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MANUAL DE TRONCO COMUM DOS

CURSOS DE LICENCIATURA
ANTROPOLOGIA GERAL

ENSINO ONLINE. ENSINO COM FUTURO 2022


UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

MANUAL DE TRONCO COMUM DOS


CURSOS DE LICENCIATURA
ANTROPOLOGIA GERAL

2º ANO: MANUAL DE TRONCO COMUM


CÓDIGO

TOTAL HORAS/ 1 SEMESTRE 100

CRÉDITOS (SNATCA) 4

NÚMERO DE TEMAS 8

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Direitos de autor (copyright)

Este manual é propriedade da Universidade Aberta ISCED (UnISCED), e contém reservados


todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução parcial ou total deste manual, sob
quaisquer formas ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico, gravação, fotocópia ou
outros), sem permissão expressa de entidade editora (Universidade Aberta ISCED) UnISCED.

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Agradecimentos

A Universidade Aberta ISCED (UnISCED) e o autor do presente manual agradecem a


colaboração dos seguintes indivíduos e instituições na elaboração deste manual:

Pela Coordenação Vice-reitoria Académica do ISCED (UnISCED)

Pelo design Direcção de Qualidade e Avaliação do ISCED

Financiamento e Logística
Instituto Africano de Promoção da Educação
a Distância (IAPED)
Pela Revisão
2019
Ano de publicação
2022
Ano de actualização ISCED-Beira
Local de publicação

Elaborado Por: Jone Januário Mirasse,


Mestre em Desenvolvimento Rural

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Índice
Visão geral............................................................................................................................................. 9
Bem-vindo à Disciplina/Módulo de Antropologia ................................................................................ 9
Objectivos do Módulo ........................................................................................................................... 9
Quem deveria estudar este módulo ....................................................................................................... 9
Como está estruturado este módulo..................................................................................................... 10
Ícones de actividade ............................................................................................................................ 11
Habilidades de estudo.......................................................................................................................... 11
Precisa de apoio? ................................................................................................................................. 12
Tarefas (avaliação e auto-avaliação) ................................................................................................... 13
Avaliação............................................................................................................................................. 13
TEMA 1: FUNDAMENTOS DAS CIENCIAS SOCIAIS ................................................................. 16
UNIDADE 1.1. Introdução Geral........................................................................................................ 16
Introdução............................................................................................................................................ 16
Sumário ............................................................................................................................................... 17
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 17
UNIDADE 1.2. Constituição e desenvolvimento das ciências sociais................................................ 19
Introdução............................................................................................................................................ 19
Sumário ............................................................................................................................................... 23
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 23
UNIDADE 1.3. Pluralidade, diversidade e interdisciplinaridade nas ................................................. 24
Introdução............................................................................................................................................ 24
Sumário ............................................................................................................................................... 27
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 27
UNIDADE 1.4. Ruptura com senso comum ....................................................................................... 29
Introdução............................................................................................................................................ 29
Sumário ............................................................................................................................................... 30
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 31
TEMA 2: HISTÓRIA DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO .................................................... 32
UNIDADE 2.1. Origem ...................................................................................................................... 32
Introdução............................................................................................................................................ 32
Sumário ............................................................................................................................................... 33
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 35
UNIDADE 2.2. A curiosidade intelectual e o interesse pelo exótico.................................................. 36
Introdução............................................................................................................................................ 36
Sumário ............................................................................................................................................... 37
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 37
UNIDADE 2.3. A universalização da antropologia ............................................................................ 39
Introdução............................................................................................................................................ 39
Sumário ............................................................................................................................................... 41
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 41
UNIDADE 2.4. As diferentes “cores” e campos de ............................................................................ 42

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aplicação da antropologia .................................................................................................................... 42


............................................................................................................................................................. 42
Sumário ............................................................................................................................................... 43
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 43
TEMA 3: DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA .............................................................. 45
UNIDADE 3.1. Antropologia como ciência ....................................................................................... 45
Introdução............................................................................................................................................ 45
Sumário ............................................................................................................................................... 47
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 47
UNIDADE 3.2. A antropologia interpretativa a.................................................................................. 48
antropologia pós-moderna ................................................................................................................... 48
Introdução............................................................................................................................................ 48
Sumário ............................................................................................................................................... 50
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 50
UNIDADE 3.3. Diferentes ramos da antropologia ............................................................................. 51
Sumário ............................................................................................................................................... 54
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 54
TEMA 4:O CONCEITO DE ANTROPOLOGIA CULTURAL......................................................... 56
UNIDADE 4.1. Definições e abordagens sobre .................................................................................. 56
Antropologia Cultual ........................................................................................................................... 56
Introdução............................................................................................................................................ 56
Sumário ............................................................................................................................................... 59
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 60
UNIDADE 4.2. Origem e o desenvolvimento da cultura .................................................................... 61
Introdução............................................................................................................................................ 61
Sumário ............................................................................................................................................... 63
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 63
UNIDADE 4.3. Cultura e sociedade ................................................................................................... 64
Introdução............................................................................................................................................ 64
Sumário ............................................................................................................................................... 65
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 65
UNIDADE 4.4.A cultura material e a cultura imaterial ...................................................................... 68
Introdução............................................................................................................................................ 68
Sumário ............................................................................................................................................... 69
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 69
TEMA 5:TEORIAS, FACTOS E PROCESSOS NA ANTROPOLOGIA.......................................... 70
UNIDADE 5.1. As principais correntes Antropológicas .................................................................... 70
Introdução............................................................................................................................................ 70
Sumário ............................................................................................................................................... 79
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 79
UNIDADE 5.2.Desenvolvimento histórico e principais áreas de interesse contemporâneas ............. 80
Introdução............................................................................................................................................ 80
Sumário ............................................................................................................................................... 82

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Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 82


UNIDADE 5.3. As correntes antropológicas e sua ............................................................................. 83
operacionalização em Moçambique .................................................................................................... 84
Introdução............................................................................................................................................ 84
Sumário ............................................................................................................................................... 86
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 86
TEMA 6:TRADIÇÃO E IDENTIDADE CULTURAL ...................................................................... 87
UNIDADE 6.1.A génese da multiplicidade cultural na ...................................................................... 87
Introdução............................................................................................................................................ 87
Sumário ............................................................................................................................................... 88
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 88
UNIDADE 6.2.O processo de construção do império colonial e a pluralidade cultural ..................... 90
Introdução............................................................................................................................................ 90
Sumário ............................................................................................................................................... 91
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 92
UNIDADE 6.3.A antropologia na África colonial e pós-colonial ...................................................... 93
Introdução............................................................................................................................................ 93
Sumário ............................................................................................................................................... 94
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 94
UNIDADE 6.4.A antropologia em Moçambique colonial e pós colonial ........................................... 96
Introdução............................................................................................................................................ 96
Sumário ............................................................................................................................................... 98
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO .................................................................................................. 98
UNIDADE 6.5. Dinâmica aculturacional e permanência de modelos societais endógenos ............. 100
Introdução.......................................................................................................................................... 100
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 103
TEMA 7:CULTURA E EDUCAÇÃO EM MOÇAMBIQUE .......................................................... 104
UNIDADE7.1.Saberes e Contextos contemporâneos de Aprendizagem em Moçambique .............. 104
Introdução.......................................................................................................................................... 104
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 107
UNIDADE 7.2.O paradigma da diversidade cultural em Moçambique ............................................ 108
Introdução.......................................................................................................................................... 108
Sumário ............................................................................................................................................. 110
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 111
UNIDADE 7.3.Os discursos da identidade nacional moçambicana: da ideologia á prática ............. 112
Introdução.......................................................................................................................................... 112
Sumário ............................................................................................................................................. 113
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 113
UNIDADE 7.4.A construção do Outro e a ........................................................................................ 114
etnicização/tribalização em Moçambique ......................................................................................... 114
Introdução.......................................................................................................................................... 114
Sumário ............................................................................................................................................. 115
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 115

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TEMA 8: PARENTESCO, FAMILIA E CASAMENTO EM MOÇAMBIUE ................................ 116


UNIDADE 8.1.Introdução ao estudo das relações de parentesco ..................................................... 116
Introdução.......................................................................................................................................... 116
Sumário ............................................................................................................................................. 119
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 119
UNIDADE 8.2.Nomenclatura, Simbologia e Características do parentesco (filiação, aliança e
residência) ......................................................................................................................................... 120
Introdução.......................................................................................................................................... 120
Sumário ............................................................................................................................................. 123
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 124
TEMA 9:FAMILIA EM CONTEXTO DE MUDANÇA EM MOÇAMBIQUE .............................. 125
UNIDADE 9.1. Origem e evolução histórica do conceito de família ............................................... 125
Introdução.......................................................................................................................................... 125
Sumario ............................................................................................................................................. 127
UNIDADE 9.2. Família como fenómeno cultural............................................................................. 128
Introdução.......................................................................................................................................... 128
UNIDADE 10.4. A emergência de sincretismos religiosos e de igrejas messiânicas em Moçambique
........................................................................................................................................................... 148
Sumário ............................................................................................................................................. 150
Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO ................................................................................................ 150

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Visão geral

Bem-vindo à Disciplina/Módulo de
Antropologia Cultural de Moçambique

Objectivos do Módulo

Ao terminar o estudo do módulo de Antropologia Cultural de


Moçambique, deverá ser capaz de: identificar e interpretar
diferentes manifestações do ser humano e fenómenos emanados da
acção da sociedade imbuída no seu meio endógeno e também os
sinais emitidos pelo meio exógeno. Identificar as trajectórias do
pensamento antropológico desde a emergência da disciplina à
actualidade; Conhecer o saber e o fazer antropológicos actuais;
Familiarizar-se com as abordagens da noção de cultura do clássico
ao pós-moderno; Reconhecer as linhas de homogeneidades e
heterogeneidades do território etnográfico nacional; Apresentar
algumas das novas questões e paradigmas da antropologia, com
reflexos em Moçambique.


Conhecer a história da Antropologia e sua importância na vida
 humana.

Definir Antropologia Cultural.
Objectivos
▪
Específicos Aplicar os conhecimentos da Antropologia Cultural
paraidentificar e aplicar as diferentes teorias na resolução prática
de fenómenos observados.


Reconhecer e interpretar tendências e novas abordagens no
contexto das dinâmicas sociais.

Quem deveria estudar este módulo

Este Módulo foi concebido para estudantes do 1º ano do curso de


licenciatura da UnISCED. Poderá ocorrer que, havendo leitores que
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queiram se actualizar e consolidar seus conhecimentos nesta


disciplina, serão bem-vindos, não sendo necessário para tal se
inscrever. Mas poderá adquirir o manual de acordo com os
procedimentos estabelecidos pela UnISCED.

Como está estruturado este módulo

Este módulo de Antropologia Cultural, é para estudantes do 1º ano


do curso de licenciatura e à semelhança dos restantes módulos do
UnISCED, está estruturado como se segue:
Páginas introdutórias
▪ 
 Um índice completo.
Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo, resumindo
os aspectos-chave que você precisa conhecer para melhor
estudar. Recomendamos vivamente que leia esta secção com
atenção antes de começar o seu estudo, como componente de
habilidades de estudos.
Conteúdo desta Disciplina / módulo

Este módulo está estruturado em Temas. Cada tema, por sua vez
comporta certo número de unidades temáticas ou simplesmente
unidades. Cada unidade temática se caracteriza por conter uma
introdução, objectivos, conteúdos.
No final de cada unidade temática ou do próprio tema, são
incorporados antes o sumário, exercícios de auto-avaliação, só
depois é que aparecem os exercícios de avaliação.
Os exercícios de avaliação têm as seguintes características: Puros
exercícios teóricos/Práticos, Problemas não resolvidos e actividades
práticas, algumas incluindo estudo de caso.

Outros recursos

A equipa dos académicos e pedagogos da UnISCED, pensando em si,


num cantinho, recôndito deste nosso vasto Moçambique e cheio de
dúvidas e limitações no seu processo de aprendizagem, apresenta
uma lista de recursos didácticos adicionais ao seu módulo para você
explorar. Para tal a UnISCED disponibiliza na biblioteca do seu centro
de recursos mais materiais de estudos relacionados com o seu curso
como: Livros e/ou módulos, CD, CD-ROOM, DVD. Para além deste
material físico ou electrónico disponível na biblioteca, pode ter
acesso a Plataforma digital moodle para alargar mais ainda as
possibilidades dos seus estudos.

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Auto-avaliação e Tarefas de avaliação

Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final


de cada unidade temática e de cada tema. As tarefas dos exercícios
de auto-avaliação apresentam duas características: primeiro
apresentam exercícios resolvidos com detalhes. Segundo, exercícios
que mostram apenas respostas.
Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação
mas sem mostrar os passos e devem obedecer o grau crescente de
dificuldades do processo de aprendizagem, umas a seguir a outras.
Parte das tarefas de avaliação será objecto dos trabalhos de campo
a serem entregues aos tutores/docentes para efeitos de correcção e
subsequentemente nota. Também constará do exame do fim do
módulo. Pelo que, caro estudante, fazer todos os exercícios de
avaliação é uma grande vantagem.
Comentários e sugestões

Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados


aspectos, quer de natureza científica, quer de natureza didáctico-
Pedagógica, etc., sobre como deveriam ser ou estar apresentadas.
Pode ser que graças as suas observações que, em gozo de confiança,
classificamo-las de úteis, e no próximo módulo venham a ser
melhoradas.

Ícones de actividade

Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas


margens das folhas. Estes ícones servem para identificar diferentes
partes do processo de aprendizagem. Podem indicar uma parcela
específica de texto, uma nova actividade ou tarefa, uma mudança
de actividade, etc.

Habilidades de estudo

O principal objectivo deste campo é o de ensinar aprender a


aprender. Aprender aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para


facilitar a aprendizagem e alcançar melhores resultados, implicará
empenho, dedicação e disciplina no estudo. Isto é, os bons
resultados apenas se conseguem com estratégias eficientes e
eficazes. Por isso é importante saber como, onde e quando estudar.
Apresentamos algumas sugestões com as quais esperamos que caro
estudante possa rentabilizar o tempo dedicado aos estudos,
procedendo como se segue:

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1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de


leitura.

2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e assimilação


crítica dos conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua


aprendizagem confere ou não com a dos colegas e com o padrão.

5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou as


de estudo de caso se existirem.

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo,


respectivamente como, onde e quando...estudar como foi referido
no início deste item, antes de organizar os seus momentos de estudo
reflicta sobre o ambiente de estudo que seria ideal para si: Estudo
melhor em casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo melhor à
noite/de manhã/de tarde/fins-de-semana/ao longo da semana?
Estudo melhor com música/num sítio sossegado/num sítio
barulhento!? Preciso de intervalo em cada 30 minutos, em cada
hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido


estudado durante um determinado período de tempo; Deve estudar
cada ponto da matéria em profundidade e passar só ao seguinte
quando achar que já domina bem o anterior.

Precisa de apoio?

Caro estudante, temos a certeza que por uma ou por outra razão, o
material de estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas
como falta de clareza, alguns erros de concordância, prováveis erros
ortográficos, falta de clareza, fraca visibilidade, páginas trocadas ou
invertidas, etc.). Nestes casos, contacte os serviços de atendimento
e apoio ao estudante do seu Centro de Recursos (CR), via telefone,
sms, E-mail, se tiver tempo, escreva mesmo uma carta participando
a preocupação.
Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes
(Pedagógico e Administrativo), é de monitorar e garantir a sua
aprendizagem com qualidade e sucesso. Dai a relevância da
comunicação no Ensino a Distância (EAD), onde o recurso as TIC´s se
tornam incontornáveis: entre estudantes, estudante – Tutor,
estudante – CR, etc.

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As sessões presenciais são um momento em que você caro


estudante, tem a oportunidade de interagir fisicamente com staff do
seu CR, com tutores ou com parte da equipa central da UnISCED
indigitada para acompanhar as sua sessões presenciais. Neste
período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos de natureza
pedagógica e/ou administrativa.
O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30%
do tempo de estudos a distância, é de extrema importância, na
medida em que permite lhe situar, em termos do grau de
aprendizagem com relação aos outros colegas.

Desta maneira ficará a saber se precisa de apoio ou precisa de


apoiar aos colegas. Desenvolver hábito de debater assuntos
relacionados com os conteúdos programáticos, constantes nos
diferentes temas e unidade temática, no módulo.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)

O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e


autoavaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é
importante que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues
duas semanas antes das sessões presenciais seguintes.
Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não
cumprimento dos prazos de entrega, implica a não classificação do
estudante. Tenha sempre presente que a nota dos trabalhos de
campo conta e é decisiva para ser admitido ao exame final da
disciplina/módulo.
Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os
mesmos devem ser dirigidos ao tutor/docente.

Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa,


contudo os mesmos devem ser devidamente referenciados,
respeitando os direitos do autor.
O plágio1é uma violação do direito intelectual do(s) autor(es).Uma
transcrição à letra de mais de 8 (oito) palavras do texto de um autor,
sem o citar é considerada plágio. A honestidade, humildade
científica e o respeito pelos direitos autorais devem caracterizar a
realização dos trabalhos e seu autor (estudante da UnISCED).

Avaliação

Muitos perguntam: Com é possível avaliar estudantes à distância,


estando eles fisicamente separados e muito distantes do
docente/tutor!? Nós dissemos: Sim é muito possível, talvez seja uma
avaliação mais fiável e consistente.

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Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com


um mínimo de 90% do total de tempo que precisa de estudar os
conteúdos do seu módulo. Quando o tempo de contacto presencial
conta com um máximo de 10%) do total de tempo do módulo. A
avaliação do estudante consta de forma detalhada do regulamento
de avaliação.
Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e
aprendizagem no campo, pesam 25% e servem para a nota de
frequência para ir aos exames.

Os exames são realizados no final da cadeira, disciplina ou módulo e


decorrem durante as sessões presenciais. Os exames pesam no
mínimo 75%, o que adicionado aos 25% da média de frequência,
determinam a nota final com a qual o estudante conclui a cadeira.
A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da cadeira.
Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 2 (dois)
trabalhos e 1 (um) (exame).
Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados
como ferramentas de avaliação formativa.
Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em
consideração a apresentação, a coerência textual, o grau de
cientificidade, a forma de conclusão dos assuntos, as
recomendações, a identificação das referências bibliográficas
utilizadas, o respeito pelos direitos do autor, entre outros.
Os objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento
de Avaliação.

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária,
propriedade intelectual de outras pessoas, sem prévia autorização.

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TEMA 1: FUNDAMENTOS DAS CIENCIAS SOCIAIS

UNIDADE 1.1. Introdução Geral


UNIDADE 1.2. Constituição e desenvolvimento das ciências
sociais UNIDADE 1.3.Pluralidade, diversidade e
interdisciplinaridade nas ciências sociais
UNIDADE 1.4. Ruptura com senso comum

UNIDADE 1.1. Introdução Geral

Introdução

As ciências sociais são um ramo da ciência que diferentemente de


outros, se ocupa a estudar os fenómenos sociais que compenetram a
essência do Homem.
Em toda sua existência o ser humano é um ser social, no sentido de
que ele próprio assegura a criação de laços sociais e que de forma
recíproca depende desses laços para se constituir e completar-se


Conhecer os fundamentos da antropologia duma forma geral
e cultural em particular;

Acompanhar as dinâmicas sociais seus efeitos na essência do
Objectivos 
específicos Homem;


 sociais para o Homem
Identificar a importância das ciências
como indivíduo e como grupo.

Desenvolvimento
Muitos estudiosos Assis (2008), Batalha (2004), Nunes (2005) quando
falam sobre o conceito de ciência, convergem na sua maioria na
palavra conhecimento, no sentido de que, ciência é conhecimento no
seu sentido lato, isto é, um conhecimento organizado. De acordo com
Peirano (1986) o caracteriza a ciência não é só o modo como são os
conteúdos dos mesmos conhecimentos ou organização dos discursos,
proferidos na oralidade, como uma das formas de exteriorização do
conhecimento, mas o próprio discurso científico é que possui
características próprias.
A ideia de Peirano (1986) é corroborada com Maía (2000) quando
falam de que não se faz ciência sobre o geral, mas faz-se sim, ciência

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

quando se delimita aquilo que se quer estudar, o objecto de que se


pretende estudar.

O objecto de estudo não é apenas delimitado, pode ser construído,


pois trata-se de algo ideal, de uma representação. Esta delimitação é
da ordem do discurso e não da experiência.
Como se pode depreender no exemplo demonstrado acima, a
delimitação é resultado da experiência humana na sua relação com os
diferentes elementos que compõem e constituem a natureza. E
também, os resultados das sistematizações dos discursos podem ser
verificados em condições experimentais, como é o caso dos
laboratórios. O que se procura verificar na essência é se o discurso que
se fez é verdadeiro, ou seja, se o que se disse é condizente com a
realidade.

Para tal emprega-se o termo hipótese, que significa entre outras


palavras, se é um discurso que está, assente em alguma base verdadeira
na vida real, e esta só existe ou se confirma depois da verificação pela
experiência -Método (NUNES 2005; ITURRA, 1987)
As Ciências Sociais fazem parte do grupo de saberes intitulado Ciências
Humanas, que apresentam métodos próprios de investigação dos
fenómenos observados. As Ciências Sociais nos ajudam a "limpar a
lente" para enxergarmos melhor as diferentes realidades com que o
homem enquanto individuo e ser social convive (PEIRANO, 1986).
Portanto, a ciência não é simplesmente o conhecimento organizado ou
sistematizado das relações objectivas da natureza ou dos homens, ela
é uma interpretação da realidade, que supõe uma certa bagagem
conceitual e teórica sem a qual tudo permaneceria mudo.

Sumário

Nesta Unidade temática 1.1 estudamos e discutimos fundamentos


das ciências sociais como forma de assegurar aos principiantes em
particular e dos interessados em geral, um bom “mergulho” na área
ou temática da antropologia cultural:
1. Os contornos sobre definição da ciência
2. Objecto de estudo
3. Diferentes mecanismos investigativos nas ciências sociais

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1. O que é ciência?
2. Como se faz a ciência?

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

3. Porquê se usam experimentos nas ciências?

Respostas

1. Conhecimento
2. Através da delimitação do discurso/objecto de estudo
3. Para provar os factos.

Grupo 2 (Respostas detalhadas)


1. No seu sentido lato é conhecimento organizado
2. A ciência não se faz sobre o geral, mas sim delimitando
os discursos, aquilo que se pretende estudar
3. Para verificar se o discurso que se fez é verdadeiro

Grupo 3 (Exercícios de gabarito)


1. O que é um objecto de estudo?
2. Qual é a razão de envolver o termo “ hipótese” nas ciências?
3. O que significa afirmar: … As Ciências Sociais nos ajudam a "limpar
a lente" para enxergarmos melhor as diferentes realidades com que o
homem enquanto individuo e ser social convive…

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 1.2. Constituição e desenvolvimento das ciências sociais

Introdução

As ciências sociais se revestem de grande importância para o ser


humano, como único animal pensante capaz de obter o
pensamento científico para elaboração de uma visão crítico e
reflexiva sobre a sociedade.


Objectivos Caracterizar a neutralidade nas ciências:

específicos Conhecer as diferentes fontes de conhecimento

Desenvolvimento
Batalha (2004) afirma que a prática da ciência está ligada a um
projecto que nunca é neutro e desinteressado, mas que se insere na
história e nos conflitos dos homens. Para ele a, o objectivo das ciências
sociais perpassaria em reconhecer o conhecimento como
característica do ser humano, identificar as características do senso
comum, distinguir o conhecimento científico do senso comum bem

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pensamento científico para a elaboração de uma visão crítico-reflexiva


da sociedade.

De acordo com Gusmão (2008) e Marconi (2006) o homem é o único


animal que vive no mundo e pensa sobre o mundo em que vive. Ao
pensar, ele formula explicações acerca da realidade e dos fenómenos
que o cerca. Portanto, é no ato de pensar que o homem conhece a si e
o mundo, manifestando isso através da linguagem.
Existem várias formas do homem buscar ou obter conhecimento,
nomeadamente:
a)O mito

• O mito é uma narrativa, uma fala, que contém em si diversas


ideias. É uma mensagem cifrada, que não é entendida
facilmente por quem não está dentro da cultura de que o mito
faz parte;

• O mito não é objectivo, assim como não se situa no tempo, fala
das origens, sem, no entanto, referir-se ao contexto histórico.
Trata de tempos fabulosos;

• Os mitos dão forma e aparência explícita a uma realidade que
as pessoas sentem intuitivamente;

• O mito pode também transmitir, de geração a geração, uma
espécie de conhecimento, muitas vezes sobre a origem do
mundo, algumas sobre processos de cura, outras sobre
interpretações de fenómenos da natureza e, ainda, sobre a
sociedade e a relação entre os homens, através de histórias
mitológicas. Quem não ouviu falar do mito do Cupido, que fala
do enamoramento?
b)Conhecimento religioso

• Esse tipo de conhecimento do mundo se dá a partir da


separação entre a esfera do sagrado e do profano;

• As religiões também apresentam, de forma geral, uma narrativa
sobrenatural para o mundo, porém, para aderir a

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uma religião, é condição fundamental crer ou ter fé nessa


narrativa;

• Além disso, é uma parte essencial da crença religiosa a fé no fato


de que essa narrativa sobrenatural pode proporcionar ao
homem uma garantia de salvação, bem como prescrever
maneiras ou técnicas de obter e conservar essa garantia, que
são os ritos, os sacramentos e as orações.

c)Conhecimento filosófico

• De modo geral, o conhecimento filosófico pode ser traduzido


como amor à sabedoria, à busca do conhecimento.

• A filósofa Lizie Cristine da Cunha definiu o saber filosófico como
aquele que trata de compreender a realidade, os problemas
mais gerais do homem e sua presença no universo.

• Segundo a autora, a Filosofia interroga o próprio saber e
transforma-o em problema. Por isso, é, sobretudo, especulativa,
no sentido de que suas conclusões carecem de prova material
da realidade.

• Mas, embora a concepção filosófica não ofereça soluções
definitivas para numerosas questões formuladas pela mente,
ela é traduzida em ideologia.

• E como tal influi directamente na vida concreta do ser
humano, orientando sua actividade prática e intelectual.

d)Senso comum

• Retomando a ideia de que as coisas por si só não têm sentido,


sendo este atribuído a elas pelos homens, tratemos agora do
senso comum, que é algum sentido dado colectivamente às
coisas vividas;

• Para se orientar no mundo, o ser humano assume como certas

e seguras diversas coisas, situações e relações entre fatos,


coisas e situações.

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• Estabelece, assim, sistemas de discursos sobre o que tem


vivido, isto é, sistemas de conhecimento;

• Nem sempre o senso comum representa a realidade. Às vezes,

conceitos erróneos são formulados e adoptados por


colectividades.

Peirano (1996) citando o pensador escocês David Hume (1711-1776),


diz que propôs um cuidado especial ao se tratar da causalidade, isto é,
das relações de causa e efeito entre os eventos vivenciados. Adverte ele
que o fato de um evento acontecer depois do outro não significa
necessariamente que haja relação de causa e efeito entre eles.

É o caso do cidadão fumante que, respeitoso pelas regras de convívio,


não fuma em ambientes em que haja outras pessoas, como um ônibus.
Ele costuma esperar seu ônibus sem acender um cigarro, pois logo o
ônibus chegará, deixando, assim, o prazer de fumar para depois da
viagem. Dando contribuição sobre a temática, Assis (2008) traz
experiências começando por afirmar que se o ônibus, porém, demora a
chegar, a falta de nicotina em seu organismo o deixará em estado de
ansiedade que o levará a acender um cigarro. Como já se terá passado
algum tempo de espera, o ônibus provavelmente já estará próximo e,
assim, nosso amigo será surpreendido antes de acabar o cigarro.

Como em sua experiência diária, pouco depois de acender o cigarro, é


surpreendido com a aparição do ônibus, poderia supor que o fato de
acender o cigarro causa a chegada do ônibus. O fenómeno observado
por várias pessoas poderia estabelecer uma crença comum na
causalidade entre o ato de acender o cigarro e o ônibus chegar. Aí está
um caso de armadilha que o senso comum pode conter.

Algo simples como observar coisas como esta contribuiu muito para que
a humanidade estabelecesse mais uma diferença fundamental entre
formas de pensamento humano, entre o senso comum e a ciência.

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Sumário

Nesta Unidade temática 1.2 estudamos de uma forma geral as


fontes de conhecimento e sua contribuição para o pensamento
científico, focalizados em dois aspectos principais:

1. Da prática a teoria
2. As diferentes fontes de conhecimento

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1. Qual é a importância do pensamento para o ser humano?
2. Quais são os diferentes tipos de conhecimento que conhece?
3. Porquê o mito não é objectivo?

Respostas
1.para obtenção do conhecimento científico
2. Mito, religioso, filosófico, senso comum, etc.

3. Porque ele não é objectivo na apresentação e localização no


espaço e tempo dos factos

Grupo 2 (Respostas detalhadas)


1.Formular explicações acerca da realidade e dos fenómenos que o
cerca
2. mito, religioso, filosófico, senso comum, etc.
3.Dá forma e aparência explicativa a uma realidade que as pessoas
sentem intuitivamente.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1. Caracteriza o mito como fonte de conhecimento
2. Quais são as diferenças entre o mito e conhecimento religioso?
3. O filme é uma fonte de conhecimento?

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UNIDADE 1.3. Pluralidade, diversidade e interdisciplinaridade nas


ciências sociais

Introdução

As ciências sociais concentram-se no ser humano como objecto de


estudo. Daí surgem especificidades emanadas pela sua característica
base de ser um ser social. Nesta unidade temática pretende-se que
os estudantes demonstrem alguma flexibilidade sobre o pensamento
e respeito pela pluralidade, diversidade e interdisciplinaridade nas
ciências sociais.



