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Profª.Drª.

Marilene Nunes

UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ


INSTITUO DE CIÊNCIAS EXATAS
FACULDADE DE QUÍMICA

ESTEREOQUÍMICA

Definição: é a parte da química que estuda os compostos que diferenciam-se pelo arranjo espacial de seus
átomos ou grupos de átomos, portanto, está voltada para o estudo dos estereoisômeros (isômeros espaciais).

Para uma melhor análise dos diferentes estereoisômeros é comum escrever suas estruturas em perspectiva
ou usando projeções. Estas diferentes formas de representar os compostos estão mostradas abaixo:

Perspectiva
Projeção de Newman
Projeção de Fisher

O conhecimento desta parte da química é importante na compreensão de propriedades físicas das moléculas,
no curso e no mecanismo de reações, na espectroscopia, nas características fisiológicas que possuem entre
outros fatores.

A estereoisomeria pode ser dividida em: estereoisomeria conformacional, estereoisomeria geométrica e


estereoisomeria enantiomérica (ótica). Estas duas últimas também são chamadas de estereoisomeria
configuracional.

A seguir definições e características de cada uma dessas formas de estereoisomeria.

1) ESTEREOISOMERIA CONFORMACIONAL

Esta parte da estereoisomeria é caracterizada por isômeros que interconvertem-se por rotação em torno de
ligações simples. Esses isômeros são chamados de confôrmeros e em geral são analisados em um tipo de
projeção chamada projeção de Newman.

Para uma molécula como a do butano a rotação em torno da ligação C2-C3, varia de um ângulo de 0° - 360°.
Em rotações de 0°, 120°, 240° e 360° diz-se que os arranjos espacias entre os átomos corresponde a uma
conformação em coincidência, já com rotações de ângulos de 60°, 180° e 300º a conformação é dita em
oposição/ Gauche. As conformações em oposição podem ainda ser divididas em vici e anti.

A conformação vici (Gauche) é caracterizada por apresentar grupos volumosos separados por um ângulo de
rotação de 60° e tem um conteúdo energético superior àquele observado para moléculas que estão em
conformação anti. O conteúdo energético elevado é atribuído a elevada repulsão de Van der walls entre os
grupos volumosos.

Em uma conformação anti, os grupos volumosos estão separados por um ângulo de 180°, por este motivo as
repulsões de Van der walls são menores, consequentemente, moléculas em conformação anti possuem
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conteúdo energético inferior às moléculas em conformação vici (Gauche). Com base nos diferentes conteúdos
energéticos das conformações vici (Gauche) e anti pode-se dizer que quando uma molécula assume a
conformação anti esta é mais estável que quando em uma conformação vici, que por sua vez é mais estável
que confôrmeros em conformação em coincidência.

Abaixo os isômeros conformacionais do butano e um diagrama de energia rotacional representativa para as


diferentes conformações.

O ciclohexano também é um hidrocarboneto que existe em diferentes conformações: são as formas cadeira,
bote e bote torcida, onde a conformação cadeira é mais estável que as demais, pois na conformação bote há
hidrogênios em coincidência.

Nas conformações do ciclo hexano, os hidrogênios são chamados de axiais e equatoriais conforme mostrado a
seguir:
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Quando o ciclohexano encontra-se em conformação do tipo cadeira os seus átomos estão todos em oposição
do tipo vici (separados por um ângulo de 60º), enquanto que na conformação bote, há átomos em
coincidência e esta não é uma condição para todos os átomos, como mostra as estruturas em perspectiva e
projeção de Newman abaixo:

O fato de se ter átomos em coincidência na conformação bote, justifica sua menor estabilidade frente à
conformação cadeira.

Derivados do ciclo hexano, como o metil-ciclohexano, também apresentam-se na forma de confôrmeros e


vale ressaltar que os substituintes em posição equatorial conferem maior estabilidade ao confôrmero que em
posição axial. Abaixo, a representação do equilíbrio entre os dois isômeros do metilciclohexano, assim como a
justificativa para as diferentes estabilidades:
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Vale ressaltar que isômeros conformacionais, tais como, metil-ciclohexano e os do butano, não podem ser
isolados, já que as barreiras de energia envolvidas nas interconversões são pequenas.

2) ESTEREOISOMERIA GEOMÉTRICA

Diferentemente da estereoisomeria conformacional, a geométrica estuda os isômeros espaciais que não


interconvertem-se, a não ser, por rompimento de ligações seguida da formação de novas ligações.

A estereoisomeria geométrica é observada em compostos cíclicos e compostos com duplas ligações. O que
determina a existência de diferentes formas isoméricas é a substituição nos carbonos da ligação dupla ou nos
carbonos do ciclo dos diversos compostos. Esse tipo de isomeria não será possível se um dos dois átomos de
carbono que formam a ligação dupla ou aqueles que se ligam aos hidrogênios ou outro substituinte nos
compostos cíclicos contiver dois grupos idênticos.

