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2.

Das “escolas históricas” aos “giros”: formas de narrar a história da


historiografia. [H1] Comentário:

- Atenção a este ponto. Acho que posso


desenvolver algo interessante aqui.
Não seria prudente tentar indicar precisamente o momento em que começamos a fazer
referência ao mundo. partir das categorias dadas por HW ou
pelos teóricos da linguagem que ele cita
A linguagem surgiu junto com as necessidades básicas do homem para existir: organização para estruturar uma análise de autores de
grupal para se defender de predadores, para caçar, para procriar e dar continuidade à sua escolas e giros [linguistico] que a prova
pede.
espécie. A comunicação surgiu quando o homem surgiu.
Ao longo dos séculos, fizemos referência à realidade a partir de diferentes chaves. texto - Apresentação - Teoria e história da
Foi recentemente, ao longo do século XIX, que fomos aprimorando nosso entendimento sobre historiografia: do giro linguístico ao giro
ético-político
a referência que fazíamos sobre o mundo.
Se até então era crível que havia uma separação entre objeto estudado e sujeito que sobre
ele faz referência, alguns filósofos e historiadores desse período começaram a questionar essa
visão.

Com Humboldt temos a criação da agenda científica dos historiadores prussianos a partir de
sua palestra ministrada em 1821 na Universidade de Berlim cujo título era “A tarefa dos
historiadores”. Nela, Humboldt, influenciado por Niebuhr, indica que os historiadores devem
coligir fatos buscando a força motriz que os une, seus nexos, expondo-os através de uma
narrativa.
O historiador deve se preocupar em expor o que se produziu. Mas, somente expor esses fatos
históricos ainda era insuficiente para Humboldt.
Em sua visão, o historiador devia operar pequenos acréscimos, completando as lacunas de
sua tendência à busca pela verdade.
Criticando a história de matiz teleológica, alimentada por uma filosofia que buscava as causas
finais, Humboldt foi um dos fundadores do chamado historicismo alemão através da oferta de
uma interpretação histórica focada no particular para, só então, como desdobramento, tentar
dar conta da ação humana em sua integralidade, do geral.

À época da palestra de Humboldt em Berlim, Leopold von Ranke completava seus estudos
filológicos.
Defendendo que a base da história deve se deter tão e somente aos estudos dos fatos, Ranke
foi muitas vezes mal interpretado e tachado, erroneamente, como positivista, como destacado
por Bentivoglio em coleção organizada por Jurandir Malerba “O caminho da Ciência”.

Ao firmar o horizonte cognitivo da história nos fatos, a epistemologia histórica de Ranke