Caracterizar a pluralidade, diversidade e multidisciplinaridade
 nas ciências sociais

Objectivos ▪
Saber interpretar os diferentes fenómenos observados no âmbito 
específicos  da pluralidade, diversidade e interdisciplinaridade nas ciências

sociais

Desenvolvimento
Marconi (2006) advoga que ao contrário das Ciências Naturais, as
Ciências Sociais lidam não apenas com o que se chama de realidade,
com fatos exteriores aos homens, mas igualmente com as
interpretações que são feitas sobre a realidade.
Neste sentido, no que se refere ao objecto de estudo e, consequentemente
ao método de investigação, as ciências sociais diferem bastante das
ciências naturais. Peirano (1986) diz que tal diferença, aliás, suscita
intensos debates quanto à validade e o rigor científico do conhecimento
produzido pelas ciências sociais. Os argumentos utilizados têm como
princípio epistemológico a dificuldade de reconhecê-las como verdadeiras
ciências, à medida que elas tratam com eventos complexos, de difícil
determinação, uma vez que envolvem valores e significados socialmente
dados. Outra questão reside no fato de estar o pesquisador social, de
alguma forma, envolvido com os fenómenos que pretende investigar
dificultando a objectividade e a neutralidade científica (Marconi, 2006:
Peirano 1986)
De acordo com os mesmos autores, afirmam que é possível,
percebermos, portanto, que as ciências sociais não podem ser
enquadradas em modelos de cientificidade de outras ciências, pois
possuem uma racionalidade e especificidades próprias, relativas ao seu
objecto de estudo.
Nessa perspectiva, tal campo de saber não comporta métodos ou
técnicas rígidas e rigorosas, nem

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fórmulas de aplicação imediata que garantam a obtenção de resultados


objectivos e exactos. Assim, o que mais importa é a interpretação dos
fenómenos, ou seja, não apenas os fatos por si só, mas a forma como
se constituem esses fatos. O sujeito (o pesquisador) deve ser
considerado no contexto no qual estes fatos ou fenómenos se
apresentam, pois ele também faz parte do objecto que investiga.
Assim, para que se possa interpretar, analisar, investigar nessa área do
conhecimento, é necessário um suporte teórico que fundamente
determinadas opções metodológicas, não podendo ser considerada
apenas a aplicação de determinada técnica, pois isto não garante por si
só a obtenção de resultados válidos.
As áreas constitutivas das ciências sociais: Sociologia, Antropologia e
Ciência Política.
Marconi (2006) aponta que a Sociologia estuda o homem e o universo
sociocultural, analisando as inter-relações entre os diversos fenómenos
sociais. Neste campo de conhecimento, a vida social é analisada a partir
de diferentes perspectivas teóricas, notadamente as que têm como
base conceitual os estudos desenvolvidos por Émile Durkheim, Max
Weber e Karl Marx. Gusmão (2008) diz que a partir dessas matrizes
teóricas, estudam-se os fatos sociais, as acções sociais, as classes
sociais, as relações sociais, as relações de trabalho, as relações
económicas, as instituições religiosas, os movimentos sociais etc.
Assis (2008) e Gusmão (2008) afirmam que na Antropologia privilegiam-
se os aspectos culturais do comportamento de grupos e comunidades.
Questões cruciais para o entendimento da vida em grupo, como
alteridade, diversidade cultural, etnocentrismo, relativismo cultural são
tratadas por essa ciência, que, em seus primórdios estudava povos e
grupos geográfica e culturalmente distantes dos povos ocidentais. Ao
longo de seu desenvolvimento, os antropólogos passaram a analisar
grupos sociais relativamente próximos, buscando transformar o
exótico, o distante, em familiar.
Assim, diz Maía (2000), em sua história, a Antropologia revelou estudos
notáveis sobre sociedades indígenas e sociedades camponesas,
identificando suas diferentes visões de mundo, sistemas de parentesco,
formas de classificação, cosmologias, linguagens etc. Também
desenvolveu uma série de estudos sobre grupos sociais urbanos,
enfatizando a diferenciação entre seus indivíduos, com base em
critérios de raça, cor, etnia, género, orientação sexual, nacionalidade,
regionalidade, afiliação religiosa, ideologia política, sistemas de crenças
e valores, estilos de vida etc.
De acordo com o mesmo autor, na Ciência Política analisam-se as
questões ligadas às instituições políticas. Conceitos de poder,
autoridade, dominação, autoridade são estudados por essa ciência.
Analisam-se também as diferenças entre povo, nação e governo, bem
como o papel do Estado com instituição legitimamente reconhecia

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como a detentora do monopólio da dominação e do controle de


determinado território.

O conhecimento científico da vida social não se baseia apenas no fato,


mas na concepção do fato e na relação entre a concepção e o fato. Por
estudar a acção dos homens em sociedade, de seus símbolos, sua
linguagem, seus valores e cultura, das aspirações que os animam e das
alterações que sofrem, as Ciências Sociais constituem ferramenta
importante para o desenvolvimento de compreensão crítico-reflexivo
da realidade (PEIRANO, 1986, Maía 2000)
Por essa razão, cada vez mais as Ciências Sociais são utilizadas em
diversos campos da actividade humana. Campanhas publicitárias,
campanhas eleitorais, elaboração de políticas públicas, até mesmo a
programação de redes de rádio e televisão levam cada vez mais em
conta resultados de investigações sócia antropológicas, à medida que
estas buscam entender as pessoas envolvidas em cada uma dessas
actividades, suas crenças, valores e ideias.
Com as mudanças cada vez mais rápidas e profundas dos padrões
morais e culturais das sociedades contemporâneas, mais relevantes se
tornam as análises que visam compreendê-las. Deslocamentos de
pessoas e grupos motivados pelo processo de globalização da
economia, que intensificou os fluxos migratórios em todo planeta,
trocas culturais proporcionadas pelo estabelecimento de uma?
sociedade em rede, novos modelos de família e conjugalidade, novas
configurações no campo religioso, entre outros, constituem temas de
trabalhos de cientistas sociais contemporâneos. Segundo Maía (2000)
esses trabalhos são utilizados frequentemente como fonte de reflexão
por governos, sociedade civil e indivíduos que buscam desenvolver sua
capacidade de compreensão dos acontecimentos e planeamento de
acções com vistas à actuação na vida social.
Sabemos que vários problemas que nos afectam individualmente são
compartilhados por outros tantos indivíduos, constituindo-se, por assim
dizer, problemas sociais. Entretanto, existe uma diferença entre
problemas sociais e problemas sociológicos.
O problema social designa comummente algo que atinge um grupo, ou
uma categoria de indivíduos, as drogas, por exemplo. Iturra (1987) diz
que embora a classificação de um problema social possa ser subjectiva,
afinal de contas, o que é um problema para nossa cultura pode não ser
em outra. Em outras palavras, o problema social é uma situação que
afecta um número significativo de pessoas e é julgada por estas ou por
um número significativo de outras pessoas como uma fonte de
dificuldade ou infelicidade e considerada susceptível de melhoria.
Já os problemas sociológicos são o objecto de estudo da Sociologia
enquanto ciência, a qual se debruça sobre esses para compreender suas
características gerais. Como vimos anteriormente, a Sociologia estuda
os fenómenos sociais, sendo eles percebidos como problemas sociais

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ou não, lançando mão de uma observação sistemática e pormenorizada


das organizações e relações sociais (BATALHA, 2004).

Maía (2000) diz que o problema sociológico é uma questão de


conhecimento científico que se suscita e resolve no âmbito da
sociologia. Ao contrário do que parece formular correctamente um
problema destes constitui tarefa muito difícil, em regra só acessível a
quem é especialista da ciência em causa e que seja dotado de uma
imaginação viva e treinado na pesquisa.
Em outras palavras, de acordo com Maía (2000) nem todas as questões
suscitadas acerca das matérias de que se ocupam as ciências sociais
constituem problemas científicos, mas podem ser problemas sociais. Só
são problemas científicos as questões formuladas de tal modo que as
respostas a elas confirmem, ampliem ou modifiquem o que se tinha por
conhecido anteriormente. Isto significa dizer que apenas os cientistas
estão em condições de enunciá-las e resolvê-las; que a sua formulação
como a sua solução pressupõem um esforço metódico de pesquisa.
Podemos concluir, portanto, que todo problema social pode ser um
problema sociológico, mas nem todo problema sociológico é um
problema social.

Sumário

Nesta Unidade temática 1.3 estudamos de uma forma aprofundada


as questões ligadas a compreensão de uma das características básicas
sobre as ciências sociais:
▪ 
 Pluralidade
▪ 
Diversidade

▪ 
Interdisciplinaridade

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1. O que é um problema científico?
2. Quando é que um problema individual se transforma em
social?

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Respostas
1. Quando a formulação obedece os procedimentos científicos
2. Quando o problema é sentido também pela sociedade

Grupo 2 (Respostas detalhadas)


1.um problema é científico quando as questões são formuladas de tal
modo que as respostas a elas confirmam, ampliam ou modificam o que se
tinha por conhecido anteriormente.
2. Se são compartilhados por outros indivíduos constituem-se assim de
problemas sociais

Grupo 3 (Exercícios de gabarito)


1.Qual é a diferença entre um pesquisador social e o das ciências
naturais?
2. Em que se baseia o conhecimento científico da vida social?
3.As ciências sociais podem ser usadas/utilizadas nas campanhas
eleitorais?
4.Qual é a diferença entre problemas sociológicas e problemas sociais?

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UNIDADE 1.4. Ruptura com senso comum

Introdução

Nesta unidade temática pretende-se que os estudantes tenham um


grande aprofundamento sobre o senso comum e seus contornos
evolucionistas do termo em função das dinâmicas sociais.


Aprofundar o senso comum

Conhecer a evolução do conceito

Objectivos Identificar mecanismos de aplicação na vida social

específicos

Desenvolvimento
É interessante observar que linguagem e pensamento são coisas
indissociáveis, não se pode conceber uma sem a outra. Os conceitos
nascem nos quotidianos (senso comum) são apropriados pelo meio
científico e tornam-se científicos ao romperem com esse quotidiano, com
esse senso comum. O vasto conjunto de concepções geralmente aceitas
como verdadeiras em determinado meio social recebe o nome de senso
comum.
Retomando a ideia de Francelin (2004) que as coisas por si só não têm
sentido, sendo este atribuído a elas pelos homens, tratemos agora do
senso comum, que é algum sentido dado colectivamente às coisas vividas.
Para se orientar no mundo, o ser humano assume como certas e seguras
diversas coisas, situações e relações entre factos, coisas e situações.
Estabelece, assim, sistemas de discursos sobre o que tem vivido, isto é,
sistemas de conhecimento.
Nem sempre o senso comum representa a realidade. Às vezes, conceitos
erróneos são formulados e adoptados por colectividades. É o caso do
cidadão fumante que, respeitoso pelas regras de convívio, não fuma em
ambientes em que haja outras pessoas, como um ônibus. Algo simples
como observar coisas como esta contribuiu muito para que a humanidade
estabelecesse mais uma diferença fundamental entre formas de
pensamento humano, entre o senso comum e a ciência.
Nesse sentido, a ciência moderna "construiu-se contra o senso comum",
considerando-o "superficial, ilusório e falso" e a ciência pós-moderna vem
para reconhecer os valores ("virtualidades") do senso comum que
enriquecem a "nossa relação com o mundo", ou seja, o senso comum
também produz conhecimento, mesmo que ele seja um "conhecimento
mistificado e mistificador". Mas, apesar disso e apesar de ser conservador,

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tem uma dimensão utópica e libertadora que pode ser ampliada através
do diálogo com o conhecimento científico" (FRANCELIN , 2004)
A aproximação do conhecimento do senso comum ao conhecimento
científico com a da descrição de algumas características do próprio senso
comum, tais como causa e intenção; prática e pragmática; transparência
e evidência; superficialidade e abrangência; espontaneidade;
flexibilidade; persuasão.
Como boa parte dos pensadores pós-modernos, Santos (2000) não deixa
de mencionar a influência exercida em sua obra pelo pensamento
bachelardiano e, seguindo o pensamento deste último, diz que o
conhecimento científico somente é possível mediante o rompimento com
o conhecimento vulgar, com o senso comum. A ciência ", a ciência
constrói-se, pois, contra o senso comum, e para isso dispõe de três actos
epistemológicos fundamentais: a ruptura, a construção e a constatação"
(Santos, 2000, p.31).
De acordo com Francelin (2004) a caracterização do senso comum não
passa, necessariamente, por critérios de verdade ou falsidade, mas sim
pela "falta de fundamentação sistemática", ou seja, recebem e emitem
opiniões sem saber por que e o que significam. São processos acríticos nos
quais um indivíduo concebe um conjunto de informações como
conhecimentos, sem saber realmente o que significam, e os utiliza na
prática quotidiana como se fossem verdadeiros e definitivos, sendo estes
últimos apenas "conhecimentos provisórios e parciais" (Francelin, 2004
citando Cotrim, 2002). No meio científico, os conhecimentos também
podem ser provisórios e parciais, podem dar lugar a novos conhecimentos
que surgem ao longo do tempo através de novas pesquisas.
Francelin (2004) afirma que a grande diferença é que no meio científico
deve haver plena consciência de que uma pesquisa que leva a um novo
conhecimento não é definitiva. O senso comum, portanto, descarta essa
premissa, pois as opiniões obtidas podem ser emitidas como verdadeiras
e definitivas. A ciência, aparentemente, busca por meio de seu rigor na
pesquisa, no debate e crítica de opiniões, afastar-se do senso comum.

Sumário

Nesta Unidade temática 1.4 estudamos de uma forma aprofundada as


questões sobre a génese do senso comum, como um tipo de
conhecimento popular. Ademais debruçamos as questões ligadas a
ruptura do senso comum:
▪ 
 A génese do senso comum
▪ 
Características diferenciais entre senso comum e ciência

▪ 
Interpretação prática do senso comum

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Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual é a posição da ciência moderna sobre o senso comum?
2.De acordo com o conceito de senso comum, para Santos (2000) em
que situação é possível o conhecimento científico?
3.Diga uma das diferenças entre o meio científico e senso comum?

Respostas
1.A ciência moderna constitui-se contra o senso comum,
considerando-o superficial, ilusório e falso.
2.É possível mediante o rompimento com o conhecimento vulgar, com senso
comum, e para isso dispõe de três actos epistemológicos fundamentais: a
ruptura, a construção e a constatação.
3.Pesquisa leva a um novo conhecimento e não é definitivo. Senso
comum descarta essa premissa.

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Os conceitos nascem nos quotidianos
2.Para se orientar no mundo, o ser humano assume como certas e
seguras diversas coisas, situações e relações entre factos, coisas e
situações.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que é senso comum?
2. Olhando pela sua génese, porque se verifica a ruptura do senso
comum?
3.O que é um sistema de conhecimento?

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TEMA 2: HISTÓRIA DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO

UUNIDADE 2.1. Origem


UNIDADE 2.2. A curiosidade intelectual e o interesse pelo exótico
UNIDADE 2.3. A universalização da antropologia
UNIDADE2. 4. As diferentes “cores” e campos de aplicação da
antropologia

UNIDADE 2.1. Origem

Introdução

A antropologia faz parte das ciências sociais e como qualquer ciência,


possui as suas características existenciais que o diferem de outras. Nesse
sentido, serão abordados para esta unidade inicial as questões ligadas
com a sua origem para:

Conhecer a história do surgimento



Objectivos ▪ Dominar as características que diferem de outras
específicos ▪ ciências Identificação da finalidade da antropologia

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Desenvolvimento
O surgimento da Antropologia aconteceu devido a curiosidade
do respeito de si mesmo, independentemente do seu nível de
desenvolvimento cultural. De acordo com autores como
Francelin (2004), Batalha (2004), Assis (2008), Casal (1996) e
Gusmão (2008) falam do surgimento da antropologia, apontando
que surgiu na idade clássica, no século V ac. com a figura de
Herótodo que é considerado o pai da antropologia, que
caracterizou minuciosamente as culturas circulantes. Os gregos
foram os que mais reuniram informações sobre povos diferentes.
De acordo com estes autores, até o século XVIII a antropologia
pouco se desenvolveu. Os estudos antropológicos iniciaram-se
efectivamente a partir de meados do século XVIII quando a
antropologia passa a adquirir sua categoria de ciência, quando
Linneu classificou os animais, relaciona o homem entre os
primatas.
Copans (1999) e Maía (2000) dizem que a Antropologia
sistematizou-se como ciência depois que Darwin trouxe a teoria
evolucionista. O progresso da antropologia no século X é
resultado das descobertas anteriores relativas ao homem Franz
Boas é considerado o pai da Antropologia Moderna, pois foi
quem incentivou as pesquisas de campo em carácter científico
(ASSIS, 2008).
A antropologia vem adquirindo importância cada vez maior no
mundo moderno, onde o isolamento cultural é quase impossível
e onde os contactos são inevitáveis e se multiplicam, levando
muitas vezes a situações conflituantes. Gusmão (2008) diz que a
antropologia empenha-se na solução dessas situações,
procurando minimizar os desequilíbrios e tensões culturais e
tentando fazer com que as culturas atingidas sejam menos
molestadas e seus valores e padrões respeitados. Aplica
conhecimentos antropológicos, físicos e culturais na busca de
soluções para os modernos problemas sociais, políticos e
económicos, dos grupos simples e das sociedades civilizadas
(MAÍA, 2000).
Por isso mesmo que Casal (1996) corroborando com Peirano
(1995) afirma que a finalidade da antropologia é o fornecimento
do maior número possível de estudos sobre grupos humanos,
uma vez que cada um deles é o produto de uma experiência
cultural particular.

Sumário

Nesta unidade 2.1. debruçamos de forma sintética a origem


da antropologia para melhor compreender
 ▪ 
Os passos dados para a sua evolução
 ▪ 
Alguns dos pensadores envolvidos
▪ 
E sua finalidade

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Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)

1.Quando surgiu a antropologia?

2.Em que século ela se tornou como ciência?

3.Em que século a antropologia foi estanque?

Respostas

1.Idade clássica, século V ac

2.Meados do século XVIII

3. até o século XVIII

Grupo 2 (respostas detalhadas)

1.Procura minimizar os desequilíbrios culturais

2.Maior número de estudos de grupos humanos

3.É considerado pai da antropologia moderna

Grupo 3 (exercícios de gabarito)

1.Qual é a importância da antropologia?

2.Fala sobre o progresso da antropologia.

3. Diga quem foi o precursor da sistematização?

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UNIDADE 2.2. A curiosidade intelectual e o interesse pelo exótico

Introdução

A ciência se desenvolveu porque sempre o ser humano teve


curiosidades, vontade de saber, descobrir e interpretar os fenómenos.
A antropologia é uma dessas ciências que pela sua curiosidade
intelectual e o interesse pelo exótico auxilia o processo de
conhecimento para:

▪ 
Explicar o porque de tantas diferenças entre grupos humanos
▪ 
Objectivos  Explicar o homem, a sociedade e a cultura a partir de circunstâncias específicas
específicos ▪ 
Definir os paradigmas de explicação e compreensão do homem e do mundo

Desenvolvimento
Ao longo da nossa disciplina, aprendemos que os homens sempre
tiveram uma grande curiosidade acerca do porquê das diferenças
humanas e sociais. De acordo com Francelin (2004) a busca por essa
explicação a princípio tomou como base a aparência física: cor de pele,
cabelo e olhos, formato dos olhos, textura dos cabelos, altura etc.
Gradativamente, os estudiosos perceberam que o parâmetro da
aparência física não servia para explicar a diversidade.
De acordo com o mesmo autor, o critério mais relevante está no modo
de vida, particular ou próprio de cada grupo humano. Ou seja, as
diferenças seriam oriundas das formas encontradas pelo homem na
busca da satisfação de suas necessidades mínimas (fisiológicas e
psicológicas), a partir das condições dadas para a sua sobrevivência: a
natureza, o conhecimento e o domínio do conhecimento.
Consubstanciado a ideia trazida pelo Francelin (2004), Copans (1999)
afirma que a necessidade premente de conhecer-se e conhecer os
outros, entender e explicar o porquê de tantas diferenças entre os
grupos humanos, ao longo dos tempos, consubstanciou os modelos
explicativos.
No quadro das ciências humanas, a maioria dos paradigmas se
constituiu da confluência de saberes oriundos de distintas ciências.
Cada ciência humana é composta por visões interpretativas, por meio
das quais os estudiosos observam, analisam e explicam o homem, a
sociedade e a cultura, a partir de circunstâncias específicas. Ou seja, a

36
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diversidade sociocultural é investigada por modelos explicativos


edificados a partir de circunstâncias históricas específicas, dos
interesses e dos objectivos envolvidos no estudo e na reflexão dos
temas analisados (ASSIS, 2008).
Na opinião do Francelin (2004), podemos afirmar que a compreensão
do homem, da sociedade, da cultura ou da diversidade humana - suas
manifestações, implicações, enfim, os aspectos que lhe são inerentes -
não resultou do esforço de um único pesquisador ou grupo de
pesquisadores, observando a mesma realidade num único lugar e numa
época demarcada.
Na verdade, o entendimento do homem enquanto ser plural resultou
de um esforço amplo e complexo, perpassado por diversos factores,
dentre eles, o tempo, o espaço, as peculiaridades histórico-sociais e
cognitivas inerentes aos sujeitos que se propuseram a tal estudo. No
entanto, de acordo com Maía (2000) e Gusmão (2008) é necessário
frisar que ao longo do processo de construção da explicação e
compreensão do homem e do mundo, os paradigmas (modelos
explicativos) tanto uniram quanto separaram os homens, pois em seu
interior sempre se encontram presentes as concepções e os ideais de
uma época.

Sumário

Nesta unidade temática 2.2 aprendemos as questões ligadas


com interesse e curiosidade do homem em se conhecer e
conhecer o outro, fomentando cada vez mais a competição no
domínio do conhecimento que permite entre outras coisas
 ▪ 
O aperfeiçoamento da explicação das dinâmicas sócias

 das diferenças observadas entre os seres
A interpretação
humanos

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (Com respostas)


1.Qual é o critério mais relevante no esforço do homem em buscar
explicações de aspectos observados?
2.Quais são os factores que se tomam em consideração na busca da
compreensão do Homem?

Respostas
1.Modo de vida
2.Tempo, espaço, peculiaridades histórico-sociais e cognitivas

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Diferenças seriam oriundas das formas encontradas pelos homens

37
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

na busca de satisfação e suas necessidades mínimas


2.Cada ciência humana é composta de por visões interpretativas
3.O entendimento do homem enquanto ser plural resultou de um
esforço amplo e complexo

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que é curiosidade científica?
2.Quais são os critérios que o homem usa na busca de explicações
daquilo que observa?
3.Qual é a necessidade do ser humano conhecer-se e conhecer a
outros?

38
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 2.3. A universalização da antropologia

Introdução

Ao estudar esta unidade temática, pretende-se de uma forma inicial


conhecer os grandes pensadores universais que constituíram a base
para os desenvolvimentos da antropologia. Daí que ao completar
esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

▪ 
 Compreender a etnologia e sua aplicação
▪ 
Conhecer os grandes precursores da universalização da antropologia
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
De acordo com Corrêa (2010) uma tentativa de universalização do
significado dos termos pode ser encontrada na obra do antropólogo
francês Claude Lévi-StrauusAntropologia Estrutural. Sua proposta é a
seguinte:
A etnografia - corresponde aos primeiros estágios da pesquisa:
observação e descrição, trabalho de campo (field-work). Uma
monografia, que tem por objecto um grupo suficientemente restrito
para que o autor tenha podido reunir a maior parte de sua informação
graças a uma experiência pessoal, constitui o próprio tipo do estudo
etnográfico. Para Copans (1999) a etnologia - representa um primeiro
passo em direcção à síntese. Corrêa (2010) afirma que sem excluir a
observação directa, ela tende para conclusões suficientemente
extensas e que seja difícil funda-las exclusivamente nem conhecimento
de primeira mão. Esta síntese pode operar-se em três direcções:

39
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

a) Geográfica, quando se quer integrar conhecimentos relativos a


grupos vizinhos;
b) Histórica, quando se visa reconstituir o passado de uma ou várias
populações;
c) Sistemática, enfim, quando se isola, para lhe dar uma atenção
particular, determinado tipo de técnica, de costume ou de instituição.
A etnologia compreende a etnografia como seu passo preliminar, e
constitui seu prolongamento. É o que encontramos tanto no Bureau
ofAmericanEthnology da Smithsonian Instituion, como na
ZeitschritftfürEthnologie ou noInstitut d`ethnologie de L`Université de
Paris (CORRÊA, 2010)
Para Corrêa (2010) em toda parte onde encontramos os termos
antropologia cultural ou social, eles estão ligados a uma segunda e
última etapa da síntese, tomando por base as conclusões da etnografia
e da etnologia. Nos países anglo-saxónicos, a antropologia visa um
conhecimento global do homem, abrangendo seu objecto em toda sua
extensão histórica e geográfica; aspirando a um conhecimento aplicável
ao conjunto do desenvolvimento humano desde, digamos, os
hominídeos até as raças modernas, e tendendo para conclusões,
positivas ou negativas, mas válidas para todas as sociedades humanas,
desde a grande cidade moderna até a menor tribo melanésia. Esta ideia
de Corrêa (2010) é também corroborada com Maía (2000) e Assis (2008)
pode-se, pois, dizer, neste sentido, que existe entre a antropologia e a
etnologia a mesma relação que se definiu acima entre esta última e a
etnografia.
Por fim, Lévi-Strauss escreve: etnografia, etnologia e antropologia não
constituem três disciplinas diferentes, ou três concepções diferentes
dos mesmos estudos. Corrêa (2010) diz que são, de fato, três etapas ou
três momentos de uma mesma pesquisa, e a preferência por este ou
aquele destes termos exprime somente uma atenção predominante
voltada para um tipo de pesquisa, que não poderia nunca ser exclusivo
dos dois outros.
i. A preferência por uma ou outra nomenclatura depende da tradição
teórica do país. Por exemplo, o que se faz em nome da antropologia
cultural nos EUA, na França se reconhece como Etnologia e na Grã-
Bretanha como Antropologia Social.
ii. A Etnologia é definida como a ciência que estuda as heranças
biológicas (ditas raciais), costumes e línguas da humanidade, isto é, suas
características, suas origens, diferenças e distribuição espacial

40
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário

Nesta unidade 2.3 aprendemos as ideias dos grandes


precursores da universalização da antropologia através
da descrição sobre a:

- Etnologia e etnografia e sua

- Relação com a antropologia

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que é a etnografia?
2.O que é a etnologia?
3.Quais são as 3 direcções em que a síntese se opera?
Respostas

1.Corresponde aos primeiros passos -observação


e descrição
2.Representa o primeiro passo em direcção a síntese
3.Geográfica, histórica e sistemática

Grupo 2 (respostas detalhadas)

1. O termos antropologia cultural ou social, eles estão


ligados a uma segunda e ultima etapa de síntese, tomando
por base as conclusões da etnografia e da etnologia.

2.A etnologia é definida como ciência que estuda


as heranças biológicas
Grupo 3 (exercícios de gabarito)

1.Diga as semelhanças e diferenças entre a etnografia e


a etnologia?

2. Explica a ideia de L’evi-Strauss sobre a etnografia,


etnologia e antropologia
3.O que são heranças biológicas?

41
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 2.4. As diferentes “cores” e campos de


aplicação da antropologia

Introdução

A antropologia possui diversas “facetas em termos de características


existenciais” e seus campos de aplicação. Contido ao completar esta
unidade, o estudante pressupõe-se que deverá ser capaz de:

 ▪ 
Conhecer os diferentes campos da antropologia
▪ 
Identificar as suas características
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
De acordo com Corrêa (2010) a ciência antropológica é comummente
dividida em duas esferas principais: a antropologia biológica (ou física)
e antropologia cultural (ou social). Cada uma delas actua em campos de
estudo mais ou menos independentes, pois especialistas numa área
frequentemente consultam e cooperam com especialistas na outra
área.
A antropologia biológica é geralmente classificada como uma ciência
natural, enquanto a antropologia cultural é considerada uma ciência
social. A antropologia biológica, como o nome já indica, dedica-se aos
aspectos biológicos dos seres humanos. Busca conhecer as diferenças
ditas raciais e étnicas, a origem e a evolução da humanidade.
Os antropólogos desta área de conhecimento estudam fósseis e
observam o comportamento de outros primatas. A antropologia
cultural dedica-se primordialmente ao desenvolvimento das
sociedades humanas no mundo. Estuda os comportamentos dos grupos
humanos, as origens da religião, os costumes e convenções sociais, o
desenvolvimento técnico e os relacionamentos familiares.
Um campo muito importante da antropologia cultural é a linguística,
que estuda a história e a estrutura da linguagem. A linguística é
especialmente valorizada porque os antropólogos se apoiam nela para
observar os sistemas de comunicação e apreender a visão do mundo
das pessoas. Através desta ciência também é possível colectar
histórias orais do grupo estudado. História oral é constituída na
sociedade a partir da poesia, das

42
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

canções, dos mitos, provérbios e lendas populares.


Ainda Corrêa (2010) afirma que a antropologia cultural e biológica
conectam-se com outros dois campos de estudo: a arqueologia e a
antropologia aplicada. Nas escavações, os arqueólogos encontram
vestígios de prédios antigos, utensílios, cerâmica e outros artefactos
pelos quais o passado de uma cultura pode ser datado e descrito
(pesquisar Arqueologia).
A antropologia aplicada, com base nas pesquisas realizadas pelos
antropólogos, assessora os governos e outras instituições na
formulação e implementação de políticas para grupos específicos de
populações. Ela pode, em certa medida, ajudar governos de países em
desenvolvimento a superarem as dificuldades que as populações destes
países enfrentam no embate com a complexidade dos fluxos
civilizacionais do século 21. E pode também ser usada pelos governos
na formulação de políticas sociais, educacionais e económicas para as
minorias étnicas no interior de suas fronteiras. O trabalho da
antropologia aplicada é frequentemente desenvolvido por especialistas
nos campos da economia, da história social e da psicologia (CORRêA,
2010).
Pelo fato da antropologia explorar amplo conjunto de disciplinas,
investigando diversos aspectos em todas as sociedades humanas, ela
deve apoiar-se nas pesquisas feitas por estas outras disciplinas para
poder formular suas conclusões. Dentre as disciplinas mais afins
segundo Corrêa (2010) encontramos a História, Geografia, Geologia,
Biologia, Anatomia, Genética, Economia, Psicologia e Sociologia,
juntamente com as disciplinas altamente especializadas como a
linguística e a arqueologia, anteriormente mencionadas.

Sumário

Nesta unidade temática 2.4. buscou-se o aprofundamento sobre os


grandes grupos ou tipos e características específicas da antropologia,
procurando aglutinar em dois. De salientar que não são somente estes
campos, diferentes autores nos remeterão a diferentes classificações,
mas para alguns autores que compõem a lista bibliográfica consultadas
ditam:
 ▪ 
Antropologia cultural
▪ 
Antropologia biológica

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que é antropologia cultural?

43
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

2.O que é a antropologia biológica?

Respostas
1. Estuda os comportamentos dos grupos humanos
2.Estuda aspectos biológicos dos seres humanos

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A antropologia deve apoiar-se nas pesquisas feitas por estas
outras disciplinas para poder formular suas conclusões.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Quais são as disciplinas afins exploradas pela antropologia?
2.Em que momento a antropologia cultural e biológica se
conectam?

