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ENTREVISTA E
ACONSELHAMENTO
PSICOLÓGICO
O terapeuta
como pessoa
Gleison Gomes da Costa
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
O profissional que trabalha com atendimento terapêutico é alguém que passou
por longa e sólida formação acadêmica e prática e cujo trabalho é pautado pela
ética e pela ciência. No entanto, antes disso, ele é uma pessoa, que, como tal, tem
sentimentos, emoções e crenças, que vivencia dias bons e dias ruins, que adoece,
ou seja, é um ser humano como qualquer outro.
Ter consciência disso é muito importante para o terapeuta, que deve compreen-
der que, para além de seu conhecimento técnico e teórico, é fundamental investir
em seu autocuidado. Esse é um entendimento necessário também ao paciente,
que deve estar consciente de que o terapeuta não detém todas as respostas e
não está destinado a obter sucesso em suas intervenções.
Um dos segredos para o estabelecimento de relações terapêuticas saudáveis e
duradoras consiste no terapeuta se permitir ser vulnerável e estabelecer relações
de intimidade com seus pacientes, pois esta tem grande influência no estabele-
cimento de relações de confiança, tão importantes para o processo.
2 O terapeuta como pessoa
Rígidos Flexíveis
Ativos Receptivos
Próximos Distantes
É importante que o terapeuta tenha em mente que ele vai para o seu setting
de trabalho com todas as suas características individuais (sentimentos, emo-
ções, traços de personalidade, crenças e convicções), mas que o ator central
da prestação do serviço psicológico será a pessoa que procura ajuda. Sendo
assim, ele não deve permitir que suas questões ou características pessoais
induzam as questões e os problemas do seu paciente, como expresso no Código
de Ética Profissional do Psicólogo (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005,
p. 9), segundo o qual é vedado ao psicólogo “[...] induzir a convicções políticas,
filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer
tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais”.
Em síntese, portanto, o terapeuta deve reconhecer suas características
individuais e compreender como elas podem se apresentar no setting tera-
pêutico, cuidando para que elas não interfiram negativamente no processo.
No entanto, como expõe Mota (2017), é fundamental que o terapeuta também
atente para o autocuidado, promovendo sua própria saúde, sua qualidade de
vida e seu bem-estar integral, a fim de estar capacitado para ajudar outras
pessoas. Para cuidar de si, é importante que o terapeuta faça terapia, o
que lhe possibilitará conhecer a si mesmo e trabalhar questões que podem
estar se misturando com as dos seus pacientes. Também são alternativas
interessantes para promover o autocuidado a meditação e a prática de ativi-
dade física, que, entre outros benefícios, ampliam suas conexões sociais e o
compartilhamento de momentos de intimidade. De maneira geral, o terapeuta
deve compreender que o autocuidado é uma forma ética e responsável de
iniciar o cuidado com o outro.
O terapeuta como pessoa 5
Foi somente nos últimos anos que as duas ficaram mais afastadas, o que
se deveu à dedicação de Juliana ao curso de psicologia e de Mariana aos seus
filhos e à família.
Ao saber que a amiga havia se tornado psicóloga, Mariana decidiu procurar
Juliana para iniciar um processo terapêutico, pois julgou que seria muito mais
fácil conversar com sua amiga de longa data. Porém, Juliana disse para a amiga
que precisaria avaliar se poderia ou não realizar o atendimento, já que não
podia atender parentes e pessoas próximas. Mariana falou que, por ela, não
havia problema e que aceitaria.
Após muito refletir, Juliana optou por não atender a amiga, pois sabia que
as questões pessoais iriam surgir e ela não conseguiria desempenhar de forma
adequada seu papel profissional. Comunicou isso à Mariana e a encaminhou para
outro profissional. Porém, Mariana, sem compreender muito bem a situação,
ficou chateada com Juliana e decidiu não mais fazer terapia.
Nesse exemplo, é interessante atentar para o fato de que Juliana falou à
amiga que iria avaliar a situação. Isso porque não existe vedação legal para
realizar ou não esse tipo de atendimento. É necessária, portanto, uma análise
pessoal do terapeuta, que deve considerar o seu Código de Ética.
Referências
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Leituras recomendadas
CALLIGARIS, C. Cartas a um jovem terapeuta: reflexões para psicoterapeutas, aspirantes
e curiosos. São Paulo: Planeta, 2019.
OLIVEIRA, N. H. Como se estabelece a aliança terapêutica em situações de psicoterapia
obrigatória? 2013. 91 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica) — Universidade
do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2013.