nega a função de Magistra Vitae que desde Cícero rondava a investigação do passado.
Foi na segunda metade do século XVIII que se iniciou um processo de deslocamento de sentido
dos esforços de entendimento das ações do homem no tempo, mapeado, por Koselleck, em O
Conceito de História, através dos termos utilizados para nos referirmos à nossa disciplina.
Da matriz latina Historie, que a língua alemã tomou de empréstimo, temos o sentido de relato,
de narrativa.
Koselleck mostra como, aos poucos, a palavra utilizada passou a ser Geschichte, que significa
acontecimento em si ou uma série de acontecimentos. A história passa a ter um sentido de
coletivo singular.
No seu “A História dos povos romanos”, de 1824, Ranke já adota essa postura e usava
[P2] Comentário: Para Ranke, a tarefa
Geschichte ao entender que o acontecimento é consequência do embate entre forças do historiador é saber o que efetivamente
singulares genuínas. ocorreu, sem fazer com que o passado
assuma a priori compromissos com o
futuro.
Ou seja, ao longo, principalmente, do século XIX, a História como produto do historiador passa
a ser o resultado de uma análise de um embate de forças. Ela deixa de ter uma função [P3] Comentário: 07 – o período de
1806 e 1871 da derrota para Napoleaso em
projetiva, de Magistra Vitae, e passa a ter a função de “[...] apenas mostrar o que aconteceu”, Iena e a anexação dos territórios de Alsacia
como anota Ranke. Lorena por Bismarck em que deu a
fundação do império Germanico, temos a
profissionalização da historia como cadeira
nas universidades.
Em termos metodológicos, como destaca Murari Pires, diferente de Tucídides, a quem Ranke AS elites alemães passaram a se ver como
creditava o título de maior historiador que existiu e que tinha na testemunha presencial a base guardiãs do caráter especial da nação; os
historiadores passaram a agir de acordo
heurística para sua narrativa, em Ranke encontramos a necessidade de uma heurística com seus compromissos a determinados
diacrônica, na qual o distanciamento temporal é necessário. projetos político, atuando como
conselheiros políticos, editores de jornais,
Uma das características da escrita de Ranke é que na forma de concatenar os fatos já se deputados ou ministros; Ranke, p.e., foi
conselheiro do rei Frederico IV da Prussia;
encontram os aspectos filosóficos, os quais são procurados em Ranke de forma explícita por suas aulas na faculdade de Berlim eram
alguns historiadores desavisados. frequentadas por políticos, militares,
autoridades, liberais e a elite da burocracia
Ranke não enuncia sua filosofia. Ele a faz. prussiana; a historia acabava por ser
E a faz através da concatenação dos acontecimentos em uma narrativa eivada de sentidos. tomada como tematizadora do
pensamento social;
E o estilo da narrativa de Ranke o aproximava de Goethe, nas palavras de Peter Gay em O
Estilo na História.
10 – através da obra de Barthold Niebuhr,
Para Ranke, apenas a forma confere imortalidade às tendências práticas e à vida cotidiana. ocorre o desenvolvimento de técnicas de
critica dos documentos; a heurística e a
Segundo Hayden White, Ranke usava a comédia como forma de vazar seu enredo, buscando a sistemática, herdadas da escola filológica
reconciliação. Seu modo de explicação era o organicista, através dos elementos integrativos de Gottingen.

fundamentais que estruturavam as relações que analisava. Atraves da obra de Wilhelm von Humboldt,
em 1821, em sua conferencia inaugural na
universidade de Berlim, ocorre a
Nesse período, em boa medida, as preocupações com a transformação da história em ciência enunciação do programa fundamental
adotado pela geração de prussianos que
levaram os historiadores pais do historicismo, Humboldt e Ranke, a se aproximarem da viria a emergir posteriormente; a ideia era
tradição hermenêutica antiga, em suas vertentes jurídica e filosófica-filológica. que fatos reunidos através de vestígios,
após sua critica, fossem concatenados em
Ao imputarem ao documento o valor de prova e de evidência esses historiadores se um dado sentido através de uma narrativa.
inspiraram em traduções de textos gregos e latinos para o alemão e francês para se É o chamado historicismo alemão!!
Humboldt, Niebuhr e Chladenius foram os
apropriarem de procedimentos utilizados pelos hermeneutas. maiores influenciadores de Ranke e sua
A base disso está na aproximação que eles tinham com as ciências auxiliares como a geração;