44
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

TEMA 3: DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA

UNIDADE 3.1. Antropologia como ciência


UNIDADE 3.2. A antropologia interpretativa a antropologia
pós-moderna
UNIDADE 3.3.Diferentes ramos da antropologia

UNIDADE 3.1. Antropologia como ciência

Introdução

Ao estudar esta unidade temática buscar-se-á ligar as questões


que nortearam ao surgimento da antropologia e a consideração
como ciência. Pretende-se que ao completar esta unidade, você
deverá ser capaz de:

 ▪ 
Dominar os marcos de surgimento da antropologia

Descrever os processos queditaram a transformação ou evolução da
antropologia como ciência
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
Segundo Gusmão (2008) a antropologia, como ciência da
modernidade, coloca seu aparato teórico construído no passado, com
possibilidade de, no presente, explicar e compreender os intensos
movimentos provocados pela globalização: de um lado, os processos
homogeneizantes da ordem social mundial e, de outro, contrariando
tal tendência, a reivindicação das singularidades, apontando para a
constituição da humanidade como una e diversa. Contudo, essa
tradição é hoje alvo de controvérsias, na medida em que os fatos
decorrentes da intensa transformação da realidade parecem não
estar contidos em seus princípios explicativos.
Para Gusmão (2008) nesse campo de tensão, defende-se que ora a
trajectória da antropologia tem sido a de avaliar as diferenças sociais,
étnicas e outras com a finalidade de proporcionar alternativas de
intervenção sobre a realidade social de modo a não negar as diferenças;
ora não seria a tradição antropológica suficiente para dar conta do
contexto político das diferenças e, como tal, estaria superada em seus
propósitos.
Decorrentes do questionamento que afecta as ciências humanas de
modo geral ainda na segunda metade do século XX, e em particular a
antropologia, emergem outras perspectivas teóricas, dentre as quais se
destacam os chamados estudos culturais, cuja definição se dá no
interior das correntes ditas pós-modernas.

45
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Jordão (2004) e Gusmão (2008) comungam a ideia de que no contexto


dos debates, a análise das relações existentes entre antropologia,
estudos culturais e educação apresenta-se como desafio teórico da
modernidade e como uma necessidade diante dos princípios e das
práticas presentes na articulação entre o campo científico e o processo
educativo na sociedade moderna. Em jogo, a busca do diálogo inter e
transdisciplinar capaz de recuperar da modernidade o pensamento
crítico para compreender as propriedades da vida social e resgatar a
noção de cultura como noção crítica e engajada, ou seja, que entende
a cultura como questão política (GUSMÃO, 2008)
Ainda Gusmão (2008) avança a ideia de que a análise do lugar variável
da antropologia, como campo disciplinar no passado e no presente,
coloca em questão a dimensão política própria de qualquer ciência e
não ausente da história e da prática dessa ciência nascida nos estertores
do século XIX e no início do século XX. Na divisão de trabalho entre as
ciências sociais, a antropologia especializou-se na descrição e na
classificação dos grupos sociais frequentemente tidos como primitivos,
atrasados, marginais, tribais, subdesenvolvidos ou pré-modernos,
definidos por sua exterioridade e alteridade em relação ao mundo dos
antropólogos, ele próprio definido pela civilização, pela ciência e pela
técnica.
A antropologia como ciência pregava, então, a preservação, a
protecção, a transformação e a repressão como objecto de políticas
dirigidas ao mundo do outro. Nesse sentido, a participação dos
antropólogos e a ciência que praticam acontecem na elaboração e na
implementação das políticas, o que, mais tarde, já no início do século
XX, seria conhecido como uma ciência da prática ou uma ciência de
serviço. O que está em jogo nesse tipo de ciência são as relações entre

46
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

ciência e prática, até hoje, fato de constantes discussões no mundo


científico e social. Expressiva desse tipo de prática científica e,
posteriormente, objecto de considerações morais e políticas, como
toda ciência praticada naquele período, inscreve-se em um campo
particular da antropologia – a chamada antropologia “da” educação
(GUSMÃO, 2008).

Sumário

Nesta unidade temática, procurou-se problematizar sobre o


surgimento da antropologia como ciência como forma de chamar
a atenção sobre os marcos históricos desse processo. Daí que o
aprofundamento remete sempre a
 ▪ 
Compreensão dos factos históricos
▪ 
Localização no espaço e no tempo

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual é a ideia de Gusmão (2008) sobre a dimensão da análise e lugar
da antropologia?
2.O que a antropologia como ciência pregava?

Respostas
1.Como campo disciplinar no passado e no presente coloca em
questão a dimensão política
2.A preservação, a protecção, a transformação e a repressão como
objecto de políticas dirigidas ao mundo do outro

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1. Há necessidade diante dos princípios e das práticas presentes na
articulação entre o campo científico e o processo educativo na
sociedade moderna
2. Na divisão de trabalho entre as ciências sociais, a antropologia
especializou-se na descrição e na classificação dos grupos sociais
frequentemente tidos como primitivos, atrasados, marginais, tribais,
subdesenvolvidos

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Quando é que a antropologia foi considerada como ciência?
2.Quais são os desafios teóricos da modernidade?
3.O que é a alteridade?

47
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 3.2. A antropologia interpretativa a


antropologia pós-moderna

Introdução

Nesta unidade temática iremos nos concentrar em outras perspectivas


classificatórias de antropologia como forma de ampliar o horizonte
holístico desta temática. Por isso que o estudante ao completar esta
unidade, você deverá ser capaz de:

 ▪ 
Diferenciar a antropologia interpretativa da pós moderna
▪ 
Conhecer os campos de aplicação dos princípios teóricos destas duas abordagens
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
De acordo com Jordão (2004) os primeiros sinais da abordagem
interpretativa na antropologia datam da década de 1960, e têm a ver
com a influência dos estudos literários e da crítica literária. Um dos
primeiros antropólogos a popularizar a ideia de que as culturas são
como textos literários à espera de interpretação antropológica foi
Clifford Geertz (1973). Segundo ele, os antropólogos (ou melhor, os
etnógrafos) são intérpretes selectivos que escolhem os aspectos que
mais lhes interessam nas sociedades que estudam. São eles que tornam
a cultura do “outro” acessível a um “público” ansioso por consumir a
diferença, e a diferença é aquilo que esse público não encontra na sua
própria cultura e que acha fascinante na cultura dos outros. O
antropólogo funciona como um intérprete que torna inteligíveis as
coisas estranhas após o exercício da sua capacidade interpretativa, uma
espécie de tradutor intercultural que só traduz as partes que acha
capazes de cativar a sua audiência (Geertz 1973,Marcus &Fischer 1986).
Para muitos antropólogos a interpretação é o único objectivo que a
antropologia pode prosseguir com sucesso.
Aos defensores da “antropologia interpretativa” opõem-se os
defensores de uma “antropologia científica”, baseada em critérios de
observação e análise semelhantes aos das ciências naturais. Jordão
(2004) citando William Haviland (1934) é um conhecido defensor da
antropologia enquanto ciência, o que aliás se vê pela maneira como a
antropologia é tratada no seu manual, sucessivamente re-editado ao
longo das últimas três décadas.

48
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Enquanto o intérprete lida com sentimentos e emoções, o cientista lida


com causas cujo entendimento escapa aos próprios participantes
(Batalha, 1998). A interpretação e a explicação não se excluem
mutuamente, podem antes ser abordagens complementares. Uma
interpretação intuitiva descrita em termos causais e universais pode,
quando cientificamente testada, gerar uma poderosa explicação. O
problema é definir como se testam intuições de modo a transformá-las
em generalizações científicas. Em certos âmbitos da antropologia
interpretativa é inquestionável, por exemplo, a influência da teoria crítica
da Escola de Frankfurt, da filosofia de Nietzsche, da semiótica de Charles
SandersPeirce e do romantismo alemão, principalmente WillianDilthey e
Max Weber, através de seus método compreensivo.
Como vimos, e de um modo geral, as alternativas proposta pelo
movimento pós-moderno são basicamente textuais, referindo-se como
encontrar uma nova maneira de escrever sobre culturas, uma maneira
que incorpore no texto um pensamento e uma consciência sobre a
tradição da antropologia.
A crítica feita pelos antropólogos pós-modernos, mostra que o
rompimento com o modelo anterior é parcial, pois questiona-se o
processo da interpretação, mas não rompe com a separação radical entre
observador e observado e suas culturas no trabalho de campo. Isto
significa que o objecto de estudo não é mais a cultura do outro, mas a
etnografia, o género literário como texto e, enfatiza, as novas alternativas
de escrita etnográfica.
Clifford Geertz (1973) acredita que é possível conhecer e interpretar
outras culturas, produzindo traduções de outros modos de vida para a
nossa própria linguagem. O autor acredita também que estas condições
se transformaram em consequência da influência da escrita pós-moderna.
Ao contrário da separação entre a autoridade da ciência como
conhecimento ocidental e a autoria do texto etnográfico, o que ele sugere
é a necessidade do pesquisador assumir maior responsabilidade pôr seu
texto e pelas interpretações que produz (JORDÃO, 2004)
De acordo com o mesmo autor, a interpretação realizada pelos pós-
modernos, está baseada sobre uma outra cultura entendida como
diferente e estranha a do antropólogo, mas com possibilidades de
compreensão e tradução mútua através da conversação respeitosa e não
etnocêntrica, do diálogo que se caracteriza como uma actividade, não
somente científica, mas de confraternização e solidariedade

humana. Para os antropólogos pós-modernos, em particular os autores


do WritingCulture, a etnografia deve ser mais que uma interpretação
sobre o outro.
Deve ser uma negociação com diálogos, uma expressão das trocas entre
uma multiplicidade de vozes, onde fique evidente o outro no texto
etnográfico e seu relacionamento com o antropólogo, além da própria voz
deste último. O importante nisto tudo é perceber que existe uma reflexão
profunda no pensar e fazer antropológico, necessária no mundo
contemporâneo, para uma reflexão da própria ciência como
conhecimento absoluto da realidade. Um mundo globalizado que muitas

49
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

vezes demonstra uma tendência a homogeneização, mas que ao mesmo


tempo, nunca foi tão abundante quando se trata do surgimento de
nacionalidades localizadas.

Sumário

Nesta unidade temática 3.2 complementamos o conhecimento sobre


diferentes campos da antropologia e suas características diferenciais, ao
abordarmos especificamente
 ▪ 
A antropologia interpretativa e
▪ 
Antropologia pós-moderna

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Na opinião do Jordão (2004) quando é que se iniciaram os primeiros
sinais da abordagem interpretativa da antropologia?
2.Qual é a relação entre a interpretação e a explicação?

Respostas
1.Desde a década de 1960
2. A interpretação e a explicação não se excluem mutuamente, podem
antes ser abordagens complementares.

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Os antropólogos tornam a cultura do outro acessível
2.Os antropólogos são uma espécie de tradutor intercultural que só
traduz as partes que acha capazes de cativar a sua audiência.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Porque os defensores da antropologia interpretativa opõem-se aos
defensores de uma antropologia científica?

2.Quais são as diferenças entre a antropologia interpretativa da


explicativa?

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 3.3. Diferentes ramos da antropologia

Introdução

Ao apresentarmos a esta unidade temática pretende-se mais uma vez


dispor do estudante mais instrumentos de debate e análise sobre as
várias ramificações da antropologia quer no campo de existência e
quer no campo de aplicação e na interligação com outras ciências. Por
isso que ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:
 ▪ 
Identificar os diferentes ramos de antropologia
▪ 
Conhecer os diferentes campos de aplicação
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
A investigação antropológica envolve a comparação entre sociedades, ou
culturas, tendo em conta as mudanças culturais e biológicas que nelas
ocorrem. O âmbito global da antropologia é demasiado amplo, pelo que
a disciplina se foi organizando em subdisciplinas e especialidades. De
acordo com Batalha (2004) apresenta:

Antropologia biológica
Este campo começou por ser o estudo da morfologia anatómica das
“raças humanas” passando mais tarde ao estudo das suas
características genéticas. Hoje interessa-se pela relação biológica entre
os humanos e os primatas e pela evolução dos hominídeos
antepassados da actual população humana. A ideia de evolução é
fundamental para esta disciplina e um dos seus objectivos é estabelecer
a origem da espécie humana pelo estudo de fósseis. A genética e a
bioquímica estão muito ligadas ao trabalho dos antropólogos-biólogos.
A antropologia biológica faz também estudos sobre a distribuição de
características físicas que são relevantes para a indústria do vestuário e
calçado (aos fabricantes interessa saber a frequência e distribuição dos
tamanhos nos diferentes mercados, de modo a ajustar a sua produção

Arqueologia
A arqueologia está para a antropologia como a paleontologia está para a
biologia.Sem ela os antropólogos não seriam capazes de descrever e
explicar a evolução cultural humana. Procura reconstruir o passado da
cultura material das sociedades humanas, através do estudo dos
materiais e artefactos usados pelas populações humanas no seu
quotidiano.

51
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

É uma aliada frequente da antropologia e da história. Estabelece a ligação


entre os objectos culturais e o comportamento social humano. A cultura
material dos povos desaparecidos traz-nos informação importante sobre
a forma como viviam. Por exemplo, o estudo das formas de arquitectura
e construção das habitações fornece informação importante sobre as
características da vida social. As formas de vestuário encontradas na
antiguidade ajudam a esclarecer a diferenciação e estratificação sociais
existentes nas diferentes sociedades e nas diferentes épocas.
A arqueologia é sobretudo importante para a antropologia cultural norte-
americana e para a etnologia europeia. A antropologia social recorre
sobretudo a documentos históricos, estando portanto mais ligada à
história, uma vez que a evolução cultural pré-histórica não faz parte da
sua agenda de investigação.

Antropologia cultural
Envolve o estudo detalhado das diferentes sociedades humanas. Ou,
como diz Bates, “o estudo detalhado de culturas tomadas
individualmente, designado por etnografia, assim como a análise e
interpretação dos dados recolhidos de modo a descobrir padrões
culturais, designado por etnologia”. Esta definição é tipicamente norte-
americana e revela uma preocupação universalista ausente na
antropologia social. Esta está mais preocupada com os casos particulares
e menos com as regularidades culturais universais.
É comum utilizar-se a simples designação antropologia, em vez de
antropologia cultural ou antropologia social. Usualmente, e por defeito,
antropologia é entendida no sentido cultural e social.
De entre os muitos aspectos culturais que se lhe deparam, o(a)
antropólogo (a) (na sua qualidade de etnógrafo(a)) tem sempre de fazer
escolhas em função do que considera ser mais relevante para o tipo de
pesquisa que se propõe fazer. Essas escolhas prendem-se com as
diferentes esferas da vida socio--cultural humana: a economia, a
tecnologia, a organização social, as representações mentais e ideologia, a
religião, a magia, etc.
Dentro da antropologia cultural uma das actividades mais relevantes é a
etno-história, que se ocupa da história dos “povos nativos” e seus
descendentes. A análise da história oral, dos relatos deixados por
exploradores, missionários e comerciantes são as principais fontes da
etno-história. No caso de sociedades já desaparecidas, as principais fontes
são a análise dos títulos de propriedade das terras, dos registos de
nascimento e morte, ou quaisquer outros documentos disponíveis.
Contudo a perspectiva antropológica distingue-se da histórica. Convém
no entanto dizer que as fronteiras da antropologia cultural e social com
a história, assim como com outras disciplinas académicas, são cada vez
mais difíceis de traçar.

Antropologia social
A antropologia social nasceu na Europa e distingue-se da cultural por não
ser tão ambiciosa em termos de grandes teorias e princípios capazes de
52
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

explicar globalmente os fenómenos culturais. Além disso, a antropologia


social des-preza o estudo da evolução humana por considerá-lo um
empreendimento demasiado especulativo e por encarar a teoria da
evolução como uma construção cultural emanada da mentalidade
“progressista” emergente com a Revolução Industrial. Prefere trabalhar
com informação recolhida através de observação participante e
documentação. A sua retrospecção histórica é pouco profunda e apenas
na medida necessária para poder compreender os processos de
transformação das relações sociais nas sociedades estudadas ou
contextos estudados, geralmente de pequena dimensão.

Etnografia
Significa literalmente “escrever sobre os povos” e designa a actividade
antropológicade recolha de informação através da observação
participante, prática que consiste em ficar durante meses num lugar
estudando a vida de um grupo de pessoas ou de uma pequena sociedade.
A permanência do etnógrafo (o antropólogo na sua função de recolha de
informação) durante alguns meses no seio da sociedade ou grupo humano
que pretende observar garante informação em primeira-mão, que de
outro modo não poderia ser recolhida.
O conhecimento etnográfico baseia-se na experiência de participação do
próprio etnógrafo na vida social que pretende descrever e analisar.
Durante o chamado trabalho de campo o etnógrafo recolhe informação,
questionando, filmando, fotografando, sobre os diferentes aspectos da
vida social do grupo ou comunidade. Tradicionalmente, a etnografia fazia-
se em pequenas comunidades, que raramente ultrapassavam algumas
centenas de pessoas, e em muitos casos não iam além de uma centena. A
informação etnográfica mais importante encontra-se nas esferas da
economia (de que vive o grupo ou a comunidade), tecnologia
(ferramentas e técnicas de uso), organização social (formas de parentesco
e casamento), actividade política (grupos de interesse, formas de resolução
dos conflitos, relações com o exterior, formas de decisão), religião, magia,
ciência e outras estratégias usadas no controle o mundo envolvente.
A essência da etnografia é a aprendizagem do modo de vida do “nativo”
através da prática em conjunto e da partilha com o próprio e não a mera
recolha de informação. O etnógrafo trata as pessoas como parceiros de
interacção e não como “objectos” de estudo.
Os objectivos do etnógrafo podem ser muito variados, desde obter uma
visão geral da sociedade estudada até à compreensão de uma questão ou
detalhe particular.

Etnologia
Consiste na interpretação e análise da informação etnográfica. A
separação entre a etnologia e a etnografia não é fácil de estabelecer, pois
não só frequentemente o etnólogo e o etnógrafo são a mesma pessoa
como este é sempre guiado por alguma orientação teórica no seu
trabalho de campo. Não existe recolha cega de informação, qualquer
tarefa etnográfica é sempre orientada por escolhas determinadas pela
teoria etnológica, seja ela qual for.
53
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

A etnologia revela os padrões e regras gerais que governam o


comportamento humano. Esta ideia revela uma preocupação
universalista que actualmente não é partilhada pela maioria dos
antropólogos/etnólogos (os nomes são sinónimos na maior parte das
vezes). De qualquer maneira, a etnologia procura comparar a informação
etnográfica recolhida em diferentes locais e sociedades, quanto mais não
seja para tentar mostrar que não existem comportamentos ou elementos
culturais universais e que cada sociedade humana é diferente de todas as
outras. Esta é uma questão antiga na antropologia e sem solução à vista.
Uns preferirão salientar a similitude e a universalidade dos fenómenos
culturais, outros a diferença e especificidade de cada sociedade. O
paradoxo da antropologia é ter de criar universalidades a partir de casos
particulares no tempo e no espaço; por um lado estuda casos particulares,
mas por outro tenta enquadrá-los universalmente. Trata-se de um círculo
hermenêutico sem saída.

Antropologia linguística
Sendo a língua o principal meio de codificação e transmissão de cultura
não é de estranhar que a antropologia linguística seja um ramo da
antropologia geral. Trata-se de um desenvolvimento particular da
linguística ao serviço da antropologia. A linguagem é o aspecto mais
importante da cultura humana, uma chave para a compreensão dos
outros aspectos. Os antropólogos linguistas estudam a língua na sua
diversidade, origem e evolução. Mais recentemente desenvolveu-se um
ramo, a sociolinguística, que explora as relações entre a língua e as
relações sociais, assim como os usos sociais da língua em cada sociedade.
O primeiro passo, e mais importante, de um antropólogo quando se
propõe estudar “outra cultura” é aprender a língua. A ligação entre a
linguística e a antropologia aconteceu sobretudo nos EUA.

Sumário

Nesta unidade temática 3.3 abordou-se com mais ampla apresentação os


diferentes ramos de antropologia e suas características:
 ▪ 
Biológica
 ▪ 
Arqueológica
 ▪ 
Cultural
 ▪ 
Social
 ▪ 
Etnográfico,
 ▪ 
Etnologia
▪ 
Linguístico

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1(com respostas)


1.Quais são os ramos da antropologia?
2.Qual é o primeiro passo mais importante, na opinião de Batalha
(2004) quando o antropólogo se propõe a estudar outra cultura”?
54
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Respostas
1.Biológica, arqueológica, cultural, social, etnografia, etnologia,
linguística
2.É a língua
3.É o principal meio de codificação e transmissão da cultura

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.O etnógrafo trata as pessoas como parceiros de interacção e não como
“objectos” de estudo
2.A linguagem é o aspecto mais importante da cultura humana, uma
chave para a compreensão dos outros aspectos

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Qual é o paradoxo de antropologia?
2.Qual é a relação entre etnologia e etnografia?
3.Porque a antropologia social des-preza o estudo de evolução?

55
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

TEMA 4:O CONCEITO DE ANTROPOLOGIA CULTURAL

UNIDADE 4.1. Definições e abordagens sobre Antropologia Cultual


UNIDADE 4.2. Origem e o desenvolvimento da cultura
UNIDADE 4.3. Cultura e sociedade
UNIDADE 4.4. A cultura material e a cultura imaterial

UNIDADE 4.1. Definições e abordagens sobre


Antropologia Cultual

Introdução

A antropologia é uma ciência na qual não se esgotam campos de


actuação e aplicação do conhecimento. Nesta unidade temática
pretende-se que o estudante ao completar esta unidade, seja
capaz de:

 ▪ 
Definir a antropologia
 ▪ 
Conhecer as abordagens da antropologia
▪ 
Caracterizar a antropologia cultural
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
A noção de cultura é das mais enganosas para o estudante de
antropologia, devido ao facto de ter na antropologia, e nas ciências
sociais em geral, um uso diferente da linguagem quotidiana. Este
associa cultura a determinados aspectos da vida social, como saber ler,
saber música, ser pessoa de grande saber, ser culto, etc. Na linguagem
corrente ter cultura significa ser instruído em termos literários,
científicos, musicais e artísticos (GUSMÃO, 2008)
Refere-se ao modo de vida global em qualquer sociedade, e não
simplesmente aos aspectos que cada sociedade considera superiores
ou mais desejáveis. Assim, cultura, quando aplicada ao nosso próprio
modo de vida, não tem nada a ver com tocar piano ou ler Browning.
Para o cientista social, tais actividades são apenas elementos
pertencentes ao todo cultural (JORDÃO, 2004)
56
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

O qual inclui coisas tão mundanas como lavar pratos e guiar, as quais,
em termos de estudo da cultura, valem o mesmo que as actividades
“refinadas” da vida social. Daí que para os cientistas sociais não existam
sociedades ou indivíduos incultos. Para Maía (2000) cada sociedade tem
uma cultura, por mais

57
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

simples que ela possa ser, e todo o ser humano é nesse sentido um
ser culto.
Para Spiro (1998) o paradigma da cultura é composto por um conjunto
diversificado de escolas teóricas, orientações filosóficas ou
pressupostos ideológicos. A razão desta multiplicidade encontrasse no
fato de que conhecer o universo da cultura tornou-se uma forma de
contribuir para o entendimento da natureza humana, sem contar que
através da compreensão do universo cultural é possível propor ou
encontrar alternativas e soluções para os problemas sociais, planejar
formas de promover o convívio harmonioso entre os grupos humanos
e o desenvolvimento.
Na Antropologia segundo Gusmão (2008) e Jordão (2004) privilegiam-
se os aspectos culturais do comportamento de grupos e comunidades.
Questões cruciais para o entendimento da vida em grupo, como
alteridade, diversidade cultural, etnocentrismo, relativismo cultural são
tratadas por essa ciência, que, em seus primórdios estudava povos e
grupos geográfica e culturalmente distantes dos povos ocidentais. Ao
longo de seu desenvolvimento, os antropólogos passaram a analisar
grupos sociais relativamente próximos, buscando transformar o
exótico, o distante, em familiar.
Assim, Geertz (1973) afirma em sua história que, a Antropologia revelou
estudos notáveis sobre sociedades indígenas e sociedades camponesas,
identificando suas diferentes visões de mundo, sistemas de parentesco,
formas de classificação, cosmologias, linguagens etc. Também
desenvolveu uma série de estudos sobre grupos sociais urbanos,
enfatizando a diferenciação entre seus indivíduos, com base em
critérios de raça, cor, etnia, género, orientação sexual, nacionalidade,
regionalidade, afiliação religiosa, ideologia política, sistemas de crenças
e valores, estilos de vida etc.
1. "Culturas são sistemas (de padrões de comportamento socialmente
transmitidos) que servem para adaptar as comunidades humanas aos
seus embasamentos biológicos. Esse modo de vida das comunidades
inclui tecnologias e modos de organização económica, padrões de
estabelecimento, de agrupamento social e organização política, crenças
e práticas religiosas, e assim por diante."
2. "Mudança cultural é primariamente um processo de adaptação
equivalente à selecção natural." "O homem é um animal e, como todos
animais, deve manter uma relação adaptativa com o meio circundante
para sobreviver. Embora ele consiga esta adaptação através da cultura,
o processo é dirigido pelas mesmas regras de
selecção natural que governam a adaptação biológica."

Para Jordão (2004) citando Geertz (1973) afirma que as teorias


idealistas de cultura, que subdivide em três diferentes abordagens. A
primeira delas é a dos que consideram cultura como sistema cognitivo,
produto dos chamados "novos etnógrafos". Esta abordagem
antropológica tem se distinguido pelo estudo dos sistemas de
classificação de folk (Chamamos de sistemas de classificação de folk
àqueles que são desenvolvidos pelos próprios membros da
comunidade. Um exemplo disso entre nós é a classificação popular de
58
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

alimentos fortes e fracos.), isto é, a análise dos modelos construídos


pelos membros da comunidade a respeito de seu próprio universo.
Assim, cultura é um sistema de conhecimento: "consiste em tudo aquilo
que alguém tem de conhecer ou acreditar para operar de maneira
aceitável dentro de sua sociedade." Keesing comenta que se cultura for
assim concebida ela fica situada epistemologicamente no mesmo
domínio da linguagem, como um evento observável. Daí o fato de que
a antropologia cognitiva (a praticada pelos "novos etnógrafos") tem se
apropriado dos métodos linguísticos, como por exemplo, a análise
componencial.

A segunda abordagem é aquela que considera cultura como sistemas


estruturais, ou seja, a perspectiva desenvolvida por Claude Lévi-Strauss,
"que define cultura como um sistema simbólico que é uma criação
acumulativa da mente humana. O seu trabalho tem sido o de descobrir
na estruturação dos domínios culturais — mito, arte, parentesco e
linguagem — os princípios da mente que geram essas elaborações
culturais." Assim, os paralelismos culturais são por ele explicados pelo
fato de que o pensamento humano está submetido a regras
inconscientes, ou seja, um conjunto de princípios — tais como a lógica
de contrastes binários, de relações e transformações — que controlam
as manifestações empíricas de um dado grupo.
Jordão (2004) a última das três abordagens, entre as teorias idealistas,
é a que considera cultura como sistemas simbólicos. Esta posição foi
desenvolvida nos Estados Unidos principalmente por dois
antropólogos: o já conhecido Clifford Geertz e David Schneider.
O primeiro deles busca uma definição de homem baseada na definição
de cultura. Para isto, refuta a ideia de uma forma ideal de homem,
decorrente do iluminismo e da antropologia clássica, perto (a qual as
demais eram distorções ou aproximações, e tenta resolver o paradoxo
de uma imensa variedade cultural que contrasta com a unidade da
espécie humana. Jordão (2004) adianta que para isto, a cultura deve ser
considerada "não um complexo de comportamentos concretos, mas um
conjunto de mecanismos de controle, planos, receitas, regras,
instruções (que os técnicos de computadores chamam programa) para
governar o comportamento". Assim, todos os homens são
geneticamente aptos para receber um programa, e este programa é o
que chamamos de cultura.

Sumário

Nesta unidade temática discutiu-se a definição e as diferentes


abordagens da antropologia como forma de poder dominar
 ▪ 
As abordagens teóricas
▪ 
Aplicação na vida social

59
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Quais são as questões cruciais para o entendimento da vida em
grupo?
2. O que diz a segunda abordagem antropológica?

Respostas
1.Alteridade, diversidade cultural, etnocentrismo, relativismo cultural
2. A segunda abordagem é aquela que considera cultura como
sistemas estruturais

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1. O paradigma da cultura é composto por um conjunto diversificado
de escolas teóricas, orientações filosóficas ou pressupostos ideológicos
2.Para os cientistas sociais não existam sociedades ou indivíduos
incultos

Grupo 3 (exercícios de gabarito)

1.Anuncia as três abordagens da antropologia apresentadas no texto


2. Qual é a diferença entre a primeira da terceira abordagem da
antropologia?
3.Porque os antropólogos passaram a analisar grupos sociais
relativamente próximos, buscando transformar o exótico, o distante,
em familiar?

60
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 4.2. Origem e o desenvolvimento da cultura

Introdução

Ao entrar mais ao fundo sobre a antropologia cultural precisamos


de proporcionar metodologicamente o estudo separado das partes
constituintes da frase. Vimos o que é antropologia na opinião de
alguns autores e agora a intenção é olhar a cultura. Por isso que ao
completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

 Conhecer a origem da cultura
▪ 
Descrever as fases do seu desenvolvimento
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
De acordo com Maía (2000) falando sobre origem, no século XIX,
definiu-se como um empreendimento científico destinado a
compreender as origens da humanidade e a natureza cultural e
biológica dos povos “primitivos” ou “selvagens”. Mas à medida que o
mundo “primitivo” foi desaparecendo, a antropologia virou-se para a
própria sociedade onde nasceu: a sociedade industrial e pós-
industrial. Convém dizer que o pensamento antropológico é
significativamente mais antigo do que a antropologia como disciplina
académica.
Para Gusmão (2008) a origem daquele pode situar-se com alguma
precisão entre a publicação da obra de John Locke Na Essay
Concerning Human Understanding (1690) e o rebentar da Revolução
Francesa (Harris 1968). Isto se ignorarmos toda a actividade reflexiva
de natureza antropológica ocorrida antes (e. g. Grécia Antiga, Mundo
Árabe, China, etc.) de o “Ocidente” existir como categoria
hegemónica.
O conceito de cultura é uma preocupação intensa actualmente em
diversas áreas do pensamento humano, no entanto a Antropologia é
a área por excelência de debate sobre esta questão (BATALHA, 2004)
De acordo com o mesmo autor, desde sempre os homens se
preocuparam em entender por que outros homens possuíam hábitos
alimentares, formas de se vestir, de formarem famílias, de acessarem
o sagrado de maneiras diferentes das suas. A essa multiplicidade de
formas de vida dá-se o nome de diversidade cultural.
Contudo, segundo Jordão (2004) concordando com Gusmão (2008) e
Assis (2008) foi a partir da descoberta do Novo Mundo, nos séculos
XV e XVI, que os europeus se depararam com modos de vida
completamente distintos dos seus, e passaram a elaborar mais
intensamente interpretações sobre esses povos e seus costumes. É

61
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

fundamental lembrarmos que o impacto e a estranheza se deram dos


dois lados. Os grupos não europeus se espantavam com o ser
diferente que chegava até eles desembarcando em suas praias e
tomando posse de seu território. Existem relatos de povos que após
a morte de um europeu em combate, colocavam seu corpo dentro de
um rio e esperavam sua decomposição para ver se eram pessoas
como eles. A diferença é que não temos contacto com esses relatos
dos povos não europeus para conhecermos a visão que eles tinham
dos brancos (MAÍA, 2000)

O termo cultura, para alguns, significa comportamento aprendido, ou


abstracção do comportamento, e também não é específico da área da
antropologia, outras vertentes da ciência também empregam e valem-
se do mesmo. Na antropologia, o significado da cultura é a totalidade
de padrões diversos, aprendidos e desenvolvidos pelo ser humano,
incluindo conhecimento, crenças, arte, morais, leis, costumes e outras
aptidões e hábitos.
Batalha (2004) diz que o termo cultura tem associações diferentes
conforme temos em mente o desenvolvimento de um indivíduo, de um
grupo ou classe ou de toda uma sociedade. É parte da tese que a cultura
do indivíduo está dependente da cultura de um grupo ou classe, e que
a cultura do grupo ou classe está dependente da cultura de toda a
sociedade a que esse grupo ou classe pertence. Por isso, é a cultura da
sociedade que é fundamental, e é o significado do termo «cultura» em
relação a toda a sociedade que se devia examinar primeiro. Para Batalha
(2004) e Gusmão (2008) dizem que quando o termo «cultura» se aplica
à manipulação de organismos inferiores - ao trabalho do bacteriologista
ou do agricultor - o significado é bastante claro porque podemos obter
unanimidade a respeito dos fins a serem atingidos, e podemos
concordar quanto a tê-los atingido ou não. Quando se aplica ao
aperfeiçoamento do intelecto e espíritos humanos, é menos provável
que concordemos em relação ao que a cultura é. O termo em si,
significando alguma coisa a que se deve conscientemente aspirar em
assuntos humanos, não tem uma história longa.

