Você está na página 1de 7

NOVO TEMPO / MARANHÃO NOVO:

QUAIS OS TEMPOS DA
OLIGARQUIA?∗

Wagner Cabral da Costa


Professor do Departamento de História da
Universidade Federal do Maranhão - UFMA

“E se as letras do abecedário se repartissem pelos estados de


Portugal, que letra tocaria ao nosso Maranhão? Não há dúvida
que o M. M – Maranhão, M – murmurar, M – motejar [gracejar],
M – maldizer, M – malsinar, M – mexericar, e, sobretudo, M –
mentir: mentir com as palavras, mentir com as obras, mentir
com os pensamentos, que de todos e por todos os modos aqui
se mente...”.

As palavras do padre Antônio Vieira (no Sermão da Quinta Dominga da


Quaresma, pronunciadas no ano de 1654, no começo da conquista e da colonização
portuguesa das terras do norte), de certa forma, pressagiavam uma característica das
elites políticas e econômicas do Maranhão: o uso constante e sistemático da mentira e da
mistificação no exercício do poder, construindo uma realidade falsa e ilusória para
sustentar seus desejos de grandeza e de domínio.

Apenas para ilustrar com a passagem mais conhecida: no século XIX, falava-se
que o estado (e especialmente São Luiz) seria a Atenas Brasileira, por causa da
prosperidade econômica (o Maranhão seria a 4a província mais rica do país) e,
principalmente, devido ao desenvolvimento cultural da região, com seus famosos
escritores e intelectuais. O que a louvação da Atenas sempre “esqueceu” é que essa
“riqueza” econômica e cultural era desfrutada por pouquíssimas pessoas, pois a mesma
foi construída com base na mais brutal exploração dos escravos e dos homens pobres
livres nas lavouras de algodão do Itapecuru, nos canaviais da baixada, nas fazendas de
gado do sertão. Exploração complementada pela repressão e pela violência, pelo
“espichar do couro”, tal como aconteceu no massacre dos revoltosos e dos quilombolas

∗ A primeira versão deste artigo foi escrita para um curso do MST, realizado em outubro/2001, no
assentamento Conceição Rosa (Itapecuru/MA). Agradeço aos vários amigos e companheiros que discutiram,
com textos próprios ou pessoalmente, os temas aqui em pauta.
O presente texto foi originalmente publicado em: SOUSA, Moisés Matias Ferreira de (org.). Os outros
segredos do Maranhão. São Luís: Editora Estação Gráfica, 2002. p. 13-24.
que participaram da Balaiada. De maneira simplificada, poderíamos dizer que a Atenas
Brasileira das elites regionais tinha o seu avesso necessário no tempo do cativeiro: na
escravidão, no latifúndio, na violência e na mentira. Duas faces da mesma moeda...

Hoje, em pleno século XXI, vivemos em uma época que o governo estadual
batizou de Novo Tempo. E aí vem a dúvida: mas o que seria realmente esse Novo
Tempo, apregoado pela oligarquia Sarney através da televisão, do rádio e dos jornais?
Para responder a essa pergunta é preciso voltar um pouco na história, visando entender
quais os processos e mecanismos que levaram o grupo Sarney a conquistar e se
perpetuar no poder estadual. (Por óbvias razões de espaço, seremos sucintos).

Até o limiar dos anos 1960, a política estadual era dominada por um outro grupo
oligárquico, chefiado pelo senador Victorino Freire. Este comandava com mão de ferro o
Maranhão, apoiado nos coronéis latifundiários do interior, nos grandes comerciantes e
industriais, além de utilizar a máquina do governo para beneficiar seus aliados, para
reprimir com imensa violência as manifestações dos trabalhadores e para praticar a
fraude nas eleições, garantindo a “vitória” de seus candidatos. Este foi o tempo da
Ocupação, como se dizia na época.

Nesse período, foi organizada uma ampla e heterogênea aliança política chamada
Oposições Coligadas, que procurou mobilizar a população contra os desmandos do
vitorinismo. Depois de muitos conflitos e embates eleitorais (com destaque para a Greve
de 1951), a frente única oposicionista conseguiu eleger José Sarney ao governo do
estado em 1965. A vitória das Oposições somente foi possível porque contou com o apoio
decisivo da ditadura militar, que se instalara no Brasil em 1964 para reprimir as
mobilizações sindicais e populares em defesa das Reformas de Base (reforma agrária,
reforma educacional, reforma urbana, controle do capital estrangeiro, dentre outras).
Moral da estória: o Maranhão “trocava seis por meia dúzia”, pois saía de cena a oligarquia
vitorinista e começava a se formar a oligarquia Sarney, que cresceu e se fortaleceu à
sombra dos militares no poder.