numismática, a diplomacia, a filologia e paleografia que ajudavam a decodificar os vestígios Ranke e Droysen desenvolveram a relação
entre teoria e pratica no novo saber; Ranke
históricos que baseavam seus escritos. estava mais preocupado com a pratica e
Não apenas isso. Humboldt e Ranke recusavam a inscrição da história no vir a ser que escita da historia e Droysen com seus
pressupostos teóricos;
encaixotaria a história em uma lei. 12 – em 1859 Heinrich von Sybel cria a
Para ambos, a singularidade da História se encontra em um agregado delas, em um coletivo Historische Zeitschrift , que dá espaço para
um regime de escrita de historia particular
singular, como indicado por Koselleck. aos historiadores prussianos; a geração de
Para esses historiadores, qualquer coisa que tolhesse a liberdade do homem era indigno de Ranke estabelece uma relação intrínseca
entre pensar o passado e agir
Deus, o que revela a influência religiosa luterana em suas concepções de história. politicamente ou estimular a ação politica;
o historicismo de Humboldt e de Ranke foi
o que caracterizou esta geração; de fundo,
havia a defesa da objetividade;
Em Gustav Droysen temos, em seu “Historik”, de 1857, a indicação de que a teoria da
história seria uma exposição sistemática de campo e de método.
Ele dividiu sua obra em heurística, critica, interpretação e exposição completando as lacunas
teóricas da historiografia moderna, que, para ele, significava a historiografia feita por Leopold
von Ranke. [P4] Comentário:
Para Droysen, a história era mais do que a exposição de textos do passado, como parece ter Não podemos esquecer que a obra-prima
sido um dos focos de Ranke. do velho historiador francês Fustel de
Coulanges, A Cidade Antiga (1864),
Os indivíduos deviam ser tomados em relações constantes, para Droysen, e a sua dedicava-se antes à história da religião, da
compreensão não se daria somente nos textos, mas também através da realidade histórica e família e da moralidade, do que aos
eventos e à política.
dos poderes éticos que compõem o quadro do objeto estudado.
Marx também oferecia um paradigma
Para Droysen, o retorno à tradição – ao passado – era infinito, pois cada retorno compreende histórico alternativo ao de Ranke. Segundo
de forma renovada o mesmo passado, o que possibilita novas compreensões sobre a mesma sua visão histórica, as causas fundamentais
da mudança histórica deveriam ser
tradição. encontradas nas tensões existentes no
Por elaborar considerações sobre a natureza da história como as aqui indicadas, Droysen é tido interior das estruturas socioeconômicas.
(peter Burke re. francesa p. 22 do word).
como um dos primeiros teóricos da história após a sua instituição como ciência no século XIX.

No alvorecer do século XX, por mais que seja inegável que a sociologia durkheimiana, sua [P5] Comentário: De qualquer forma,
os historiadores eram vistos dessa maneira
aproximação com as ciências naturais e tomada do fato social como objeto tenham pelos cientistas sociais. O desprezo de
confrontado a hegemonia da história, o debate não foi mortal para nenhuma das partes. Durkheim pelos eventos já foi mencionado;
seu seguidor, o economista François
Simiand, foi mais longe nesse sentido,
A busca por objetividades e causas gerais cara à sociologia se confrontava com a tentativa de quando, num famoso artigo, atacou o que
chamou de “os ídolos da tribo dos
entendimento do individual e psicológico da história guiado por uma cronologia temporal. historiadores”. Segundo ele, havia três
ídolos que deveriam ser derrubados: “o
François Simiand, herdeiro de Durkheim, dizia que a a tribo dos historiadores adorava três ídolo político”, “a eterna preocupação com
ídolos, que deviam ser derrubados: 1 – o ídolo político; 2 – o ídolo individual; 3 – o ídolo a história política, os fatos políticos, as
guerras, etc., que conferem a esses
cronológico. eventos uma exagerada importância”; o
Simiand tentava que a história diminuísse a importância do político, revisse o peso dado aos “ídolo individual”, isto é, a ênfase excessiva
nos chamados grandes homens, de forma
grandes homens nas monografias e não necessariamente voltasse constantemente às origens que mesmo estudos sobre instituições
dos fatos. eram apresentados como “Pontchartrain e
o Parlamento de Paris”, ou coisas desse
Simiand defendia uma nomologia de produção de leis que não ficou sem resposta. gênero; e, finalmente, o “ídolo
cronológico”, ou seja, “o hábito de perder-
se nos estudos das origens” (Simiand,
O debate foi travado em páginas de revistas especializadas e a História teve em Charles 1903).

Seignobos sua defesa, que indicou a imperfeição da história que só alcança parte daquilo que
[P6] Comentário: explorar fala de
é consciente do individuo. causalidade no caderno de sergio da mata.
A perfeição dos filósofos, buscada também pela sociologia, seria mera especulação.

E foi através de uma revista, a Revue de Synthèse historique, surgida em 1900 pelas mãos do
filósofo Henri Berr que as propostas sociológicas e historiográficas (que não eram
unanimidade) encontraram algum equilíbrio.
A realidade não se explicaria somente pela análise objetiva do fato social e nem unicamente
pelo olhar para as ações conscientes dos indivíduos.
A proposta da Revue historique era conciliar ambas abordagens.