Como alguma coisa a ser alcançada com esforço deliberado, a «cultura»


é relativamente inteligível quando nos preocupamos com o acto do
indivíduo se Auto cultivar, indivíduo cuja cultura é vista contra o pano
de fundo da cultura do grupo e da sociedade. A cultura do grupo tem
igualmente um significado definido em contraste com a cultura menos
desenvolvida da massa da sociedade.
A diferença entre as três aplicações do termo segundo Assis (2008) e
Gusmão (2008) pode apreender-se melhor perguntando em relação ao
indivíduo, ao grupo e à sociedade como um todo, em que medida o
objectivo consciente de alcançar cultura tem algum significado. Podia
evitar-se muita confusão se nos abstivéssemos de pôr diante do grupo
o que pode ser objectivo apenas do indivíduo; e diante da sociedade
como um todo o que pode ser objectivo apenas de um grupo.

62
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário

Nesta unidade temática 4.2. abordou-se as questões relacionadas


com a origem e desenvolvimento da cultura, sob proposta de que
após a leitura se possa apropriar de forma sistemática os conceitos e
conteúdos para:
 ▪ 
Melhoramento da compreensão dos factos sociais
▪ 
Alargamento da base de discussão e reflexão crítica

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual é a diferença entre as três aplicações do termo cultura?
2.Qual é o significado de cultura na antropologia?

Respostas
1.Cinge-se na relação entre indivíduo, grupo e sociedade
2.É a totalidade de padrões diversos aprendidos e desenvolvidos pelo
ser humano

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Convém dizer que o pensamento antropológico é significativamente
mais antigo do que a antropologia como disciplina académica.
2. O termo cultura tem associações diferentes conforme temos em
mente o desenvolvimento de um indivíduo, de um grupo ou classe ou
de toda uma sociedade

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Porque a cultura de sociedade deve ser examinada primeiro antes a
do indivíduo?
2.Quais são os diferentes significados do termo “cultura”?
3.Porque se afirma que a cultura do indivíduo está dependente da
cultura de um grupo ou classe?

63
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 4.3. Cultura e sociedade

Introdução

Como vimos nas unidades temáticas anteriores, falar de cultura


significa a prior estabelecer relação entre o comportamento
individual do colectivo ou social, isto é, o comportamento individual
pode indicar a cultura do indivíduo e o comportamento da sociedade
definir a cultura da sociedade. Ao completar esta unidade, o
estudante deverá ser capaz de:
 
Definir a cultura e sua aplicação na vida real

 Definir sociedade e suas características

Identificar a relação existente entre a cultura e sociedade
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
De acordo com Batalha (2004) não existem sociedades sem
indivíduos e os indivíduos só se tornam verdadeiramente humanos
por meio da socialização, processo pelo qual um indivíduo se torna
um membro activo da sociedade em que nasceu, isto é, comporta-se
de acordo com determinados atributos pré-concebidos. O indivíduo,
assim, desempenha na realidade um papel duplo em relação à
cultura.
Entretanto, as sociedades existem e funcionam num mundo em
perpétua mudança. Como uma simples unidade no organismo social,
o indivíduo perpetua o status quo. Como indivíduo, ajuda a
transformá-lo quando há necessidade (GUSMÃO, 2008). Desde que
nenhum ambiente se apresente completamente estacionário,
nenhuma sociedade pode sobreviver sem o inventor ocasional e sem
sua capacidade para encontrar soluções para novos problemas.
Segundo Jordão (2004) citando Scaglion (1998) as pessoas são
sujeitos activos no meio - tomam posições fazendo novas
interpretações, recebendo e construindo criativamente um processo
cultural em determinada época histórica. Cultura, indivíduo e
actividade indivíduo e sociedade importância da filogénese dos
processos psicológicos - no decorrer do desenvolvimento o ser
humano é moldado pela actividade cultural de outros.
De acordo com a mesma fonte, o individuo se constitui através da
rede de inter-relações sociais - tendo "instintos" ou comportamentos
pré-programados, passa através da vida social a adquirir a fala e

64
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

planejar e controlar sua actividade e de outrem, através das


representações mentais. Para Laraia (2001) e Jordão (2004) o
individuo passa de uma relação interpessoal para um controle e
planeamento intra-pessoal da sua própria actividade.

Mesmo estando sozinho, o ser humano tem os hábitos de uma


sociedade. Já está comprovado por estudos científicos, que existe uma
organização social entre os animais, não apenas entre os mamíferos
superiores, mas também entre os insectos como: formigas, cupins,
abelhas, etc. Entre esses insectos existe algo que podemos chamar de
“hierarquia social” ou “poder político”, “divisão de trabalho” etc. A
questão é; Qual a diferença entre a “sociedade” desses animais e a
sociedade do homem?
As pessoas apresentam comportamentos diferentes de acordo com o
lugar onde vivem (país estado, região) e também não se comportam
mais hoje como se comportavam a cinco ou dez anos atrás.
Laraia (2001) advoga que a diferença é que as formas de
comportamento dos animais irracionais e insectos são transmitidas
geneticamente, ou seja, decorrem da natureza, enquanto os padrões
de comportamento do homem são artificiais, criados pelo próprio
homem.
Spiro (1998) afirma que apesar de a espécie humana ser dotada de
certas características orgânicas que só ela possui, estas não são
suficientes para o desenvolvimento da sua personalidade e do
comportamento na sua forma social. A ecologia cultural considera a
interacção entre as características do ecossistema e o apetrechamento
tecnológico humano como sendo a principal condicionante da
organização das sociedades humanas. Ember & Ember (1996) diz que a
selecção natural se encarrega de seleccionar positiva ou negativamente
os comportamentos que cada grupo humano adopta na exploração dos
recursos naturais. Os grupos humanos que tiverem os comportamentos
mais adequados à sobrevivência num determinado ecossistema terão
maior sucesso reprodutivo e deixarão descendência, enquanto os que
tiverem comportamentos menos adequados desaparecerão por falta
de descendência.

Sumário

Nesta unidade temática 4.3 abordou-se questões relacionadas com


o indivíduo e sua relação com a cultura e esta com a sociedade
como forma de facilitar:
 ▪ 
A compreensão desta relação tripartia
▪ 
Os mecanismos da sua interacção para o equilíbrio da relação

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1( com respostas)

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1.Qual é a diferença entre as formas de comportamento do homem de


outros animais irracionais?
2.O que é a ecologia cultural?

Respostas

1.É que as formas de comportamento dos animais irracionais são


transmitidas geneticamente enquanto que os padrões de
comportamento do ser humano são artificiais, criadas pelo próprio
homem.
2.considera a interacção entre as características de ecossistema e o
apetrechamento tecnológico humano como sendo a principal
condicionante da organização das sociedades humanas

Grupo 2( respostas detalhadas)


1.As sociedades existem e funcionam num mundo em perpétua
mudança
2.Mesmo estando sozinho, o ser humano tem os hábitos de uma
sociedade
3.Não existem sociedades sem indivíduos e os indivíduos só se tornam
verdadeiramente humanos por meio da socialização

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Qual é a relação entre indivíduos, cultura e sociedade?
2.Porque se afirma que o indivíduo desempenha um papel duplo em
relação a cultura?
3.Comenta afirmação segundo a qual o ecologista cultural apenas pode
testar o que observa e não aquilo que poderia estar no lugar do que
observa

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UNIDADE 4.4.A cultura material e a cultura imaterial

Introdução

Nas unidades anteriores vimos de forma sequencial como as relações são


construídas e constituídas. Para esta unidade temática queremos observas
aspectos ligados a cultura material e imaterial para:

Conhecer a sua importância na socialização do indivíduo;


Objectivos Identificar as diferenças entre a cultura material e cultura imaterial
específicos

Desenvolvimento
O Património Cultural pode ser definido como um bem (ou bens) de
natureza material e imaterial considerado importante para a
identidade da sociedade.
O património material é formado por um conjunto de bens culturais
classificados segundo sua natureza: arqueológico, paisagístico e
etnográfico; histórico; belas artes; e das artes aplicadas (MAIA, 2000).
Eles estão divididos em bens imóveis – núcleos urbanos, sítios
arqueológicos e paisagísticos e bens individuais – e móveis – colecções
arqueológicas, acervos museológicos, documentais, bibliográficos,
arquivísticos, videográficos, fotográficos e cinematográficos.
Para Jordão (2004) património Imaterial é transmitido de geração em
geração e constantemente recriado pelas comunidades e grupos em
função de seu ambiente, interacção com a natureza e sua história,
gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo,
assim, para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade
humana.

Muitos autores como Cuche (1999), Laraia (2001), Jordão (2001) e


Gusmão (2008) advogam que os bens culturais imateriais estão
relacionados aos saberes, habilidade, as crenças, as praticas, ao modo
ser das pessoas. Desta forma podem ser considerados bens imateriais:
conhecimentos enraizados no cotidiano das comunidades;
manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; rituais e
festas que marcam a vivência coletiva da religiosidade, do
entretenimento e de outras práticas da vida social; além de mercados,
feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e se
reproduzem práticas culturais.
De acordo com estes autores, na lista de bens imateriais brasileiros
estão a festa do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, a Feira de Caruaru,
o Frevo, a capoeira, o modo artesanal de fazer Queijo de Minas e as
matrizes do Samba no Rio de Janeiro.
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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Para Assis (2008) e Jordão (2004) o patrimônio material é formado por


um conjunto de bens culturais classificados segundo sua natureza:
arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e das
artes aplicadas. Eles estão divididos em bens imóveis – núcleos urbanos,
sítios arqueológicos e paisagísticos e bens individuais – e móveis –
coleções arqueológicas, acervos museológicos, documentais,
bibliográficos, arquivísticos, videográficos, fotográficos e
cinematográficos.

Sumário

Nesta unidade temática 4.4 abordamos questões ligadas a cultura


material e cultura imaterial, dois conceitos que possibilitaram
descobrir como os bens materiais e imateriais contribuem para:
 ▪ 
A existência do homem como indivíduo
▪ 
A existência do homem como grupo.

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que são bens imateriais?
2.O que é património cultural?

Respostas
1.são conhecimentos enraizados no quotidiano das comunidades
2.bem de natureza material e imaterial

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Os bens culturais imateriais estão relacionados aos saberes, às
habilidades, às crenças, às práticas, ao modo de ser das pessoas.
2.Arqueologia faz parte do património imaterail.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que são bens materiais?
2.O que é cultura material?
3. O que é cultura imaterial?
4.O que é património material?
5. O que é património imaterial?

69
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TEMA 5:TEORIAS, FACTOS E PROCESSOS NA ANTROPOLOGIA

UNIDADE 5.1. As principais correntes Antropológicas


UNIDADE 5.2. Desenvolvimento histórico e principais áreas de
interesse contemporâneas
UNIDADE 5.3. As correntes antropológicas e sua operacionalização
em Moçambique

UNIDADE 5.1. As principais correntes Antropológicas

Introdução

Nesta unidade temática vai aflorar duma forma geral as principais


correntes antropológicas que directa ou indirectamente deram
origem a diversas interpretações das manifestações daquilo que hoje
constitui o objecto de estudo da antropologia. Por isso pretende-se
que o estudante ao concluir, tenha capacidade de:

 ▪ 
Conhecer as principais correntes antropológicas
 ▪ 
Caracterizar cada corrente antropológica estudada
▪ 
O papel delas na interpretação das diferentes manifestações sociais
Objectivos
específicos

Desenvolvimento
Ao longo dos seus pouco mais de cem anos de existência como
disciplina académica, a antropologia produziu um conjunto de teorias
muitas vezes em oposição entre si (ERIKSEN E NIELSEN, 2007).
Basicamente, essas teorias distribuem-se por dois paradigmas
alternativos: um, o paradigma “científico”, inspirado nas ciências
naturais, outro, a que podemos chamar “interpretativo”, o que
considera a antropologia como a arte da interpretação e não como
uma ciência (BATALHA, 2004).
Os adeptos do primeiro paradigma defendem que a actividade
antropológica pode ter um carácter científico, enquanto os segundos
dizem que a objectividade, tão apregoada pelo discurso científico, é

impossível de alcançar em antropologia e que o lugar desta é entre as


humanidades (literatura, história, estudos culturais, etc.). Para os
interpretativistas, cada sociedade e cada cultura são casos únicos e não

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é possível extrair generalizações válidas através da comparação de


sociedades ou culturas. Segundo Caldeira (1988) o antropólogo deve
preocupar-se mais em “deixar falar” cada cultura através daquilo que
as pessoas fazem e dizem, do que estabelecer generalizações com
pretensão universalista.
O relativismo cultural absoluto transforma-se numa forma de
determinismo cultural, em que tudo é determinado pela especificidade
de cada cultura, tornando-se esta na causa e fim de sim mesma.
As teorias antropológicas, tal como a teoria sociológica em geral, de
acordo com Eriksen e Nielsen (2007) podem emanar de dois princípios
metodológicos opostos: o individualismo metodológico e o colectivismo
metodológico. Resumidamente, os individualistas metodológicos
defendem que entidades colectivas como sociedade, grupo, família,
etc., são ficções criadas pela teoria sociológica; para eles apenas
existem indivíduos, sendo a história o resultado de acções individuais.

O evolucionismo
A época em que a antropologia emergiu como ciência, segunda metade
do século XIX, foi marcada pelo triunfo das ideias evolucionistas.
Como afirma Lelatine (2003) na antropologia, as teorias evolucionistas
estão associadas a nomes pioneiros, como o britânico Edward
BurnettTylor (1832-1917) e o americano Lewis Henry Morgan (1818-
1889). O evolucionismo era também a doutrina que melhor servia os
interesses do colonialismo e a ideologia dos administradores coloniais,
uma vez que continha uma escala hierarquizada de instituições e
valores culturais, no topo da qual se encontravam os valores da
“civilização” europeia (Kuper 1996), legitimando assim a colonização
“civilizadora”.
A principal ideia do evolucionismo consistia em defender que a cultura
e as sociedades evoluem, tal como as espécies e os organismos, a partir
de formas mais simples até chegarem a outras mais complexas. Tanto
Tylor como Morgan afirmavam que as sociedades passam por estádios
de evolução até chegarem às formas mais complexas da vida social.
Acreditavam também que era possível encontrar ainda no século XIX
sociedades em diferentes estádios e graus de evolução.
Para Eriksen e Nielsen (2007) as teorias evolucionistas não explicam
satisfatoriamente toda a diversidade cultural. Porque é que umas
sociedades “evoluíram” para a “civilização” enquanto outras se
mantiveram na “selvajaria”? Se existe uma unidade química da
humanidade, então como se explica toda a diversidade cultural
existente? Mais, existe hoje evidência etnográfica e histórica de que
nem todas as sociedades passaram pelas mesmas fases na sua marcha
evolutiva para a “civilização”.

O particularismo histórico
Os primórdios do século XX trouxeram a crítica ao evolucionismo por
parte da antropologia cultural norte-americana.
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A defesa que os evolucionistas faziam da existência de leis universais de


evolução era prematura e não sustentada pela pesquisa etnográfica. De
acordo com Eriksen e Nielsen (2007) citando Boas(…) os dados
etnográficos e arqueológicos recolhidos até à data não eram suficientes
para estabelecer generalizações universais. A sua orientação teórica era
a de que apenas se podiam recolher dados de situações particulares e
explicá-las de acordo com esses dados, mas não se podia generalizar
essas explicações a situações até então não estudadas
etnograficamente. Ao enfatizar a variabilidade histórica, Boas tomou
claramente partido contra os esquemas evolucionistas que procuravam
colocar toda a humanidade numa fórmula evolutiva única
Para Moutinho (1980) diz que a complexidade de formas culturais e
sociais não se compadecia com generalizações e o estabelecimento de
“leis universais” da cultura. Cada cultura e sociedade tinham de ser
analisadas no seu contexto próprio e qualquer extrapolação para
contextos diferentes era vista como abusiva. Os antropólogos deviam
gastar menos tempo com especulações infundamentadas e usá-lo antes
para recolher material etnográfico.
A falácia desta estratégia está em pensar que se pode recolher dados
sem um enquadramento teórico prévio. Os factos não falam por si, mas
sim pelas ideias de quem os recolhe. Para Boas, o antropólogo era uma
espécie de ceifeira – debulhadora que recolhe tudo a eito. A verdade é
que os antropólogos, como qualquer outra pessoa, são selectivos na
escolha dos “factos”, não ceifam à toa, apenas apanham aquilo que o
seu interesse prévio definiu como importante.

O difusionismo
Eriksen e Nielsen (2007) diz que o difusionismo tornou-se popular, nos finais
do século XIX, quando o evolucionismo era ainda uma teoria influente, e
constituiu um domínio das teorias evolucionistas. Existiram duas escolas
principais: uma na Alemanha-Áustria e outra na Grã-Bretanha. A sua ideia
central era a de que as civilizações mais “avançadas”, das quais a Europa
representava o expoente máximo, tinham a sua origem no velho Egipto,
considerado uma civilização avançada devido ao facto de nela se ter
desenvolvido a prática da agricultura muito cedo e de esta ter levado ao
desenvolvimento de formas de religião, arquitectura e arte muito
“avançadas”. Para os difusionistas britânicos, a evolução independente
e paralela parecia de menor importância, senão mesmo uma concepção
errada. Para eles, a difusão a partir do Egipto explicava o
desenvolvimento de todas as outras civilizações.

De acordo com Eriksen e Nielsen (2007) a espécie humana não era


particularmente inventiva, pelo que não fazia sentido que soluções
extremamente engenhosas e requerendo grandes capacidades
tivessem sido inventadas várias vezes em sítios diferentes. A
humanidade era sobretudo imitadora e não inventora. Nenhuma destas
“teorias” difusionistas apresentava o suporte histórico e arqueológico

72
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necessário para ser minimamente credível à luz de padrões científicos


actuais.
Segundo os difusionistas a semelhança de características culturais
numa determinada área era explicada pela difusão a partir de um
centro. Quanto mais nos afastássemos desse centro menor seria a
relação entre os elementos culturais originais existentes nesse centro e
os elementos encontrados na sua periferia. Para Leplatine (2003) o
conceito de área cultural teve a sua origem nas exigências práticas da
pesquisa etnográfica norte-americana, tendo sido usado como artifício
heurístico no mapeamento e classificação dos grupos tribais das
Américas do Norte e do Sul. O difusionismo contribuiu para que as
colecções dos museus passassem a ser organizadas com base em
categorias geográficas em vez de dispostas segundo um modelo
evolucionista.

Para Gonçalves (2002) o princípio da difusão não está errado em si


mesmo. De facto, as sociedades trocam entre si elementos das suas
culturas. Mas o que o difusionismo não explica é porque é que uns
elementos se difundem enquanto outros não. Por exemplo, porque é
que a “cultura” da Coca-Cola se difunde tão facilmente, tornando-se
praticamente universal, enquanto a monogamia não? E a mesma
questão se pode colocar em relação a muitas outras coisas.

O funcionalismo e o estrutural-funcionalismo
Para Eriksen e Nielsen (2007) estes dois paradigmas, que fazem hoje
parte do museu da teoria antropológica, marcaram a antropologia
social europeia, sobretudo britânica, até pelo menos ao início da década
de 1950. O funcionalismo interpreta a sociedade como se ela fosse um
organismo; cada parte do sistema desempenha uma determinada
função. O trabalho do antropólogo seria explicar as funções das
diferentes partes do sistema social.
Nesse sentido, e apesar do seu esquema conceptual simples, tanto o
funcionalismo como o estrutural- funcionalismo representavam uma
certa revolução teórica face ao carácter meramente particularístico e
descritivo da abordagem tradicional (BATALHA, 2004).
De acordo com a teoria funcionalista os elementos culturais serviam
para satisfazer as necessidades dos indivíduos em sociedade, estas, por
sua vez, eram determinadas pela própria biologia humana. Um
elemento ou traço cultural tinha como função satisfazer uma qualquer
necessidade básica resultante da natureza biológica dos indivíduos.
Jordão (2004) diz que a nossa espécie não era, nesse aspecto, diferente
das outras. Essas necessidades básicas eram a nutrição, reprodução,
conforto corporal, segurança, relaxamento (e outras do mesmo
género).
Para Leplatine (2003) a cultura estava ao serviço da satisfação dessas
necessidades. Por outro lado, a satisfação das necessidades básicas
daria origem a outro tipo de necessidades, e, assim, as coisas ter-se-iam
tornado mais complexas em termos de organização social.

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Apara Batalha (2004) a questão não era tanto a de saber se a cultura se


colocava ao serviço das necessidades individuais mas sim a de descobrir
de que modo ela contribuía para a manutenção de uma estrutura social
equilibrada. Entendendo por estrutura social a rede total de relações
sociais existentes numa sociedade. A ênfase colocada na estrutura em
vez de nos indivíduos fez com que a sua escola de designasse por
estrutural-funcionalista em vez de funcionalista.

Tal como o funcionalismo, nos falares de eriksen e Nielsen (2007)


também o estrutural-funcionalismo não explicava porque razão as
sociedades satisfazem as suas necessidades funcionais de maneiras tão
diferentes. Por exemplo, porque é que numas sociedades o pai
desempenha o papel de “irmão mais velho” com quem se pode ter uma
relação de brincadeira, enquanto noutras é uma figura autoritária que
se teme e respeita? O principal mérito do funcionalismo e do estrutural-
funcionalismo foi a sua preocupação central com o trabalho de campo
e a recolha etnográfica.

O culturalismo norte-americano
Por volta da década de 1920 segundo afirma Gonçalves (2002) alguns
antropólogos americanos interessaram-se pela relação entre a cultura
e a personalidade. A teoria psicanalítica de Sigmund Freud (1856-1939)
foi uma das influências fundamentais nesse movimento da antropologia
cultural norte-americana, que ficou para a história da antropologia
como culturalismo ou, movimento de cultura-personalidade
(LEPLATINE, 2003)
Desta forma de acordo com Eriksen e Nielsen (2007) as diferenças de
comportamento entre homens e mulheres existentes em qualquer sociedade
são um produto do treino social e da enculturação, e não das diferenças
biológicas entre géneros. A personalidade base resultaria sobretudo do
treino e educação sociais recebidos na infância, da maneira como os adultos
educam as crianças. O conjunto de práticas culturais que davam forma
personalidade base era designado por instituições primárias. Santos
(1969) afirma que uma vez formada a personalidade base, esta faria
depois emergir um conjunto de instituições secundárias destinadas a
satisfazer as necessidades e solucionar os conflitos originados pela
estrutura da própria personalidade base.
Ainda de acordo com Santos (1969) a religião e o ritual eram exemplos
de instituições secundárias decorrentes da personalidade base. As
instituições primárias e as secundárias influenciavam-se assim
mutuamente de forma circular, através da personalidade base. O
problema deste tipo de teorias é criarem explicações circulares das
quais não se consegue sair, pois uma coisa explica a outra e vice-versa,
e assim sucessivamente (BATALHA, 2004).
Assim, nas sociedades onde se pratica a agricultura o treino social
enfatiza a obediência e a responsabilidade, enquanto nos caçadores-
recolectores e pescadores enfatiza a independência e a confiança
individual (LEPLATINE, 2003). Mas este tipo de generalização também
não pode ser levado demasiado longe. Por exemplo, a punição do
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comportamento agressivo infantil poderia levar ao desenvolvimento de


adultos preocupados com a agressão, o que por sua vez poderia levar
esses adultos a atribuírem à agressividade os estados de doença. O
maior problema com este tipo de teorias é o facto de elas muitas vezes
procurarem generalizações demasiado amplas e para as quais não
existe prova etnográfica suficiente (BATALHA, 2004).

O neo-evolucionismo
Na década de 1930, diz Eriksen e Nielsen (2007) e depois do domínio
completo de Franz Boas na antropologia norte-americana, Leslie A.
White (1900-1975) posicionou-se contra o particularismo boasiano
defendendo a abordagem evolucionista, embora com uma nova
roupagem. Acusado de neo-evolucionista, White defendeu-se dizendo
que as suas teorias pouco tinham que ver com o evolucionismo do
século XIX. Segundo ele, a cultura estava ao serviço da domesticação e
captura de energia. Para exprimir isso, avançou com a sua lei básica de
evolução cultural, a qual afirmava que mantendo todos os outros
factores constantes uma sociedade evoluiria de acordo como o
aumento da quantidade anual de energia per capita, ou então de
acordo com os melhoramentos tecnológicos que permitissem
aproveitar melhor a quantidade de energia já existente (White 1949).
A teoria de White (1949) segundo Eriksen e Nielsen (2007) foi criticada por
dar ênfase quase absoluta aos factores tecnológicos e aos elementos materiais
dos sistemas culturais. Um dos principais problemas da sua teoria é que ela
não explica porque é que umas sociedades foram capazes de domesticar e
aproveitar mais energia do que outras, nem explica porque é que determinadas
sociedades tendo sido capazes de aproveitar quantidades enormes de
energia vieram posteriormente a ruir e desaparecer, como no caso das
sociedades clássicas do Médio Oriente e da América Central e do Sul.

Diz Gonçalves (2002) que portanto tentou conciliar as teorias dos seus
antecessores desenvolvendo as ideias de evolução específica, a qual se
refere ao processo de evolução cultural característico de cada
sociedade no seu ecossistema particular, e de evolução geral, que se
refere à maneira como a humanidade evolui na generalidade, isto é,
passando de formas de aproveitamento de energia menos complexas
para outras mais complexas.
Para Peirano (1995), Caldeira (1998) e Gonçalves (2002) a grande
diferença entre evolucionismo clássico e o neo-evolucionismo é que
este procura relacionar mudança evolutiva com a emergência de
formas de adaptação ecológica mais eficientes. De acordo com Eriksen
e Nielsen (2007) a evolução depende assim essencialmente da
tecnologia de aproveitamento e manuseamento da energia. Enquanto
para os evolucionistas do século XIX o “progresso” das “civilizações”
dependia essencialmente do desenvolvimento da mente humana,
sendo sobretudo uma questão cultural e não técnica ou natural.

75
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

O estruturalismo
O responsável pela adaptação do modelo estruturalista à antropologia
foi o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss (1908), inspirado pelo
trabalho de alguns dos linguistas do chamado Círculo de Praga, como
Nicolai S. Trubetzkoy (1890-1938) e RomanJacobson (1896-1982). À
influência do Círculo de Praga Lévi-Strauss juntou as ideias de Émile
Durkheim e Marcel Mauss (1872-1950), introduzindo na antropologia o
modelo linguístico da oposição binária ou das categorias contrastantes,
como também é por vezes designado (ERIKSEN E NIELSEN, 2003).
Para Eriksen e Nielsen (2007) enquanto o estrutural-funcionalismo se
preocupava acima detudo com o funcionamento do sistema social, o
estruturalismo de Lévi-Strauss procurava descobrir a origem desse
mesmo sistema, assim como provar a universalidade dessa origem, a
qual segundo ele se ancorava na estrutura profunda da mente humana.
Segundo Lévi-Strauss, a cultura, expressa através dos rituais, da arte e
do quotidiano, não é mais do que a manifestação de uma estrutura
mental profunda inerente à espécie humana. Por exemplo, o facto de
as populações “primitivas” organizarem os casamentos através de um
sistema que trocam entre si os indivíduos para fugir à endogamia, é um
exemplo de organização binária. A estrutura binária da mente humana
reflectir-se-ia assim na linguagem e nas instituições culturais humanas.
De acordo com mesma fonte, dando exemplo do caso das metades
(moieties, como são designadas na literatura antropológica de língua
inglesa) e do sistema de casamentos nas estruturas de parentesco é um
exemplo de organização e estrutura binárias. Corroborando a ideia de
Santos (1969) Jordão (2004) a sociedade estabelece regras de troca que
obrigam os indivíduos a circular entre metades através do sistema de
casamento. O mundo à nossa volta é organizado em categorias que se
opõem umas às outras; por exemplo, alto-baixo, cozido-cru, norte-sul,
mau-bom, terra-ar, cá-lá, cultura-natureza, etc. De acordo com a teoria
estruturalista, toda a construção cultural do mundo se faz com base
num sistema de oposições. Gonçalves (2002) e Eriksen & Nielsen (2007)
dizem que segundo Lévi-Strauss, esta organização do mundo em
categorias opostas não decorre somente de uma necessidade prática,
mas essencialmente de uma necessidade intrínseca da mente humana.
A cultura é uma manifestação da nossa estrutura mental. A natureza
profunda da mente força-nos a organizar o mundo à nossa volta através
de um sistema de contrastes binários que obedece aos mesmos
princípios que a linguagem falada humana, o produto cultural por
excelência.
Para Eriksen e Nielsen (2007) as interpretações de Lévi-Strauss são,
nalguns casos, completamente arbitrárias, não havendo a possibilidade
de as testar por serem consideradas à partida fora de qualquer
possibilidade de teste. Mas a sua maior falha é não explicar porque é
que havendo uma só estrutura universal existe uma diversidade tão
grande de padrões e sistemas culturais à escala mundial. Ou, por que
razão a mesma estrutura mental se exprime de formas tão diversas?

A nova etnografia ou etnociência

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Existe segundo Assis e Nepomuceno (2008) algo de comum entre o


estruturalismo e a etnociência: ambos derivam os seus princípios da
linguística estrutural. Para os estruturalistas trata-se de descobrir as
regras que emanam da estrutura mental que governa a linguagem e o
pensamento humanos. Para os etnocientistas trata-se de descobrir o
quadro mental, definido culturalmente, que orienta o comportamento
humano numa dada sociedade.
Mas ara Eriksen e Nielsen (2007) enquanto o estruturalista define ele
próprio as categorias binárias de oposição com que vai interpretar a
cultura que é objecto do seu estudo, o etnocientista procura entender
e usar as categorias dos próprios actores, tentando não contaminá-las
com as suas próprias categorias. O seu objectivo é descobrir o mapa
cognitivo que governa os comportamentos e, a partir dele, explicá-los.
Segundo afirmam Santos (1969) e Eriksen & Nielsen (2007) usando uma
metáfora podemos dizer que os indivíduos são como que comandados
por um sistema operativo, arquivado no seu cérebro, e que se
conseguíssemos aceder a esse sistema estaríamos em condições de
entender o comportamento humano e o sentido dos sistemas culturais.
Cada cultura possui o seu sistema operativo próprio. O etnocientista
procura não misturar as categorias do seu próprio sistema operativo
com as do sistema que estuda.

