessário, pode o juiz decretar a proibição de contacto do arguido com a vítima.
Extinção das medidas de coacção – artigo 203º
A extinção da prisão preventiva implica a libertação imediata do arguido (n.º 3); a menos que haja
lugar ao cumprimento de pena de prisão.
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No caso do artigo 203º, al. c) do n.º 1, se o arguido vier a ser posteriormente condenado no mesmo
processo, pode, enquanto a sentença condenatória não transitar em julgado, ser sujeito às medidas
de coacção legalmente admissíveis (n.º 4).
No caso de existir caução e, o arguido vier a ser condenado em prisão, aquela só se extingue com
o início da execução da pena (n.º 5).
O Habeas Corpus
Artigo 263º ate artigo 268º do CPP
A Constituição da República Democrática de Timor-Leste, que constitui um garante dos direitos,
liberdades e garantias do cidadão, consagrou que ninguém pode ser detido ou preso senão nos
termos legais.
Para o efeito, no seu artigo 33º, criou a figura jurídica do Habeas Corpus, remetendo para a lei (o
CPP) a sua regulamentação.
- Qualquer pessoa que for detida ou depois de detida, permanecer nessa condição, de forma ilegal,
tem o direito de pedir ao Supremo Tribunal de Justiça (actual Tribunal de Recurso), por si ou por
qualquer pessoa no gozo de seus direitos políticos, que lhe seja concedida a providência de habeas
corpus (artigo 205º, n. 1).
- A ilegalidade da detenção ou prisão deve fundar-se (artigo 205º, n. 2) no facto de:
- Ter sido efectuado ou ordenado por entidade incompetente;
- Ser motivada por facto pelo qual a lei não permite a sua aplicação;
- Mostrarem-se ultrapassados os prazos máximos de duração, nomeadamente as 72 horas para
apresentação do detido para o primeiro interrogatório;
- Manter-se fora dos locais legalmente permitidos.
Tramitação do incidente
- O requerimento (artigo 206º, n. 1) de Habeas corpus é:
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- Elaborado em duplicado,
- Dirigido ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (actual Tribunal de Recurso),
- Apresentado à autoridade à ordem de quem prende ou detém o requerente, esta autoridade,
remete o requerimento ao Supremo Tribunal de Justiça (actual Tribunal de Recurso), no prazo de
24 horas, acompanhado das informações relativas às circunstâncias que determinaram a prisão ou
a detenção e, se esta se mantém.
Actos Processuais
A manutenção da ordem na realização do acto processual compete a quem presidir ao acto (juiz ou
Magistrado do Mº Pº) e ao funcionário que nele participar.
Estes devem tomar as providências necessárias, podendo requisitar a colaboração da força pública,
que actuará sob a orientação de quem preside ao acto, art. 73º.
O segredo de justiça
Os intervenientes processuais não podem falar do processo, nem assistir a actos processuais a que
não tenham o direito, ou o dever, de assistir enquanto o processo estiver em segredo de justiça -
art. 74º.
Publicidade dos actos processuais
O processo penal é público a partir da acusação - art. 75º, nº 1; e, nunca a leitura da sentença ou
acórdão deve ser feita à porta fechada (art. 76º, n. 2).
Qualquer pessoa pode assistir aos actos processuais, bem como os meios de comunicação social
narrar o seu teor, desde que autorizados pelo tribunal - art. 75º, nº 2.
Isto é, se um jornal ou televisão (meios de comunicação social) quiser reproduzir peças
processuais ou documentos juntos aos autos, ou captar imagens e/ou som, terá de ter pedir e, ter
autorização do Tribunal, artigo 75º, nº 3.
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Também só a partir da acusação podem o suspeito, o arguido e o lesado consultar os autos e obter
cópias e certidões, artigo 77º, n. 3.
Consulta de autos e pedidos de certidões são viáveis apenas quando o processo deixar de estar em
segredo de justiça (art. 75º e 77º).
Após ser deduzida acusação é que o suspeito, o arguido e o lesado, podem consultar os autos e
obter certidões ou cópias, sem necessidade de autorização, art. 75º, nº 2, al. c).
Antes da acusação ser deduzida só é possível consultar os autos e obter certidões ou cópias depois
de prévia autorização dada por despacho da autoridade judiciária que presidir à fase processual em
curso – art. 77º, nº 1 e 2.
Qualquer outra pessoa que queira consultar os autos, obter certidão ou cópia terá que demonstrar o
seu legítimo interesse, sendo igualmente necessário despacho prévio de autorização – art. 77º, nº
3.
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Existe um regime restrito para o interrogatório de arguido dado que não pode ser efectuado entre
as zero (meia – noite) e as seis horas (seis da madrugada), sob pena de nulidade insanável, salvo se
for seguido à detenção ou à prisão - nº 3.
Quando o prazo termine em dia feriado, sábado ou domingo (e também em dia de tolerância de
ponto) o final do prazo passa para o primeiro dia útil seguinte.
Da mesma forma, o termo de um prazo que ocorra em férias judiciais, é contado no primeiro dia
útil seguinte, ou seja, no 1º dia útil após as férias.
Existe correspondência entre férias e sábado ou domingo, para efeitos de transferir o termo do
prazo para o primeiro dia útil seguinte ou seja, para o primeiro dia útil seguinte às férias.
Consequentemente, os prazos em Processo Penal contam-se mesmo em férias, (regra da
continuidade dos prazos).
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Na contagem do prazo não se conta o dia nem a hora (se o prazo for em horas) em que ocorreu o
evento a partir do qual o prazo começa a correr.
O prazo fixado em semanas, meses ou anos termina às 24 horas do dia que lhe corresponda.
Se o prazo for para fazer uma declaração, entregar um documento ou praticar outro acto na
secretaria judicial, ele considera-se esgotado no momento em que a secretaria fechar ao público.
No caso de no último mês não existir dia correspondente, o prazo termina no último dia desse mês.
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Excepcionalmente, a autoridade que presidir ao acto pode autorizar que o declarante se socorra de
apontamentos escritos como adjuvantes de memória, fazendo consignar no auto tal circunstância,
e se necessário, ordena a junção ao processo dos apontamentos usados – art. 85,º nº 2 do CPP.
As declarações ou depoimentos orais são documentadas em auto ou através de meios de gravação
áudio - art. 86º, nº 1 do CPP.
Se depois da leitura final das declarações, o declarante verificar que existe alguma
desconformidade entre o que foi dito e o que foi registado em auto, deve requerer a sua
rectificação imediatamente – art. 86º, nº 4.