Foi nesse cenário de pluralidade de perspectivas que jovens com menos de 40 anos de idade,
como Lucien Febvre e Marc Bloch, publicaram seus primeiros artigos na Revue historique.
Entre eles, é possível encontrar, por exemplo, resenhas de livros de linguistas, o que mostra a
aproximação desses dois historiadores a temas de caráter não necessariamente políticos à
época.
Marc Bloch e Febvre foram profundamente influenciados pelo modelo de reunião de
disciplinas que a Revue de Synthèse historique propiciou, existindo como um espaço de
discussão intelectual entre posições antagônicas de análise da realidade.

Considerando a circunstância da primeira guerra mundial, experimentada nos campos de


batalha por muitos dos historiadores envolvidos nos debates à época, entre eles Bloch e
Febvre, houve um repensar das condições de produção de suas reflexões.

Em termos metodológicos, a psicologia dos testemunhos, os indícios matérias e elementos


corporais e físicos ganharam em importância para esses historiadores nesse período.
Mais do que isso.
As revoluções einsteiniana e quântica deram uma roupagem de incerteza às abordagens feitas
pelos historiadores que ainda estavam ligados à maneira de se pensar a história a partir do
fato positivo (não confundir com positivismo) herdeira da escola alemã historicista e, de certa
forma, ainda tributária da valorização dos fatos que os historiadores metódicos franceses
davam em seus escritos.

Em 1929, Bloch e Febvre criam a Annales d’histoire économique et sociale numa tentativa de
se contrapor ao que eles chamaram de história politica, que era praticada por Charles
Seignobos e Charles Langlois, e que nos termos de Simiand era “o ídolo ao político”.
Desde sua concepção, a Annales foi pensada para ser a revista responsável pela difusão em
favor de uma nova abordagem interdisciplinar da história.
Em seus primeiros anos, a revista transitou entre a economia, a politica e as ciências sociais,
buscando sempre o dialogo com outros campos.

O que os Annales trazem de novo é uma revolução metodológica a respeito dos objetos e nas
questões colocadas.
Não há a alegada revolução epistemológica que suplantaria aquilo feito pelos metódicos.
Os historiadores dos Annales mantiveram a necessidade de trabalho a partir de fontes
históricas e de suas citações, o que nos permite afirmar que as normas da História
continuaram integras, como diz Antoine PROST.

NA primeira fase da revista, Bloch estava interessado na produção de trabalhos sobre a


história rural medieval, usando categorias durkheimiana como consciência coletiva,
representações coletivas e da memoria.
Por outro lado, Bloch defendia que o historiador não deve postular uma causa, mas sim buscá-
la em suas investigações. [P7] Comentário:
Bloch chama atenção para as estruturas de
Essa crítica foi direcionada a Simiand, que no final do século XIX defendia uma nomologia ou classificação que ultrapassariam uma
uma história regrada por leis, baseada nas ciências naturais e ao império da causalidade como época em particular e seriam categorias
gerais de análise ( o que os estudos
explicação. Ou seja, ao mesmo tempo que Bloch de apropriava de parte do pensamento de decoloniais já mostraram não ser possível):
Capitalismo, classe; revolução; proletário;
Durkheim, ele combatia outros de seus aspectos que ainda reverberavam em seus discípulos. totem; tabu; o que vale na palavra é o uso
que dela é feito (Witt);
Fernand Braudel, historiador francês da segunda geração da Escola dos Annales, foi o
principal responsável pela problematização do tempo como instrumento na História,
propondo a curta, média e longa durações.
Braudel tinha interesse em analisar mudanças lentas, desencadeadas pelo tempo geológico e
sua ação sobre o entorno do Mar Mediterrâneo, em uma postura historiográfica que
repudiava o acontecimento factual evidente, a curta duração, a narrativa das grandes
ocorrências políticas, a história dos grandes nomes e dos sujeitos em suas individualidades.