O que a etnociência não explica de acordo com Santos (1969) é porque


é que diferentes sociedades desenvolvem diferentes sistemas
operativos (basicamente o mesmo problema do estruturalismo com a
sua noção de estrutura profunda). Outro problema desta abordagem é
aquilo a que se pode chamar “o perigo do informante bem informado”,
ou seja, como o número de potenciais informantes é ilimitado, os
etnógrafos, por razões práticas de capacidade, têm de trabalhar com
um pequeno número apenas, acabando frequentemente por ficarem
limitados a apenas um informante. Este, muitas vezes, é escolhido
devido a uma aparente maior competência para descodificar o sistema
operativo da sua cultura, ou, simplesmente, por ser de contacto fácil.

Existencialismo
Para Eriksen e Nielsen (2007) em Filosofia será preferível a expressão
"filosofia da existência", por ser mais específica e menos controvertida.
A "existência" que aqui está implicada é o Homem, que se torna o
centro de atenção, encarado como ser concreto - nas suas
circunstâncias, no seu viver, nas suas aspirações totais. Centrado nos
problemas do Homem, o Existencialismo penetra nos seus sentimentos
concretos, nas suas angústias e preocupações, nas suas emoções
interiores, nas suas ânsias e preocupações, nas suas emoções
interiores, nas suas ânsias e satisfações - temas particularmente aptos
para um desenvolvimento literário.
Para Eriksen e Nielsen (2007) o Kierkegaard defende que "O
existencialismo nunca poderá ser uma teoria como outra qualquer,
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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

porque a existência não é, em si, susceptível de teoria. O


existencialismo, para Kierkegaard, é apenas a expressão da sua própria
vida e a única coisa de geral ou de universal que contém é a exortação
que a todos nos dirige para que nos tornemos cristãos. A natureza deste
existencialismo só poderá, portanto, ser definida em função das
condições que são requeridas por um existir autêntico - existir que se
deverá iniciar e intensificar seguidamente, por meio de uma reflexão
capaz de fazer, de uma existência vivida, uma existência desejada e
pensada. Essas condições podem reduzir-se a três: a necessidade do
compromisso e do risco, o primado da subjectividade e a prova da
angústia e do desespero."
O que o Karl Marx critica, segundo Leplatine (2003) é a questão de
como compreender o que é o homem. Não é o ter consciência (ser
racional), nem tampouco ser um animal político, que confere ao
homem sua singularidade, mas ser capaz de produzir suas condições de
existência, tanto material quanto ideal, que diferencia o homem. "A
essência do homem é não ter essência, a essência do homem é algo
que ele próprio constrói, ou seja, a História. "A existência precede a
essência"; nenhum ser humano nasce pronto, mas o homem é, em sua
essência, produto do meio em que vive, que é construído a partir de
suas relações sociais em que cada pessoa se encontra. Assim como o
homem produz o seu próprio ambiente, por outro lado, esta produção
da condição de existência não é livremente escolhida, mas sim,
previamente determinada.

O homem pode fazer a sua História mas não pode fazer nas condições
por ele escolhidas. O homem é historicamente determinado pelas
condições, logo é responsável por todos os seus actos, pois ele é livre
para escolher. Logo todas as teorias de Marx estão fundamentadas
naquilo que é o homem, ou seja, o que é a sua existência.
O Homem é condenado a ser livre (JORDÃO, 2004).

Eriksen e Nielsen (2007) afirmam que as relações sociais do homem são


tidas pelas relações que o homem mantém com a natureza, onde
desenvolve suas práticas, ou seja, o homem se constitui a partir de seu
próprio trabalho, e sua sociedade se constitui a partir de suas condições
materiais de produção, que dependem de factores naturais (clima,
biologia, geografia...) ou seja, relação homem-Natureza, assim como da
divisão social do trabalho, sua cultura. Logo, também há a relação
homem-Natureza-Cultura.
De acordo com a mesma fonte, o Jean Paul Sartre defende que a
distinção entre essência e existência corresponde a distinção entre
conhecimento intelectual e conhecimento sensível. Os sentidos põem
em contacto com os seres particulares e contingentes, únicos que
realmente existem, ao passo que a inteligência permite aprender as
ideias ou essências, géneros e espécies universais, meras possibilidades
de ser, em si mesmas inexistentes. Sabe-se, no entanto, desde Sócrates,

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que o objecto da ciência é o universal e não o particular, quer dizer a


essência e não a existência. Platão tenta resolver essa contradição
hipostasiando as ideias, atribuindo-lhes a realidade, no mundo supra-
sensível ou topos ouranoú (lugar do céu). Poder-se-ia dizer que é em
nome da existência que Aristóteles critica a teoria platónica das ideias,
sustentando que as ideias, ou essências, não estão fora mas dentro das
próprias coisas, as quais, feitas de matéria e de forma, contem, em si
mesmas, o universal e o particular, a essência e a existência.
Leplatine (2003) e Eriksen & Nielsen (2007) dizem que o Vergílio
Ferreira (…) admite que o "O existencialismo ergue o seu protesto,
afirmando que o Homem é pessoalmente, individualmente, um valor;
que a sua liberdade (em todas as suas dimensões e não apenas em
algumas) é uma riqueza, uma necessidade estrutural de que não deve
perder-se entre a trituração do dia-a-dia; e finalmente que, fixando o
homem nos seus estritos limites, só por distracção ou imbecilidade ou
por crime se não vê ou não deixa ver que ao mesmo homem impende a
tarefa ingente e grandiosa de se restabelecer em harmonia no mundo,
para que em harmonia a sua

vida lucidamente se realize desde o nascer ao morrer.

Sumário

Nesta unidade temática 5.1 procuramos apresentar várias


correntes antropológicas para ajudar a fazer interpretação das
diferentes manifestações observadas, entre elas:
 ▪ 
Evolucionismo
 ▪ 
Difusionismo
 ▪ 
Pluralismo
▪ 
Funcionalismo

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1(com respostas)


1.indique algumas correntes antropológicas estudadas neste texto?
2.Porque as pessoas dão informações erradas?
3. Por que a teoria de White foi criticada?

Respostas
1.evolucionismo, funcionalismo, difusionismo, pluralismo, etc.
2.Por varias razões como medo, prudência, ignorância, esperança de
receber ou ganhar algo, etc.

3.por dar ênfase quase absoluta aos factores tecnológicos e aos


elementos materiais dos sistemas culturais

Grupo 2 (respostas detalhadas)

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1.Ao longo dos seus pouco mais de cem anos de existência como
disciplina académica, a antropologia produziu um conjunto de teorias
muitas vezes em oposição entre si.
2.O homem pode fazer a sua História mas não pode fazer nas condições
por ele escolhidas.
3. A estrutura binária da mente humana reflectir-se-ia assim na
linguagem e nas instituições culturais humanas.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Qual é a fronteira entre a actividade científica e não científica?
2.Qual é a importância de inter-ajuda e das relações de troca?
3.Explica a relação entre homem-natureza-cultura?

UNIDADE 5.2.Desenvolvimento histórico e principais áreas de interesse contemporâneas

Introdução

Nesta unidade temática procuraremos nos concentrar em aspectos


ligados ao desenvolvimento histórico e das principais áreas de
interesse contemporâneas. Nesse sentido, pretende-se que ao
completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

 ▪ 
Conhecer o desenvolvimento histórico
 ▪ 
Identificar as áreas de interesse contemporâneas
▪ 
Estabelecer mecanismos de aplicação prática
80
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Objectivos
específicos

Desenvolvimento

De acordo com Maia (2000) diz que no texto clássico que marcou a
etnografia moderna, a questão era sobre a imensa distância entre a
apresentação final dos resultados da pesquisa e o material bruto das
informações colectadas pelo pesquisador, através de suas próprias
observações das asserções dos nativos, do caleidoscópio da vida
tribal. Nesse sentido, há uma transformação do antropólogo para
entrar em outra cultura, a necessidade de "aprender a comportar-se
como eles", desenvolvendo o sentimento de "empatia". De outro
modo, o antropólogo deveria reinterpretar os "dados brutos",
dependendo da inspiração oferecida pelos estudos teóricos, por uma
teoria da cultura.
Maia (2000) adianta que a produção do conhecimento antropológico
fez-se através do estudo dos povos coloniais numa perspectiva
"interstícia -o olhar desde dentro". O enfoque do tipo "colocá-lo todo
dentro" para a etnografia e "deixá-lo todo fora para prosa" marcou a
forma da passagem do campo para o texto etnográfico deste primeiro
momento. Para Peirano (1995) o princípio "eu estive lá" e, assim,
"posso falar do outro" demonstra que a experiência tem servido
como eficaz garantia de autoridade etnográfica. Deste modo, evoca
tanto uma presença participativa, uma certeza de percepção, uma
relação de afinidade emocional, como sugere um conhecimento
cumulativo (sobre uma realidade). E esse mundo "o meu povo",
concebido como criação da experiência, é subjectivo e não dialógico
(MAIA, 2000).
O antropólogo não se encontra mais numa situação de exclusividade
quanto à produção do conhecimento em relação ao outro. Perdendo
o lugar de sujeito absoluto do conhecimento, ele "agora se depara
com objectos falantes, com um ponto de vista próprio", que aceitam
ou se contrapõem às interpretações etnológicas, assumem, recusam
ou corrigem as imagens de si que dividem os académicos em tomo
na natureza da explicação antropológica (JORDÃO, 2004).

As inovações contemporâneas no texto etnográfico são reveladoras


da direcção da antropologia a uma sensibilidade histórica e política
de um constante refinamento, que está transformando a maneira
como a diversidade cultural é retratada.
Para Caldeira (1988) as mudanças actuais, das convenções do passado,
na passagem para o texto sobre outras culturas, constituem o "locus de
operação" para a função estratégica contemporânea da antropologia.
As regras definidoras da relação autor, objecto, leitor, que permitem a
produção, a legibilidade e a legitimidade do texto etnográfico, estão
tomando um rumo diverso, em função do processo de autocrítica pelo
qual passa a antropologia, na medida em que os mais variados aspectos
de sua prática vêm sendo questionados e desconstruído. Para Maia
(2000) as experiências vivenciadas colocam, lado a lado, antropólogo e

81
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nativo e, ao mesmo tempo, são reveladoras da "diversidade


irredutível".
Ao contrário dos parâmetros da antropologia moderna, que reconstruía
uma totalidade para dar sentido à diversidade, o que se pretende é o
ponto de vista do nativo e a diversidade de experiências, cabendo ao
antropólogo representar esta diversidade na forma textual (MAIA,
2000).
Nesse sentido, modos de vida trocam influências, imitam-se entre si,
pretendem dominar-se uns aos outros, pretendem traduzir-se
reciprocamente, subverter-se entre si. A análise cultural se acha imersa
em todo movimento de contestação ao poder.

Sumário

Nesta unidade temática 5.2 abordamos as questões relacionadas com


desenvolvimento histórico e áreas de interesse contemporâneas para:
 ▪ 
Ampliação do leque de estudos

Definição
clara de aspectos a considerar nos estudos desta
natureza

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que revelam as inovações contemporâneas no texto etnográfico?
2.Qual é o princípio que procura garantir a autoridade etnográfica?
3. De que se suporta este princípio?

Respostas

1.As inovações contemporâneas no texto etnográfico são


reveladoras da direcção da antropologia a uma sensibilidade
histórica e política de um constante refinamento, que está
transformando a maneira como a diversidade cultural é retratada.
2. O princípio "eu estive lá"
3. das experiencias vivenciadas daí o sentido de segurança de que
assim, "posso falar do outro".

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.As experiências vivenciadas colocam, lado a lado, antropólogo e
nativo e, ao mesmo tempo, são reveladoras da "diversidade
irredutível".
2.O antropólogo não se encontra mais numa situação de
exclusividade quanto à produção do conhecimento em relação ao
outro

82
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

a produção do conhecimento antropológico fez-se através do estudo


dos povos coloniais numa perspectiva "interstícia -o olhar desde
dentro"

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Quais são as mudanças actuais, das convenções do passado, na
passagem para o texto sobre outras culturas?
2.Quais são as regras definidoras da relação autor, objecto, leitor?
3. Porque é que a análise cultural se acha imersa em todo
movimento de contestação ao poder?

UNIDADE 5.3. As correntes antropológicas e sua

83
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

operacionalização em Moçambique

Introdução

Neta unidade temática, procura consolidar as lições aprendidas nas


unidades anteriores, fazendo sua aplicação prática à realidade
Moçambicana. Daí que ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:

▪ Interpretar as manifestações observadas em Moçambique


Objectivos ▪ Estabelecer paralelismo prático entre os aspectos comuns e diferentes
específicos
das correntes apresentadas

Desenvolvimento
Tomando como base a escola funcionalista, WLSA ((2013) diz que em
toda a sua diversidade, se constituiu como determinante na
operacionalização do conceito de cultura, ao procurar uma
generalização caracterizada pela busca de leis gerais através de
fenómenos culturais que desempenham uma função, contribuindo para
a coesão interna de um sistema de valores e crenças manifesto no
comportamento das pessoas.
Tomando a cultura como um subsistema de símbolos significativo para
os agentes, mediado por instituições que visam a cooperação e a
integração. Nesse sentido, para WLSA (2013) a cultura é vista como um
subsistema do sistema geral de acção social, constituído por valores e
padrões comuns aos actores que, deste modo, orientam os seus
comportamentos. Isto significa que as disposições de cada indivíduo e
a sua acção têm sempre como função uma partilha de valores,
condicionando a autonomia dos sujeitos a um padrão cultural comum.
Destacando a função normativa das instituições secundariza os factores
de mudança e acção dos actores que alteram/influenciam as práticas
institucionais. É o caso, por exemplo em Moçambique, da acomodação
das instituições, como a educação e a saúde, que realizam “arranjos” no
sentido de conciliar práticas culturais excludentes no quadro de
políticas públicas que se pretendem globais.

Esta posição defende a necessidade metodológica de tomar em conta


as lutas, os conflitos e as negociações pelos agentes que, actuando em

84
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

contextos específicos, produzem adaptação/reestruturação da ordem


social e da cultura enquanto dimensão dessa mesma ordem social.
Significa assim para Maia (2000) e Santos (1969) que, para
compreender realidades culturais, é tão importante reconhecer quais
os sistemas de valores e crenças que condicionam as práticas dos
sujeitos, como os atributos que organizam as suas representações
relativamente a si e aos outros. Nesta perspectiva, é importante
identificar como se constituem os elementos reconhecíveis de pertença
ao grupo, através de processos intersubjectivos e por meio da
linguagem reveladora de sentidos (WLSA, 2013).
Nesta ordem de ideias, a compreensão da cultura remete-nos para a
análise do discurso referente aos ritos e aos significados que assumem
para os sujeitos, às escolhas referentes ao que é mais ou menos
importante exprimir, tendo em conta os interlocutores e os espaços em
que os discursos são produzidos.
Neste sentido, foi interessante constatar, e contrariamente ao discurso
masculino, a desvalorização que é transmitida pelas jovens sobre a
aprendizagem da sexualidade no contexto ritual e também escolar),
contudo profundamente presente nas respostas às questões sobre o
corpo, em que o discurso da higiene sexual se apresentava construído
em função de atributos que caracterizam o exercício da sexualidade
tendo em conta a expectativa masculina (WLSA, 2013).

Recusando a abordagem redutora da cultura tal como é proposta pelos


funcionalistas e pelos estruturalistas a um epifenómeno quando
consideramos a duração e o tempo escolhidos para a realização dos
ritos como mecanismos aparentemente formais, referimo-nos à
necessidade de atender à importância que estes aspectos podem
assumir, principalmente quando essas alterações correspondem à
introdução de valores produzidos noutros espaços, como a escola. Se,
para os funcionalistas, cada elemento contribui para a coesão da
estrutura, já para os estruturalistas a análise deve ter como foco a
estrutura e a forma, incidindo sobre acção, permitindo a existência de
regularidades.
Para WLSA (2013) as representações e as práticas informadas (e
comunicando com outras esferas do campo político) permitem
entender como se regulam as relações entre os sujeitos e como o poder,
estruturando essas relações, classifica, categoriza, selecciona e prediz o
dominante.
De acordo com a mesma fonte, por exemplo, no caso das matronas e
dos mestres que orientam os ritos, é interessante compreender os
factores, como o controlo/contacto com/das instâncias formais do
Estado e/ou o maior acesso das e dos jovens às escolas têm produzido
alterações ao longo do tempo nas suas fontes de legitimação,
recorrendo tanto ao discurso da afirmação identitária étnica, como
estabelecendo alianças, embora informais, com a dispensam a
articulação e a comunicação entre as várias esferas sociais, políticas e
económicas.

85
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário

Nesta unidade temática 5.3 aprofundamos questões relacionadas com


aplicação das correntes antropológicas para a realidade Moçambicana,
como forma de auxiliar :
 ▪ 
Na orientação dos estudos e
▪ 
Interpretações de objectos observados em Moçambique

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual é o papel das matronas e mestres dos ritos?
2. O que é cultura segundo WLSA 2013?

Respostas
1.Orientar os ritos eu contacto com instituições legais do Estado
2. A cultura é vista como um subsistema do sistema geral de acção
social, constituído por valores e padrões comuns aos actores que, deste
modo, orientam os seus comportamentos

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A compreensão da cultura remete-nos para a análise do discurso
referente aos ritos e aos significados que assumem
2.As matronas e dos mestres que orientam os ritos, é interessante
compreender os factores, como o controlo/contacto com/das
instâncias formais do Estado

3 (exercícios de gabarito)
1.O que é epifenómeno?
2.Anuncia a abordagem redutora da cultura?
3. O que deve ser feito na tua opinião para conciliar práticas culturais
excludentes no quadro de políticas públicas?

86
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

TEMA 6:TRADIÇÃO E IDENTIDADE CULTURAL

UNIDADE 6. 1. A génese da multiplicidade cultural na metade


Oriental da África Austral
UNIDADE 6.2. O processo de construção do império colonial e
a pluralidade cultural
UNIDADE 6.3. A antropologia na África colonial e pós-colonial
UNIDADE 6.4. A antropologia em Moçambique colonial e pós
colonial UNIDADE 6.5. Dinâmica aculturacional e permanência de
modelos societais endógenos;

UNIDADE 6.1.A génese da multiplicidade cultural


na metade Oriental da África Austral

Introdução

Após intensas abordagens sobre a génese e desenvolvimento da


antropologia, temos nesta unidade temática uma proposta de debate
sobre a multiplicidade cultural que se pretenda estudar na metade
oriental da África Austral. Ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:

 
Conhecer a génese da multiplicidade cultural

Objectivos ▪ 
Descrever as suas características na metade Oriental da África Austral
específicos ▪ 
Identificar os pontos fortes e fracos desta parte da África

Desenvolvimento

Segundo Costa (2013) todas as missões de investigação científica,


temporárias ou permanentes, levadas a cabo pelas diferentes
instituições da metrópole aos territórios ultramarinos, contribuindo
para a empresa da ocupação científica do ultramar, para lá do mero
interesse e motivações dos investigadores de investigar e conhecer
(numa lógica de ciência pela ciência), estes foram norteadas por uma
finalidade e estratégia política.
Conhecer é Poder e é na relação das Universidades com os
organismos de investigação ultramarina que esse conhecimento
colonial é produzido, aprofundado e reproduzido, de modo a
autoridade colonial melhor poder orientar e explorar os diversos
recursos existentes e poder afirmar-se politicamente no plano
nacional e internacional (COSTA, 2013).
Ainda de acordo com Costa (2013) a ocupação científica das colónias
(através do seu estudo nas mais diversas vertentes) emerge como

87
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

fundamento político, como via para a exploração económica das


colónias, ao mesmo tempo que permite o desenvolvimento e
progressos das próprias ciências. Partilhando a ideia de Geffray
(1991) este desenvolvimento científico implica o desenvolvimento de
instituições na metrópole, responsáveis pela organização e realização
de investigação científica colonial, assim como nas próprias colónias
são criados organismos de estudo científico.
Levar a civilização aos territórios tropicais que se pretendiam
dominar, era levar a fé, a moral, os bons costumes, a higiene, os
cuidados de saúde, a cultura ocidental mas também fomentar a
exploração económica dos bens naturais aí existentes. De acordo com
Costa (2013) para lá das glórias e conquistas passadas, fruto directo
das descobertas e expansão de quinhentos, a Conferência de Berlim
(1885) vem impor um novo paradigma de afirmação dos títulos de
posse desses espaços ultramarinos. Dominar essas possessões, como
termo de afirmação de política internacional, importa observar a
fórmula: conhecer para possuir e dominar, o que só é alcançado pela
plena e empenhada Ocupação Científica dos territórios de além-mar.

Sumário

Nesta unidade temática 6.1 debruçamos sobre a génese da


multiplicidade cultural na metade Oriental da África Austral,
com o propósito de:
 ▪ 
Ilustração do papel da conferência de Berlim

A ocupação cientifica que foi desencadeada logo após a
conferência



Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.A metrópole sempre fez investigação no território ultramarino?
2.Em que se baseava essas investigações?
3.Qual era a lógica das investigações da metrópole aos territórios
ultramarinos?

Respostas
1.Sim
2. As missões de investigação da metrópole aos territórios
ultramarinos estavam norteados por uma finalidade e estratégia
política.
3.A lógica de investigação era conhecer para possuir e dominar.

88
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A Conferência de Berlim (1885) vem impor um novo paradigma de
afirmação dos títulos de posse desses espaços ultramarinos
2.Importa observar a fórmula: conhecer para possuir e dominar, o que
só é alcançado pela plena e empenhada Ocupação Científica dos
territórios de além-mar
3.O conhecimento colonial era produzido para melhor poder orientar e
explorar os diversos recursos existentes e poder afirmar-se
politicamente no plano nacional e internacional

Grupo 3( exercícios de gabarito)


1.O que é a multiplicidade cultural?
2.Como surge a multiplicidade cultural na metade Oriental da África
Austral
3.Como se caracteriza a multiplicidade no contexto moçambicano

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 6.2.O processo de construção do império colonial e a pluralidade cultural

Introdução

Nesta unidade temática, pretende-se aflorar com mais profundidade o


processo de construção do império colonial e pluralidade cultural. Daí
que ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

Objectivos
 ▪ 
Descrever o processo de construção do império colonial
específicos
▪ 
Identificar as características da pluralidade cultural

Desenvolvimento
Para Costa (2013) a dominação e um vector do imperialismo ocidental.
Conhecer para poder intervir, vigiar para disciplinar e regulamentar o
Outro. Os interesses, as motivações e as produções da ciência
reconfiguram-se no tempo. Ainda de acordo com Costa (2013) as
Missões de estudo científico no espaço colonial estão embutidas de
uma função ideológica, exterior à própria ciência embora tenham sido
criadas dentro de uma perspectiva e lógica científicas, como
instrumento de excelência para a abertura e conhecimento de África.
A partir das ciências da metrópole mobilizam-se conhecimentos que
fundam novas subespecialidades (história e geografia coloniais, direito
e economia coloniais, psicologia indígena, medicina colonial…),
conduzindo à criação de novas instituições de ensino e de investigação
coloniais. Para tornar eficiente a ocupação científica do espaço colonial,
de acordo com Conceição (2006) e Costa (2013) criam-se na metrópole
instituições de ensino que visam difundir as ciências coloniais e formar
agentes coloniais dotando-os de um saber localizado.
Para Costa (2013) a institucionalização dos saberes coloniais permite
analisar conjuntamente dois processos fundamentais: a
profissionalização dos agentes da colonização e o movimento da
construção disciplinar. A maioria dos saberes coloniais são produzidos,
ou pelo menos “traduzidos” dentro do quadro do ensino superior da
metrópole. Daí que o ensino superior colonial de acordo com Geffray
(1991) constitui um espaço de encontro e de troca entre universitários
e administradores, entre políticos e homens de propaganda política.
Neste sentido, a ciência afigura-se como um elemento orgânico para a
colonização, assumindo-se aquela, como uma “missão civilizadora”

90
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

(COSTA, 2013).
A par de objectivos económicos, a “missão civilizadora” (tendo a ciência
como essência) torna-se, não apenas como um potente argumento para
a ideologia da colonização e imperialismo, mas também como uma
forma radicalmente nova de olhar o mundo e de (re)organizar a
sociedade. Costa (2013) afirma que o facto de se identificar a ciência
com o progresso, permite o estabelecer e o partilhar duma rede social,
dos valores coloniais pela comunidade de cientistas. A ciência, como
“missão civilizadora” mobiliza o altruísmo individual e colectivo como
base moral da colonização, tornando-se esta perspectiva mais
acentuada especialmente após a I Guerra Mundial.
A ciência é por natureza, altruísta, diz Costa (2013) tornando-se a
colonização um imperativo moral das nações civilizadas, para benefício
dos povos “atrasados” das colónias (a ciência traria as virtudes do
progresso aos povos colonizados) e como importante instrumento para
explorar os recursos naturais que os indígenas não eram capazes de
explorar. A ciência surge como veículo de civilização e progresso.
Contudo, muitos cientistas como diz Geffray (1991), Conceição (2006) e
Costa (2013) não se cingem simplesmente aos ditames e propósitos das
autoridades coloniais, mas desenvolvem também a sua própria
estratégia orientada pelos imperativos e restrições científicas e
institucionais.
Para Costa (2013) temos que a política colonial seguida na I República,
tendente para a descentralização administrativa, para a autonomia
financeira e aposta na economia das colónias é em grande medida
herdada da Monarquia. Assim, a ciência emerge como um precioso
instrumento para melhor conhecer, para melhor possuir, para melhor
explorar. Este perfil da ciência, enquanto instrumento económico e de
administração, transparece na análise das teses apresentadas no II
Congresso Colonial (DEMARTIS, 2002). O interesse científico pelas
colónias renova-se e intensifica-se ao longo do tempo, desenvolvendo-
se diversos estudos nas mais diversas áreas do saber: Destas
transcrições, ressalta a questão da nacionalidade da ciência, deixando
transparecer o entendimento que as missões científicas estrangeiras
nos territórios portugueses eram vanguardas de penetração política.
Importava conhecer o império pela mão dos cientistas portugueses e
dá-lo a conhecer aos outros.

Sumário

Nesta unidade temática 6.2 debruçou-se sobre o processo de


construção do império colonial e a pluralidade colonial para
permitir fazer inferências sobe a história da ocupação colonial,
baseada na análise de :
▪ 
Factos históricos observados

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

▪ 
Análise antropológica dos factos observados

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual era a tendência da política na I República
2.O que caracteriza a economia das colónias?

Respostas
1.Era tendente para a descentralização administrativa, para
autonomia financeira
2. A aposta na economia das colónias é em grande medida herdada da
Monarquia

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A ciência é por natureza, altruísta
2. A ciência, como “missão civilizadora” mobiliza o altruísmo individual
e colectivo como base moral da colonização

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Como emerge o instrumento para melhor conhecer, para melhor
possuir, para melhor explorar?
2.Quais são as teses apresentadas no II Congresso Colonial?
3.Porque importava conhecer o império pela mão dos cientistas
portugueses e dá-lo a conhecer aos outros?

92
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 6.3.A antropologia na África colonial e pós-colonial

Introdução

A unidade temática se propõe a fazer uma abordagem mais holística


sobre a perspectiva antropológica na África colonial e pós-colonial. Por
isso mesmo que ao completar esta unidade, o estudante deverá ser
capaz de:

Objectivos ▪ 
Conhecer a perspectiva antropológica na África
específicos

Descreveras características entre a antropologia na África colonial

e pós-colonial
▪ 
Identificar as diferenças entre elas

Desenvolvimento
Geffray (1991) avança que o contacto com novos espaços e novas
gentes conduz inevitavelmente a uma re-configuração efectiva (e
afectiva) da conquista, da posse, do querer colonizar. Os
conhecimentos produzidos sobre a natureza dos novos espaços, sobre
os nos povos, numa linha naturalista (por tradição masculina,
eurocêntrica), permitem estabelecer a posse intelectual e abstracta de
um saber e da natureza, com traços sugestivos da idealização do
viajante/ colonizador expressando o seu desejo de posse. Para
Conceição (2006) o marco divisório através do qual o europeu julga e
classifica a sociedade nativa é a escravatura. Esta estabelece a divisão
básica entre o Eu e o Outro, sendo o Outro percebido como brutal e
inferior.
Nesta lógica, com as ciências coloniais emerge uma nova cultura. A
colonização enquanto fenómeno cultural, faz a destrinça entre o
colonizador com conhecimento e o colonizado ignorante. A ciência nas
colónias é antes de mais, um instrumento de controlo (COSTA, 2013).

A antropologia na África pós-colonial


Os caminhos começaram se abrir a partir do momento que o
nacionalismo criou os movimentos de revolução que conduziram os
países africanos a independência dos seus países. Essa era a porta que
precisava para que o processo de autoconhecimento fosse exposto em
documentos e em ambientes adequados para sua estruturação
cientifica.

93
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Os estudos sobre o colonialismo e o pós-colonialismo actuais de acordo


com Costa (2013) prendem-se, em parte, comum a necessidade mais ou
menos recente de pôr em causa a produção antropológica sobre povos
e culturas não ocidentais, que não levem em contacto debate sobre o
pós-colonialismo. Porque o tempo pós-colonial deu lugar a uma série
de redefinições dos espaços ex-coloniais, da relação entre globalização
e localização. A globalização sua utilização vai no sentido de percebê-la
como uma rápida celebração dos acontecimentos no mundo
contemporâneo. Em contrapartida, a localização fornece-nos a via para
pensar a resposta à própria globalização.
A relação entre globalização e localização leva-nos, necessariamente, à
reflexão sobre outro binómio conceptual como o de poder e resistência,
particularmente importante para entender como do colonialismo pode
nascer o nacionalismo.
Para Geffray (1991) conquistada a independência, os novos cidadãos
reclamam o fim da ideologia europeia, que “instruíram” os não-
europeus, visto que as elites nacionalistas ficaram com os lugares do
poder outrora ocupados pelo poder colonial. Então, tal como o
colonialismo tinha sido um sistema, também a resistência começou a
ser sistemática. Conceição (2006) e Costa (2013) à luz dos estudos pós-
coloniais, o conceito de resistência ganhou novo fôlego. Já não se pensa
apenas nos processos de resistência visíveis, com vista à obtenção de
frutos imediatos; tende-se antes a privilegiar processos mais ou menos
informais de resistência.