Requisitos e autenticação do auto (art. 87º e 88º)
Para que o auto constitua prova de como se passaram os actos processuais, deve obedecer a
determinados requisitos, que são:
- Ter os elementos referidos no art. 87º, nº 2 (hora, dia, mês, ano e lugar da prática do acto,
identificação dos participantes, causas, descrições, etc)
- Ser redigido de forma legível, sem espaços em branco, rasuras, entrelinhas ou emendas por
inutilizar ou ressalvar - 87º, nº 3
- Ser assinado - art. 88º - por quem presidiu ao acto, pelas pessoas cujas declarações nele sejam
documentadas e pelo funcionário que o redigiu.
Em caso de urgência na convocação de alguma pessoa para acto processual, a notificação pode ser
substituída por telefonema, mensagem telegráfica ou outro meio de telecomunicação (ex. e-mail),
lavrando-se cota nos autos a consignar tudo o que se passou – cfr. art. 91º, nº 2.
As notificações podem ser efectuadas por:
- Funcionário de justiça;
- Agente policial;
- Autoridade a quem a lei atribua essa competência V. art. 91º, nº 3.
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Da acusação,
Do arquivamento,
Do despacho que designa dia para julgamento,
Da aplicação de medida de coacção ou de garantia patrimonial e da decisão final
O Lesado, o queixoso, o arguido, v. art. 92º, nº 2.
No residente na área do tribunal para esse efeito designada pelo notificando - art. 92º, nº 3.
Situações especiais:
- Ministério Público, defensores públicos e advogados – as notificações destes sujeitos processuais
são efectuados por termo nos autos, por via informática ou por via postal – artigo 92º, nº 4 do
CPP.
- Preso - a notificação é requisitada ao director do estabelecimento prisional. Este manda que um
funcionário a faça por contacto pessoal com o detido - art. 92º, nº 5 do CPP.
- Funcionário público - é requisitado ao superior hierárquico. Este incorre em responsabilidade
disciplinar se não cumprir a requisição - art. 92º, nº 6;
- Menor de 14 anos ou interdito por anomalia psíquica - a notificação é efectuada na pessoa do seu
representante legal - art. 92º, nº 7.
Nulidade da notificação
A notificação é nula quando não respeita os requisitos do art. 93º do CPP, designadamente,
quando:
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- Efectuada de forma incompleta, nomeadamente por não indicar o tribunal ou processo a que
respeita, faltar a indicação do notificando ou a finalidade da notificação ou alguma indicação que
deva considerar-se essencial na perspectiva da posição processual do notificando;
- For usada a notificação edital fora dos casos legalmente autorizados;
- Faltar a assinatura do notificando ou a menção a que se refere o nº 2 do artigo 88º
- Na notificação edital, não foram afixados os editais ou publicados os anúncios quando exigidos;
- Viola o disposto no artigo 92º.
Legislação subsidiária
No âmbito das notificações é aplicável o Código de Processo Civil, com as devidas adaptações,
art. 94º.
Registo Criminal
- Tem por objecto a recolha e conservação ordenada dos extractos das decisões criminais
proferidas pelos tribunais com o objectivo de permitir o conhecimento dos antecedentes criminais
das pessoas (art. 95º).
- Quanto aos factos sujeitos a registo criminal, o conteúdo do respectivo registo consiste no registo
das decisões que constam das alíneas do art. 96º.
- O Registo deve ser cancelado, nos casos do art. 99º.
- Podem não ser transcritas para o Boletim de registo criminal as decisões condenatórias que
preencham os requisitos do art. 100º.
Nulidades
Existem situações que fazem com que o acto processual viole uma norma de processo penal,
quando assim é, o acto está viciado.
Se a lei expressamente prever, o acto viciado é nulo (art. 102º, n. 1).
Se a lei nada sancionar, o acto inválido é irregular (art. 102º, n. 2).
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- São as constantes das alíneas a) a f) do art. 103º, bem como aquelas que ao longo do Código se
indique a sanção de nulidade insanável (ex. art. 112º, n. 2; art. 247º).
- Não podem ser rectificadas (sanadas), o acto é repetido.
- São de conhecimento oficioso pelo Tribunal - 103º, nº 2, em qualquer fase do processo, até ao
trânsito em julgado da decisão final, excepto quanto à incompetência territorial que é conhecida
até ao início do julgamento (art. 27º).
Sanáveis (art. 104º)
- São nulidades sanáveis todas as que na lei não estão indicadas como insanáveis.
- Têm de ser invocadas (arguidas) apenas por quem não praticou o acto.
- Dentro de um determinado prazo:
Antes do acto terminar (quando o interessado assiste à realização do acto)
Nos cinco dias depois de saber que o vício existe (quando o interessado não está presente, não
assiste à realização do acto).
V. art. 105.
Sanação das nulidades
A Prova
A Prova representa o resultado de um conjunto de actos praticados pelas partes, que têm como
objectivo permitir que o tribunal crie a sua convicção acerca da existência, ou inexistência, de
certos factos, com relevância num determinado processo (penal) em curso.
Meios de prova
São os meios instrumentais necessários à demonstração/prova dos factos relevantes e que não
sejam proibidos por lei.
São todos os recursos, directos ou indirectos, utilizados para alcançar a verdade dos factos no
processo. Meios de prova: a prova testemunhal, as declarações do arguido, do lesado, a acareação,
o reconhecimento, a reconstituição do facto, inspecção ao local do crime, a perícia e a prova
documental.
- Os meios de prova podem ser lícitos – que são admitidos pelo ordenamento jurídico – ou ilícitos
– contrários ao ordenamento.
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Somente os meios de prova lícitos são aceites, por isso, sanciona a lei com nulidade a prova obtida
de forma ilegal.
Ónus da prova
Em relação à matéria penal - impende sobre a acusação, por força do princípio da presunção de
inocência até trânsito em julgado, não existe ónus da prova em relação ao arguido (114º, 1 e 2 –
Investigação oficiosa).
Em matéria civil – obedece às regras processuais próprias do Código Civil e Processo Civil (art.
115º subsidiariedade).
Quanto à forma:
- Pessoal (afirmação feita por uma pessoa: testemunho, interrogatório, declaração),
- Documental (afirmação feita por escrito)
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- Material (qualquer materialidade que sirva de prova ao facto a provar: o instrumento do crime, as
coisas apreendidas, os exames periciais).
Aqui já não há uma proibição absoluta porque estamos perante direitos disponíveis, assim se
houver consentimento, é sempre possível usar os meios aí referidos.