Esta “mudança” significou a incorporação do Maranhão ao projeto autoritário,


excludente e repressor do regime militar, ao seu projeto de modernização conservadora.
Significou ainda uma maior abertura ao processo de expansão do capitalismo monopolista
na Amazônia, o qual aprofundou as desigualdades sociais, acelerou o processo de
concentração fundiária, assim como a violência, a grilagem e a expulsão dos
trabalhadores de suas terras, aumentando enormemente os conflitos no campo em toda a
região. Por outro lado, o governo Sarney (1966-70) anunciava um Maranhão Novo, uma
nova época de prosperidade e modernização. Os jornais comentavam sobre o “milagre
maranhense”, pois a economia estaria crescendo a índices bastante elevados. Falava-se
também em “desenvolvimento com justiça social”. E poderíamos perguntar: como os
trabalhadores compreendiam e viviam esse momento? O que significava esse processo
para a grande maioria da população? Que “santo” era esse? Esse “milagre” favoreceu a
quem?

E assim, os governos estaduais seguintes, comprometidos com a lógica de


expansão do capitalismo, continuaram falando – e muito – em desenvolvimento,
crescimento econômico, modernização, enfim, do Novo Maranhão que estaria surgindo.
No final dos anos 1970 e nos anos 1980, alardeava-se o progresso que chegaria através
dos projetos do Programa Grande Carajás (com destaque para a ferrovia da Vale do Rio
Doce e para a instalação da multinacional ALUMAR em São Luiz). O governo e os jornais
noticiaram que haveria um milhão de empregos (isso mesmo, um milhão!) para os
maranhenses, o que elevaria as condições de vida e trabalho de toda a população.

Já nos anos 1990, temos convivido com outra versão da mistificação, o Novo
Tempo de Roseana Sarney, que fez uma aposta modernizante e começou o mandato
falando em investimento industrial, em “pólos regionais de desenvolvimento” (quem
conhece a estória da KAO-I em Rosário ou do projeto Salangô em São Mateus?), em
crescimento do turismo (associado ao apoio à cultura popular). Além do mais, o governo
estadual tem procurado implementar algumas medidas do receituário neoliberal, tais
como, a tentativa de doação fraudulenta (disfarçada de “privatização”) do Banco do
Estado, a reforma administrativa (com ênfase na criação das gerências regionais), o apoio
à grande agricultura de exportação (em detrimento da agricultura familiar). Conforme as
elites dominantes, o Maranhão estaria vivendo uma nova fase de “enriquecimento” e já
seria o 4o estado mais rico do Nordeste. Ademais, ainda segundo o discurso oficial, o
progresso trazido pelas políticas do governo Roseana estaria incrementando
substancialmente todos os indicadores sociais, ou seja, melhorando as condições de
todos, no campo e na cidade.

Resumidamente, podemos afirmar que, nesses 35 anos de predomínio da


oligarquia Sarney (1966-2001), uma característica marcante de sua atuação foi a defesa
da modernização capitalista da economia, apregoando uma falsa euforia de
desenvolvimento com justiça social. Esta a base concreta de todo o discurso do
Maranhão Novo e do Novo Tempo, o qual é desmentido pela dura realidade de miséria,
fome e violência, mantidas e perpetuadas pelas práticas do grupo dominante. Pois, ao
contrário do que os meios de comunicação oficiais afirmam, o desenvolvimento
econômico nesse período foi acompanhado pelo crescimento da desigualdade e da
injustiça social, isto é, houve sim crescimento da “riqueza”, mas esta não foi distribuída,
se concentrando cada vez mais em mãos de poucos. Assim, o caráter socialmente
excludente do processo de modernização se constitui no outro lado da moeda... Estado
rico e povo pobre: que novos tempos são estes?