Sumário

Na unidade temática 6.3 foi abordada as questões relacionadas com a


antropologia na África colonial e pós colonial como forma de Ajudar a
localizar:

 Os acontecimentos no tempo e no espaço

E consolidação do conhecimento de antropologia em África
.

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1( com respostas)


1.Que lição aprendemos da relação entre a globalização e a
localização?
2. Porque é importante poder e resistência?

Respostas

94
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

1. Leva-nos, necessariamente, à reflexão sobre outro binómio


conceptual como o de poder e resistência
2. Particularmente importante para entender como do colonialismo
pode nascer o nacionalismo.

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.O tempo pós-colonial deu lugar a uma série de redefinições dos
espaços ex-coloniais, da relação entre globalização e localização.
2. A localização fornece-nos a via para pensar a resposta à própria
globalização

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Qual é a relação entre globalização e localização?
2. Comente a afirmação segundo a qual para colonizar importa
conhecer o espaço e realidade do “Outro”
3. Quais são as semelhanças e diferenças da antropologia na África
colonial e pós-colonial?

95
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 6.4.A antropologia em Moçambique colonial e pós colonial

Introdução

Como é sempre o perfil dos textos apresentados na sequência de tema


e unidades temáticas, é de tal forma que um assunto leva em outro
assunto. Uma vez discutida a antropologia na África colonial e pós
colonial duma forma geral, agora é a vez de fazer a mesma abordagem
para Moçambique. Ao completar esta unidade, o estudante deverá ser
capaz de:

 ▪ 
Caracterizar a antropologia no Moçambique colonial
▪ 
Caracterizar a antropologia no Moçambique pós colonial

Objectivos
específicos

Desenvolvimento
Cabral (2005) afirma que os dois períodos colonial e pós-colonial, as
linhas políticas preferenciais ditaram o percurso e desenvolvimento do
conhecimento antropológico em Moçambique colonial e pós colonial.
Somente na actualidade, existe uma fraca tendência de se abrir e se
apropriar do conhecimento endógeno, procurando lavar a embalagem
política que sempre definiu o percurso das manifestações sociais.

A antropologia no Moçambique colonial


Para Osório e Macuacua (2013) nesse período, a antropologia
portuguesa ganhou maior impulso do Estado. Ela apresentava-se, no
conjunto da acção colonial, como «ciência global» do homem africano.
Encarregou-se da universalização da ideologia colonial no espaço
português, apresentando, as suas ideias como as mais racionais e
universalmente válidas e, portanto, como de interesse comunitário de
todos os membros da sociedade.
Nesta dimensão para Costa (2013) também «fornecia aos missionários
uma vasta panóplia de preconceitos racistas e etnocentristas e às
diversas organizações coloniais do governo uma argumentação e
conhecimentos que lhe facilitavam a sua acção destruidora das
estruturas sociais e económicas indígenas», prestando relevantes
serviços ao Estado Novo.

96
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Para responder melhor aos objectivos da colonização e sob o impulso do


próprio Estado Novo, Geffray (1991) foram sendo criadas instituições
especializadas. Orientado pelos mesmos objectivos, destacava-se o
«Acordo Missionário», de 7 de Maio de 1940, assinado entre a Santa Fé e
a República Portuguesa, no qual as missões eram consideradas
«corporações missionárias» ou «religiosas».
Esta filosofia etnológica fundamentava e alimentava ideologicamente
todo o discurso político e religioso, tranquilizava as consciências da
dominação e exploração económicas e, sobretudo, «ocultava» - usando a
expressão de Mário Moutinho - o carácter etnocida da política colonial
(CABRAL, 2005).
Por vezes, diz Conceição (2006) o sistema de ensino colonial foi sofrendo
reformas, mas adequadas às circunstâncias histórico-económicas e à
conjuntura política internacional. E Redondo (1994) a formação do
indígena e a criação da figura jurídico-política de «assimilado» impunham-
se como necessidade de força de trabalho qualificada para a maior
exploração capitalista.
Para Redondo (1994) e Cabral (2005) o sistema de educação colonial
organizou-se em dois subsistemas de ensino distintos: um «oficial»,
destinado aos filhos dos colonos ou assimilados, e outro «indígena»,
engenhosamente articulado à estrutura do sistema de dominação em
todos os seus aspectos.
Para Lopes (2011), consolidando a ideia de Redondo (1994) a antropologia
foi, pelo menos até às independências dos povos africanos colonizados,
um «discurso do Ocidente (e somente do Ocidente) sobre o outro». A
ciência antropológica permitia ao pesquisador conhecer o universo
cultural dos povos colonizados, para apenas recolher dados que
facilitassem a penetração e exploração coloniais. Reconhecendo embora
a outra cultura, esta continuou a ser pensada e avaliada a partir da cultura
europeia.
A negação da cultura ao colonizado constituía uma justificativa ideológica
para a acção civilizadora junto dos «indígenas», mantendo-os submissos
à exploração da sua força de trabalho barata (CABRAL, 2005).

A antropologia no Moçambique pós-colonial


Nguenha (1998) a Independência, portanto, foi vivida universalmente com um
enorme sentimento de esperança e o país estava inicialmente em paz. Aliás,
durante as duas décadas precedentes à Independência, Moçambique tinha
experimentado um processo acelerado de crescimento económico e
modernização. Infelizmente, diz Geffray (1991) coadjuvado com Cabral (2005)
que por um lado, os jovens líderes do movimento militar não estavam
preparados para tomar em mãos um Estado moderno e, por outro, o êxodo
da população branca e mulata durante o período de transição, que ninguém
soube ou quis impedir, retirou os principais recursos humanos ao país.
Dado que o mundo colonial Cabral (2005) diz que foi pensado como um
mundo dividido em dois, que funcionava segundo uma dialéctica de
exclusão recíproca das identidades nele simetricamente colocadas,
97
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

o mundo pós-colonial define-se pelo desaparecimento dessa dialéctica.


Ele não está mais dividido em dois, mas mostra-se, antes, em termos de
diferenças, de misturas, de hibridismo e de ambivalência.
Para Costa (2013), Cabral (2005) e Conceição (2006) no actual contexto o
“atrelamento” à ocidentalização fez emergir o conceito de “pós-
colonialidade” que, em alguma medida, procura mostrar como é ínfima a
margem de manobra dos povos saídos recentemente do quadro colonial,
como é o caso de Moçambique, em direcção a uma modernidade mais
assente em seus substratos culturais.
Cabral (2005) diz que a fase de “pós-colonialidade” emerge com novos
problemas mais ou menos insolúveis com os quais se choca um
anticolonialismo desprovido de suas ilusões – mas que parece ser a única
via possível - que é tomada como constitutiva de um momento particular
da história social e intelectual (GEFFRAY, 1991). A expressão parece ser a
que dá melhor conta da problemática do mundo em desenvolvimento, na
medida em que a característica principal do período actual é o fracasso de
todas as “hipóteses felizes”, quer elas venham do interior ou do exterior,
e o desaparecimento de qualquer outra solução que não seja o
ocidentalismo.
Ainda de acordo com Geffray (1991) com efeito, chegou-se a pensar que
a independência política, possibilitaria o controlo das rédeas económicas,
o que não ocorreu. Foi mais fácil realizar a independência política que a
independência económica. Por definição, é sabido que, a economia de
uma sociedade colonizada é essencialmente dependente de economias
mais avançadas.

Sumário

Nesta unidade temática 6.4 debruçou-se sobre a antropologia em


Moçambique colonial e pós colonial, dois momentos e dois factos que
poderão auxiliar na:
 ▪ 
Interpretação dos factos observados em Moçambique
▪ 
E no estabelecimento de paralelismo com fora de Moçambique

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que permitia a ciência Antropologia no Moçambique colonial?

2.Como estava organizado o sistema de educação no Moçambique


colonial?

Respostas
1.A ciência antropológica permitia ao pesquisador conhecer o
universo cultural dos povos colonizados
2. O sistema de educação colonial organizou-se em dois subsistemas de
ensino distintos: um «oficial», destinado aos filhos dos colonos ou
assimilados, e outro «indígena».
98
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.O mundo pós-colonial define-se pelo desaparecimento dessa
dialéctica
2.Durante as duas décadas precedentes à Independência, Moçambique
tinha experimentado um processo acelerado de crescimento
económico e modernização
3. A negação da cultura ao colonizado constituía uma justificativa
ideológica para a acção civilizadora

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Estabeleça as diferenças entre a antropologia no Moçambique
colonial e pós colonial
2. Estabeleça as diferenças do sistema de educação entre o sistema de
educação colonial e pós colonial
3.O que preconizava o “Acordo Missionário” de 7 de Maio de 1940?

99
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 6.5. Dinâmica aculturacional e permanência de modelos societais endógenos

Introdução

Esta unidade temática propõe estudar as dinâmicas aculturacionais e a


permanência de modelos societais endógenos. A ideia ’e perceber
como são dadas as dinâmicas sociais em contextos de modelos
endógenos. Por isso que ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:

 ▪ 
Perceber a mudança de paradigmas culturais

Interpretar as tendências aculturacionais na sociedade onde vive

Objectivos
Específicos Desenvolvimento
Conforme estudado no capítulo anterior, em todas as sociedades humana
percebemos a existência de diversos hábitos, costumes, linguagem,
estilos de vida. Essa multiplicidade de formas de ver, sentir e se inserir no
mundo denomina-se diversidade cultural.
Como consequência das grandes transformações verificadas com a
expansão do processo de globalização nas últimas décadas, o mundo
tornou-se, cada vez mais, marcado pela diversidade cultural e a
convivência de diferentes formas de agir, de padrões culturais, de estilos
de vida.
Esse processo, de acordo com Costa (2013) definido por Anthony Giddens
com a intensificação de relações sociais mundiais que unem localidades
distantes de tal modo que os acontecimentos locais são condicionados
por eventos que acontecem a muitas milhas de distância e vice-versa,
colocou em contacto, principalmente através das tecnologias de mídia,
povos e culturas distintas.
Conceição (2006) diz que contudo, devemos notar que esse processo foi
liderado pelos Estados Unidos da América, que impôs seu modelo de vida
como o padrão a ser seguido pelos outros países, provocando
movimentos contestatórios a esse domínio, denominados movimentos
antiglobalização. Demartis (2002) afirma que esses movimentos que
buscam não apenas combaterem o domínio económico e cultural norte-
americano, mas também propor novas formas de organização do mundo,
com base na valorização das diferenças étnicas e culturais entre os povos
do planeta.

100
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Multiculturalismo
Segundo Wiviorka (1999) é no quadro acima descrito que se impõe a ideia
de multiculturalismo, que preconiza a interacção entre as diferentes
culturas, sem hierarquização de saberes e modos de vida. Desta forma, o
multiculturalismo pressupõe uma visão positiva da diversidade cultural,
privilegiando o reconhecimento, valorização e incorporação de
identidades múltiplas nas formulações de políticas públicas e nas práticas
quotidianas.
A despeito dos desafios impostos pelo mundo globalizado, é preciso que
reconheçamos a necessidade do convívio em uma sociedade cuja
realidade é multicultural. Para tanto, devemos, mais do que respeitar,
valorizar as diferenças próprias de cada indivíduo. Para Wiviorka (1999).
"O movimento antiglobalização apresenta-se, na virada deste novo
milénio, como uma das principais novidades na arena política e no cenário
da sociedade civil, dada a sua forma de articulação/actuação em redes
com extensão global. Ele tem elaborado uma nova gramática no
repertório das demandas e dos conflitos sociais, trazendo novamente as
lutas sociais para o palco da cena pública, e a política para a dimensão,
tanto na forma de operar, nas ruas, como no conteúdo do debate que
trouxe à tona: o modo de vida capitalista ocidental moderno e seus efeitos
destrutivos sobre a natureza (humana, animal e vegetal)"
Costa (2013) diz que "É fato social toda maneira de agir, fixa ou não,
susceptível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou então
ainda, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando
uma existência própria, independente das manifestações individuais que
possa ter."
A segunda teoria é a idealista, que se subdivide em três, sendo elas:
- Sistema cognitivo: Desenvolvido por W. Googdenough, que acreditava
que cultura era um sistema de conhecimento. Keesing comenta que se
cultura for assim concebida fica no mesmo patamar da linguagem. O
sistema cognitivo aprimora os métodos linguísticos.
- Sistemas estruturais: Desenvolvido por Claude Lévi-Strauss, a cultura é
um sistema simbólico, ou seja, uma criação cumulativa da mente humana.
Ele tenta descobrir na estruturação dos domínios culturais como: mito,
arte, linguagem, etc. os paralelismos culturais são por ele explicados pelo
fato de que o homem está submetido as regras.

- Sistemas simbólicos: Desenvolvida nos Estados Unidos principalmente


por dois antropólogos: Clifford Geertz e David Schneider. Geertz define
homem baseado na definição de cultura, ou seja, para ele a cultura dever
ser considerada um conjunto de mecanismos de controle, planejar,
regras, receitas, etc., para se poder governar. Ele afirma que "um dos mais
significativos fatos sobre nós pode ser finalmente a constatação de que
todos nós nascemos com um equipamento para viver mil vidas, mas
terminamos no fim tendo vivido uma só!", ou seja, podemos nos adaptar
a qualquer ambiente, basta procurarmos respeitar as regras de
convivência desse lugar. Estudar cultura é em síntese estudar um sistema
de símbolos.
101
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

O conceito de cultura é essencialmente semiótico, que vem de encontro


com o pensamento de Max Weber "que o homem é um animal amarrado
a teias de significados que ele mesmo teceu". Geertz (2007) concebe a
cultura como uma "teia de significados" que o homem tece ao seu redor
e que o amarra. Busca-se apreender os seus significados (sua densidade
simbólica).
Para Costa(2013) apontando Schneider cultura também é um sistema de
símbolos e significados, porém a cultura não depende da observação, mas
do status epistemológico das unidades, mesmos fantasmas e pessoas
mortas podem influenciar na cultura. Ex: nós brasileiros todo dia dois de
novembro vamos ao cemitério para “celebrar” o ‘Dia de finados’, já os
americanos celebram o ‘Dia de todos os santos’, ou como é mais
conhecido ‘Halloween’.
Anomia
Caracteriza-se pela ausência ou desintegração das normas sociais. O estado de
anomia gera conflitos e desordens. Seu aparecimento ocorreria quando diversas
funções sociais se tornassem muito ténues ou intermitentes.

Para Conceição (2006) como as sociedades mais complexas são baseadas


na diferenciação, é necessário que as tarefas individuais correspondam a
seus desejos e aptidões; como isso nem sempre acontece, os valores ficam
enfraquecidos e a sociedade é ameaçada pela desintegração resultante
da divisão social do trabalho, é solucionada com formas cooperativistas
de produção económicas, com grupos profissionais, associações de
grupos que socializam o individuo e despertam valores comunitários e
disciplina moral)
As forças litigantes se desenvolvem sem limites e acabam se chocando
umas contra as outras para se recalcarem e se reduzirem mutuamente.
As paixões humanas só cessam diante de uma potência moral que
respeitem (COSTA, 2013). Não são sancionadas senão pela opinião, não
pela lei, e sabe-se quanto a opinião se mostra indulgente com a maneira
pela qual essas vagas obrigações são realizadas. Os actos mais censuráveis
são frequentemente absolvidos pelo sucesso, que o limite entre o que é
proibido e o que é permitido, o que é justo e o que não é, não tem mais
nada fixo.

Sumário

Nesta unidade temática 6.5. debruçou-se sobre as questões


relacionadas com Dinâmica aculturacional e permanência de modelos
societais endógenos para;

 
Obtenção do conhecimento mais amplo sobre o ser humanos e seus
sistemas sociais
▪ 
Aplicação na vida real



102
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique



Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Como são tratados os actos mais censuráveis?
2. O que é Anomia?
3.O que é um fato social?

Respostas
1. São frequentemente absolvidos pelo sucesso
2.Caracteriza-se pela ausência ou desintegração das normas sociais

3. É fato social toda maneira de agir, fixa ou não, susceptível de exercer


sobre o indivíduo uma coerção exterior
Grupo 2( respostas detalhadas)
1.Cultura também é um sistema de símbolos e significados,
2.A cultura não depende da observação, mas do status epistemológico
das unidades, mesmos fantasmas e pessoas mortas podem influenciar na
cultura
3. O movimento antiglobalização apresenta-se, na virada deste novo
milénio, como uma das principais novidades na arena política e no cenário
da sociedade civil, dada a sua forma de articulação/actuação em redes
com extensão global

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Debruce-se sobre o limite entre o que é proibido e o que é permitido?
2. Debruce-se também sobre o limite entre o que e justo e o que não
é?
3. O que são sistemas simbólicos?
4. O que são sistemas cognitivos?

103
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

TEMA 7:CULTURA E EDUCAÇÃO EM MOÇAMBIQUE

UNIDADE 7.1. Saberes e Contextos contemporâneos de Aprendizagem


em Moçambique
UNIDADE 7.2. O paradigma da diversidade cultural em Moçambique
UNIDADE 7.3. Os discursos da identidade nacional moçambicana: da
ideologia á prática
UNIDADE 7.4. A construção do outro e a etnicização/tribalização em
Moçambique

UNIDADE7.1.Saberes e Contextos contemporâneos de Aprendizagem em Moçambique

Introdução

Nesta unidade temática vai debruçar sobre aspectos relacionados


com saberes e contextos contemporâneos de aprendizagem em
Moçambique. Trata-se de um assunto de interesse particular por
constituir uma via para autoconhecimento nacionalista. Daí que ao
completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

 ▪ 
Identificar saberes contemporâneos de aprendizagem

Fazer análise crítica da construção da identidade

Objectivos
específicos

Desenvolvimento
Nos últimos anos tem-se constatado em Moçambique a existência de
um desfasamento entre o sector produtivo e o sector educativo que se
traduz na falta de enquadramento de muitos graduados no mercado de
emprego. Daí a necessidade de reformas generalizadas do ensino
técnico, disciplinas profissionalizantes, educação bilingue, educação
inclusiva, Alfabetização e Educação de Adultos, etc.

Verifica-se igualmente em Moçambique que o saber fazer não é


devidamente enquadrada nos mais variados contextos do país devido
ao não reconhecimento das aprendizagens adquiridas. Além disso, no
subsistema de educação técnico-profissional vigente no país os
certificados atribuídos aos graduados não indicam exactamente as
competências (saber fazer) destes novos profissionais. São estes
ingredientes que se afiguram necessários na configuração do Quadro
Nacional de Qualificações. Aliás, a reforma da educação profissional

104
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

encetada em 2006 prevê a participação activa dos empregadores na


formulação dos curricula através da indicação exacta do que os
candidatos devem saber fazer, ou seja, como devem estar qualificados,
no final da sua formação. Grosso modo, embora o processo de reforma
enfatize o ensino técnico-profissional o mesmo pode ser enquadrado
nas mudanças globais vigentes com vista a elevar a qualidade de ensino
em todos os subsistemas começando pelo nível primário até ao nível
superior.

No ensino primário, por exemplo, a introdução da provinha pode


entender-se como um elemento crucial no reconhecimento das
qualificações em termos de conhecimentos, habilidades e
competências adquiridas. Apesar de todo este esforço, o
reconhecimento das aprendizagens adquiridas na educação informal e
não formal ainda não iniciado. No âmbito do Plano Estratégico de
Educação 2012-2016, um dos pilares é o reforço da capacidade
institucional que assegure uma gestão eficiente e eficaz da acção
educativa, que passa necessariamente pela concepção de padrões de
qualidade, com o desiderato de preparar os alunos para a vida laboral
através: i) do aumento dos graduados do ensino secundário geral com
competências gerais e profissionalizantes; ii) da expansão de Ensino
Técnico-Profissional, baseado em competências necessárias e
requeridas pelo mercado de trabalho e com enfoque nos sectores
prioritários e indústrias emergentes; e iii) da criação de oportunidades
de formação e capacitação profissionais de curta duração, respondendo
de forma célere e específica às necessidades de mão-de-obra
qualificada.

O que é um processo de RVCC profissional e a quem se destina? O


Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências Profissionais,
nas suas vertentes profissional e ou dual tem em vista a melhoria dos
níveis de certificação dos adultos com 18 ou mais anos de idade que não
possuem certificação na sua área profissional, numa perspectiva de
aprendizagem ao longo da vida. Sempre que o adulto não possua o
correspondente nível de escolaridade, deverá desenvolver um processo
dual (profissional e escolar):

O Reconhecimento, Validação e Certificação de Saberes e de


Competências bem como a educação e formação de adultos
desempenham um papel essencial e específico, dado que, por um lado,
proporcionam, a homens e mulheres, os meios que lhes permitem
responder, de modo construtivo, a um mundo em constante mudança e,
por outro, facultam processos que reconhecem os direitos e as
responsabilidades dos adultos e das comunidades.

A necessidade de construir uma resposta assente em princípios estritos


de rigor técnico, a par da exigência do manuseamento de um processo tão
complexo, como o que estamos em presença, determina o
desenvolvimento de uma intervenção cuidada, e que possibilite aos
105
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

adultos uma visão clara do que se pretende, garantindo que a validação


de competências não seja um processo administrativo e que caia em
facilitismos contraproducentes.

Os Sistemas Educativos e de Formação actuais devem garantir a cada


indivíduo as competências básicas para a sociedade do conhecimento, e
em consequência dos diversos modos de aprender, as pessoas adquirem
competências, que constituem o seu património pessoal.

Actualmente reconhece-se que os indivíduos não devem ser analisados


unicamente sob o ponto de vista das qualificações que possuem. A aprendizagem
formal adquirida pelo indivíduo ao longo do seu percurso educativo,
começa a ser perspectivada como uma parte de um todo, isto é, uma das
partes do todo que constitui a aprendizagem ao longo da vida
concretizada pelo sujeito.

Consequentemente, torna-se necessário identificar e reconhecer estas


competências para que possam ser valoradas, quer do ponto de vista
profissional, quer do ponto de vista pessoal e social.

A grande novidade trazida por este processo prende-se com a valoração


das aprendizagens informais e não formais dos adultos, maiores de 18
anos. Pretende-se demonstrar que embora formalmente os adultos não
possuam certificação escolar, as aprendizagens decorrentes das suas
experiências pessoais, sociais e profissionais permitam que estes
adquiram competências, transferíveis para diferentes situações e
contextos equivalentes a um percurso escolar.

Esta valoração das aprendizagens operacionaliza-se sob a forma de


reconhecimento das competências do indivíduo, tendo como base
metodologias e instrumentos específicos as Histórias de Vida, o Balanço
de Competências, o Referencial de Competências-Chave e a Carteira
Pessoal de Competências, que permitirão, à posteriori uma validação e
certificação formais dessas competências do indivíduo.

Assim, a aprendizagem ao longo da vida não pode ser entendida como


educação de adultos apenas. Cobre o leque de aprendizagens formais,
não formais e informais e tem por objectivos a cidadania activa, o
desenvolvimento individual, a inclusão social e os aspectos ligados com o
emprego. Com este propósito o governo de Moçambique através do
Ministério de Educação cria os Centros de RVCC.

Sumário

Nesta unidade temática 7.1 debruçou-se sobre as questões ligadas com


Saberes e Contextos contemporâneos de Aprendizagem em Moçambique,
como forma de poder auxiliar na:
 ▪ 
Obtenção de conhecimento moçambicano e
▪ 
Criação de plataformas de comparação com outras realidades

106
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Como se operacionaliza a valorização das aprendizagens do indivíduo?
2.O que é RVCC?

Respostas
1.Operacionaliza-se sob a forma de reconhecimento das competências
do indivíduo
2. Reconhecimento, Validação e Certificação de Saberes e de
Competências

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A aprendizagem ao longo da vida não pode ser entendida como
educação de adultos apenas
2.Actualmente reconhece-se que os indivíduos não devem ser analisados
unicamente sob o ponto de vista das qualificações que possuem

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Qual é a grande novidade trazida pelo processo de reformas de ensino
em Moçambique?
2.Qual é a diferença entre a educação formal e não formal?
3. Qual é a diferença entre a educação não formal da educação
informal?

107
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 7.2.O paradigma da diversidade cultural em Moçambique

Introdução

Na presente unidade temática pretende-se debruçar sobre o paradigma


da diversidade cultural em Moçambique, como forma de poder
contribuir no acervo infinito de conhecimentos moçambicanos sobre
esta temática. Sendo assim, ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:

 ▪ 
Definir o que é diversidade cultural
▪ 
Conhecer os diferentes paradigmas para a realidade moçambicana

Objectivos
específicos

Desenvolvimento

Para Medeiros (2006) durante a dominação colonial em Moçambique,


a cultura assumiu a dimensão essencial para permitir a sua
sobrevivência. Mas além de um acto de sobrevivência, foi um fenómeno
de afirmação da dignidade do escravo, do colonizado, cuja história lhe
era negada pelo sistema colonial. Na luta de libertação nacional, nas
zonas libertadas do colonialismo, a partir de um novo tipo de relações
sociais de trabalho, se começaram a construir as bases de
moçambicanidade, dando assim à luta de libertação uma dimensão
cultural.

Ainda de acordo com Medeiros (2006) e coadjuvado com ideia de Lopes


(2011) as zonas libertadas deixavam de ser um espaço restrito a um
grupo, a uma categoria social, a uma comunidade linhageira ou aldeã,
para tornar-se espaço nacional mais aberto, não sem contradições,
caminhando para relações sociais trans-étnicas e intra-raciais. Neste
novo espaço começavam a cruzar-se todos os agrupamentos e camadas
sociais para a construção de uma real identidade cultural. Sob o ponto
108
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

de vista cultural, a luta de libertação tornava as zonas libertadas, ao


mesmo tempo, um espaço de destruição da maneira de viver colonial e
da mentalidade aldeã, em si fechada a afinidades étnicas e regionais, e
espaço de construção de uma nova mentalidade.

Para Cabaço (2007) esse efeito, o Partido afirmava que iria criar as
condições para que se realizassem diversas acções, entre as quais se
podiam salientar as de estudo e preservação de todos os elementos do
património histórico e cultural do povo moçambicano (monumentos,
museus, tradição oral e estudo sociedade tradicional. Afirmou-se ainda
que o Partido atribuía uma grande importância à constante troca de
experiências no domínio da cultura, quer no plano nacional, quer no
internacional.

Osório e Macuacua (2013) afirmam que é fato, é que a problemática da


diversidade cultural em Moçambique continua envolta num manto no
qual se abrigam, e ao mesmo tempo se subestimam, estas duas posições.
A cultura e as identidades individuais ou colectivas continuam a
representar- depois da independência, como no período de ocupação
colonial – o derradeiro refúgio, o locus onde, alimentando-se das
“condições desconstrutivas que ameaçam desintegrá-las”, mulheres e
homens buscam novas formas de harmonia com o espaço e o tempo de
que se vão descobrindo interlocutores, estabelecendo outras redes de
solidariedade, apropriando-se de experiências diferentes, reinventando
tradições, reorganizando, por meios simbólicos, a própria acção.

Quando se presta atenção às origens étnicas, códigos linguísticos, às


referências confessionais, às correntes políticas, aos estilos de vida...uma
rica diversidade cultural se manifesta em Moçambique (MEDEIROS, 2006).
A abertura ao outro, mas também o respeito daquilo que para nós é
diferente são duas atitudes essenciais para viver esta confrontação
cultural. Concordando com a ideia de Medeiros, Lopes (2011) e Osório &
Macuacua (2013) são unânimes ao afirmarem que esta diversidade não
pode, entretanto, ser mosaica, simples justaposição de grupos que
caracterizam comportamentos sociais particulares. Quer rejeitemos ou
aceitemos a diferença, quer pretendamos incorporá-la à cultura
hegemónica, quer defendamos a preservação de seus aspectos originais,
quer procuremos desafiar as relações de poder que a organizam, não
podemos, na verdade, negá-la. Se as fronteiras não são naturais, elas
tornam-se aquilo que os homens fazem delas.

Importa ainda frisar que o multiculturalismo é, antes de tudo, um projecto


político e é o que lhe proporciona a ocupação de um lugar central e
controverso nas “políticas identitárias” e nas “guerras culturais”.

109
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Cabaço 82007) e Junod (1996) possuem afirmações que indicam que o


multiculturalismo, em tanto que movimento geral, espera talvez poder
utilizar a cultura como meio de resistência, numa luta que parte da base
contra as estruturas dominantes em expansão. As concepções de
fronteira cultura/cultura tornam-se então um instrumento de exclusão e
de demonização, um sucedâneo do racismo, ou no melhor dos casos, um
jargão administrativo desajeitado que os aparelhos de Estado utilizam
para definir as populações minoritárias, alvos que devem ser objecto de
medidas especiais. De acordo com Cabaço (2007) mesmo quando, neste
último caso, as intenções são boas, as consequências nem sempre são
plenamente vantajosas para aqueles que são etiquetados como
“diferentes”. Na Europa ocidental, como Stolcke (1993) chamou a
atenção, o discurso cultural vai doravante frequentemente a par com um
“fundamentalismo cultural”, hostil aos
imigrados e tornando natural a xenofobia, considerada como uma
característica humana.

Osório e Macuacua (2013) afirmam que no conjunto das identificações


que constituem o ser social na actualidade, o conflito inevitável entre o
global e o local parece reafirmar a via de identificação nacional baseada
na concepção de que o diferente é igual, embora não idêntico. A
emergência reivindicatória das minorias – sexuais, étnicas, religiosas –
torna visível tal concepção no âmbito do cotidiano, dando ao aludido
plebiscito diário uma complexidade antes insuspeitada. Se a fronteira é o
que diferencia uma nação do que está fora dela – o território do Outro, o
discurso minoritário assinala a existência de fronteiras internas, que
demarcam o espaço heterogéneo da identidade a ser compartilhada.

Medeiros (2006) e Lopes (2011) comungam a ideia de que a identificação


resulta, pois, num movimento dual de estreitamento e
alargamento de fronteiras culturais, tendo em vista os “territórios” a
serem cedidos ou conquistados nos interstícios das diferenças sociais e
das lutas políticas. Nesse sentido, a integração nacional passa a depender
mais da agonística dos valores em jogo na cena social do que das
estratégias postas em funcionamento pelo aparato ideológico do Estado.

Sumário

Nesta unidade temática 7.2. apresentou-se paradigma da diversidade


cultural em Moçambique, como forma de buscar a história e fazer a

110
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

interface com os factos actuais. Neste sentido, a percepção do


percurso histórico permitiu o:

  de conhecimentos sobre os
O processo de organização
diferentes paradigmas e
▪ 
Proporcionou uma análise crítica sobre o mesmo

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual foi o papel da cultura durante a ocupação colonial em
Moçambique?
2. Quais foram as transformações ocorridas em termos de cultura após o
colonialismo?

Respostas

1.Durante a dominação colonial em Moçambique, a cultura assumiu a


dimensão essencial para permitir a sua sobrevivência
2. Novas formas de harmonia com o espaço e o tempo de que se vão
descobrindo interlocutores, estabelecendo outras redes de solidariedade,
apropriando-se de experiências diferentes, reinventando tradições,
reorganizando, por meios simbólicos, a própria acção.