De acordo com as diferentes substituições os isômeros geométricos estão classificados em: CIS, TRANS, E e Z.

Os estereoisômeros do tipo CIS são aqueles que contêm substituintes idênticos em ambos os carbonos da
dupla ou do ciclo em um mesmo plano e serão TRANS se estiverem em planos opostos.

Segue abaixo os isômeros CIS e TRANS do but-2-eno e 1,2 – dimetilciclopentano.

As classificações E e Z são geralmente utilizadas, quando os isômeros geométricos não possuem substituintes
comuns aos carbonos da dupla ou do ciclo. Por definição, o estereoisômero geométrico Z é aquele em que os
substituintes de maior prioridade dos carbonos da dupla ou do ciclo estão em um mesmo plano e E se estão
em planos opostos.

A prioridade mencionada acima está baseada no número atômico dos substituintes e segue as regras de Cal-
Ingold –Prelog. Quanto maior o número atômico, maior a prioridade de determinado substituinte.

Os exemplos abaixo listram o enunciado acima:

Os estereoisômeros geométricos possuem propriedades físicas e químicas diferenciadas e podem ser


separados por métodos de separação convencionais. A seguir, uma breve discussão de algumas propriedades.
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No que se refere à solubilidade, os estereoisômeros CIS e TRANS de alquenos, assim como os demais
alquenos, possuem solubilidades semelhantes aos dos alcanos de peso molecular semelhante. Porém, ao
contrário dos alcanos, certos alquenos, como por exemplo, os CIS alquenos, são fracamente polares. Em
função da pequena polaridade dos CIS alquenos, estes possuirão maiores pontos de ebulição comparados aos
valores registrados para os TRANS alquenos, que por sua vez são apolares.

H3C H H3C H H3C H


C µ = 0,35 D C µ = 0,40 D Cµ = 0D

C C C
H H H3C H H H3C

Ao analisar os calores de hidrogenação para os isômeros CIS e TRANS, observa-se


que um maior conteúdo energético para os CIS alquenos. A partir desta observação ficou estabelecido que os
isômeros TRANS são mais estáveis que os isômeros CIS. O maior conteúdo energético medido para os CIS
alquenos é função da interferência dos dois substituintes volumosos que criam uma compressão estérica
aumentando a tensão de Van der Walls.

3) ESTEREOISOMERIA ÓTICA

Da mesma forma que os estereoisômeros geométricos, os estereoisômeros óticos não convertem-se uns nos
outros e diferentemente dos estereoisômeros geométricos, os óticos, mais comumente chamados de
enantiômeros, possuem propriedades físicas idênticas, exceto a de rotação da luz polarizada que se dá de um
mesmo ângulo, porém em sentidos opostos.

Os estereoisômeros óticos ou enantiômeros são caracterizados por possuírem assimetria molecular e por este
motivo guardam uma relação íntima entre si: são imagens especulares não superponível um do outro.
Moléculas que possuem esta propriedade são ditas quirais. Quiralidade é a condição necessária e suficiente
para a existência de enantiômeros. Todas as moléculas quirais têm enantiômeros e são oticamente ativas.

O termo oticamente ativo está relacionado com a capacidade das substâncias quirais provocarem um desvio
do plano da luz polarizada. Por outro lado, moléculas aquirais são oticamente inativas, superpõem-se as suas
imagens e não formam pares de enantiômeros.

A presença de um carbono assimétrico (um átomo de carbono que está ligado a quatro substituintes
diferentes) indica usualmente uma molécula quiral. Um átomo de carbono ou qualquer outro átomo que
possua quatro substituintes diferentes ligados a eles é chamado de centro assimétrico ou centro
estereogênico. Nenhuma molécula ou conformação molecular que possua um plano de simetria é quiral.

A existência de um centro assimétrico e formação de pares de enantiômeros pode ser observada para a
molécula do 2 – cloro – butano.

O átomo de carbono 2, por ser um centro assimétrico confere


quiralidade a molécula do 2 – cloro-butano, consequentemente, este
produz uma imagem especular não superponível e assim, na natureza
encontra-se dois isômeros enantioméricos para esta molécula, como
esquematizado ao lado.
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Os enantiômeros que provocam um desvio do plano da luz polarizada para a direita são chamados de
dextrórrotatório ou dextrógiro e aqueles que provocam o desvio no sentido inverso são chamados de
levorrotatório ou levógiros e experimentalmente essa é a maneira mais comumente utilizada para diferenciar
os enantiômeros.

Se dois enantiômeros são misturados em quantidades equimoleculares obtem-se uma mistura racêmica que é
oticamente inativa, já que cada enantiômero cancela o desvio que o outro isoladamente provocaria.

Para moléculas com mais de um centro assimétrico, vários estereoisômeros são possíveis. O número total de
estereoisômeros possíveis, com dois ou mais centro assimétricos é 2 n, onde n é o número de centros
assimétricos não identicamente substituídos.