Alguns dados podem ajudar a visualizar melhor o que estamos afirmando. Um


deles refere-se à mudança do perfil da população maranhense, em decorrência da
expansão do capitalismo no campo e das políticas agrárias e agrícolas que beneficiam o
latifúndio, a agroexportação, a impunidade e a violência, expulsando os trabalhadores de
suas terras e provocando o “inchaço” das cidades (ver Tabela 1). Apenas para ilustrar:
entre 1996 e 2000, a população da ilha de São Luiz aumentou em mais de 128 mil
habitantes, o equivalente a uma cidade como Caxias (a 3a maior do estado). Onde vivem
esses homens e mulheres? Do que sustentam suas famílias? Na periferia das cidades
ainda pensam em ter terra para plantar? Um outro exemplo: no projeto de criação do
Estado de Carajás (no sul do Pará) constatou-se que 23% dos habitantes dessa região
eram nascidos no Maranhão, do qual saíram em busca de alternativas de trabalho e
sobrevivência aqui inexistentes. Quantos maranhenses foram mortos no massacre de
Eldorado de Carajás?

Estes e outros elementos ajudam a desmentir a afirmação oficial de que o


Maranhão seria “modelo” de reforma agrária (para quem?). Que “reforma” é essa que
expulsou e continua expulsando do campo aos milhares? Contudo, apesar de todas as
adversidades, as variadas formas de luta e resistência na e pela terra possibilitaram que
cerca de 56% dos trabalhadores no estado ainda hoje estejam ligados a atividades
agrícolas (principalmente à pequena agricultura familiar).
Tabela 1
POPULAÇÃO URBANA, RURAL E TOTAL – MARANHÃO (1960/2000)
1960 1970 1980 1991 1996 2000
Pop. Urbana 442.995 752.027 1.255.156 1.972.421 2.711.175 3.355.577
% 18 % 25 % 31 % 40 % 51,9% 59,5%
Pop. Rural 2.034.376 2.240.886 2.741.248 2.957.832 2.511.008 2.282.804
% 82 % 75 % 69 % 60 % 48,1% 40,5%
Pop. Total 2.477.371 2.992.686 3.996.404 4.930.253 5.222.183 5.638.381
Fonte: Censos IBGE.

Vejamos os números da exclusão social no Maranhão. As estatísticas do IBGE


apontam que 52,9% das famílias têm uma renda mensal de até meio salário mínimo
(abaixo da “linha de pobreza”), ou seja, perto de 2,9 milhões de maranhenses são
miseráveis. Da mesma forma, a Fundação Getúlio Vargas confirma que o estado tem o
“maior número de miseráveis do país”, cerca de 3,5 milhões de pessoas (63,7% da
população), segundo seus cálculos. Conclusão: o Maranhão é o estado mais pobre da
Federação, apresentando desde 1993 o menor PIB per capita do Brasil. Quanto à
distribuição da riqueza, o IBGE informa que, enquanto os 50% mais pobres detinham
apenas 16,4% da renda em 1999, os 1% mais ricos detinham quase o mesmo valor com
15,8% - uma altíssima concentração de renda também exemplificada na Tabela 2.

Tabela 2
PARTICIPAÇÃO NA RENDA (%) – MARANHÃO
1970 1980 1988
10% mais ricos 48,9% 52,1% 54,7%
50% mais 20,9% 16,5% 14,4%
pobres
Fonte: PESSOA & MARTINS, in: Revista de Políticas Públicas, v.2, n.2, jul/dez 1996, p.27.

Os indicadores sociais do IBGE 2000 revelam ainda outras “cifras que choram” do
subdesenvolvimento estadual (Tabela 3). O conjunto desses estarrecedores e revoltantes
dados relativos à EDUCAÇÃO, SAÚDE e RENDA foram agrupados pelo PNUD
(Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) no chamado Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH), que aponta o Maranhão como um dos estados mais
desiguais (ou desumanos) do Brasil, o qual, por sua vez, ocupa a vergonhosa 69a
colocação no mundo. Nos idos de 1966, o então governador José Sarney, ao se referir às
mazelas sociais, afirmava que o estado era o “campo de concentração da democracia
brasileira”. E hoje, passados 35 anos de dominação sarneísta, o que não seria o
Maranhão?
Tabela 3
INDICADORES SOCIAIS – MARANHÃO

INDICADOR ANO-BASE = 1999 POSIÇÃO NO


BRASIL
Crianças (7 a 14 anos) 5,3% 18o
fora da escola
Taxa de analfabetismo 28,8% 25o
(maiores de 15 anos) (3o pior do país)
Taxa de analfabetismo funcional 52,8% 26o
(menos de 4 anos de estudo) (2o pior)
Esperança de vida ao nascer 64,5 anos 24o
o
(4 pior)
Taxa de mortalidade infantil 54,2 24o
o
(em 1000 nascidos vivos) (4 pior)
Proporção médicos / habitantes 1 médico por 27o
1000 habitantes (pior do país)
Domicílios com saneamento básico 8,4% 22o
(água, esgoto e lixo)
Índice de Desenvolvimento Humano 0,547 25o
o
(expectativa de vida, escolarização e (ano-base = 1996) (3 pior do Brasil)
renda)
Fontes: a) IDH: IPEA / PNUD. O índice varia entre zero (desenvolvimento nulo) e um (alto DH),
assim, quanto mais próximo de 1, melhor seria a justiça e igualdade social no país ou região.
b) Síntese dos Indicadores Sociais 2000 / IBGE.

