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Mestrado em

Reabilitação Psicomotora

Núcleo de Estágio em
Saúde Mental

2º ano | 1º semestre

Análise do
Desenho
Orientador Académico:
Prof. Dr. Rui Martins Infantil
Sara Duarte
saraduarte06@gmail.com
Índice
O desenho infantil e as suas funções

 Evolução do desenho infantil

 Desenho infantil e personalidade

 Analisando o desenho da árvore, da


família e da figura humana

 Papel da psicomotricidade
Desenho Infantil
 Linguagem própria da criança

 Expressa pensamentos, sentimentos,


desejos, emoções

 “Faz de conta” (interação entre o


imaginário e o meio envolvente)

Representação baseada na
experiência da criança

Widlöcher (1971), Barbosa (2005), Gomes (2009)


Funções do Desenho
O desenho permite ao sujeito:

Tornar visível o invisível, consciente o


inconsciente, comunicar um mal-estar e
defender-se contra a angústia

Expressar-se sem necessidade de verbalizar

Projetar o seu próprio corpo e desejos

Refletir a sua personalidade

Pedir ajuda
Evolução do Desenho (1)
 Surge de forma espontânea e evoluir ao ritmo do
desenvolvimento global da criança

 Dimensão subjetiva inerente à idade da criança

 Analisar o desenho implica o conhecimento sobre o


estádio de evolução do desenho em que a criança
se encontra

Rabiscos
Desenho
(garatuja)

Barbosa (2005), Gomes (2009)


Evolução do Desenho (2)
 O papel principal do desenho é REPRESENTAR algo

 O desenho infantil caracteriza-se pelo realismo intencional

Realismo Realismo
Fortuito Visual

Realismo Realismo
Falhado Intelectual

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)


Evolução do Desenho (3)

0-1 anos: Resposta reflexa

1-2 anos: Fase do Realismo Fortuito / Garatuja

• O desenho é apenas uma ação sobre


uma superfície, na qual a criança sente
prazer em constatar os efeitos visuais
que essa ação produz

• Não existe intenção de representar um


objeto
Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)
Evolução do Desenho (4)

2-3 anos: Fase do Realismo Falhado

• Surge o desenho intencional, porém com um


“desnível” entre a intenção e as capacidades
gráficas  Falhas na execução

• Linhas verticais, horizontais e a mandala

• Aquisição do controlo do traçado

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)


Evolução do Desenho (5)

4-7 anos: Fase do Realismo Intelectual (1)

• Desenho premeditado em que a criança usa


os esquemas gráficos para significar a
realidade exterior

• Mudança de pontos de vista do desenho, i.e. a


criança desenha observando parte do objeto de
um ângulo e parte de outro a partir de outro
ângulo (e.g. um corpo de frente e pés de perfil)

• Uso de transparências
Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)
Evolução do Desenho (6)

4-7 anos: Fase do Realismo Intelectual (2)

• Uso de pormenores que


facilitam a identificação do
desenho

• O desenho criado está


dependente quer da perceção
que a criança tem das coisas,
quer do seu próprio estilo
(controlo motor)

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)


Evolução do Desenho (7)

7-12 anos: Fase do Realismo Visual

• O objeto é desenhado pela criança tal e qual como é


visto por ela (ao invés de como elas são conhecidas na
fase anterior)

• Surge a noção de perspetiva

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)


Evolução do Desenho (8)

7-12 anos: Fase do Realismo Visual

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971), Coelho (1993)


Evolução do Desenho (8)

Imagem retirada do livro “Le dessin et l’écriture dans l’acte clinique” de Marcilhacy (2011)
Evolução Gráfica do Desenho
A diminuição da velocidade do gesto permite a evolução de:

Traço
Traço contínuo,
descontínuo,
amplo e pouco
curto e repetido,
controlado
linear ou circular

A evolução do desenho pressupõe:

 Controlo Motor
 Integração Visuomotora
 Maturidade Emocional
Desenho e Personalidade (1)
O desenho, enquanto sistema expressivo,
revela a dimensão afetiva da criança pelo
tipo de grafismo, temas , cores, formas,
posicionamento na folha, etc

Através do desenho, a criança revela:


•Capacidades práticas
•Traços da sua personalidade

Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971)