François Dosse, em entrevista, diz que o historiador dos Annales transformava-se em


antropófago.
Isso teve um lado positivo, ou seja, a constante abertura por parte dos historiadores em
direção à produção das outras ciências sociais. [P8] Comentário: Mais do que
abertura, essa operação pode ser
Mais do que abertura, essa operação pode ser entendida como o estabelecimento de uma entendida como o estabelecimento de uma
rede acadêmica na forma de se pensar e fazer história no século XX que se estendia a outros rede acadêmica na forma de se pensar e
fazer história no século XX.
enquadramentos da realidade.

Desse modo, os Annales conseguiram a captação do durkheimismo; em seguida, a captação


das teses de Claude Lévi Strauss, que ameaçava a hegemonia da História no campo social [P9] Comentário:
através do estudo das estruturas do inconsciente no pensamento primitivo, daquilo que não enfim, a captação de Foucault
vaiava, que, dizia Levi Strauss, compunha a dimensão mais profunda da episteme humana.
Todavia, essa suposta profundidade ocorria em detrimento de uma reflexão sobre o que
muda de forma mais evidente, quando a sensibilidade à mudança me parece ser uma das
especificidades da história.
De um jeito ou de outro, o fato foi que a tendência à totalização foi ganhando espaço nos
Annales, levando Braudel à alongar a temporalidade para lidar com um tempo (quase) imóvel.

Foi com Pierre Chaunu, o ardoroso advogado da história quantitativa e serial, que os Annales
viveram seu ápice totalizante, transformando o indivíduo em um dado, em um número em
uma tabela, que figurava ora como unidade em uma amostra populacional em uma época, ora
compondo o gráfico do número de mortes em outra.
Tudo isso dividindo espaço com variações de preços e de taxas que invisibilizavam o homem
em meio a forças maiores do que as suas, na perspectiva demográfica, geográfica de longa
duração que os Annales estabeleceram em meio a rede de diálogos estabelecida com a
sociologia e antropologia.

Mais ou menos no mesmo período em que Chaunu atuava na história serial, surgiu nos EUA o
que se denominou como escola cliométrica, que utilizava ferramental matemático e
computadores para, a partir de uma grande quantidade de dados, enxergar tendências e
sugerir comportamentos padrões na longa duração, como sugere Lawrence Stone em artigo
em reação a essa escola, de 1979, propondo o retorno à narrativa.

Na década de 1970, uma postura do fazer historiográfica relativamente nova emergiu. O


mundo ainda tentava entender o que foram as barricadas de maio em Paris, com seus
estudantes questionando a ordem e o conjunto de ismos dos grandes sistemas explicativos,
desde o capitalismo ao marxismo.
Era o período de crítica aos modelos de análise que privilegiavam as estruturas e havia uma
demanda por novas formas de se olhar para a realidade.
Quentin Skinner e John Pocock podem ser entendidos como dois dos principais intérpretes
dessa demanda.
Em 1969, Skinner publicou o artigo “Meaning and understanding”, no qual retoma
considerações sobre a enunciação de J. Austin.
Para Austin, o ato de dizer tem a sua face de locução e sua força não locutiva, que pode ser
entendida como as ações ou sentidos que aquilo que é dito possui.
Skinner introduz um terceiro elemento que ele chama de perlocutivo, que são as intenções
do autor da enunciação com a realização do seu ato de fala.
Para Skinner, seria necessário inserir o ato de fala na sua teia de relações linguísticas para se
mapear a intencionalidade do seu locutor.
Skinner, dessa forma, criticava a postura da história das ideias tradicional que retirava os
textos de suas circunstancias históricas e tentavam perceber uma validez universal de
significação.
Ao contextualizar esses atos de fala, Skinner busca compreender o sistema de ações
comunicativas, tentando enquadrar os atos de fala em convenções linguísticas e entender se
as afirmações foram executadas, as modificações que o vocabulário vai passando etc.
Sua ideia é ver como os termos do edifício jurídico politico do estado moderno inglês é
formado.

