Você está na página 1de 8

Tutoria de Teoria Geral do Direito Civil – Tutora Maria Luísa de Bruges

PESSOAS COLETIVAS – EM ESPECIAL

▪ Associações
(i) São pessoas coletivas de base associativa constituída por uma pluralidade de
membros com vista à realização de um fim e dotadas de um meio económico
(ii) Não têm fim lucrativo – sendo que é um fator de distinção em relação às
sociedades
(iii) As participações sociais não são transmissíveis
(iv) Não há distribuição de dividendos
(v) A responsabilidade por dívidas sociais é limitada ao respetivo património e
nunca se comunica aos sócios
(vi) A sua constituição é livre – aliás, na CRP está consagrado a liberdade de
associação

Como é que as associações se constituem?


(i) Constituem por escritura pública
(ii) Da escritura de constituição devem obrigatoriamente constar,
segundo o art. 167.º do CC:
o Os bens e serviços que os associados entrem para o património
social
o A denominação, sede e o fim da associação
o A forma do seu funcionamento
o Duração (apesar de haver a possibilidade de ser constituída
por tempo indeterminado
(iii) Tal como resulta do 167.º/2 podem ainda constar dos estatutos da
associação:
o Os direitos e as obrigações dos associados
o As condições de admissão, saída e exclusão
o Os termos da extinção da constituição
Art. 168.º: o ato da constituição e os estatutos estão sujeitos a exigências de
publicidade. Onde? → respetivo extrato no jornal oficial, controlo da legalidade
pelo notário que intervém na escritura, Ministério Público (a quem são
oficiosamente comunicados pelo notário)

Orgânica das associações:


o Integra pelo menos três órgãos: (i) assembleia geral, (ii) direção e (iii)
conselho fiscal
o Assembleia geral: (i) órgão deliberativo por excelência a quem cabe a
formação da vontade interna da associação, (ii) composta pela
universalidade dos associados

▪ Fundações
a) Designa-se por fundação toda a pessoa coletiva caracterizada pela afetação de um
património à prossecução de fins de caráter social.O Código Civil (CC), nos seus
artigos 157.º e seguintes, qualifica as fundações como pessoas coletivas, a par das
associações e sociedades, atribuindo-lhes, como regra geral personalidade jurídica
e capacidade de exercício.
b) As fundações distinguem-se das demais pessoas coletivas pelo facto de deverem
prosseguir, necessariamente, fins sociais e por assentarem num conjunto de bens
patrimoniais que lhe são afetos e que resultam ser indispensáveis para a
prossecução desses mesmos fins.
c) As fundações podem assumir natureza privada ou pública.
d) As fundações privadas decompõem-se, predominantemente, em fundações de
interesse social (artigo 185.º do CC), fundações privadas de mera utilidade pública
e, ainda, fundações privadas de solidariedade social, as quais prosseguem
interesses públicos qualificados que envolvem a sua colaboração com o Estado.As
fundações privadas de interesse social podem ser instituídas por ato entre vivos
ou por testamento (artigo 185.º do CC) e adquirem personalidade jurídica
mediante reconhecimento do Governo, o qual deve atestar quer o fim social
prosseguido pelo ente, como também a suficiência do património para o
preenchimento do mesmo fim. As fundações privadas de interesse público e de
solidariedade social regem-se pelo disposto no CC mas estão sujeitas a tutela do
Governo, estabelecida em legislação especial.
e) O instituidor que constitui a fundação, em vida ou em morte, não faz parte do seu
substrato.
f) O artigo 185º do CC e o 188º/3/a exige que a fundação tenha um fim ‘’de interesse
social’’ para poder ser personalizada.
g) Relativamente ao artigo 188º, o Profº PPV, considera que é lamentável a sua
inalteração na Reforma de 1977 do CC, pois nos dias atuais deveria ser
interpretado de outra forma. Esta atualização era reclamada, por exemplo, por
Ferrer Correia que propõe que ‘’ o reconhecimento das fundações só deixará de
ser concedido quando o fim da instituição for contrário à ordem pública, ou
quando os meios para o atingir forem manifestamente insuficientes’’. A doutrina
considera que o ‘’interesse social’’ exigido pela lei não tivesse de coincidir
necessariamente com o ‘’interesse geral’’ ou com o ‘’interesse público’’ e muito
menos com o ‘’interesse do Estado’’.Por isso, o PPV considera que o legislador
tem que rever este regime, pois não há perigo para vinculações nocivas ou ilícitas
já que consegue evitar-se através da clausula geral dos artigos 280 e 281 do CC.

Lei Quadro das Fundações


Na opinião do PPV, o legislador interveio mas não da maneira correta.

Porquê?