Desenho e Personalidade (2)
1) Valor expressivo do desenho
• Depende do gesto gráfico, da escolha do tema, das
formas e das cores, posição no espaço
2) Valor projetivo do desenho
• O estilo geral da figuração revela a visão da criança sobre
o mundo; ela projeta a sua maneira de ver esse mundo
3) Valor narrativo do desenho
• Manifestação dos interesses, gostos e preocupações
(produtos da imaginação ao narrar o desenho)
4) Sentimentos e pensamentos inconscientes
• Expressão de objetos recalcados
Luquet (1927, cit in Widlöcher, 1971)
1) Valor Expressivo (Cores)
A cor tem valor expressivo, no qual cada cor e as suas
combinações têm efeitos próprios e exprimem uma
tonalidade emocional

Inicialmente, a criança usa as cores indiscriminadamente;


ao longo do tempo irá usar as cores reais do objetos que
quer representar

Progressivamente, a riqueza do jogo de cores corresponde


a uma libertação da afetividade

Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Cores)
Unicolor
•Significa preguiça ou falta de motivação
•Ao elaborar menos sobre a cor, ela dá mais
importância ao traço e à forma
•Pobreza afetiva e eventuais traços
depressivos

Cores quentes
•Crianças abertas, bem adaptadas ao
grupo
•Alegres, calmas

Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Cores)

Cores neutras
•Crianças fechadas, independentes

Cores frias
•Crianças com tendência para se
concentrarem em si mesmas

Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Cores)
Preto
•Inibição, medo, ansiedade,
depressão

Violeta
•Isolamento, rigidez, medo, misto
de imaturidade e impulsividade

Vemelho
• Hostilidade
Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Posição no espaço - 1)
• Representa o intelecto, a imaginação
Parte superior da
e o futuro; a criança expressa a sua
folha
curiosidade e desejo de descoberta

Parte inferior da • Representa o passado, as


folha necessidades físicas e materiais;
necessidade de suporte/estabilidade

Grande separação • Representa insegurança e baixa


espacial autoconfiança

Tendência para • Representa falta de controlo,


ultrapassar os limites imaturidade; pode também indicar
da folha uma atitude de oposição
Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Posição no espaço - 2)
Predominância • A criança pode estar ligada a um
sobre o lado acontecimento do passado
esquerdo • Pode representar impulsividade

Predominância • A criança está ligada ao presente e


sobre o centro da disponível para o que a rodeia
folha
• Não sofre de tensão ou ansiedade

Predominância
sobre o lado • A criança pensa no futuro e coloca
direito muita energia e esperança nele

Widlöcher (1971)
1) Valor Expressivo (Pressão exercida no traço)
Aspeto a considerar na observação psicomotora…

Elevada Pressão Fraca Pressão


pressão normal pressão variável
• Maior a • Entusiasmo • A criança • Hesitação
cólera empenha- • A criança
e vontade
presente se de forma não é
distante, constante
sem na sua
convicção afirmação
ou pode presente
sentir fadiga
física

Widlöcher (1971)
2) Valor Projetivo
 O desenho reflete uma visão global
da personalidade da criança

 Em qualquer que seja a idade, no


desenho existe projeção de afetos,
pensamentos, desejos, medos

 Em suma, a produção gráfica fornece


informações cognitivas, percetivas e
afetivas da criança

Widlöcher (1971), Marcilhacy (2011)


2) Valor Projetivo

Criança Sensível

 Interessa-se por objetos familiares, o que dá aos seus


desenhos uma impressão de imensa riqueza:
paisagens, árvores, casas, estradas, pormenores e
detalhes; dinamismo

 Tons vivos e realistas

Widlöcher (1971)
2) Valor Projetivo

Criança Racional

 É o oposto da criança sensível

 O desenho apresenta cor; a construção é precisa e


equilibrada, mas estática e imóvel; os traços são
claros, e verifica-se simetria

 O espaço não é completamente preenchido, os


objetos deixam entre si superfícies vazias

Widlöcher (1971)
3) Valor Narrativo
A escolha do tema determina-se pelo desejo de
representar certo objeto, e relaciona-se com as suas
motivações, gostos, preocupações, receios

A criança escolhe objetos do seu quotidiano, dos livros que


gosta, da sua própria imaginação (e não temas sugeridos por
terceiros)