Entretanto, em 1974, em “Some problems in the analysis of political Thought and action”
Skinner reconhece que a intencionalidade do agente é irrecuperável através do ato de fala.
Mesmo assim, é possível afirmar que Skinner radicalizou a alteridade entre texto e contexto,
propondo entender os atos de fala em conformidade com as ações que os rodeiam (isso em
contato com o antropólogo Clifford Geertz).
Sua proposta inicial foi levada ao extremo nas interpretações textualistas que surgiram depois [P10] Comentário:
com o que foi convencionado chamar de giro linguístico. Aqui ocorre que para reconstruirmos esse
contexto semântico e de ações, devemos
olhar para a recepção que ocorreu à época.
Essa é uma categoria um tanto difusa, mas que Richard Rorty tentou definir como o conjunto O antropólogo Clifford Geertz em seu
de problemas que podem ser resolvidos seja através de uma reforma da linguagem seja trabalho de campo no Bali em 1958 pensa
que a cultura deve ser lida como um texto.
através de uma melhor compreensão da linguagem que usamos no presente. Para isso seria necessário que os artefatos
culturais fossem interpretados. Geertz diz
Essas possibilidades de solução remeteriam, por um lado, à filosofia analítica e, por outro, é que as próprias sociedades possuem a
chamada de definição estreita. chave de interpretação de seus artefatos e
o que o investigador deve fazer é ter
acesso a essa chave.O que temos nesse
O significado amplo do giro linguístico ia ser dado por A. Ayer que argumenta que o sentido ponto é uma análise da relação do eu e do
outro; do civilizado (investigador) e do
que damos ao mundo não é factual, mas linguístico. nativo (objeto). Para Geertz, o antropólogo
não deve tentar se converter no nativo,
Os sentidos que damos não descrevem os comportamentos físicos ou mentais.
mas, sim, conversar com ele.
Nossas descrições apenas expressam definições e as consequências formais dessas definições.
E, no limite, nessa conversa o investigador
deve focar atenção nos modos observáveis
Com a definição ampla de Ayer, O que temos é uma mudança de foco onde a linguagem não é de pensamento.

vista mais como representante de uma realidade objetiva.


[P11] Comentário:
A realidade não pode ser “transmitida” objetivamente, como se cria até então.
O que se tem são apenas modos de produção de sentido acerca do real em diferentes Mas, se se perde o real, o que sobra?

contextos históricos e culturais.


Como nos expressamos acerca de algo passa a ser o objeto de estudo, e não mais aquilo a o
que nosso discurso se refere. A forma se torna o objeto. [P12] Comentário:
Essa perceptiva abre a possibilidade de análise das situações que engendram poder nos Retirado:
discursos. Quem fala? de onde se fala? quem legitima o que se fala? A partir de então essas e Isso significa que ocorreu uma
radicalização da união referencial entre
outras questões passaram a ser postas para se compreender a distribuição e a operação das sujeito e o objeto que ele estuda.
relações de poder através dos discursos na sociedade.
Mas, nesse momento, o que se observa
não é apenas a não separação entre sujeito
(historiador, filosofo) e objeto (sociedade)
Foi com Michel de Foucault que o questionamento sobre o uso da linguagem ganhou outra mas o reconhecimento que o resultado
proporção. dessas análises são eles também objetos
históricos fruto de um momento preciso e
No seu “As palavras e as coisas”, de 1966, ele analisa o modo como o homem põe condicionado pelas características culturais
cognitivamente ordem no mundo. dadas pelo local de quem a produziu.

O processo de classificação operado pelo pensamento clássico, estabelecendo relações de Tanto o sujeito como o objeto são
linguagem. A única coisa que existe é
similaridade e equivalência entre as palavras e as coisas é o que ele analisa.
linguagem, no limite, a materialidade desse
Ao buscar pistas para essas classificações nas práticas institucionais, Foucault inicia o texto não existe.
desenvolvimento de uma análise que ele trata na sua aula inaugural em 1970 no College de
France.
Transformada em um pequeno livro, na “A ordem do discurso” Foucault olha para os
elementos de controle, seleção e organização dos discursos e suas relações com o desejo e o
poder.
O discurso possui elementos de dominação e a forma que ele é estruturado em si mesmo
pode ser usado para controle.
Foucault analisa discursos produzidos por agentes que representavam manicômios, casas
politicas, consultórios médicos e instituições de ciência escrutinando suas elaborações que
revelavam suas vontades de verdade.
Foucault considerava que o conjunto de regras estabelecidas no interior de uma disciplina
orienta o que é erro e acerto.
E é o reconhecimento da construção histórica do que é aceito como verdadeiro em um dado
momento que Foucault diz estruturar as regras das políticas discursivas que obedecemos. No
limite, seria possível afirmar que a verdade é ela mesma discurso.