Mesmo se levarmos em conta a ligeira melhora dos indicadores sociais, isto não
pode obscurecer um fato fundamental, qual seja, a responsabilidade dos sucessivos
governos estaduais ligados à oligarquia Sarney na manutenção da desigualdade e da
miséria em terras timbiras, bem como a inexistência de efetivas políticas públicas de
combate e erradicação da pobreza. Em lugar de levá-los a sério, a postura do governo
Roseana e seus porta-vozes tem sido de buscar desacreditar estes dados, chegando
mesmo ao cinismo de negar a existência da pobreza absoluta dos maranhenses, quando
não chegam a dizer que a pobreza é “vontade de Deus”, e não resultante das ações dos
homens, grupos e classes em sociedade. O que a imprensa oficial faz em demasia é
maquiar e distorcer estatísticas, num jogo de marketing com os números. Tudo em nome
da propaganda do Novo Tempo. Mas, afinal, que tempos estranhos são estes?

Paralelamente à conjugação de desenvolvimento econômico + injustiça social


crescente, pode-se observar nos últimos anos uma série de práticas da oligarquia que
visam reestruturar e reorganizar o sistema de dominação política e social no estado.
Assim, ao lado das velhas estratégias de utilização da máquina pública para garantir a
continuidade do poder estabelecido (a corrupção, o clientelismo, o favorecimento de
aliados e parentes, como também a repressão e a violência), outras estratégias têm sido
adotadas pelo governo Roseana Sarney objetivando angariar legitimidade e apoio social.
Uma delas foi a reforma administrativa que pretendeu criar uma ilusão de participação e
cidadania, através da construção de canais de “diálogo” e “colaboração” entre o governo,
lideranças políticas e religiosas, movimentos sociais e a população em geral. Reforma
conjugada à adoção de “políticas compensatórias” (isto é, de distribuição de migalhas)
junto às comunidades urbanas e rurais (a maior parte intermediada por políticos da base
governista, como o programa “Comunidade Viva”), visando reciclar o sistema de
apadrinhamento e de cooptação, bem como contribuir para o enfraquecimento e
fragmentação dos movimentos sociais.

Outra das estratégias relaciona-se ao domínio dos meios de comunicação de


massa e ao marketing dos números, numa tentativa de constituição de “currais eleitorais
eletrônicos”, através de intensa propaganda, de comícios, de governos itinerantes, de
vazios slogans de governo – enfim, uma bem planejada e executada política do
espetáculo, que tem como principal suporte o Sistema Mirante e demais órgãos de
imprensa controlados pelos aliados da oligarquia. Uma das facetas desse processo é o
investimento político e simbólico na cultura popular, estratégia que, além de vincular-se à
indústria do turismo, busca reconstruir a identidade regional e criar novos modos de
legitimação da dominação (assim, a própria governadora acabou por se transformar em
brincante de bumba-meu-boi e outras manifestações). Dessa forma, procurou-se unificar
“por cima” a tradição da Atenas Brasileira e as tradições religiosas e culturais populares.
Como no século XIX, vale a pena perguntar: qual o outro lado dessa moeda? Que
estranho novo tempo é esse de “valorização” da cultura popular enquanto aumenta a
miséria da população?

Os resultados dessa reorganização do sistema de dominação foram bastante


satisfatórios do ponto de vista da oligarquia, como demonstram os dados das últimas
eleições, em que os candidatos governistas foram amplamente vitoriosos, com louváveis
exceções (ver Tabela 4). Outrossim, os índices de popularidade da governadora estão
entre os mais altos do Brasil, habilitando-a a se projetar no cenário político nacional como
um dos nomes mais expressivos do PFL. As pesquisas de opinião sobre as eleições de
2002 passaram a incluí-la entre os presidenciáveis, ao lado de Lula (PT), Ciro Gomes
(PPS), Itamar Franco (PMDB), dentre outros.