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- As proibições de prova dão lugar a provas nulas (artigo 34°, n.º 4, da CRP).
- A nulidade das provas proibidas obedece a um regime distinto da nulidade insanável e da
nulidade sanável.
Trata-se de um regime complexo, que distingue dois tipos de proibições de provas consoante as
provas atinjam a integridade física e moral, ou ao invés, afectem a privacidade da pessoa humana.
- A nulidade da prova proibida que atinge os direitos à privacidade previstos no artigo 111°, é
sanável pelo consentimento do titular do direito – nulidade relativa de prova.
O consentimento pode ser dado antes ou depois da prática do facto. Se o titular do direito pode
consentir na intromissão na esfera jurídica do seu direito, ele também pode renunciar
expressamente à arguição da nulidade ou aceitar expressamente os efeitos do acto, tudo com a
consequência da sanação da nulidade da prova proibida.
Arguição da nulidade:
A nulidade da prova proibida pode ser conhecida oficiosamente ou, a requerimento dos sujeitos
processuais, designadamente:
- A prova que atinge o direito à integridade previsto no artigo 110º, n.º 1 e 2 do CPP pode ser
conhecida oficiosamente ou a requerimento;
- A prova que atinge os direitos à privacidade previstos no artigo 111°, só pode ser conhecida a
requerimento do titular do direito infringido.
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- Caso o vício tenha ocorrido durante o inquérito e não tenha sido expressamente conhecido no
despacho que recebe a acusação, o juiz de julgamento pode ainda dele conhecer a requerimento ou
oficiosamente, consoante os casos.
- Caso o vício tenha ocorrido durante a fase de julgamento, o juiz de julgamento pode dele
conhecer (a requerimento ou oficiosamente, consoante os casos) em qualquer momento.
- A nulidade da prova proibida pode ser conhecida quer a prova já tenha sido utilizada pelo
tribunal, quer ainda o não tenha sido. Neste caso, a nulidade da prova há-de ser declarada, com a
consequência da sua rejeição.
Concluindo:
As provas obtidas ou produzidas com violação da legalidade dos meios de prova estão feridas de
nulidade, e não podem ser valoradas ou tidas em atenção pelo tribunal (a não ser para efeitos de
procedimento criminal contra os seus autores (artigo 112º CPP).
Toda a prova proibida deve ser desentranhada sob pena de nulidade insanável (artigo 112º, n.º 2).
Procedimento probatório
- Em regra, as provas são indicadas com a acusação (MP), e defesa escrita (contestação).
- São valoradas de acordo com o Princípio do Livre Apreciação da Prova (art. 113º, CPP) ou seja,
o juiz deve valorá-las com a importância devida de acordo com a sua convicção. Ex: crime de
violação, palavra da vítima – ausência de perícia – sémen, sangue. A palavra da vítima releva
quando não há outras provas.
- Princípio da livre apreciação da prova (art. 113º) é um princípio geral para todas as entidades
competentes intervenientes nos autos.
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Aplica-se este regime ao caso em que o depoimento da testemunha resulta da leitura de documento
de autoria de pessoa diversa da testemunha (artigo 120º n.º 3).
- Não pode servir como meio de prova o depoimento de quem não estiver em condições de indicar
a fonte/pessoa pela qual tomou conhecimento dos factos (artigo 120º n.º 4).
- Não se admite a reprodução de rumores, boatos, ou vozes -“diz que disse” (artigo 121º, n.º 1).
Não se admite a mera convicção pessoal/interpretação sobre factos (artigo 121º, n.º 2), excepto:
Quando estiver ligada aos factos concretos,
Quando for em consequência da ciência, técnica ou arte,
Quando prestada por testemunhas abonatórias.
- Tem capacidade para testemunhar qualquer pessoa que esteja em condições fisicas e mentais
para prestar testemunho (artigo 122º, n.º 1), embora possam recusar a testemunhar nos casos
legalmente previstos.
- Autoridade judiciária verifica a aptidão fisica e mental quando isso for necessário (art. 122º, n.º
2) para efeitos de credibilidade e sem retardar marcha normal do processo
Esta indagação ordenada antes do testemunho não impede que este se efectue (art. 122º, n.º 3).
- Deveres da testemunha (art.123º, n.º 1)
Apresentar-se perante quem a convocou
Prestar juramento perante autoridade judiciária
Obedecer às indicações sobre a forma de prestar juramento
Responder com verdade às perguntas.
- Se a resposta implicar responsabilização penal da testemunha, esta pode alegar tal argumento
para não responder.
- Impedimentos (art. 124º)
Arguidos e lesados não podem depor como testemunhas no mesmo processo.
- Recusa a prestar testemunho (art. 125º, n.º 1 ) –
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O Tribunal superior decide sobre o incidente de levantamento suscitado pela autoridade judiciária
no tribunal onde corre o processo, sempre que se mostre justificada face:
- Normas e princípios aplicáveis da lei penal
- Princípio da prevalência do interesse preponderante.
Nota- O regime deste n.º 2, não se aplica ao segredo religioso.
Para os efeitos do nºs 2 e 3 a decisão do Tribunal Distrital ou Supremo Tribunal de Justiça
(actualmente, Tribunal de Recurso) é tomada depois de ouvido o organismo representativo da
profissão relacionada com o segredo profissional em causa - n.º 5.
Segredo de Funcionário -
Os funcionários não podem ser inquiridos sobre factos que sejam segredo quando o conhecimento
desses factos tenha acontecido no desempenho das funções que exercem - aplica-se o regime do
art. 126º, n.º 2 e 3, v. art. 127º n.º 1 e 2.
Segredo de Estado
As testemunhas não podem ser inquiridas sobre factos que sejam segredo de Estado ou que
possam causar dano à segurança interna ou externa de Timor ou à defesa da ordem constitucional,
art. 128º, n.º 1.
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Se houver dúvidas da autenticidade do documento porque o documento não está legalizado nos
termos da lei processual ou, se existem dúvidas da autenticidade do reconhecimento, pode ser
exigida a sua legalização (com tradução, transcrição, ou mesmo, com perícia para decifrar códigos
se estiver em código).
Valor probatório das repoduções mecânicas (art. 136º)
Só valem como prova dos factos ou coisas reproduzidas se não forem ilicitas nos termos da Lei
penal.
Não se consideram ilicitas, nomeadamente as que respeitam os termos do capítulo III deste Titulo
- as reproduções mecânicas abrangidas pelos exames, buscas, revistas e escutas telefónicas.