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A emergência reivindicatória das minorias – sexuais, étnicas, religiosas
– torna visível tal concepção no âmbito do cotidiano, dando ao aludido
plebiscito diário uma complexidade antes insuspeitada
2.Se a fronteira é o que diferencia uma nação do que está fora dela – o
território do Outro, o discurso minoritário assinala a existência de
fronteiras internas, que demarcam o espaço heterogéneo da identidade a
ser compartilhada

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que é fundamentalismo cultural?
2. Quais são os elementos do património histórico e cultural do povo
moçambicano?

3. O que são zonas libertadas?

111
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 7.3.Os discursos da identidade nacional moçambicana: da ideologia á prática

Introdução

Nesta unidade temática pretende-se discutir questões ligadas aos


discursos da identidade nacional moçambicana ligando a ideologia á
prática. Este assunto propõe que se apresente os factos de forma clara
academicamente e proporcione a compressão cientifica que se pretende.
Daí que ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

 ▪ 
Conhecer as motivações do discurso nacionalista
▪ 
Fazer enquadramento científico no tempo e espaço

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

Paredes (2014) afirma sobre discursos nacionalistas, há que realçar


elementos como sensos, danças culturais, jogos escolares, -unidade
nacional, figuras “desprezadas” como régulos e agora readmitidos com
nova roupagem ou rótulo para assegurar o alcance e garantia de
manutenção de objectivos igualmente nacionais.

Em seu Discurso na tomada de posse como Presidente da República


Popular de Moçambique, de acordo com Paredes (2014) o Presidente
da FRELIMO Samora Moisés Machel afirmava que a luta de libertação
nacional de Moçambique teria sido contra o carácter imperialista do
colonialismo português. De maneira clara e contundente, afirmava que
“ o racismo, o regionalismo e o tribalismo como inimigos que deveriam
ser combatidos ao mesmo título que o colonialismo”.

Este posicionamento de Samora Machel marca a singularidade das


decisões tomadas em Moçambique no que tange ao relacionamento
entre identidades étnicas pré-coloniais, migrações e valores coloniais e
o projecto de construção da identidade moderna moçambicana.

112
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Vale dizer que, em cada etapa, naturalmente, foram re-significados os


termos nos quais a própria construção identitária foi pensada ou
proposta, independentemente da escala referida: regional, étnica ou
nacional.

O que é natural, visto serem as condições contextuais e o ideário


mobilizado. É muito difícil, a não ser por arroubos românticos e/ou
historicistas, estabelecer indelevelmente um fio condutor único ligando
gerações, ideias, projectos políticos e contextos distintos (PAREDES,
2014)

Sumário

Nesta unidade temática 7.3 apresentou-se as linhas críticas sobre o


discurso da identidade nacional como forma de contribuir no
debate sobre a construção do nacionalismo. Assim o
desenvolvimento permitiu um:
▪ 
Aprofundamento crítico do processo
▪ 
Endossamento sobre a mudança de paradigma

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que foi feito a cada etapa deste processo?
2.Qual foi a escala ou dimensão cultural definida durante o período em
questão?

Respostas
1.Foram re-significados os termos nos quais a própria construção
identitária foi pensada ou proposta.
2.A escala referida: regional, étnica ou nacional

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Samora Moisés Machel afirmava que a luta de libertação nacional de
Moçambique teria sido contra o carácter imperialista do colonialismo
português.
2.Sobre o racismo afirmava de maneira clara e contundente, que “ o
racismo, o regionalismo e o tribalismo como inimigos que deveriam ser
combatidos ao mesmo título que o colonialismo

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Quem foi Samora Machel?
2. Quais papéis foram desempenhados durante o processo de
construção da identidade nacional?
113
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 7.4.A construção do Outro e a

etnicização/tribalização em Moçambique

Introdução

Nesta unidade temática propõe-se a debateras questões ligadas a


construção do Outro e a etnicização/tribalização em Moçambique.
Mais uma vez e a semelhança da unidade anterior, ao completar
esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

▪ Perceber os contornos da construção do Outro


Objectivos ▪ Perceber as questões envolvidas com etnia ou tribo para o caso
específicos
Moçambicano

Desenvolvimento

De acordo cm Toledo (2008) a ideia de região resulta do ato de autoridade


política, consistindo em circunscrever um território, definindo-lhe as
fronteiras. Portanto o espaço resultante não é natural. É resultante de
uma imposição, de uma convenção no âmbito do poder que lhe deu
origem e o confirmou por actos jurídicos.

114
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Assim, o espaço se apresenta como um lugar não natural, produto de uma


construção social a partir de práticas de representação, nem sempre
coerentes, muitas vezes até contraditórias, que se confrontam nas
experiências vivenciadas ao longo do processo histórico. Este modelo do
“regional” acabou gerando preconceitos, transformando-o em unidades
fechadas e isoladas das demais comunidades, circunscritas por fronteiras,
reduzidas a uma unidade simples, apreendida de forma unidimensional,
tendendo para uma homogeneização, segundo os preceitos dos modelos
externos. De acordo com Toledo (2008) a sua representação social era
determinada pela relação tempo-espaço. O tempo percebido como a
expressão de uma divisão mecânica, à semelhança de um universo regido
por leis, orientado de forma linear. Um lugar visto como a
complementaridade da evolução da humanidade, ou como queria os
sociólogos, visto como um espaço social bem delimitado, constituído por
um conjunto de relacionamentos sociais estreitos, marcado pela
influência da família, da comunidade, na dimensão do tempo marcada
pela continuidade de residência num mesmo local / habitat.

A partir deste enfoque, a questão do regional pressupunha uma dada


continuidade cultural, uma identidade social homogénea, integrada e,
portanto, estável. Em outras palavras, uma comunidade distinta, um lugar
social peculiar, onde os relacionamentos e as regras de convivência
fossem simples e directas, capazes de instituir e sedimentar uma união
duradoura e autêntica. A visão era de uma comunidade específica,
integrada, relativamente isolada, baseada em relacionamentos estáveis
que eram alimentados por laços afectivos e emocionais estreitos,
pressupondo uma continuidade temporal.

intuito de manter o poder sobre os colonizados, pois previam que para


manter o controlo tinham que usar a força.

Sumário

Nesta unidade temática 7.4 foi discutido aspectos relacionados com a


construção do Outro e a etnicização/tribalização em Moçambique. Como
a semelhança das outras unidades anteriores, pretendeu-se ajudar na
 ▪ 
Obtenção dos conhecimentos sobre a temática e no
▪ 
Estabelecimento de pontes de análise crítica comparativa

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Como foi orquestrado o espirito discriminatório em África no geral?
2.Como os dominados buscavam ou ascendia a categoria de assimilação?
115
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Respostas
1.O pensamento discriminatório para com os africanos é remetido como
uma raça inferior, incapaz de terem um grau de intelectualidade igual ao
do branco
2. A busca pela assimilação ocorreria por meio da imposição da língua
estrangeira

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A questão da identidade e diversidade cultural voltam a compor um
quadro actual de preocupações, representativo da complexidade dos
resultados das interacções sociais que se operam ao nível da sociedade
actual
2.A questão do regional pressupunha uma dada continuidade cultural,
uma identidade social homogénea, integrada e, portanto, estável

Grupo 3 (exercícios d gabarito)


1.Descreve o processo de construção do Outro

2.O que é etnicização/tribalização?

3. Diga em que circunstâncias o espaço se apresenta como um lugar não


natural?

TEMA 8: PARENTESCO, FAMILIA E CASAMENTO EM MOÇAMBIUE

UNIDADE 8.1. Introdução ao estudo das relações de


parentesco UNIDADE 8.2. Nomenclatura, Simbologia e
Características do parentesco (filiação, aliança e residência)
UNIDADE 8.3. Crítica do parentesco: O caso Macua; Lobolo em
Moçambique: “Um velho idioma para novas vivências conjugais”

UNIDADE 8.1.Introdução ao estudo das relações de parentesco

Introdução

Nets unidade temática vai apresentar em forma de descrição as


relações de parentesco. Pretende-se que com esta unidade se inicie
o processo de convergência epistemológica sobre o parentesco e
com ela as ramificações ou laços constituintes. Daí que ao completar
esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

Definir o parentesco

Conhecer as suas relações no contexto de construção da sociedade

Objectivos Classificar os diferentes graus de parentesco
específicos
Desenvolvimento
116
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

De acordo com Augé (2003) o parentesco é o vínculo por


consanguinidade, adopção, aliança (através do casamento), afinidade
ou qualquer relação estável de afectividade. Trata-se, portanto, de
vínculos podendo ser ou não biológicos e que se organizam de acordo
com linhas que permitem medir/qualificar diversos graus de
parentesco.
Duas pessoas podem estar emparentadas de três formas básicas: por
consanguinidade, por afinidade ou por adopção. O parentesco por
consanguinidade estabelece-se através de um vínculo de sangue,
quando existe pelo menos um ascendente em comum. A proximidade
deste parentesco mede-se de acordo com o número de gerações que
separam ambos os pais (AUGÉ, 2003).

117
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

A linha directa de parentesco consanguíneo pode ser ascendente (cada


uma das pessoas relativamente a quem descendem de forma directa:
bisavô-avô-pai) ou descendente (vincula o antepassado com quem
descendem de forma directa e sucessiva: tetraneto-bisneto-neto).

Augè (2003) também define os tipos de parentesco, sendo que para ela,
existe o parentesco por afinidade e por adopção. Por afinidade é aquele
que tem lugar entre o cônjuge e os parentes consanguíneos do outro
ou entre uma pessoa e os cônjuges dos seus parentes consanguíneos.
O parentesco por adopção ou parentesco civil é aquele que existe entre
o adoptante e o adoptado e entre o adoptado e a família do adoptante.

Outra particularidade apresentada por Augé (2003) e partilhada com


Granjo (2005) a união ou o elo que existe entre as coisas também se
pode considerar parentesco: “O futebol e o rugby têm um certo
parentesco”. Dessa perspectiva, surge como definição do Parentesco:
é a relação que vincula entre si as pessoas que descendem do mesmo
tronco ancestral. Assim sendo, pode caracterizar de várias e muitas
maneiras :

Parentesco biológico ou consanguíneo.

Temos em linha recta e em linha colateral.

Linha recta: é infinito, contado por graus.

1º Grau: pai e filho

2º Grau: avô e neto

3º Grau: bisavô e bisneto

Ascendentes: pais, avós, bisavós

Descendentes: filhos, netos, bisnetos

Linha paterna: parentesco como genitor e com os ascendentes deles,


como avôs e bisavós paternos.

Linha materna: diz respeito aos pais e avós da mãe, como avós e
bisavós maternas.

118
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário

Nesta unidade temática 8.1 falou-se sobre o parentesco, sua


classificação e estruturação familiar. Assim permitiu o:
 ▪ 
Conhecimento sobre o parentesco
▪ 
Aplicação na vida real

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que é parentesco?
2.Como se comporta a linha directa de parentesco consanguíneo?
3.Aponte dois tipos de parentesco que conhece?

Respostas

1.O parentesco é o vínculo por consanguinidade, adopção, aliança


(através do casamento), afinidade ou qualquer relação estável de
afectividade.

2. Pode ser ascendente (cada uma das pessoas relativamente a quem


descendem de forma directa: bisavô-avô-pai) ou descendente (vincula o
antepassado com quem descendem de forma directa e sucessiva:
tetraneto-bisneto-neto).

3. Parentesco por afinidade e por adopção

Grupo 2 (respostas detalhadas)

1.Os vínculos de parentesco que igualmente se estabelecem entre


duas pessoas devido a existência de um ancestral comum

2. O parentesco por consanguinidade estabelece-se através de um


vínculo de sangue, quando existe pelo menos um ascendente em
comum.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)

1.Quais são as diferenças entre os parentescos de afinidade e por


adopção?

2.Comente a afirmação segundo a qual “a união ou o elo que existe


entre as coisas também se pode considerar parentesco”

119
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 8.2.Nomenclatura, Simbologia e Características do parentesco (filiação, aliança e


residência)

Introdução

Nesta unidade temática será apresentada as questões relacionadas


com Nomenclatura, Simbologia e Características do parentesco como
forma de conciliar os conhecimentos adquiridos no âmbito do estudo
sobre o parentesco na unidade temática anterior. Por isso mesmo que
ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:


Conhecer a nomenclatura usada

Saber os símbolos usados

Objectivos Caracterizar as diferentes formas de parentesco no contexto de filiação,

específicos aliança e residência.

Desenvolvimento

Para Augè (2003) e Toledo (2008) começam por reconhecer assinalável


conceito de linhagem para Evans-Pritchard (1978) inserido na obra Os
Nuer. Esta obra clássica da antropologia britânica tem como campo
etnográfico uma região africana mais precisamente O Sudão, país
atravessado pelo Rio Nilo onde as tribos Nuer habitam foi o campo
empírico desta tão bem executada pesquisa. Então, definiu o autor que
um clã é um sistema de linhagens,

e uma linhagem é um segmento genealógico de um clã. Por tanto, uma


linhagem se define como um grupo de agnatos vivos, que descendem do
fundador dessa linhagem determinada.

Ainda de acordo com estes autores, acrescentam que com relação ao


sistema de linhagem, Evans-Pritichard se diferencia do Radicliffe-Brown
(1973), uma vez que o primeiro é mais abstrato, estruturalista. Para Lévi-
Strauss, a proibição do incesto é a regra (condição de possibilidade da
reciprocidade social – a exogamia – isto é, a troca. Para Toledo (2008) a
teoria da aliança é a sincronia enquanto que a descendência representa a
diacronia, ou seja a aliança versus a filiação. E esta envolve a descendência
social (reprodução biológica). Lévi-Strauss ainda mostra que a
conjugalidade na estrutura elementar do parentesco gera a afinidade (o
cunhado). Daí a proibição do incesto que numa linguagem mais coloquial
seria o sistema de troca, exemplificando: o caso de você casar com a
minha irmã e eu casar com a sua.

120
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

O método comparativo como um dos mais completos. Ele exemplifica a


importância de se fazer esse tipo de estudo comparativo falando da
semelhança nas formas de representação de divisões sociais, para as quais
vários povos de lugares distintos do globo usam pássaros. Esses mesmos
pássaros são por vezes usados para explicar o mundo e as relações
existentes. Este mesmo autor, para não perdermos o foco de análise deste
trabalho, volta a questão que mais nos interessa. A relação de parentesco
a qual pretendemos relacionar com a obra da Eunice Durhan (1978) que
trata a família e a reprodução humana.

Para resumir a temática, Radicliffe-Brown (1973) na obra " O irmão da


mãe na África do Sul" conclui-se que o padrão de conduta para com a mãe,
que é revelado na família em razão da natureza do grupo familiar e sua
vida social, é estendido com modificações apropriadas à irmã da mãe e ao
irmão da mãe, portanto ao grupo de parentes maternos, ancestrais do
grupo da mãe.

No tocante ao sistema de parentesco, Levi-Strauss trata do problema da


relação entre os tipos de sistema matrimonial. Começa afirmando que
não há uma seqüência evolutiva ou hierárquica: um sistema com classes
não é superior a um sem classes, e a passagem de um tipo de divisão em
classes para outro não só é logicamente possível, como se trata de um
dado empírico. Toma, então, o caso dos Murimbata como exemplo de
difusão dos sistemas matrimoniais, mostrando que existe um problema
de adaptação entre o "sistema tradicional" e o "sistema tomado
emprestado", e que os nativos, para consertar eventuais distorções, se
valem de artifícios como utilizar o antigo tratamento patrilinear da
filiação dentro de um sistema que é agora matrilinear. Lopes (2011)
avança assim, que Levi-Strauss conclui que os sistemas não devem ser
tratados como objetos isolados...
Por trás dos sistemas concretos... há relações mais simples que permitem
todas as transições e adaptações, quais sejam, as "relações
elementares".Levi-Strauss conclui resumindo "o estado da questão das
relações entre classes matrimoniais e sistemas de parentesco". Esses
últimos teriam papel preponderante na determinação positiva da
prescrição do cônjuge, enquanto as primeiras agiriam no sentido negativo
de dissuadir a violação da exogamia de classe(TOLEDO, 2008).

Em suma, entendeu-se que todo casamento é um encontro dramático


entre a natureza e a cultura, a aliança e o parentesco. Este, portanto, é
uma questão sociológica e não biológica.

121
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário

Nesta unidade temática 8.2 abordou-se a questão relacionada com a


nomenclatura e simbologias envolvidas no parentesco no contexto de
filiação, aliança e residência, o que permitiu de forma sucinta fazer
 ▪ 
Análise criticada constituição do parentesco
▪ 
Autodescobrimento

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Qual método se presume o mais completo?
2.O que gera na estrutura elementar, de acordo com Levi-Strauss?

Respostas
1.O método comparativo como um dos mais completos
2. A conjugalidade na estrutura elementar do parentesco gera a
afinidade (o cunhado)

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Levi-Strauss conclui que os sistemas não devem ser tratados como
objetos isolados

2.Um sistema com classes não é superior a um sem classes, e a passagem


de um tipo de divisão em classes para outro não só é logicamente
possível, como se trata de um dado empírico

Grupo 3 (exercícios de gabarito)

1.Qual é a relação entre aliança versus a filiação?

2. Qual foi a contribuição de Radicliffe-Brown (1973) nos estudos


sobre o parentesco?

3. Diferencie as ideias de Durhan (1978) das do Evan-Pritchard(1978)?

122
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 8.3.Crítica do parentesco: O caso Macua; Lobolo


em Moçambique: “Um velho idioma para novas
vivências conjugais”

Introdução

Nesta unidade temática será debruçado sobre a crítica do parentesco:


O caso Macua; Lobolo em Moçambique, em contexto de novas
vivências conjugais. Por isso ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:
▪ 
 Identificar nas diferentes vivências a caracterização do parentesco
▪ 
Elaborar uma opinião própria sobre os factos observados

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

É este um tema clássico em antropologia, o parentesco é de grande


importância na vida quotidiana. Questões como os divórcios, que nos
parecem tão modernos, são muito antiga noutras culturas (concedido a
petição dos dois), ou também o aborto, que noutras culturas é admitido
como algo normal.

Também o tema das relações sexuais fora do matrimónio, que apenas


são proibidas num 5% das culturas, e noutras é permitido mas com
certas condições. O parentesco é o sentido sociocultural dos laços de
sangue, tem uma base biológica mas precisa de uma interpretação e
reconhecimento social (ex.: o caso dos pais adoptivos).

O parentesco é um tipo de relação social pautada. As funções que


satisfazem o parentesco são: económicas (subsistência e controlo do
sistema de reprodução), psicológicas (seguridade emocional), sociais e
económicas (regulamentar as formas de intercâmbio, organizar os
casamentos), etc.

Sumário

Nesta unidade temática 8.3 falou-se sobre as questões de parentesco,


sob forma expositiva e sucinta sobre o parentesco nas diferentes
123
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

regiões de Moçambique. O estudante após esta pequena apresentação,


possibilitará a:

Obtençãode ferramentas para busca de conhecimento de forma
 orientada

Agregar valor do conteúdo em função da sua capacidade
interpretativa

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O parentesco pode ser considerada como um tipo de relação social
pautada?
2.Quais são as funções que satisfazem o parentesco?

Respostas
1.Sim
2.Económicas, psicológicas, sociais e económicas

Grupo 2 (respostas detalhadas)

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Diferencie a função psicológica da social económica?

2.O que é o divórcio?

124
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

TEMA 9:FAMILIA EM CONTEXTO DE MUDANÇA EM MOÇAMBIQUE

UNIDADE 9.1. Origem e evolução histórica do conceito de família


UNIDADE 9.2. Família como fenómeno cultural
UNIDADE 9.3. Novas abordagens teóricas e metodológicas no estudo
da família
UNIDADE 9.4. Estudo de caso (famílias em contexto de mudança em
Moçambique

UNIDADE 9.1. Origem e evolução histórica do conceito de família

Introdução

Nesta unidade temática, pretende-se falar sobre a origem e evolução


histórica do conceito de família. Como vimos nas unidades anteriores, ao
completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:
▪ 
 Descrever os processos que deram origem ao conceito de família
▪ 
Fazer a ponte de ligação entre o parentesco e família

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

Para Lévi Strauss a família é um grupo social que tem origem no


casamento, é uma união legal com direitos e obrigações económicas,
religiosas, sexuais e de outro tipo. Mas também está associada a
sentimentos como o amor, o afecto, o respeito ou o temor. Afirma que
a família é necessária para a reprodução social de um grupo humano,
pois garante a sobrevivência e a continuidade biológica e social do
próprio grupo.

Neste ponto cabe relembrar o que o antropólogo português João Pina-


Cabral (1989) sublinha para o caso português que o termo “família” é
burguês, mas o conceito de “casa” é rural. A “casa” afirma Pina-Cabral
(1989) são “os que comem juntos”, isto é, é através da comensalidade
que os camponeses, que ele estudou no Minho, reconstroem a
identidade da sua unidade familiar.

A família em questão pode ser considerada como uma unidade que


envolve as economias individuais e que pratica uma economia moral ou
125
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

cultural colectiva com base nas relações de parentesco. É o que Jack


Goody (1986) denomina economia oculta do parentesco.

Mas a unidade familiar não está isenta de tensões, rivalidades internas


e externas, negociações e conflitos. O mesmo matrimónio pode ser
considerado como uma ameaça do património entre os quais vai existir
uma tensão estrutural (O´Neill, 1984). Portanto, as tensões e
articulações entre os condicionamentos sociais e os projectos pessoais

que possam existir são ingredientes da existência humana em sociedade.

A família, diz Robert Rowland (1997) é consequência das relações de


parentesco, é um grupo doméstico co-residente e com limites variáveis
segundo os contextos culturais. Alguns tipos de família são:

1. Família nuclear: grupo de parentes formado pelos pais e os filhos,


que residem juntos, e os filhos tendem a herdar dos pais.

2. Família extensa ou “souche” (alargada).

3. Família de orientação: aquela onde um nasce e aprende a ser


criança.

4. Família de procriação: aquela que formamos no momento do nosso


casamento, quando um se casa e tem filhos.

Neste ponto também devemos pensar a linhagem ou clã, algo mais


permanente que a família nuclear. A pertença ao mesmo é por adscrição
de nascimento. Leva associada uma relação genealógica dos
descendentes de um antepassado comum.

Após a fixação do grupo etno-linguistico bantu na região onde hoje é


Moçambique, desde cerca de 1700 anos, a base fundamental da
economia consistia na agricultura de cereais, principalmente de mapira e
mexoeira. A produção agrícola, que determinava relações de produção
permanentes, era feita pelas mulheres da aldeia, que produziam para a
família alargada (clã). Sendo assim, como produtoras, as mulheres
detinham uma certa autoridade e controle sobre os celeiros, mas não
controlavam bens mais valiosos e duradouros, como o gado, por exemplo.
A caça e a pesca, por sua vez, eram praticadas pelos homens e tinham
como finalidade complementar a dieta alimentar. Não configuravam, no
entanto, relações de produção tão duráveis quanto na agricultura.

126
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumario

Nesta unidade temática 9.1 foi apresentado a origem e evolução


histórica do conceito de família. Assim permitiu estabelecer as pontes
de ligação para um
 ▪ 
Aprofundamento do conceito
▪ 
Estabelecimento de mecanismos para autodescobrimento

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Que tipos de família foram apresentadas?
2. Justifique porque a família é necessária para o ser humano?

Respostas
1.Familia nuclear, família extensa, família de orientação e família de
procriação.
2. Família é necessária para a reprodução social de um grupo humano,
pois garante a sobrevivência e a continuidade biológica e social do
próprio grupo

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A produção agrícola é que determinava relações de produção
permanentes, era feita pelas mulheres da aldeia, que produziam para a
família alargada
2.O matrimónio pode ser considerado como uma ameaça do
património entre os quais vai existir uma tensão estrutural

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Apresente o conceito de família?
2.O que é economia moral?
3.Define economia cultural colectiva?

127
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 9.2. Família como fenómeno cultural

Introdução

Nesta unidade temática pretende-se apresentar e discutir família


como um fenómeno cultural. Assim sendo, ao completar esta
unidade, o estudante deverá ser capaz de:
▪ 
 Compreender a relação família e cultura
▪ 
Diferenciar os laços familiares em função da cultura

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

De acordo com Garcia (2001), em Moçambique assim como noutras

114

128
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

sociedades africanas, a unidade fundamental das sociedades é a família


extensa, que funciona como elemento mítico -espiritual, social e até
juridicamente solidário. Aquelas estruturas possuem um carácter
intensamente comunitário; desempenhando o indivíduo funções com
importância colectiva; o seu interesse é subordinado ao geral. O
comunitarismo faz ainda parte da religião, das formas de vida
económica e da existência de inúmeras sociedades especiais (no espaço
entre família e a tribo). Visto que as famílias moçambicanas são no geral
colectivistas, onde o papel de cada um dos membros está bem definido
e, um possível erro de um dos membros pode ser analisado como sendo
um erro de toda família no geral.

De acordo com Aghassianetall (2003), as famílias podem ser


classificadas em:

Filiação unilinear ou unilateral: quando o parentesco só é transmitido


aos filhos de um casal legítimo por um dos pais, com exclusão do outro.
Quando o pai transmite o parentesco, a filiação é patrilinear; quando é
a mãe que o transmite, a filiação é matrilinear.

A filiação unilateral ou unilinear segundo o autor subdivide-se em:

• Filiação patrilinear ou Agnática

A WILSA Moçambique (1998), sustenta que a patrilinearidade é


frequente no sul e centro de Moçambique.

De acordo com Aghassian, etall (2003), os filhos fazem parte do grupo


de parentesco do pai, o que significa que os pais transmitem o
parentesco.

Nas sociedades patrilineares a linha de perpetuação de grupos de


parentesco passa exclusivamente através dos homens. Tal como se
verifica em nas regiões centro e norte do pais como a WLSA já havia
identificado como sendo regiões que apresentam o sistema Patrilinear
e como e o caso das regiões sul e centro os homens tem tido mais valor
em relação ao homem. a defende que nas sociedades patrilineares a
importância social dos homens é maior do que das mulheres.

A patrilinearidade é mais frequente nas sociedades onde as actividades


económicas masculinas são decisivas e o seu papel social é
sobrevalorizado.

A filiação patrilinear é a forma mais comum da filiação unilinear. Neste sistema


de filiação e organização patrilinear, os membros de um grupo de
parentesco unem-se pela ligação a um antepassado comum masculino
através de uma linha de ascendência - descendência que cruza as
diferentes gerações somente através de parentes masculinos.

129
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Para Pereiro (2012) numa dada geração, os irmãos e irmãs, entre si,
pertencem a patrilinhagem do seu pai e do seu avó paterno, assim como
a dos irmãos e irmãs tanto do pai como do avô paterno. Tantos filhos
como as filhas de um homem traçam a sua ascendência a um
antepassado comum através de uma linha masculina. Nestes grupos a
responsabilidade social em relação as crianças cabe ao pai ou irmão mas
velho e dentro desta linhagem os homens prestam atenção aos
descendentes masculinos.
▪ 
Filiação matrilinear ou uterina

Quando os filhos fazem parte do grupo de parentesco da mãe, o que


significa que só as mães transmitem o parentesco. Matrilinearidade em
Moçambique é mais frequente na região norte do país e uma parte do
centro (Tete).

Nas sociedades matrilineares, o parentesco passa exclusivamente


através da mulher, nesta a matrilinhagem ocorre nas sociedades onde
a horticultura é uma actividade importante, pois aí as mulheres têm o
papel económico mais importante.


A filiação matrilinear é diferente na forma como traça a
matrilinhagem assim como na forma de realizar o poder
autoridades e estruturam a nível da família. Nela as mulheres
têm por vezes bastante poder, mas nunca absoluto sobre o seu
grupo de filiação, pois este é partilhado com os irmãos que tem
maior interesse em exercer o maiorpoder controlo possível
sobre a descendência das suas irmãs.

Na matrilinhagem, os irmãos e irmãs pertencem a linhagem da mãe e


da avó materna, que é também a dos irmãos da mãe e dos filhos da irmã
desta.


Filiação cognática: diferente da filiação unilinear, ou filiação
diferenciada, a filiação cognática é uma filiação indiferenciada,
pois o parentesco é transmitido tanto pelo pai como pela mãe.
A filiação cognática reconhece o parentesco de ambos os lados.
Todos os descendentes têm direitos e obrigações, deveres e
privilégiosidênticos para com os seus parentes paternos e
maternos.

Dupla filiação unilinear: quando duas filiações unilaterais se


justapõem, cada uma regendo, com exclusão da outra, a transmissão
de determinados direitos Por exemplo, entre os Yako da Nigéria, o
grupo paterno, Kepun, está localizado; pais e filhos habitam com as
suas mulheres num mesmo aglomerado, o grupo materno, Lejima,
está disperso: tios e sobrinhos uterinos vivem, cada um, junto do seu

130
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

grupo paterno.

O pai transmite ao filho as suas terras cultiváveis, mas o gado e o


dinheiro vão para o filho da sua irmã: come-se no lado paterno e
herda-se no lado materno

Sumário

Nesta unidade temática 9.1 falou-se de família como um fenómeno


cultural. Isto serviu para:

Aprofundar as questões de família e parentesco e

Contribuiu na consolidação sobre aspectos de cultura

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Onde é frequente a patrilinearidade?
2.Explica como se procede o parentesco nas sociedades matrilineares?

Resposta
1.A patrilinearidade é mais frequente nas sociedades onde as
actividades económicas masculinas são decisivas e o seu papel social é
sobrevalorizado.
2.Nas sociedades matrilineares, o parentesco passa exclusivamente
através da mulher

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Na matrilinhagem, os irmãos e irmãs pertencem a linhagem da mãe e
da avó materna, que é também a dos irmãos da mãe e dos filhos da
irmã desta.
2.A filiação patrilinear é a forma mais comum da filiação unilinear

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Diferencie a filiação cognática da linear?
2. Explique a dupla filiação unilinear

131
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 9.3.Novas abordagens teóricas e


metodológicas no estudo da família

Introdução

Nesta unidade temática serão discutidas as novas abordagens


teóricas e metodológicas no estudo sobre a família. Daí que ao
completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:
▪ 
 Saber as novas abordagens sobre o estudo de família
▪ 
Aplicar na interpretação dos factos observados

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

Para Pereiro (2012) aponta para Joseph Campbell, no seu O Poder do


Mito, nos ensina sobre os arquétipos e mitologias que orientavam as
sociedades antigas. Nas sociedades agrícolas a figura da mulher é de
fundamental importância, pois a personificação da energia que dá
origem às formas e as alimenta é essencialmente feminina. A Deusa
é a figura mítica dominante no mundo agrário dos primitivos sistemas
de cultura do plantio. A mulher dá à luz, assim como da terra se
originam as plantas. A mãe alimenta, como o fazem as plantas. Assim,
a magia da mãe e a magia da terra relacionam-se. São povos,
também, fixos na terra que lhes alimenta. Povos pastores, por outro
lado, estão sempre em movimento, são nómadas e entram em
conflitos com outros povos, conquistando as áreas para onde se
movem.

