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Alberto Caeiro

«Se, depois de eu morrer»

1. Alberto Caeiro rejeita a racionalização das emoções, tendo como base e ideologia de
vida uma expressão quase instintiva dos pensamentos. Este seu objetivismo, marcado
pelo sensacionismo inerente à sua poesia, advém da sua rejeição de pensamentos
metafísicos e da autoconsciência. Esta forma de encarar a vida pode ser comprovada
em versos como “Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento. /
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais”.
a. Alberto Caeiro dá primazia aos sentidos, à expressão quase instintiva dos
pensamentos, tendo a “visão” como sentido eleito.
b. Ao utilizar as formas do verbo “compreender”, ainda que para explicitar a
recusa da racionalização e da autoconsciência, acaba por revelar uma atitude
cerebral e filosófica, que contrasta com a sua recusa a filosofias e
pensamentos metafísicos.
2. As vivências sensoriais descritas pelo sujeito poético, em que a racionalização dos
pensamentos e sentimentos é excluída, pode ser equiparada à ingenuidade de uma
criança, que apenas compreende e absorve o mundo através dos seus sentidos, por
não ter capacidade de racionalizar o mundo a seu redor.
3. Alberto Caeiro é caracterizado pela sua expressão instintiva dos sentimentos, sem
recurso a racionalizações ou pensamentos metafísicos. O poeta bucólico é
considerado, por isso, um “Mestre” de Fernando Pessoa ortónimo e dos restantes
heterónimos por não procurar um sentido para a sua existência: a realidade jaz no que
é apreendido pelos 5 sentidos. Assim, e por viver no momento, já que é apenas no
presente que os nossos sentidos existem, todos os dias são seus.

«Sou um guardador de rebanhos»

1. Versos 1 a 8
2. A metáfora “Sou um guardador de rebanhos” institui o sujeito poético como um ser
natural, bucólico. A associação deste verso com os seguintes (“O rebanho é os meus
pensamentos/E os meus pensamentos são todos sensações”) enfatiza o carácter
sensacionista do “eu” lírico, que tem como base a recusa dos pensamentos
metafísicos.
A enumeração das sensações nos versos seguintes (“Penso com os olhos e com os
ouvidos/E com as mãos e os pés/E com o nariz e a boca.”) reforça o primado das
sensações como meio de apreensão da realidade, em que há uma plena recusa da
racionalização da emoção.
3. Para Alberto Caeiro, poeta bucólico e sensacionista, a vida decorre no presente já que
os sentidos com que é possível apreender a realidade apenas existem no momento em
que vivemos, não no passado e não no futuro. Assim, a realidade jaz no mundo
apreendido de acordo com os nossos 5 sentidos, o que justifica o verso “Sinto todo o
meu corpo deitado na realidade”. Assim, e por saber a “verdade”, ou seja, que
pensamentos metafísicos e a racionalização das emoções não correspondem à
realidade, “Sei a verdade e sou feliz”.
4. A rejeição da racionalização intelectual é complementada pela recusa a estéticas
literárias, sendo a sua poesia assim marcada por irregularidade métrica, estrófica e
rimática.
«Acho tão natural que não se pense»

1. Enquanto sensacionista, o sujeito lírico ridiculariza “gente que pensa”, já que tem
como característica mais hiperbólica a sua posição antifilosófica de rejeição da
intelectualização dos sentimentos. A importância desta estrofe está, efetivamente, na
instituição do sujeito poético como alguém que não pensa: sente.
2. Alberto Caeiro é caracterizado por uma constante recusa do pensamento, da
intelectualização, e da primazia das sensações como meios de apreensão da realidade.
No entanto, nos versos 7 e 8 o sujeito poético revela a sua preocupação com a “gente
que pensa” (“Pergunto-me às vezes isto até dar por mim/A perguntar-me cousas…”) o
que é contraditório à sua índole de rejeição metafísica. Assim, os versos 8 e 9
decorrem do seu desagrado ao se aperceber que, contrariamente ao que defende,
estava a pensar.
3.
a. As interrogações retóricas decorrem da tentativa de afastamento do sujeito
lírico do ato de pensar, que revela uma grande indiferença face a essa
problemática

«Como quem num dia de verão abre a porta de casa»