Definiu fundação como ‘’ uma pessoa coletiva, s/ fim coletivo, dotada de um


património suficiente e irrevogavelmente afetado à prossecução de um fim de interesse
social’’. Este ‘’fim de interesse social’’ afasta-se do que o PPV tem vindo a reivindicar
pois impede as fundações de seguir interesses familiares e pessoais.
O PPV considera que esta lei manteve e agravou o caráter estatizante que o regime
legal das fundações tinha. Os fins que lhe são permitidos são praticamente decalcados dos
fins do Estado.
Considera, ainda, que a reforma do regime das fundações foi feita tendo em vista
as fundações públicas que as privadas, o que acabou por estalizar injustificadamente as
fundações propriamente de Direito Civil, fazendo com que houvesse um retrocesso na
sua opinião.
Menezes Cordeiro: a lei portuguesa recusa as fundações de família devido a
paralisia da iniciativa económica e com a abolição dos morgadios pois uma fundação de
uma família destinar-se-ia, ao longo do tempo, a ajudar a alguns membros da família.
Mas as fundações podem desenvolver atuações económicas detendo direta ou
indiretamente estabelecimento e empresas. Os lucros obtidos devem, porém, ser afetos
aos ‘’fins sociais’’ da fundação.

Como se forma uma fundação? (Tem uma lógica construtiva diferente da das
associações)

Há 3 fases na sua formação:


1) Instituição:
o Negócio jurídico unilateral entre vivos ou mortis causa
o O negócio é realizado entre o instituidor que afeta um património a
uma pessoa coletiva a criar com determinados objetivos de tipo social.
A eventual declaração não é recipienda
o O ato de instituição, quando celebrado entre vivos, deve seguir a forma
prescrita para as doações:
(i) escritura pública quando envolva imóveis: 947/1
(ii) forma escrita nos restantes casos: 947/2
o Se for em forma de testamento haverá que seguir a forma prevista para
este (2204.º)
o O ato de instituição deve indicar, necessariamente, o fim da fundação
e os bens que lhe são destinados (186º/1) ou pelo menos, deve dar
índicos bastantes que permitam ser percebidos pelas regras de
interpretação. Caso contrário, o negócio é nulo por indeterminação do
objeto (280º)
o O ato de instituição, os estatutos e as suas alterações enquanto não
forem publicados, não produzem efeitos perante terceiros.
o O ato de instituição pode ser condicionado, pelo seu autor, a quaisquer
eventualidades e às opções que venham a ser feitas quanto ao
reconhecimento.
.
Relativamente à sua interpretação e na dúvida, prevalece o sentido menos
oneroso para o instituidor, nos termos do 237º do CC

2) Elaboração dos estatutos


o Deve conter todos os demais elementos relativos à pessoa coletiva em causa que
não constem do ato de instituição: enumeração do 186º/2 retomada pelo artigo
18º/2 da Lei-Quadro
o Os estatutos podem ser elaborados pelo próprio instituidor (186º/2)
o Quando não o sejam ou sejam insuficientes cabe a sua elaboração:
(i) aos executores do testamento (187/1+19/1 da LQF)
(ii) à autoridade competente para o reconhecimento, quando os referidos
executores os não elaborem no prazo de um ano posterior à abertura da
sucessão (187º/2, in fine + 19/2 in fine)
(iii) a essa mesma instituição quando não conste de testamento: 187/1 in
medio e 19/2 da LQF in medio)
o Os estatutos devem ser publicados no jornal oficial, não produzindo efeitos,
perante terceiros.

3) Reconhecimento
o O reconhecimento pode ser pedido (188/1 e 21/1 da LQF):
(i) pelo próprio instituidor
(ii) pelos seus herdeiros ou executores testamentários
(iii) pela autoridade competente, oficiosamente
o O reconhecimento é um ato administrativo que compete ao PM, que o pode
delegar (20/1 da LQF) . maior coordenação e uniformidade de critérios
o O artigo 23/1 da LQF: alarga as circunstâncias que podem levar à recusa do
Reconhecimento - se o reconhecimento for negado devido à idoneidade do fim
então a instituição deve ser considerada sem efeito já que não é possível satisfazer
a vontade do instituidor: não é justo reter os bens
o se o reconhecimento for o problema da insuficiência do património já é diferente:
porque a vontade do instituidor ainda pode ser parcialmente respeitada (188/5)

Como é o funcionamento, modificação e extinção das fundações?


o O CC não contém regras expressas sobre a administração das fundações: temos
as regras gerais do 162º. Limita-se a dizer que compete à administração:
(i) para o reconhecimento, proposta de alteração dos estatutos (189º)
(ii) e que deve ser ouvida para efeitos de transformação (190/1)
o Os próprios estatutos podem ainda designar a administração ou prever outro
qualquer esquema de designação. No limite, ele será indicado pela autoridade
competente para o reconhecimento.
o Funções da administração: poderes comuns de gestão e representação + toda a
competência residual que não compita aos outros órgãos
o A administração tem poderes de disposição sobre os bens que constituem o
património da fundação? - A Lei Quadro é restritiva: exige, quanto aos bens
atribuídos pelo fundador,autorização da entidade competente para o
reconhecimento (11º). Quando o faça, os competentes poderes de representação
cabem aos administradores.
o Contra deliberações ilegais da administração de uma fundação é possível reagir
através de procedimento cautelar de suspensão das mesmas.
o Órgãos: designação dos órgão de fiscalização devem resultar dos estatutos, dentro
dos condicionamentos do artigo 162º. O art 26/1/c) da LQF complementa matéria.