Tabela 4
BASES POLÍTICAS DA OLIGARQUIA SARNEY (1986/2000)
1986/88 1990/92 1994/96 1998/2000
Coligação Aliança Maranhão Frente Novo
Democrática do Povo Popular Tempo
Governadores Cafeteira Lobão Roseana Roseana
Senadores 2 --- 2 1
Deputados 16 8 13 13-16
federais (em 18) (em 18) (em 18) (em 18)
Deputados 34 17-19 26-33 26-33
estaduais (em 42) (em 42) (em 42) (em 42)
Prefeitos 110 75 152 189-202
(em 136) (em 136) (em 217) (em 217)
Fonte: TRE - MA.
De passagem, vale destacar algumas curiosas semelhanças entre as candidaturas
de Roseana e de Fernando Collor de Melo (em 1989). Naquele momento, não existia um
candidato a presidente que reunisse em torno de si o apoio das elites dominantes do país
e que pudesse se contrapor à forte candidatura operária de Luís Inácio Lula da Silva (PT).
Esta situação permitiu que surgisse uma “novidade” (Collor), saída de um estado pobre do
Nordeste, dominado por seu grupo político (com relações, inclusive, com a ditadura
militar). Assim, o governador de Alagoas (até então desconhecido da grande maioria dos
brasileiros) foi “fabricado e vendido”, da noite para o dia, pelos meios de comunicação
(em especial, a Rede Globo), apresentando-se como um “governador-modelo” (lembram-
se da “caça aos marajás”?), “jovem forte e dinâmico”, que faria agora a “salvação” ou
“reconstrução nacional” (lembram-se do PRN?). Todo mundo sabe como essa estória
terminou... Em 2002, a “novidade” eleitoral pode ser a “governadora-modelo”, cujo partido
(o PFL) quer vender para todo o Brasil a pílula dourada do (falso) “milagre maranhense”,
acrescida ainda de outra “novidade”: uma mulher na política nacional...

Em nível estadual, o grupo Sarney já canta de galo, afirmando que repetirá em


2002 os resultados de 1998/2000, qualquer que seja seu candidato a governador
(provavelmente entre Édson Lobão e José Reinaldo Tavares). Ao mesmo tempo, setores
da oposição conservadora e da esquerda falam em reeditar a velha estratégia da frente
única contra a oligarquia (seria uma nova “troca de seis por meia dúzia”, como José
Sarney x Victorino Freire nos anos 1960?). Esta frente oposicionista reuniria diversos
partidos (PSDB, PSB, PDT, PT), em torno de nomes como Jackson Lago ou Roberto
Rocha. Os cenários de 2002 apresentam-se bastante nebulosos, embora estejamos a
poucos meses de sua definição. A questão que se coloca a todos os efetivamente
comprometidos com a proposta de transformação social (e não apenas com a mudança
de nomes) é: como construir uma alternativa política (que englobe e ultrapasse o
momento eleitoral), baseada num projeto popular e democrático, e alicerçada num
processo de fortalecimento e (re)organização dos movimentos sociais no estado? Este, a
nosso ver, o desafio coletivo...

“De maneira que o Sol, que em toda a parte é a regra


certa e infalível por onde se medem os tempos, os
lugares, as alturas, em chegando à terra do Maranhão,
até ele mente. E terra onde até o Sol mente, vede que
verdade falarão aqueles sobre cujas cabeças e corações
ele influi”.

Neste outro trecho de seu Sermão, Antônio Vieira ressaltou ainda as (más)
qualidades da terra e sua gente. Sem aceitar a generalização indevida do padre jesuíta,
procuramos neste breve artigo chamar a atenção para uma prática sistemática das elites
regionais: o uso da mentira e da mistificação no exercício do poder, enquanto mecanismo
de legitimação e de construção de uma euforia ilusória e passageira. Processo que um
pesquisador recentemente denominou de experiência do falso, referindo-se a outro
contexto. Assim, que significados comportaria o tão anunciado Novo Tempo? Que tempos
são estes da oligarquia? M – Maranhão, M – modernidade, M – (falso) modelo, M – (falso)
milagre, M – mentira, M – miséria, M – morte, que de todos e por todos os modos aqui se
mata... no espetáculo sombrio conduzido pela política dominante.

“Ora, sabeis discernir o aspecto do céu, e não podeis


discernir os sinais dos tempos?”. (Mateus 16:3)
São Luiz, outubro de 2001.

Você também pode gostar