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- Quando não se puder juntar ao auto, ou nele conservar original, a reprodução mecânica tem o
mesmo valor do original, se com ele tiver sido identificado no processo, ou noutro processo, art.
137º.
- Força probatória (art. 138º)
Os documentos autenticos e autenticados fazem prova plena dos factos:
Que referem como praticados pela autoridade publica
Factos que nele são atestados pela entidade documentadora -os meros juízos pessoais do
documentador só valem como elemento de livre prova pelo tribunal (n.º 1).
Documento com defeito, o tribunal aprecia a medida em que o vício exclui ou reduz a força
probatória (n.º 2).
- Os documentos particulares são livremente apreciados pelo tribunal (n.º 3).
Força probatória/Falsidade (art. 139º)
O valor de prova dos documentos autenticos e autenticados só pode ser posto em causa com base
na sua falsidade (n.º 1).
- Documento falso por:
Não ter sido autoridade/oficial público competente a redigir
Não terem ocorrido os factos que nele se descrevem. (n.º 2).
- Declaração de falsidade:
Sinais evidentes da falsidade – tribunal, oficiosamente ou a requerimento
Sem sinais evidentes – comunicação ao MP para este agir legalmente (n.º 4).
Acareação (art. 140º)
Ocorrendo oposição directa sobre um ou mais factos entre:
Depoimentos das testemunhas
Depoimentos das testemunhas e declarações do lesado ou arguido
Declarações do Lesado e do arguido
Declarações dos co-arguidos
Pode ter lugar a acareação das pessoas em contradição (oficiosamente/requerimento), no próprio
dia ou dia a designar para o efeito (n.º 2), em caso de carta precatória será no tribunal deprecado,
salvo ordem expressa para essa pessoas comparecerem perante juiz do processo (n.º 3).
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- Se os depoimentos dos acareados deverem ser gravados, igualmente será registado o resultado da
acareação (n.º 4)
-Valor probatório (art. 142º)
O resultado da prova por acareação é livremente apreciado pelo tribunal.
Inspecção ao local do crime (art. 143º)
Objecto-
Tem por fim a percepção directa de factos relevantes pelo tribunal/autoridades encarregues da
investigação.
Finalidade (art. 144º)
Sempre com respeito pela intimidade da vida privada, quando for conveniente, o tribunal pode:
- Oficiosamente ou por requerimento dos interessados,
- Inspeccionar coisas e, pessoas para se esclarecer sobre factos que interessam à decisão da causa,
- No local,
- Ou fazendo a reconstituição dos factos.
- Intervenção (145º)
- O arguido e lesado são notificados do dia e hora da inspecção e podem prestar ao Tribunal os
esclarecimentos necessários, bem como chamar atenção para alguns factos.
- O Tribunal pode ir acompanhado de técnicos com competência para elucidar sobre averiguação e
interpretação de factos.
- No despacho que ordena a diligência será nomeado o técnico e este deve também comparecer na
audiência de julgamento (art. 146º).
- O Auto de Inspecção é lavrado depois de diligência efectuada, podendo ser juntas fotografias
(art. 147º).
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- É ordenada por despacho da autoridade judiciária e requisitada pelo MP ou juiz consoante a fase
processual a estabelecimentos, laboratório, serviço oficial apropriado ou perito. (art. 150º, n.º1 e n.
2).
- Regra geral a perícia é realizada por um só perito, embora em casos complexos possa ser
efectuado por um Colégio de peritos, neste caso, pode o arguido e lesado indicar um perito (n.º 3).
Desempenho da função de perito – art.152º
- Impedimentos e suspeições dos Juízes aplica-se aos peritos – art.153º.
- Dispensa da função de perito – art. 153º, n.º 2.
- Escusa – art. 153º, n.º 3.
Nova nomeação de peritos – competente autoridade judicária da fase do processo – artigo 154º.
Quesitos – objecto e quesitos estabelecidos nos despachos que a ordena – artigo 155º
Começo da diligência – regulado logo no despacho que ordena a sua realização.
- Compromisso de cumprimento da função – prestado pelo perito que não seja funcionário público
que intervenha no processo no exercício das suas funções, no inicio da diligência, ou por escrito
assinado pelo perito (art. 157º, nºs 2 e 3).
- O relatório perícial contém as conclusões dos peritos expostas de forma fundamentada acerca do
seu objecto e quesitos existentes, no caso de perícia colegial, o perito discordante apresenta as suas
razões (art. 158º, nºs 1 e 2).
- Esclarecimentos complementares pelos peritos – artigo 159º
Segunda perícia - quando os esclarecimentos complementares da primeira perícia não foram
suficientes e para esclarecer o tribunal pode ser realizada segunda perícia, esta tem como objecto:
- Os factos objecto da perícia inicialmente realizada,
- As conclusões dos primeiros peritos,
Em caso de discordância, devem ser fundamentadas as discordâncias (art.160º).
Não pode intervir perito que agiu na primeira perícia, em regra é colegial (art. 161º).
Valor probatório (art. 162º)
Presume-se subtraido da livre apreciação do julgador o juízo técnico, científico ou artístico
existente na prova pericial, mas, pode o juiz discordar, neste caso de a opinião do juiz divergir da
existente do relatório, deve o mesmo fundamentar a divergência.
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Reconhecimento (art.163º)
Se quem deve proceder ao reconhecimento de alguma pessoa relevante no processo, não conseguir
fazê-lo, proceder-se-á ao reconhecimento físico daquela, se não for efectuada na audiência deve
ser feita, se possível, sem que aquela pessoa seja vista pelo identificando.
Fora de audiência a validade deste meio de prova exige que se coloque o identificando junto com
outras pessoa de idênticas características fisicas e maneira de vestir, n.º 2.
Sendo vàrios os supeitos, estes são identificados separadamente, n.º 3.
Reconhecimento de objectos – aplica-se o regime anterior (art. 164º).
Valor da prova por reconhecimento-
Depende da livre apreciação do julgador (art.165º).
Reconstituição
Quando for preciso saber se um facto poderia ter ocorrido, ou não, de certa maneira determinado
local, é admissível a sua reconstituição (art. 166º, n.º 1)
Trata-se de apreender o modo como ocorreram os factos cuja veracidade se quer atingir e em
ordem à dissipação de eventuais dúvidas.
- Despacho que ordena a reconstituição e as condições da mesma – art. 166º, n.º 3.
- A diligência deve ter o mínimo de publicidade possível, ou nenhuma mesmo, sem prejuízo das
regras de publicidade dos artigos 73º a 77º; titulo IV – Dos actos processuais, cap. I – disposições
gerais (artigo 166º, n.º 4).