Todavia, Foucault nota que não basta vc dominar o regramento do discurso tido como
verdadeiro em um determinado momento histórico. vc precisa fazer parte do grupo que é
autorizado a enunciar esse discurso.
Pertenças prévias de classe, raça, sexo, nacionalidade são alguns dos condicionantes que
orientam a legitimidade para se falar sobre determinados temas. [P13] Comentário: Essa abordagem
sobre as trocas, escrituras, e leituras de
signos são postas em jogo, onde os
Aproveitando que Foucault trata a vontade de verdade das disciplinas e as formas que elas participantes codificam e decodificam
significantes que circulam e lhes alcançam.
classificam o mundo, se pensarmos mesmo no ofício historiográfico, veremos que o momento
de enunciação de nossas conclusões é apenas umas das fases da nossa pretensão veritativa,
segundo entende Paul Ricoeur em “A memória, a História e o esquecimento”.

Para Ricoeur, em “A memória, a História e o esquecimento”, o percurso epistemológico se dá


em três fases.
A primeira fase é o contato com a memória.
O historiador deve acessar a memória sobre seu objeto e esse processo de busca e acesso já
indica as maneiras que ele tratará sua investigação.
O segundo momento é o de compreensão dessas memórias, onde a partir da interpretação
dos significantes com os quais ele entra em contato, o historiador elabora mentalmente uma
compreensão sobre seu objeto até que ele chega na terceira e última fase que é o de
expressão dessa compreensão.
Ao dar um aspecto discursivo à sua inteligibilidade, temos o encerramento do processo
epistemológico da pretensão de verdade do historiador em Ricouer.
Entendo que essas três fases se sobrepõem e não necessariamente são estanques ou
obedecem a um antes e depois rígido. Voltamos aos arquivos ao longo da escrita,
reformulamos nossas questões durante a formulação mental e nada nos impede de criar um
sentido histórico do nosso objeto absolutamente diferente do que pensamos inicialmente.

Entretanto, para outros teóricos, como, por exemplo, Hans Jaus, a criação de sentido ainda
avança, entrando em circulação e despertando interpretações e recepções de suas ideias que
não necessariamente estão no campo de possibilidades vislumbrado pelo historiador de
antemão.

Conclusao

Não precisaríamos ir muito longe para encontramos filósofos que não concordam com esse
tipo de proposição desenvolvida na elaboração do giro linguístico.
A pragmática da linguagem de Witt indicaria que nós usamos a linguagem para nos fazer
compreender e não se trata de a linguagem nos iludir.
Mas, sim, do reconhecimento de que através dela nós criamos sentidos, nos entendemos e
temos um acordo para nossa existência de modo compreensivo.

O esforço que fazemos para enunciar o passado de maneira a ter algum significado para quem
enuncia e o apreende está ligado à própria visao que se possui de História.
Não podemos esquecer que nossas matrizes de pensamento da escrita da História moderna,
científica, são eurocentradas.

Entretanto, com uma proposta não disciplinar, a UFABC tem a oportunidade de oferecer uma
formação em história que dê conta das multiplicidades de atores , espaços e experiências que
estiveram invisibilizados por séculos.
Na concepção de Aníbal Quijano, a ideia é não tomar mais a racionalidade ocidental como
parâmetro, ignorando-a inclusive para nos contrapormos a ela.
Nessa chave, a epistemologia europeia é mais uma forma de ver o mundo entre outras,
diferente dos saberes tradicionais nativos sobre suas experiências no fluxo do tempo, seus
modos de registro e de enunciação de suas ações.
Que as matrizes eurocentradas sejam ensinadas em nossas universidades e sobretudo
criticadas, desnudando a destituição de racionalidade que os povos nativos da América e dos
reinos africanos, aqui exterminados e escravizados, sofreram.

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