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QUARTO MUNDO, RESISTÊNCIA E OS KAYAPÓS

John Lennon Lima e Silva1

A idealização do chamado “quarto mundo” se constitui a partir de conceitos pré-


determinados e que são estabelecidos mediante características universais de consumo,
sociedade e cultura. Desse ponto de vista, a qualificação dos povos ditos “inferiores” é
conceituada sob a ótica dominante, que pressupõe níveis de civilidade e desenvolvimento
que não abrangem perspectivas não ocidentais. Ao ignorar elementos que legitimam a
cultura e a memória dos povos indígenas, cria-se um parâmetro excludente que não
reconhece as tradições seculares e territórios importantes na constituição do passado
dessas civilizações.

A produção decolonialista abrange os discursos que incluem e transformam as


tradições culturais do terceiro e quarto mundo, a partir de uma ótica não europeia, que é
historicamente imposta e perpetuada como original e dominante. Ao analisar o discurso
dos Kaiapós durante o encontro dos povos indígenas na Faculdade Integrada Brasil
Amazônia, percebemos que suas identidades são estabelecidas por lutas constantes que
buscam enaltecer a memórias de suas comunidades, e a procura de seu espaço quanto
legítimos donos da terra e da história. O líder nos mostra o quanto é necessário resgatar
esse passado glorioso, que disputa espaço com estereótipos de povos obsoletos e
atrasados e criam resistências sociais para os fenômenos da globalização e da
universalização dos saberes, costumes e memórias.

Dentro desse viés, colocar os povos indígenas como elementos do quarto mundo,
apenas amplia o discurso de que tudo aquilo que não se enquadra em uma perspectiva de
consumo, padrão moral e religioso, são automaticamente colocados à margem da
civilização “desenvolvida”. A construção do elemento “pobreza” mediante critérios da
sociedade capitalista, remete-se exclusivamente a um julgamento que padroniza todos os
povos como desenvolvidos e não desenvolvidos.

Essa dicotomia submete as culturas e costumes, e estabelece um princípio regido


apenas por fatores econômicos. A tentativa dos povos indígenas em resgatar suas

1
Historiador, especialista em história contemporânea e mestrando em Psicologia Social pela Universidade
Federal do Pará – Brasil
ORCID - https://orcid.org/0000-0001-8059-0538
memórias como referencial de identidade no mundo, nos projeta o quanto os processos
políticos e socioeconômicos são predominantemente baseados na ocidentalização
crescente e no ideal de sociedade moderna.

Deste modo, o discurso dominante não só julga, mas como transforma a realidade
através da imposição da cultura ocidental civilizatória. Essas ações constituem processos
excludentes, e que não propõe debates sobre a constituição do passado de inúmeras
nações. Os Kayapós, quanto movimento que resiste a essa dominação cultural, são povos
que ainda perpetuam essa composição do legado amazônico e brasileiro, nas matrizes que
dão origem ao nosso povo.

Assim, descontruir a imagem eurocêntrica é ampliar as discussões culturais que


resistem e vivem em meio aos povos do “quarto mundo”, e é também o marco crucial
para a compreensão e respeito da história dessas civilizações como formadoras de modos
vida, de saberes e práticas culturais.

REFERENCIAS

SHOHAT, Ella. STAM, Robert. Do eurocentrismo ao policentrismo. In: Crítica a imagem


eurocêntrica: multiculturalismo e representação. São Paulo, Cosac Naif, 2006, p. 37-88.

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