- Valor probatório – Livremente apreciado pelo tribunal (artigo 167º).
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Apreensão
A apreensão traduz a retirada de objectos relacionados com o crime, da posse do suspeito, para
ficarem à disposição do tribunal.
São apreendidos os objectos relacionados com o crime ou, que possam servir de meio de prova
relacionado com um eventual crime.
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Deve ser autorizada por despacho do juiz salvo em caso de perigo na demora ou urgência, nesta
situação os órgãos de polícia criminal podem efectuar apreensões.
Estas apreensões estão, no entanto, sujeitas a posterior validação pelo juiz (art. 172º, n.º 1).
Objecto da apreensão-
Perante bens perecíveis, perigosos, deterioráveis, o juiz ordena a conservação e manutenção
necessárias à sua guarda, ou, “destruição, venda, afectação a finalidade socialmente útil”.
Exames
Inspeccionam-se pessoas, lugares e coisas de forma a averiguar:
A existência de vestigios da existência de crime,
Do modo, lugar, e de como o crime foi praticado,
Das pessoas que os terão cometido ou sobre as quais foi cometido (art. 174º, n.º 1).
- Imediatamente a seguir à notícia de um crime, devem ser tomadas todas as providências para que
os vestígios não desapareçam ou não se alterem, proibindo-se, se necessário, o trânsito e entrada
de pessoas estranhas no local do crime ou quaisquer outros actos que possam prejudicar a
descoberta da verdade – art. 174º.
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Escutas Telefónicas
Trata-se de um meio de obtenção da prova, que consiste na:
- Intercepção e na gravação de conversações ou comunicações telefónicas – art. 177º
- Intercepção e gravação de conversações/comunicações transmitidas por outro meio técnico
diferente do telefone – art. 180º do CPP
E é ordenado quando:
- Sejam necessárias à descoberta da verdade, mas apenas relativamente a crimes puníveis com
pena de prisão superior, no seu máximo, a três anos;
- Injúria, de ameaça, de coação, de devassa da vida privada, perturbação da paz e do sossego,
quando cometidos através de telefone, se houver razões para crer que a diligência se revelará de
grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova – art. 177º do CPP.
- É ordenada ou autorizada por decisão (despacho) judicial, art. 177º, n. 1.
- Da intercepção ou gravação é lavrado auto sobre o tempo, modo e lugar da sua realização, que
depois é enviado ao juiz competente juntamente com as fitas gravadas. O Juiz analisa e manda
juntar aos autos se forem relevantes como prova, ou ordena a destruição – ar. 178º, n. 1 e 2.
- Depois de terminar o inquérito, o arguido e as pessoas escutadas têm acesso às escutas, art. 178º,
n. 4.
- A gravação efectuada por um dos intervenientes ou destinatários da comunicação ou da
conversação, só é válida como meio de prova, se tiver sido autorizada pela autoridade judicial e
respeitados os requisitos dos artigos 177º e 178º, v. artigo 179º.
- O regime das escutas telefónicas aplica-se á intercepção e escuta de conversas e comunicações
feitas por outro meio técnico além do telefone – artigo 180º.
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Do Inquérito
O inquérito é uma fase do processo comum relacionada com a investigação do crime que terá sido
cometido.
Por tal facto, tem início com uma informação sobre um crime, adquirida pelo próprio MP, por
participação das autoridades, por denúncia/queixa de cidadãos, cfr. art. 224º.
- O inquérito tem como objectivo (art. 225º):
- Recolher provas
- Realizar diligências necessárias à demonstração do cometimento de um crime e
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LIVRO III
Do Julgamento
TÍTULO I
Dos Actos Preliminares
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- Antes da audiência existe a necessidade de poderem ser ouvidas algumas pessoas, em regra, os
intervenientes processuais prestam as suas declarações na audiência de julgamento, no próprio
tribunal.
Mas, existem situações onde é ordenada a expedição de carta precatória para tomada de
declarações a intervenientes processuais (art. 244º).
Para que tal aconteça, é necessário que:
- Não tenham sido ouvidas durante o inquérito;
- Residam fora da área do tribunal:
- Tenham graves dificuldades ou inconvenientes na deslocação ao tribunal.
- Disciplina, publicidade e documentação da audiência – art. 245º e ss
A disciplina da audiência e a direcção dos trabalhos competem ao juiz, que pode adoptar as
medidas que considere adequadas e necessárias para que a audiência decorra com normalidade,
nomeadamente requisitando a força pública – art. 245º, n.º 2.
- A audiência é pública, sob pena de nulidade insanável (art. 247º) o que implica o direito de:
- Os meios de comunicação social e o público assistirem à audiência;
- A narração circunstanciada do que se passou na audiência pelos meios de comunicação social;
- A reprodução de peças processuais, documentos juntos aos autos, a captação de imagens ou a
tomada de som (com autorização prévia do tribunal).
O tribunal pode restringir, parcial ou totalmente, a publicidade da audiência, desde que as
circunstâncias concretas do caso o aconselhem, como forma de preservar outros valores,
nomeadamente a moral pública e a dignidade humana, não abrangendo nunca esta restrição a
leitura da sentença ou acordão, art. 76º, n.º 1 e 2.
Os actos da audiência são documentados em acta que contém os elementos do art. 249º n.º 1.
As declarações prestadas perante o tribunal são reduzidas a escrito se não existirem meios de
gravação vídeo ou áudio (art. 249º, n.º 2).
O juiz pode determinar que a transcrição dos actos referidos na alínea e) do nº 1 deste artigo seja
efectuada no final da produção da prova quando a transcrição imediata puser em causa o bom
andamento dos trabalhos (art. 249º, n.º 3).
Continuidade da audiência - artigo 250º
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A audiência decorrer do princípio ao fim, sem interrupções, isto é, de forma contínua, mas existem
situações em que a audiência pode ser suspensa, e/ ou interrompida.
No entanto o arguido, mesmo que tenha comparecido, pode ser afastado da sala por variadas
razões, nomeadamente se violar repetidamente os seus deveres de conduta ou se a sua presença
inibir ou intimidar alguém que deva prestar declaracões.
Porém, será sempre chamado para a leitura da sentença.
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Se o arguido faltar estando notificado, sem justificar a falta, adia-se a audiência, aplica-se multa e
pode ser emitido mandado de detenção para garantir a sua presença na futura audiência (256º, n.º 1
e 2).