Esse enunciado pode ser exemplificado com a molécula do 3 – bromo – butan – 2- ol, que por possuir 2
centros assimétricos se apresentará na natureza na forma de 2 pares de enantiômeros.

Da mesma forma que o 3 – bromo – butan – 2 - ol possui dois centros assimétricos o 1,2 –
dibromociclopropano também o possui, porém enquanto são observados quatro enantiômeros para o 3 –
bromo - butan - 2 – ol para o 1,2 – dibromo – ciclopropano são observados apenas dois, além de um terceiro
estereoisômero chamado MESO.

O MESO é um estereoisômero caracterizado por possuir uma imagem especular superponível, isto porque a
estrutura configuracional assumida confere-lhe um plano de simetria e, por conseguinte, compostos MESO
serão oticamente inativos.

O MESO do 1,2 – dibromo - ciclopropano guarda uma relação com os dois outros enantiômeros chamada
diastereoisomérica, pois diastereoisômeros são isômeros configuracionais que não são imagens especulares
um do outro. Um exemplo claro de uma relação diastereoisomérica é a relação entre os isômeros CIS e TRANS
do buteno, que por não serem imagens um do outro, são ditos diastereoisômeros.

REPRESENTAÇÃO E NOMENCLATURA DE ESTEREOISÔMEROS ÓTICOS

Uma das formas mais simples de se representar os estereoisômeros óticos é por meio da chamada projeção
de Fisher. De acordo com este tipo de representação, as linhas horizontais são imaginadas para cima do plano
da página, enquanto que as verticais estão direcionadas para baixo. Usando projeções de Fisher, torna-se
simples decidir se um par de compostos representa ou não um par de enanciômeros.
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Uma outra forma de diferenciar os estereoisômeros óticos é atribuir-lhes um sistema de nomenclatura que
expresse a configuração dos centros assimétricos de tais isômeros.

Para assinalar a configuração de um centro assimétrico dispõem-se das configurações relativas (L ou D, SIN e
ANTI e ERITRO e TREO), as primeiras a ser utilizadas, e as configurações absolutas (R e S) as que são
atualmente utilizadas.

A configuração absoluta é um tipo de classificação que especifica a ordem dos átomos, determinando os
enantiômeros e sua quiralidade. As atribuições das configurações R e S são feitas da seguinte maneira:

 Os átomos ou grupos de átomos ligados diretamente ao centro assimétrico são ordenados e


numerados de acordo com o número atômico, começando pelo de maior número atômico para o de menor.

 Se houver empate, a prioridade é determinada no ponto de diferença mais próximo.

 No caso de existirem dois substituintes isótopos, terá prioridade o de maior número de massa.

O composto então numerado pode ter:

 Configuração R (rectus = direita) – quando a seqüência dos números se dá em sentido horário.

 Configuração S (sinester = esquerda) – quando a seqüência dos números se dá em sentido anti


horário.

Um exemplo desse modelo de atribuição de configuração está mostrado abaixo para o butan – 2 – ol.

Além dos compostos, cujos centros assimétricos são átomos de carbono, compostos contendo heteroátomos
também exibem estereoisomerismo enantiomérico, como por exemplo, fosfinas, sais de sulfônio e sulfóxidos.
Compostos de silício e sais de amônio também podem exibir esse tipo de estereoisomeria.

O estereoisomerismo enantiomérico pode ainda, ser observado em compostos que não possuem centros
assimétricos ou centros quirais.

Um dos principais casos para que o estereoisomerismo seja observado é a rotação que origina planos
dissimétricos e perpendiculares. Esse tipo de comportamento é observado em compostos bifenílicos com
substituintes volumosos em posição orto, em certos espiranos substituídos, certos alenos e
alquilidenoscicloalcanos.
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Os exemplos que ilustram cada uma dessas situações está ordenadamente apresentada abaixo:

A grande relevância no estudo da estereoquímica pode-se dizer que está nas diferentes ações fisiológicas que
cada substância quiral desenvolve. Nesse sentido, inúmeros exemplos podem ser citados e alguns estão
comentados como segue:

 Metildopa é um medicamento, cujo principio ativo é uma molécula quiral e por tanto pode ser
encontrada nas duas formas enantiomérica o R e o S, porém o efeito anti hipertensivo é devido somente ao
isômero S.

 A penicilina também é um medicamento cujo principio ativo é quiral. Enquanto o isômero S é um


agente altamente potente contra artrite crônica primária o isômero R não tem ação terapêutica e á altamente
tóxico.

Essa diferença de ação fisiológica observada se dá em função dos sítios receptores dos diferentes organismos
que também possuem configurações específicas. Esta constitui a razão pela qual as indústrias farmacêuticas
buscam cada vez mais a produção de drogas com pureza ótica elevada.

Além desses exemplos, muitos outros são possíveis, sem que necessariamente as moléculas quirais tenham
ação medicamentosa, como por exemplo, os isômeros do limoneno, isômeros da adrenalina, asparagina,
entre muitos outros que possuem ação diferenciada.

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