Na cultura bantu, Pereiro (2012) afirma que à frente de cada linhagem


ou da família alargada (clã) estava um chefe, com poderes políticos e
religiosos, e um conselho de anciãos. Ao norte do rio, no entanto, não
obstante o poder pertencer ao homem, a comunidade aldeã
constituía-se em torno de parentes consanguíneos (antepassado
comum) definidos por via materna. Essa linhagem matrilinear
determinava inclusive a transferência de poder, na medida em que
este passava do tio materno para o sobrinho. Ao sul do Zambeze, por
outro lado, o poder passava do pai para o filho ou do irmão mais velho
para o mais novo.

132
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Povos pastores são sempre conquistadores, assassinos, nômades e


patriarcais. Não possuem a ligação com a terra dos povos agricultores,
pacatos, estáveis e matriarcais. Surge, então, nessas comunidades
patriarcais ao sul do Zambeze, um poder político que se estruturava
diferentemente do poder meramente linhageiro (MEDEIROS, 2006). Era
originado da conquista militar, onde o clã vencedor passava a exercer
uma supremacia política sobre as outras, as quais deveriam pagar um
tributo ao chefe da linhagem vencedora.

Surge, então, uma nova divisão social do trabalho. Os produtores


deveriam produzir um sobre-produto para o pagamento do tributo. A
linhagem do chefe e dos anciãos passa a constituir a aristocracia da
sociedade. Abaixo desta aristocracia estavam os membros das outras
linhagens que habitavam a área dominada. Estrangeiros pagavam
impostos mais altos. A classe dominante começa a possuir escravos
domésticos.

Ainda de acordo com Pereiro (2012) são destes grupos que sairão, logo
depois, as tribos que formaram, pelas sucessivas conquistas dos outros
clãs, os reinos e impérios da região. São estes, principalmente, o povo
Chona, Nguni e Tsonga. Darão origem ao reino do Grande Zimbabwe,
ao império Monomotapa e ao império de Gaza.

Para Cabaço (2007) os pacíficos povos ao norte do rio, por sua vez,
recebe a influência do contacto mercantil com os árabes e aspectos
culturais dessas etnias vão pouco a pouco mudando, com muitos deles
vindo a se estruturarem em xecados e sultanatos. São os povos do norte
também as principais vítimas do tráfico de escravos feito,
posteriormente, pelos portugueses. Um outro conceito associado ao de
família de acordo com Pereiro (2012) é o de “grupo doméstico”, isto é
um grupo de parentes que coabitam e co-residem no mesmo espaço.
Portanto há uma diferença com o conceito de família.

Para Cabaço (2007) património entende-se como um conjunto de


recursos do qual as pessoas podem dispor para enfrentar as suas
necessidades e as de seus familiares. Tais recursos compõem-se de
trabalho, saúde, moradia, habilidades pessoais e de relacionamento,
tais como os de vizinhança, de amizade, familiares, comunitários e
institucionais.

Pereira (2012) diz que estruturar uma intervenção a partir do


património da pessoa, da família e da comunidade significa considerar
as potencialidades e os nexos que estas pessoas e comunidades
estabeleceram na sua história de vida. Compreender o trabalho em
saúde a partir do património, implica uma abertura a uma realidade
133
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

mais ampla, que transcende a dificuldade em si, não se restringindo à


aplicação de soluções previamente concebidas. Tal compreensão
permite o incremento gradativo do património da pessoa em situação
de pobreza. Em outras palavras, a acção nasce do que existe e este é o
princípio que estimula a participação da família nesse processo.

Partir da falta, da doença ou da ausência de condições de vida, implica


ficar, de algum modo, esperando que a solução ocorra no futuro, o que
na maioria das vezes conduz a um imobilismo. Quantas vezes, diante de
uma criança desnutrida, da sua mãe, que parece tão "desinteressada"
da sua situação económica de carência extrema, nos sentimos
impotentes, uma vez que se trata de algo que não pode ser resolvido,
partir do património permite olhar para essa situação buscando
encontrar os recursos que já existem, identificar um caminho e não ficar
parado (PEREIRA, 2012). Essa atitude do profissional de saúde instiga a
mãe a assumir os próprios problemas, tendo em conta o seu património.

Sumário

Nesta unidade temática 9.3 apresentou-se e se discutiu questões


relacionadas com Novas abordagens teóricas e metodológicas no
estudo da família, para

 Compreensão metodológica para análise teórica do estudo
sobre família
▪ 
Apropriação do conhecimento integral

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que é um grupo doméstico?
2. Como era passado o poder de geração em geração no sul do
Zambeze?

Respostas
1.Grupo doméstico”, isto é um grupo de parentes que coabitam e co-
residem no mesmo espaço
2. No sul do Zambeze, por outro lado, o poder passava do pai para o
filho ou do irmão mais velho para o mais novo.

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A Deusa é a figura mítica dominante no mundo agrário dos
primitivos sistemas de cultura do plantio
2. Nas sociedades agrícolas a figura da mulher é de fundamental
importância, pois a personificação da energia que dá origem às
formas e as alimenta é essencialmente feminina

Grupo 3 (exercícios de gabarito)

134
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

1.Explique como uma mãe pode parecer “desinteressada” para a


saúde do seu filho?
2. Diferencie tribo de clã

3.Aponte as similaridades entre o reino e império

UNIDADE 9.4.Estudo de caso (famílias em contexto


de mudança em Moçambique)

Introdução

Nesta unidade temáticas será apresentado um estudo de caso


(famílias em contexto de mudança em Moçambique) de forma
explicativa, isto é aquilo que acontece no caso observado. Portanto
ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:
▪ 
 Agregar seus os conhecimentos sobre um estudo de caso
▪ 
Relativizar os acontecimentos narrados

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

Em Moçambique, nota-se uma diferença no que concerne à


produção. As tribos ao sul do Rio Zambeze centralizaram a sua
produção na agro-pecuária, enquanto os povos do norte do rio eram
essencialmente agricultores. Com a cultura orientada para os animais
e o pastoreio, houve uma alteração na psicologia colectiva das etnias
do sul, o que marca uma diferença ainda hoje notada no país
(MEDEIROS, 2006).

Para Osório e Macuacua (2013) na hora de organizar a descendência


e a herança há dois tipos de sistemas:

1. Com uma linha: linear.

- Matrilinear (uterina): Todos os filhos e filhas pertencem à mesma


linhagem mas são elas quem transmitem a descendência, eles não.
Os filhos delas serão da linhagem mas os deles não. A herança e a
residência é por via feminina.

- Patrilinear (agnática): A descendência transmite-se por via masculina


ainda que todos os filhos pertençam á linhagem. A residência neste caso
é virilocal e neolocal. Este sistema está mais estendido que o
matrilinear, (ex. Império Romano, Muçulmano, e Chino). Um caso
extremo é o caso do sudeste da China, onde a mulher é entendida como
algo de pouca importância para a linhagem; as filhas casam e vão morar
135
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

para casa do homem, não voltando á casa dos pais, só em caso de


falecimento dos seus pais é que volta. Os pais evitam o afecto pelas
filhas quando estas são crianças, pois irremediavelmente separam-se
delas. O significado estrutural delas é a mudança por mulheres de outra
linhagem.

2. Com duas linhas: bilinear, ainda que a autoridade oficial possa ser
só a do homem.

Se queremos estudar os sistemas de descendência, de acordo com


Medeiros (2006) citando Segalen (1999) através dos quais se transmite
a herança, também devemos ter em conta a noção de “ciclo da vida
familiar”, que serve para conceitualizar a evolução da família e as suas
mudanças em tamanho e estrutura, desde a sua constituição até a sua
dissolução.

Para Osório e Macuacua (2013) o mais é importante diferenciar entre


as noções de herança, residência pós-casamento e domínio inter-
géneros. Um exemplo é a usual confusão entre matriarcado, mater-
localidade e mater-linearidade. Para esclarecer isto construímos a

seguinte tabela:

Matriarcado Mater-localidade Mater-Linearidade

Domínio da mulher Também Define a


sobre o homem, algo denominada uxori descendência ou
que existe em muito localidade, para herança por via
poucas sociedades definir que a feminina
resistência pós-
casamento é na casa
ou localidade da
esposa

Osório e Macuacua (2013) hoje, a influência das linhagens matrilineares


e patrilineares se fazem presentes também no direito civil. Nas
províncias acima do rio Zambeze, o sobrenome (apelido, no

português moçambicano) que o filho recebe é o da mãe, enquanto nas


províncias abaixo do rio, as pessoas carregam o sobrenome do pai. Se
uma mulher da região norte casa-se com um homem da região sul, ela
adquire o sobrenome do pai do noivo. O mesmo ocorre com o homem
sulista que se casa com uma mulher do norte: ele recebe o sobrenome
da sogra.

Sumário

136
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Nesta unidade temática 9.4 falou-se do estudo de caso sobre famílias


em contexto de mudança em Moçambique. Isto permitiu a:

Organização dos factos no tempo e no espaço


Consolidação dos conteúdos das unidades temáticas anteriores

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.De quem é o apelido que a criança recebe no norte do Zambeze?
2.De quem é o apelido que a criança recebe no sul do Zambeze?

Respostas
1.Recebe o apelido da mãe
2.recebe o apelido do pai

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Com a cultura orientada para os animais e o pastoreio, houve uma
alteração na psicologia colectiva das etnias do sul
2. Os pais evitam o afecto pelas filhas quando estas são crianças, pois
irremediavelmente separam-se delas.

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que significa domínio inter-géneros?
2.Diferencie a residência neste caso é virilocal e neolocal?
3. O que está envolvido no ciclo de vida familiar?

TEMA 10:O DOMÍNIO SIMBÓLICO

UNIDADE 10.1. O estudo dos rituais em Antropologia- Os ritos de passagem


UNIDADE 10.2. Rituais como mecanismo de reprodução social - Feitiçaria
UNIDADE 10.3. Ciência e Racionalidade-Cultura, tradição e religiosidade no
contexto sociocultural do Modelos religiosos endógenos & modelos religiosos
exógenos
UNIDADE 10.4. A emergência de sincretismos religiosos e de igrejas messiânicas
em Moçambique

UNIDADE 10.1.O estudo dos rituais em Antropologia-


Os ritos de passagem

Introdução

137
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Nesta unidade temática propõe-se a estudar os rituais em


Antropologia- Os ritos de passagem. Ao completar esta unidade, o
estudante deverá ser capaz de:
▪ 
 Definir o rito de passagem
▪ 
Enquadrar o conceito de ritos de passagem em antropologia

Objectivos
Específicos

Desenvolvimento

Para Osório e Macuacua (2013) o Ritual é o conjunto de práticas


consagradas por tradições, costumes ou normas, que devem ser
observadas de forma invariável em determinadas cerimónias. Ritual
é uma cerimónia através da qual se atribuem virtudes ou poderes
inerentes à maneira de agir, aos gestos, às fórmulas e aos símbolos

usados, susceptíveis de produzirem determinados efeitos ou


resultados. Portanto o Ritual é um processo continuado de
actividades organizadas cuja prática está relacionada a ritos, que
envolvem cultos, doutrinas e seitas, encontrados não só na vida
religiosa, mas em todas as esferas culturais.

No sentido figurado ritual é uma rotina, aquilo que habitualmente se


pratica, é uma etiqueta, uma regra, um estilo usado no trato entre as
pessoas. O ritual está associado às práticas religiosas ou místicas,
criadas em torno da ideia de se estabelecer uma "relação entre os
seres humanos e um ou vários seres sobrenaturais"(OSÓRIO e
MACUACUA, 2013).

Segundo Agadjanian (1999) uma série de doutrinas sobre os deveres


e obrigações recíprocas entre a divindade e a humanidade, uma série
de normas e rituais fazem parte das inúmeras religiões com
objectivo de buscar uma interação dinâmica entre os seus seguidores.

Para Langa (1992) a Igreja Cristã possui dois rituais, ou sacramentos,


foram instituídos pelo próprio Jesus: o baptismo e a eucaristia. O
baptismo consiste em borrifar com água benta a cabeça da pessoa que
será iniciada na religião. Esse sacramento lembra o baptismo de Jesus
por João Batista. Em outras tradições, o ritual do baptismo é feito por
imersão total. A eucaristia (ou Sagrada Comunhão) é um dos principais
ritos de devoção, na qual o pão e o vinho são consagrados e oferecidos
aos fiéis, representando o gesto de Jesus na Última Ceia. Outros
rituais, celebrados em períodos de graça ou bênção, incluem a crisma,
o casamento, a ordenação para o sacerdócio, a confissão e a extrema-
unção.

As religiões afro-brasileiras como afirma Langa (1992) confirmada com


138
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Honwana (2002) seguem rituais de várias origens, como o uso de


roupa branca, imagem de santos católicos, pretos velhos, caboclos e
índios. A vela é usada para iluminar os caminhos. Dependendo das
cores, é oferecida aos orixás ou até mesmo a exus. Os defumadores
são usados para purificar o ambiente, o cachimbo é usado pelo preto
velho nas consultas etc.

Douglas (1991) referindo-se aos rituais como momentos de afirmação


identitária em que o racional aparece articulado ao sagrado. Neste
sentido, os ritos de iniciação, desdobrados na separação das famílias,
na circuncisão e na reintegração, constituem uma ruptura simbólica
(uma espécie de renascimento) com as experiências anteriores.
Organizando-se através da acção sobre o corpo (que pode sofrer
inúmeras provações), os ritos determinam um padrão de
comportamento que permite a integração dos jovens na comunidade,
ocupando os lugares e desempenhando os papéis sociais que lhe estão
reservados na hierarquia social.

Para Osório e Macuacua (2013) fica claro que, pesem outras funções
dos ritos, na sua análise tem que se ter em conta, em primeiro lugar, a
sua utilidade social, no sentido em que transgride e restaura a ordem
e, em segundo lugar, que “os ritos são sistemas de sinalização a partir
de códigos definidos do ponto de vista cultural”. Pelos ritos, pelas
mensagens que aí são transmitidas e pelo sentido que lhes é
conferido, pela implicação emotiva que é colocada e pelos processos
de negociação e manipulação aí vivenciados e, ainda, pelos elementos
de adesão (reais ou/e simbólicos) constantemente accionados, os e as
jovens iniciadas/os integram-se pela
125

139
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

diferenciação sexual na ordem social, ou seja, os dispositivos neles


desenvolvidos são marcadores de papéis e funções que exprimem os
valores e comportamentos socialmente expectáveis.

Sumário

Nesta unidade temática 10.1 estudou-se os rituais para permitir que


os membros pertencentes numa determinada família, se possam
identificar em função da sociedade onde residem. Daí que este
estudo:

Aflora nas entre linhas os laços constituintes


A dinâmica de maturação e rompimento com experiências
anteriores

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Para que servem os defumadores?
2.Como é feito o baptismo?

Respostas
1.Os defumadores são usados para purificar o ambiente, o cachimbo é
usado pelo preto velho nas consultas
2. O ritual do baptismo é feito por imersão total na água

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Os ritos de passagem, circuncisão constituem uma ruptura simbólica
(uma espécie de renascimento) com as experiências anteriores
2. Os ritos são sistemas de sinalização a partir de códigos definidos do
ponto de vista cultural

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.O que são orixá?
2.Explica como os ritos determinam os padrões de completamento?
3.Define eucaristia?

UNIDADE 10.2.Rituais como mecanismo de reprodução


social - Feitiçaria

Introdução

Nesta unidade temática serão expostos conteúdos mais aprofundados


sobre Rituais como mecanismo de reprodução social , num contexto de
feitiçaria. Ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz

140
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

de:
▪ 
 Explicar como os rituais são mecanismos de reprodução social
▪ 
Saber interpretar diferentes manifestações culturais, como são os casos

Objectivos de feitiçaria
específicos
Desenvolvimento

De acordo com CF (2008) em tempos marcados por subjetivismos,


relativismos e fundamentalismos nas mais variadas áreas do
conhecimento e nos mais diversos âmbitos da experiência humana,
todas as antropologias orientadas para o transcendente definem o ser
humano e o meio moral em que vive em termos de algum ser ou
“força” para além de si próprio. Esse além pode ser o Deus pessoal dos
judeus, muçulmanos e cristãos, alguma força indefinível, mas real no
universo, como concebem os panteístas e os agnósticos, ou alguma
divindade criada no mundo. Osório e Macuacua (2013)As
antropologias transcendentais incluem as principais religiões tanto do
Ocidente quanto do Oriente, bem como formas modernas de
maniqueísmo, gnosticismo e paganismo, frequentemente latentes na
multiplicidade de formas da espiritualidade do movimento da Nova
Era. Nesses casos, o moralmente certo e o errado derivam da
autoridade de uma fonte que está além, acima e superior ao próprio
ser humano, seja como mandamento direto, seja como inferência de
textos ou de interpretações de mensagens e sinais variados.

Fazendo um questionamento,o CF (2008) coloca que até que ponto


essas visões transcendentais influenciam a bioética contemporânea é
algo difícil de estimar, porque a mentalidade da bioética acadêmica,
ao menos nos Estados Unidos, mostra-se predominantemente secular.
A teologia católica romana representa algo de certa forma excepcional
nesse contexto, porque tem longa história de estudo formal, que
antecede em séculos a bioética contemporânea — iniciando-se no
século XV, já conta meio milênio de história. É também a posição
contrária mais citada em relação às antropologias seculares
antropocêntricas, atualmente dominantes nos ambientes acadêmicos
e científicos.

A teologia católica, na optica de CF (2008) assim como a ortodoxa,


constitui um paradigma para uma ética baseada na ideia do homem
como ser criado por Deus, a quem este deu a vida e uma natureza
única e de quem espera obediência a certas leis específicas. Na visão
católica, a existência humana é

141
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

142
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

interpretada segundo a doutrina da imago dei, ou seja, do ser humano


como imagem e semelhança de Deus (Gn 1,27). A fonte dessa dignidade
é Deus, ela é inerente a todo e qualquer ser humano e não pode ser
tirada, independentemente de sexo, idade, saúde ou doença. A vida
humana é um dom de Deus que deve ser cuidado e respeitado.

Nas antropologias antropocêntricas, diz CF (2008) e ideia partilhada por


Meneses (2000) a dignidade consiste num atributo socialmente
conferido pelos indivíduos a si próprios ou pelos outros. É definida com
base em certos atributos de personalidade que podem ser perdidos
com a doença, a deficiência mental, o estado de consciência e assim por
diante. Um exemplo de dissonância em relação a esse ponto é a
atribuição, por parte dos católicos, de dignidade pessoal para o embrião
desde a concepção e sua negação categórica pelos outros.

Para Meneses (2000) alguns defendem o “respeito” pelo embrião, mas


não como pessoa. Paradoxalmente, sustentam que o embrião pode ser
sacrificado pelo bem dos outros, como no caso de obter células-tronco
para pesquisa com o objetivo de curar determinadas doenças de cunho
genético que infernizam a vida de muita gente.

Sumário

Nesta unidade temática 10.2 aprendemos os Rituais como mecanismo


de reprodução social, incorporando nele a manifestação cultural a

Feitiçaria. Isto permitiu fazer.


 ▪ 
Leitura das diferentes faces do ritual
▪ 
Estabelecer limites epistemológicos sobre manifestações socias

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.Em que consiste a dignidade?
2.O que é a vida humana?

Respostas
1.A dignidade consiste num atributo socialmente conferido pelos
indivíduos a si próprios ou pelos outros
2.A vida humana é um dom de Deus que deve ser cuidado e
respeitado.

143
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.A teologia católica romana representa algo de certa forma
excepcional nesse contexto, porque tem longa história de estudo
formal, que antecede em séculos a bioética contemporânea
2.o moralmente certo e o errado derivam da autoridade de uma fonte
que está além, acima e superior ao próprio ser humano, seja como
mandamento direto, seja como inferência de textos ou de
interpretações de mensagens e sinais variados

Grupo 3 (exercícios de gabarito)


1.Define a teologia?
2.Porque a vida humana precisa ser cuidada e respeitada?
3.Como é que as antropologias orientadas para o transcendente
definem o ser humano?

UNIDADE 10.3. Ciência e Racionalidade- Cultura,


tradição e religiosidade no contexto sociocultural do
Modelos religiosos endógenos & modelos religiosos
exógenos

Introdução

Nesta unidade temática, debruçar-se-á sobre a Ciência e


Racionalidade- Cultura, tradição e religiosidade no contexto
sociocultural do Modelos religiosos endógenos & modelos religiosos
exógenos. Ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz
de:
▪ 
 Caracterizar a ciência e a racionalidade
▪ 
Diferenciar cultura da tradição e religião

Objectivos
específicos
Desenvolvimento

Segundo Agadjanian (1999) "Antigamente, o governante era um


escolhido de Deus porque sua legitimidade era dada pela descendência
divina. As antigas realezas haviam nascido no outro mundo e os reis
eram um dos mediadores mais importantes entre deuses e homens.
Hoje, essa legitimidade é feita pela soma de escolhas individuais dos
cidadãos que votam individualmente e, supomos, autonomamente, e
não em grupo ou família". Para Medeiros (2007) em sociedades
tradicionais ela se estabelece pela pertença a um grupo (geralmente
familiar) e pela posse de uma postura individual que permite evocar
estes valores tradicionais perante os demais. Já a dominação
144
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

carismática tem sua origem no que se convenciona chamar de prestígio,


ou seja, um tipo de valorização simbólica do detentor de alguns tipos
de títulos que legitimam seu destaque. Ex: um sacerdote de um culto
iniciante e seus seguidores.

A Dominação carismática geralmente se associa aos líderes


revolucionários neste sentido. E por último a dominação de natureza
burocrática (ou racional) se apoia na competência técnica com a qual o
indivíduo maneja as estruturas sociais do aparato burocrático, esteja
ele no âmbito social em que estiver (mas geralmente referido à
burocracia do Estado ou a uma grande empresa).

A dominação racional-legal ou burocrática é exercida dentro de um


quadro administrativo composto de regras e leis escritas que devem ser
seguidas por todos, não havendo privilégios pessoais. Ela é apoiada na
crença de uma legitimidade de ordens estatuídas e nos direitos de
mando dos chamados a exercer autoridade legal. Esta é baseada em
relações impessoais e os funcionários são incorporados ao quadro
administrativo, através de um contrato, não por suas características
pessoais mas por sua competência técnica.

Como diz Gusmão (2008) eles são livres, sendo que suas obrigações se
limitam aos deveres e objectivos de seus cargos que estão dispostos
dentro de uma hierarquia administrativa e suas competências são
rigorosamente fixadas. Realizam seu trabalho e em troca recebem um
salário fixo e regular que varia conforme a responsabilidade do cargo,
que é exercido em forma exclusiva ou como principal ocupação. Há
possibilidade de fazer carreira, podendo subir na hierarquia da
profissão, através do tempo de serviço ou por competência ou ambos.
Importante ressaltar que os funcionários trabalham em seus cargos sem
a apropriação dos mesmos. A dominação burocrática é puramente
técnica, com o objectivo de atingir o mais alto grau de eficiência e nesse
sentido é, formalmente, o mais racional conhecido meio de exercer a
dominação sobre os seres humanos.

Langa (1992) defende que a dominação tradicional repousa na crença das


tradições, costumes que existem desde de outros tempos. É a legitimidade na
crença dos indivíduos nas ordens e poderes senhoriais tradicionais. A
autoridade é exercida e legitimada pela tradição e por normas escritas.
O quadro administrativo, neste caso, pode ser recrutado não pela
competência técnica mas por vínculos pessoais e laços de fidelidade.
Honwana (2002) afirma que as tarefas não estão claramente definidas,
como na dominação racional, e os privilégios e deveres encontram-se
sujeitos a modificações de acordo com a vontade do governante. Há
outros tipos de dominação tradicional que são o: patriarcalismo onde o
poder é exercido segundo regras fixas de sucessão; e o patrimonialismo
ou gerontocracia que é autoridade exercida pelos mais velhos, em
idade, sendo os melhores conhecedores da tradição sagrada.

145
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Em um corpo administrativo encontramos o patrimonialismo quando os


funcionários ligam-se ao chefe por laços de fidelidade pessoais.

A dominação carismática pode ser caracterizada pelo seu carácter de


tipo extraordinário e irracional. Weber define carisma como uma
qualidade pessoal considerada extraordinária, atribuída a um indivíduo

que possui poderes ou qualidades sobrenaturais. Esses indivíduos são


enviados por Deus para o cumprimento de uma missão. Portanto, este
indivíduo é reconhecido como um líder por seus seguidores e assim a
autoridade carismática é legitimada. Langa(1992) admite que os
carismáticos, geralmente são profetas religiosos, políticos, demagogos,
apresentam, na maioria das vezes, provas de seu poder, fazendo
milagres ou revelações divinas. Entretanto Weber aponta para
possibilidade de uma existência permanente de um líder carismático,
tal fenómeno foi chamado de rotinização do carisma. Para que isso
ocorra são necessárias mudanças profundas, pois implicam a
transformação da autoridade carismática em tradicional ou legal. Para
Honwana (2002) sendo assim as actividades do corpo administrativo
passam a ser exercidas de forma regular seja através da constituição de
normas tradicionais seja por promulgação de regras legais. Haverá um
problema a ser resolvido que é o da sucessão que não será eleito,
geralmente o líder carismático escolhe entre aqueles de sua confiança
ou então por hereditariedade,

Sumário

Nesta unidade temática 10.3 abordou-se as questões relacionadas com


a Ciência e Racionalidade- Cultura, tradição e religiosidade no contexto
sociocultural do Modelos religiosos endógenos & modelos religiosos
exógenos. Isto permitiu fazer:

146
UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

 
Uma elaboração teórico cientifica e

Construção de realidades a partir de fontes trazidas no texto

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1( com respostas)


1.O que é patrimonialismo?
2.O eu é a dominação burocrática?

Respostas
1.O patrimonialismo ou gerontocracia que é autoridade exercida
pelos mais velhos, em idade, sendo os melhores conhecedores da
tradição sagrada.
2.A dominação burocrática é puramente técnica, com o objectivo de
atingir o mais alto grau de eficiência

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Os carismáticos, geralmente são profetas religiosos, políticos,
demagogos, apresentam, na maioria das vezes, provas de seu poder,
fazendo milagres ou revelações divinas
2. Hoje, essa legitimidade é feita pela soma de escolhas individuais
dos cidadãos que votam individualmente e, supomos,
autonomamente, e não em grupo ou família

Grupo 3 (exercícios d gabarito)


1.Que tipo de dominação apresenta as sociedades em que o poder é
passado hereditariamente?
2. Diferencie a dominação burocrática da carismática

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

UNIDADE 10.4. A emergência de sincretismos religiosos e de igrejas messiânicas em


Moçambique

Introdução

Nesta unidade temática, serão abordados questões relacionadas com


a emergência de sincretismos religiosos e de igrejas messiânicas em
Moçambique. Por isso ao completar esta unidade, o estudante
deverá ser capaz de:
 ▪
Saber o que é o sincretismo religioso

▪ 
Descrever os fenómenos sociais

Objectivos
específicos

Desenvolvimento

Para langa (1992) o Sincretismo é a fusão de diferentes doutrinas para


a formação de uma nova, seja de caráter filosófico, cultural ou religioso.
O sincretismo mantém características típicas de todas as suas
doutrinas-base, sejam rituais, superstições, processos, ideologias e etc.
Esta ideia é também partilhada com Agadjanian (1999) ao afirmar
também que o processo de sincretismo está intrinsecamente ligado às
relações de comunicação entre grupos sociais heterogêneos, ou seja,
com diferentes culturas, costumes e tradições. Quando ocorre o
contato e se desenvolve um convívio entre estes grupos distintos,
surgem "adaptações" nos vários aspectos culturais, fazendo com que
um grupo "absorva" o sistema de crenças do outro.

Para Agadjanian (1999) os, messiânicos, crem em Deus, Criador do


Universo. Crem que, desde o início da Criação, Deus objetivou
estabelecer o Céu na Terra e tem atuado continuamente para a
concretização desse objetivo. Com tal propósito, fez do ser humano o

Seu instrumento para servir ao bem-estar da humanidade,


condicionando a ele todas as demais criaturas e coisas.

Contudo, Honwana (2002) afirma que crem, portanto, que a história


humana do passado constitui estágios preparatórios, degraus para se
alcançar o Céu na Terra. Para cada época, Deus envia o Seu mensageiro
e as religiões necessárias, cada qual com sua missão. Cremos que, no

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

presente, quando o mundo vagueia em tão caótica situação, Deus


enviou o Mestre Meishu-Sama, fundador da Igreja Messiânica Mundial,
com a suprema missão de realizar o Seu sagrado objetivo de salvar toda
a humanidade. Por conseguinte, visando à concretização do Mundo
Ideal, de eterna paz, perfeitamente consubstanciado na Verdade-Bem-
Belo, empenhamo-nos em fazer sempre o melhor, erradicando a
doença, a pobreza e o conflito, as três grandes desgraças que assolam
este mundo.”

Gusmão (2008) vinca que materialismo cultural, desenvolvido por


Harris mostra que a tecnologia, a economia e a organização social
constituem o domínio mais adaptativo da cultura, prova disto é que
estamos em constantes mudanças nesses sectores, nossa tecnologia a
cada dia está mais avançada, devemos procurar aprender várias línguas
para conseguir bons empregos e a estratificação social está em
constante mutação. Vemos a cada dia que passa que a ideologia dos
sistemas culturais pode ter consequências na adaptação, no controle
populacional, na manutenção do meio ambiente.

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UnISCED, Curso de Licenciatura: 2° Ano Modulo de Antropologia Cultural de Moçambique

Sumário
Nesta unidade temática 10.4 falamos sobre a emergência de
sincretismos religiosos e de igrejas messiânicas em Moçambique,
como forma de ajudar o estudante a perceber as

Características 
das igrejas duma forma geral e messiânica
 s em particular

Absorver através de autocrítica e autodescobrimento
os
conhecimentos adaptáveis a realidade moçambicana

Exercícios de AUTO-AVALIAÇÃO

Grupo 1 (com respostas)


1.O que é sincretismo?
2.O que acontece quando ocorre contacto entre os grupos que
constituem sincretismo?

Respostas
1.O Sincretismo é a fusão de diferentes doutrinas para a formação
de uma nova, seja de caráter filosófico, cultural ou religioso
2. Quando ocorre o contato e se desenvolve um convívio entre
estes grupos distintos, surgem "adaptações" nos vários aspectos
culturais, fazendo com que um grupo "absorva" o sistema de
crenças do outro

Grupo 2 (respostas detalhadas)


1.Crem que, desde o início da Criação, Deus objetivou estabelecer
o Céu na Terra e tem atuado continuamente para a concretização
desse objetivo
2.O processo de sincretismo está intrinsecamente ligado às
relações de comunicação entre grupos sociais heterogêneos, ou
seja, com diferentes culturas, costumes e tradições

Grupo 3 (exercícios de gabaritos)


1.Quem é DEUS?
2. Em que acreditam os messiânicos?

3. Quais são as três desgraças que assolam o mundo?

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