- Se não for possível notificar pessoalmente o arguido, nem efectuar a sua detenção, e desde que
ele tenha prestado TIR, será o arguido notificado da data do julgamento por edital que será afixado
na morada constante do TIR, com antecedência de 20 dias, e com a cominação de que o
julgamento se realizará como se estivesse presente, sendo representado, para todos os efeitos
possíveis, pelo defensor – artigo 257º, nº 1 e 2, podendo ao mesmo tempo ser passado mandado de
detenção ou captura – nº 3;
- E não sendo possível a sua notificação serão pedidas informações à polícia sobre o paradeiro.
- Se mesmo assim não for possível notificá-lo, por não se encontrar na sua morada para ser
notificado, isto é, oficialmente, não se sabe onde se encontra o arguido, o tribunal pode ordenar a
passagem de mandados para detenção e comparência em juízo – art. 259º.
B)
Se o arguido notificado faltar ao julgamento e justificar a falta, será notificado da nova data, com a
cominação de que o julgamento se realizará sem a sua presença, sendo representado, para todos os
efeitos possíveis, pelo defensor – art. 256º, nº 3;
- Pode também o arguido requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência.
Neste caso é representado pelo defensor, caso se encontre impossibilitado de comparecer à
audiência devido à sua avançada idade/ doença grave ou porque reside no estrangeiro – art. 258º;
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Outras declarações
O lesado, quanto a este pode o Ministério Público e o defensor formular as suas perguntas, mas
sempre através do juiz – art. 270º.
- As testemunhas, são interrogadas directamente por quem as indicou e contra-interrogadas pelos
demais intervenientes, sendo que as indicadas por um arguido só podem ser interrogadas pelo
defensor de outro arguido se isso for requerido ao juiz e este entender que tal é necessário à boa
decisão da causa (art. 271º, n.º 4);
- Finalmente são ouvidos os peritos e consultores técnicos que eventualmente tenham sido
indicados, artigo 272º;
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- No entanto, se a alteração dos factos, isto é, se os novos factos forem resultado de prova da
Defesa do arguido, então não se aplica o n. 1 - não é necessário conceder prazo algum para o
arguido se defender dos novos factos.
Alteração substancial dos factos da acusação – art. 275º, n.º 1
Quando durante a audiência surjam factos que:
- Não constem da acusação
- Levam à aplicação de pena mais grave
- Implicam responsabilidade penal pela prática de um crime mais grave
- O Tribunal comunica-os ao MP e ao Defensor.
Se MP e arguido não se opuserem a que o julgamento prossiga
Continua o julgamento também em relação aos novos factos, a não ser que seja outro, Tribunal
competente para julgar os novos factos, caso em que os autos são enviados para o Tribunal
competente (n.º 2 e 5).
Pode o Tribunal conceder prazo para a defesa ou MP prepararem a sua posição processual (n. 3).
- Não existindo acordo entre MP e arguido quanto à existência dos factos novos
a comunicação da alteração serve de denúncia para que o MP investigue os novos factos (n. 4).
Alteração da qualificação jurídica – art. 274º
Existem situações onde os factos praticados pelo arguido não correspondem ao crime pelo qual
vem acusado, neste caso, é necessário alterar a qualificação jurídica do crime para o crime
correcto que o arguido deve ser julgado.
Isto deve ser assim, mesmo que pelo novo crime o arguido tenha uma pena superior à que teria
pelo antigo crime que constava da acusação.
- Sendo preciso, o Tribunal concede prazo para Defesa e MP prepararem a sua posição processual.
Alegações / últimas declarações do arguido
Depois de terminar a produção de prova no julgamento, o MP e o Defensor fazem as suas
conclusões oralmente, podendo existir resposta para refutação de argumentos oralmente
apresentados (art. 276º, n.º 1 e 2).
- Antes de terminar o julgamento o juiz pergunta ao arguido se tem mais alguma coisa a alegar em
sua defesa, ouvindo-o se este falar – art. 277º.
Da tomada de decisão - deliberação – art. 278º
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Depois de encerrada a discussão da causa, isto é, produzida a prova, feitas as alegações, o (s) juiz
(es) vão tomar a sua posição sobre o objecto do processo, a decisão final (n.º 1).
- Cada juiz dá o seu parecer/deliberação, e a decisão final é tomada por maioria de votos simples
(salvo se for juiz singular a julgar e decidir o caso) (n.º 2).
- Não se admitem abstenções (n.º 6)
- O Tribunal decide tendo em consideração os factos provados (n.º 8).
A sentença absolutória vale como se fosse de condenação quando (art. 283º, n.º 2):
- O arguido for um inimputável
- E, é aplicada uma medida de segurança
Correcção da sentença – art. 285º
Existem situações onde, por lapso de quem redige a sentença, se verifica que o texto tem
imprecisões, lapsos, ou, não respeita os requisitos formais da sentença, constantes dos arts. 281º a
284º (n.º 1).
Nestes casos a sentença tem de ser corrigida, mesmo que haja recurso da mesma (n.º 2).
Este artigo aplica-se também a despachos judiciais, n.º 3
Nulidade da sentença – art. 286º
As sentenças podem ter vícios, se uma sentença tiver um vicio processual, e este vício não for
possível de ser eliminado com a correcção da sentença, então a mesma será nula quando:
- não tenha fundamentação
- Condene por outros factos que não os da acusação
- Seja proferida a sentença por tribunal incompetente criminalmente
- Não seja a sentença colocada em texto escrito (mesmo que ditada verbalmente para a acta, nos
termos do artigo 349º, n.º 4).
Recurso ordinário
Diz-se recurso ordinário aquele que tem por objecto uma decisão ainda não transitada em julgado.
Sempre que a lei o não proibir expressamente, é permitido recorrer dos despachos judiciais, das
sentenças e acordãos, na totalidade ou apenas em parte – art. 287º.
Não se pode recorrer de:
- Despachos de mero expediente,
- Decisões que ordenem actos da livre resolução do tribunal,
- Sentença que condenou em indemnização civil se o valor pedido estiver dentro da alçada do
Tribunal Distrital (que é USD $1.000,00 – art. 917º, n.º 1 do CPC) e a decisão impugnada for
desfavorável para o recorrente em valor inferior a metade dessa alçada, V. art. 288º.
Legitimidade para recorrer – artigo 453º
- O Ministério Público tem sempre legitimidade para recorrer, até mesmo no interesse do arguido
(mesmo que o arguido tenha sido condenado o Ministério Público pode recorrer da sentença).
- O arguido apenas o pode fazer se tiver sido condenado.