O valor narrativo do desenho tem uma significação


simbólica; É o resultado do seu mundo imaginário

A análise permite o conhecimento das relações afetivas


da criança com o que a rodeia
Widlöcher (1971)
4) Sentimentos e pensamentos
m
inconscientes
Relação entre as representações inconscientes e a
dimensão afetiva da criança

Assim, os seus desenhos irão expressar essencialmente os


desejos/medos/pensamentos que “tocam” mais
diretamente na sua dimensão afetiva

e.g. No desenho da família, a criança pode evidenciar os


seus problemas na relação com os pais, quer como ela
deseja essa relação, quer como ela a está a viver
Widlöcher (1971)
Analisando o…

Desenho da Árvore

Desenho da Família

Desenho da Figura Humana


Desenho da Árvore
 As três principais
partes da árvore
referem-se aos três
maiores campos da
personalidade:

As raízes – dimensão
instintiva
O tronco – dimensão
emocional e social
A folhagem – dimensão
intelectual
Desenho da Árvore
 BASE: Representa o tipo de estabilidade que o seu
ambiente lhe dá

 ALTURA E COMPRIMENTO DO TRONCO: Reflete a atitude e


comportamento da criança em relação ao exterior; a sua
perceção social e o lugar que ela ocupa socialmente
- Buraco no tronco pode significar a existência de algum trauma

 RAMOS E FOLHAS: Representa a imaginação e criatividade


- Uma folhagem muito pesada pode representar um excesso de
responsabilidade ou de atividade para a criança
- A árvore fechada na copa significa autocontrolo
Desenho da Família
 O que ter em consideração
na análise do desenho da
família?

 Composição da família
 Tamanho e forma de cada
elemento
 Ordem de aparecimento dos
elementos
 Distribuição do conjunto da
família
 Lugar que a criança dá a si
própria
Widlöcher (1971)
Desenho da Família

A omissão de uma personagem pode significar que a


criança vê esse elemento excluído da família, ou exprime
o desejo de o ver excluído

Em terapia, o desenho da família pode conduzir a uma


conversa que permita perceber como a criança vive a
relação familiar, o seu lugar neste meio e a natureza de
possíveis problemas afetivos

Widlöcher (1971)
Desenho da Figura Humana

+ 10 anos
8 anos

6/7 anos

3/4 anos

Escala de Wintsch, in Widlöcher (1971)


Papel da Psicomotricidade

Encorajar a expressão do seu mundo interior, aumentando


a expressividade, a criatividade e a comunicação

Dar suporte para a criança poder aceder à representação


e atividade simbólica a partir da vivência concreta
corporal assegurando a ligação entre a componente
práxica e gnósica

Permitir organizar a expressão figurativa da noção do corpo


Conclusões
Pelo processo criativo, a criança realiza um exercício de união
entre o pensamento, o sentimento e a perceção

O desenho pode ser uma ajuda para uma maior


consciencialização, que ponha ordem nas pressões do
inconsciente

Desenhos são apenas uma parte de uma avaliação abrangente


e auxiliares no diagnóstico e na terapia

O desenho não deve ser analisado isoladamente, mas sim


relacionado com o comportamento presente e com a história
pessoal da criança

Através do desenho são incrementadas três áreas importantes


do desenvolvimento global: a cognitiva, a afetiva e a motora
Referências Bibliográficas
 Barbosa, M. d. (2005). Representação de Acontecimentos através do
Desenho com Crianças de 3/4 e 5/6 anos. Instituto Superior de Psicologia
Aplicada: Dissertação de Mestrado em Psicologia Educacional.

 Coelho, J. C. (1993). Mecanismos de Defesa no Desenho Infantil. Instituto


Superior de Psicologia Aplicada: Dissertação de Mestrado em
Psicopatologia e Psicologia Clínica.

 Gomes, Z. F. (2009). Desenho Infantil - Modos de interpretação do mundo e


simbolização do real. Um estudo em Sociologia da Infância. Universidade
do Minho: Instituto de Estudos da Criança: Tese de Mestrado em Sociologia
da Infância.

 Marcilhacy, C. (2011). Le dessin et l'écriture dans l'acte clinique. Elsevier


Masson.

 Widlöcher, D. (1971). Interpretação dos desenhos infantis. Vozes.

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