▪ Sociedade civil
a) Pessoas coletivas de caráter associativo c/ fim lucrativo
b) Podem ser sociedades comerciais ou civis: as comerciais são aquelas que
tenham por objeto a prática de atos de comércio e adoptem um dos tipos
previstos no CSC; as outras são civis
c) Alguns tipos de sociedades (as sociedades civis simples e as sociedade em
nome coletivo) não têm natureza patrimonial perfeita porque não têm
autonomia patrimonial perfeita, respondendo os sócios pelas dívidas
sociais, subsidariamente em relação à sociedade, solidariamente entre si e
sem limitação de valor.
d) Nas sociedades em comandita também respondem desse modo pelas
dívidas sociais os sócios comanditados.
e) Os resultados líquidos positivos (lucros) apurados no exercício são
distribuídos pelos sócios (dividendos).
Em concreto, as sociedades civis simples

o Na sistemática do Código, o legislador não inclui entre as pessoas coletivas e


tratou-as simplesmente como o tipo legal do contrato de sociedade civil
o O contrato não está sujeito a forma especial, salvo se assim o exigirem os bens em
jogo: 981/1º. A lei prevê, em caso de inobservância da forma, esquemas
reforçados de redução e de conservação:nº2
o As alterações ao contrato devem ser unânimes, exigindo-se ainda o acordo do
próprio para a supressão de direitos -> tudo isto sujeito a clausula em contrário:
982º // 983: os sócios estão sujeitos às obrigações de entradas fixadas no contrato,
mas são aplicados regimes diferenciados consoante a sua natureza, de acordo
com o 984º
o A administração é supletivamente entregue a todos os sócios: 955º. Todavia,
qualquer administrador pode opor-se ao ato que outro pretenda realizar, cabendo
então à maioria decidir: nº2
o A cláusula que atribua a administração a um determinado sócio pode ser revogada,
ocorrendo justa causa: 986º
o Aos administradores são aplicáveis as regras do mandato: 987.º
o Direitos e deveres dos sócios:
- direito de fiscalização (988º) - que envolve a prestação de contas anuais
- direito de uso das coisas sociais, mas apenas com o consentimento unânime dos
outros sócios: 989º
- o direito de ceder a terceiro a sua quota, c/ o consentimento de todos os outros:
995º + 995/2: a cessação de quotas fica sujeita à forma exigida para a transmissão
dos bens da faculdade
- o direito de se exonerar da sociedade: a todo o tempo, se esta não tiver uma
duração fixada no contrato (1002º/1) ou com justa casa nos outros casos (1002º/2)
o Relações com terceiros:
- a sociedade é representada em juízo e fora dele pelos seus administradores
(996/1)
- as modificações ou poderes de representação dos administradores não são
oponíveis a terceiros de boa fé (996/2)
- pelas dívidas da sociedade responde ela própria e, pessoal e solidariamente, os
sócios: 997/1
- a sociedade responde como comitente pelos atos ilícitos dos sócios: 998/1

A personalidade coletiva das sociedades


Contra a personalidade jurídica das sociedades civis puras manifestaram-se:
• Ferrer Correia
• Pires Lima e Antunes Varela
• Mota Pinto
• Isabel Magalhães

A favor da personalidade jurídica das sociedades civis puras manifestaram-se:


• Castro Mendes
• Oliveira Ascensão
• Carvalho Fernandes

Parece claro que o CC se exprime às sociedades em modo coletivo, pois admite a


responsabilidade civil da sociedade (998/1), pressupõe direitos e deveres (984º), refere
fins da sociedade (991/1), etc. A sociedade civil pura, constituída por escritura pública,
ou equivalente, dotada de denominação, devidamente inscrita no Registo Nacional das
Pessoas Coletivas, dado o âmbito dos artigos 980º e seguintes do CC, é uma pessoa
coletiva em tudo semelhante às demais sociedades. Mostram-se assegurados os diversos
interesses e valores subsequentes.
De acordo com a metodologia de Paulo Cunha podemos então recorrer ao
artigo 157º do CC.
Verifica-se a analogia que permite a aplicação dos artigos 158º e 167º, do CC: as
sociedades civis puras, desde que constituídas por escritura pública e com as
especificações prescritas, nos seus estatutos, são pessoas coletivas plenas. (O
Professor JAV abordou esta questão em sede de aula teórica)

Você também pode gostar