Se tiver sido absolvido deixa de ter interesse em agir, e por isso, falta-lhe legitimidade para
recorrer.
- Sendo vários os arguidos, em caso de comparticipação criminosa, o recurso interposto por um
aproveita aos demais, excepto o caso em que o recurso se baseia em motivos estritamente pessoais
– art. 290º.
Prazo de interposição e de resposta – art. 300º
O recurso tem de ser interposto no prazo de 15 dias:
- A contar da notificação da decisão
- Ou, a partir da data em que a mesma deva considerar-se notificada. V. n. 1.
Interposição do recurso:
- Por requerimento que terá de ser acompanhado da motivação do recurso, n. 3
- Por declaração na acta, caso em que a motivação do recurso pode ser apresentada no prazo de 15
dias a contar da interposição, n. 4.
Classificação dos recursos
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Interposto recurso de um despacho ou sentença, pode subir ao STJ (por ora, Tribunal de Recurso):
- Nos próprios autos, art. 295º, n. 1
- Em separado, art. 295º, n. 2
- Com subida imediata - art. 296º
- Com subida diferida para mais tarde - art. 297º
Quanto aos efeitos, os recursos podem:
- Ter efeito suspensivo
- Devolutivo - art. 298º.
Exemplos:
- Recurso da sentença, sobe nos próprios autos, imediatamente e, se a decisão for condenatória,
tem efeito suspensivo.
- Recurso da decisão que aplicar ou mantem uma medida de coação, sobe em separado,
imediatamente e tem efeito meramente devolutivo.
Instrução do recurso
- O requerimento de interposição do recurso ou a motivação (no caso de ter sido ditado para acta)
deve vir acompanhado das cópias necessárias para notificar os sujeitos processuais envolvidos no
processo, art. 302º, n. 1.
- Estes podem responder no prazo de 15 dias (art. 302º, n.º 2).
- A resposta é notificada aos restantes sujeitos processuais envolvidos no recurso (n.º 3).
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- Se não houver lugar à renovação da prova no tribunal superior, o relator ordena que o processo,
acompanhado daquele seu projecto, vá a vistos, por cinco dias, a cada um dos juízes adjuntos (art.
305º).
- Depois dos vistos, e não havendo renovação da prova, a deliberação é feita em conferência, sem
prejuízo do tribunal ouvir a acusação e a defesa em alegacões orais (art. 306º, n. 2).
Renovação da prova - art. 307º
O tribunal de recurso pode entender que deve conhecer de matéria de facto e, nesse sentido,
admite a renovação da prova quando:
- Ocorrerem os vicios do art. 299º, n.º 2, designadamente:
- Insuficiente a matéria de facto provada,
- Contradição insanável da fundamentação
- Erro notório na apreciação da prova
- Omissão de alguma diligência que devesse ter sido efectuada por ser essencial à descoberta da
verdade
- E, a renovação evitar o reenvio do processo para novo julgamento.
- A renovação é feita em audiência que será designada pelo relator – art. 309º, n.º 1.
- O Ministério Público e o defensor são sempre convocados – art. 309º, nº 2.
Esta audiência só será adiada por falta de alguma pessoa quando o tribunal considere essa pessoa
como indispensável à realização da justiça – art. 310º nº 1.
Deliberação e Reenvio
O tribunal delibera nos termos do art. 306º após encerramento da audiência, art. 312º.
Quando não for possível deliberar, o processo é reenviado para novo julgamento sobre:
- Totalidade do objecto do processo
- Questões concretas identificadas na decisão de reenvio. V. art. 313º.
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TÍTULO II
Recursos Extraordinários
CAPÍTULO I
Disposição Geral
O recurso extraordinário é aquele que tem como objecto uma sentença ou acórdão que já transitou
em julgado.
Recurso de Revisão – al. b), artigo 493º
É admissível a revisão quando:
- Outra sentença transitada em julgado considerou falsos algum dos meios de prova que foram
decisivos para a decisão (al. a);
- Outra sentença transitada em julgado considerou provado que o juiz cometeu um crime
relacionado com a sua função no processo (al. b);
- Os factos que serviram para fundamentar a condenação são diferentes/inconciliáveis com os
dados como provados noutra sentença e, dessa oposição resultam sérias dúvidas sobre a justiça da
condenação (al. c);
- Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram
apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, excepto se
tiverem por único fim corrigir a medida concreta da sanção (al.d).
Este recurso é admitido mesmo quando o procedimento criminal se encontre extinto ou, a pena já
esteja prescrita ou cumprida – art. 315º nº 3.
Legitimidade para requerer a revisão – art. 316º
O Ministério Público;
O condenado (arguido), quando a sentença for condenatória. V. n.º 1.
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Caso o condenado já tenha falecido, tem legitimidade para requerer a revisão o seu cônjuge,
descendentes, ascendentes, parentes ou afins até ao 4º grau da linha colateral, v. n.º 2.Tramitação
do requerimento de revisão – art. 317º do CPP
No Tribunal Ad quo (na 1ª instância) – art. 317º
O requerimento é apresentado no tribunal onde foi proferida a sentença a rever, n.º 1;
É autuado por apenso ao processo onde se proferiu a sentença a rever, n.º 2;
De seguida faz-se o processo concluso ao juiz que:
- Pode proceder às diligências que considerar necessárias e ordenar a junção, ao apenso, dos
documentos com interesse para a decisão, n.º 3;
- Sendo tomadas declarações, estas terão que ser documentadas em auto reduzido a escrito ou
outro meio de reprodução legal (gravação áudio ou vídeo – 249º nº 2), n. 4
- Findas as diligências ou decorrido o prazo de 30 dias após a apresentação do requerimento de
revisão, o juiz instrutor profere despacho quanto ao mérito da causa e ordena a remessa ao
plenário do Tribunal Superior (Tribunal de Recurso), n.º 5.
No Tribunal Ad Quem (Tribunal de Recurso) – art. 318º
Recebido o processo no Tribunal de Recurso/ Supremo Tribunal de Justiça, os autos são
apresentados ao juiz do processo, n.º 1.
Este tem prazo de 15 dias para elaborar o projecto de acordão que acompanha os autos nos vistos
aos outros juízes, n.º 2.
Após os vistos o tribunal tem 15 dias para proferir a decisão de conceder ou negar a revisão, n.º 3.
- Se a revisão for concedida é designado um tribunal de categoria e composição idêntica ao que
proferiu a decisão a rever para proceder a novo julgamento, n.º 4.
Este novo tribunal designará dia para julgamento que segue os trâmites do processo comum – art.
319º.
Caso a 1ª decisão tenha sido condenatória e o tribunal da revisão absolva o arguido este pode pedir
uma indemnização pelos danos sofridos e que lhe sejam restituídas as quantias pagas (multas,
impostos, custas), sendo o Estado o responsável pelo pagamento, art. 320º, n.º 1.
Recurso para fixação de jurisprudência – art. 321º
Fundamento do recurso - art. 321º
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A existência de dois acórdãos com soluções diferentes para duas questões iguais, ou seja que haja
uma oposição de acórdãos.
Há oposição de acórdãos quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça
(Tribunal de Recurso) proferir dois acórdãos que relativamente à mesma questão de direito,
assentem em soluções opostas (n.º 1).
Os acordãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação quando, durante o
intervalo em que foram proferidos, não tiverem ocorrido alterações legislativas (da lei) que
interfiram, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida (art. 321º,
n.º 2).
O acordão anterior que é invocado (acordão fundamento) tem que estar transitado, ou seja, já
decorreu o prazo de recurso ordinário (n.º 3).
Legitimidade para o recurso – art. 321º, nº 1 parte final.
o Ministério Público e o arguido;
Prazo e efeito – art. 322º, nº 1
- Interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acordão proferido em último
lugar.
- não tem efeito suspensivo.
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TÍTULO II
Da Execução da Pena
CAPÍTULO ÚNICO
Da Execução das Penas
A pena e a medida de segurança são sanções aplicadas a arguidos que cometem crimes, no
primeiro caso o arguido é imputável, no segundo caso é inimputável.
O Código Processo Penal, nos seus artigos 542º a 557º trata da matéria de Execução das Penas.
Refere-se à execução da pena de prisão, da pena de multa, pena suspensa, prestação de trabalho a
favor da comunidade e, das medidas de segurança (internamento, interdição e suspensão da
actividade profissional).
Fase executiva das decisões penais – artigo 324º
As decisões penais condenatórias depois de transitarem em julgado, aplicam-se em todo o
território nacional, têm força executiva, (n.º 1) e art. 427º do Código de Processo Civil.
- A decisão penal é aplicada também fora de Timor, se houver tratado ou convenção e regras de
direito internacional que o preveja (n.º 3).
- As decisões absolutórias aplicam-se de imediato, mesmo antes de transitarem em julgado, isto é,
são exequíveis logo que proferidas (n.º 2).
- Não são aplicáveis as decisões penais que não respeitam os requisitos formais da sentença,
designadamente as situações previstas no art. 325º.
Competência para a execução
Ao Ministério Público compete a promoção da execução da pena – art. 324º, nº 1 in fine e art.
326º, nº 3.
- O Tribunal competente para a execução é o tribunal de 1ª instância:
- Onde o processo corre termos,
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- Ou onde o condenado tem domicilio, para a situação de no Supremo Tribunal de Justiça (actual
Tribunal de Recurso) se julgar o caso “como se fosse a 1ª instância” então a competência para a
execução passa a ser do Tribunal de 1ª instância do domicílio do condenado.
– Art. 326º, nº 1 e n.º 2.
Suspensão do processo de execução – art. 327º
Estando uma pena a ser cumprida, pode ocorrer a sua suspensão, nomeadamente se for instaurado
processo contra magistrado, funcionário de justiça, testemunha ou perito por factos que possam ter
originado a condenação do arguido, até ser decidido este processo (n.º 1).
- Pode também a execução ser suspensa devido a fuga do condenado ou por este não se ter
apresentado após alguma saída autorizada da prisão. Neste caso o cumprimento reiniciar-se-á após
a captura ou a apresentação voluntária – art. 329º, nº 1 do CPP.
Da execução da pena de prisão – art. 328º
A entrada do arguido no Estabelecimento Prisional define o início do cumprimento da pena de
prisão, que termina na manhã do último dia da pena, com a sua libertação - n.º 1.
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- Se a prisão não for cumprida continuamente, ao dia encontrado segundo os critérios anteriores,
acresce o tempo correspondente às interrupções (n.º 2).
- A fuga do condenado, ou não apresentação após alguma saída, tem como consequência a
suspensão da execução da pena de prisão, para efeitos de contagem somam-se os períodos de
tempo interpolados (art. 329º, n.º 1 e 2).
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O Tribunal pode condenar o arguido numa pena de prisão cuja execução fica suspensa por um
período determinado, esta suspensão pode ou não, ser sujeita a alguns deveres; o processo fica a
aguardar o decurso do prazo de suspensão.
- Se o condenado praticar, durante o período da suspensão, outro crime doloso a suspensão será
revogada – art. 339º.
- Noutras situações, a sanção é modificar o conjunto de deveres que condicionam a suspensão da
execução da prisão.
- Antes porém de proferir o despacho de modificação dos deveres o juiz houve sempre o
condenado e o Ministério Público e procede à recolha da prova relativa às circunstâncias que
determinaram o incumprimento – art. 338º do CPP.
- O perdão de pena só é aplicado quando a suspensão for revogada – art. 340º.
Extinção da pena suspensa – art. 341º do CPP
A pena é declarada extinta se, findo o período de suspensão não houver motivo susceptível de
determinar a revogação ou a prorrogação da suspensão, n.º 1.
Caso contrário, aguarda-se que seja proferida decisão sobre a revogação ou prorrogação antes de
se declarar extinta a pena, n.º 2.
Execução da prestação de trabalho a favor da comunidade – art. 342º
O arguido pode requerer que no lugar de pena de multa, ou prisão, cumpra pena de prestação de
trabalho a favor da comunidade.
- Esse trabalho será prestado num organismo público previamente contactado para o efeito, que
informará o tribunal, trimestralmente ou sempre que as circunstâncias o justifiquem, do modo
como está a decorrer o cumprimento da pena (n.º 1).
- Findo o período de prestação de trabalho, e junto aos autos o relatório do organismo onde o
condenado trabalhou, o tribunal declara extinta a pena, art. 342º.
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Recurso
Só é admissível recurso da sentença ou do despacho que puser termo ao processo, art. 350º.
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Requisitos da confirmação
São os que constam do art. 354º, n.º 1, als. a) a e).
- No caso da sentença estrangeira condenar em pena superior ao máximo permitido em Timor, a
pena é reduzida para este máximo (n.º 2).
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- No caso da sentença estrangeira condenar em pena com mínimo inferior ao minimo aplicável em
Timor, tal não impede a confirmação e revisão da sentença (n.º 3).
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