1. Alberto Caeiro é caracterizado pela sua expressão quase instintiva das sensações,
como recusa total dos pensamentos metafísicos e da racionalização dos sentimentos.
Nos versos 5 e 6, o sujeito lírico revela-se “confuso, perturbado” por ter tentado
perceber o que sentiu, contrariamente ao que tão amplamente defende. Assim, as
interrogações retóricas que surgem nos versos 7 e 8 enfatizam a sua angústia e
perturbação, a sua desorientação, como forma de fazer o “eu” lírico regressar ao seu
estado natural: a apreensão da realidade a partir dos seus 5 sentidos, sem recorrer ao
pensamento
2. A personificação presente nos versos “Quando o verão me passa pela cara/A mão leve
e quente da sua brisa,” realça a importância dos sentidos na apreensão da realidade
para o sujeito poético. Está também ao serviço da instituição do “eu” lírico como um
ser natural, bucólico, intimamente conectado à Natureza. A personificação estabelece,
ainda, a sensação como único meio de verdadeira apreensão da realidade.
3. Estes versos sintetizam o sensacionismo de Alberto Caeiro, sugerindo, assim, que a
única forma de apreensão da realidade é através dos nossos sentidos. Desta forma,
esta é a sua última tentativa de recusa dos pensamentos metafísicos no poema, tendo
como base a sua plena integração na Natureza

Ricardo Reis

«Ao longe os montes»

1. O sujeito poético estabelece uma relação de plena harmonia com a Natureza,


integrando-se nela como se nela pertencesse. A relação entre o sujeito poético
enfatiza a sua resignação às emoções fortes, atingindo um estado de apatia e
consciência da efemeridade da vida.
2. A filosofia de Ricardo Reis baseia-se nos ideais de estoicismo e epicurismo. Aceitando a
efemeridade da vida e a inexorabilidade da morte, o sujeito poético resigna-se a uma
atitude de plena ataraxia, evitando emoções fortes e excessivas, encontrando, assim,
um estado de plena harmonia e tranquilidade sem quaisquer perturbações. O adjetivo
“Solenes” e o advérbio “levemente” presentes no verso 10, realçam este mesmo
sentimento de aceitação da inevitabilidade da morte, enfatizando a importância dos
prazeres simples da vida.

«Vem sentar-te comigo, Lídia»

1. Versos 1 e 2: a efemeridade da vida; versos 3 e 4: a inutilidade de compromissos;


versos 5 e 6: a busca da tranquilidade; versos 7 e 8: a ausência de perturbação face à
morte
2.
a. O sujeito poético decide desenlaçar as suas mãos às de “Lídia” (“Desenlacemos
as mãos”). Tendo em vista a efemeridade da vida e a inexorabilidade da
morte, o sujeito poético acaba por optar por uma vida tranquila, alheia a
sentimentos excessivos ou muito intensos, baseada na ataraxia, isto é,
tranquilidade sem perturbação. Assim, o sujeito lírico opta por se desfazer de
compromissos, como forma de evitar a dor. Acaba, assim, por assistir
“tranquilamente” à passagem do rio, evitando, com isto, emoções
hiperbólicas.
b. Ricardo Reis baseia a sua filosofia de vida nos ideais greco-latinos de
estoicismo e epicurismo. Assim, aceitando a inexorabilidade da morte e
tomando consciência da efemeridade da vida, o sujeito poético rejeita
qualquer emoção excessiva, vivendo em plena ataraxia, isto é, tranquilidade
sem perturbações. Vive de uma apatia emocional e uma indiferença pela
morte, aceitando, assim, os prazeres simples da vida sugeridos pelo ideal
“carpe diem”. É de forma a enfatizar esta recusa a excessos e sentimentos
intensos que as negações surgem na 2.ª e na 3.ª estrofes, negando, com isto,
os excessos da vida.
3. Ricardo Reis baseia a sua filosofia de vida nos ideais greco-latinos de estoicismo e
epicurismo. Desta forma, incorpora um estado de plena ataraxia, ou seja,
tranquilidade sem perturbações, consciencializado da efemeridade da vida e da
inexorabilidade da morte. Assim, rejeita emoções ou sentimentos extremos, aceitando
um estado de apatia emocional sem, no entanto, deixar de procurar uma felicidade
relativa através dos prazeres simples. Tal rejeição dos excessos da vida está expressa
nestas estrofes, através de versos como “Amemo-nos tranquilamente”, “Mais vale
estarmos sentados ao pé um do outro”, “Este momento em que sossegadamente não
cremos em nada”.
4. Consciencializado da inexorabilidade da morte e da efemeridade da vida, o sujeito
poético rejeita qualquer tipo de emoção intensa como forma de evitar a dor.

«As rosas amo»/«De uma só vez recolhe»/«Segue o teu destino»

1.
a. O uso do vocativo, como em “Essas volucres amo, Lídia, rosas”, de modos
imperativo e conjunto, como em “De uma só vez recolhe” e as frases
declarativas, como em “As rosas amo dos jardins de Adónis” estão ao serviço
do tom moralista presente na poesia de Ricardo Reis.
«Não consentem os deuses mais que a vida»

1. Na sua poesia, Ricardo Reis serve-se de um tom moralista e coloquial para explicitar a
sua filosofia de vida. Assim, assume uma atitude normativa perante os ideais que
invoca, tendo sempre em vista a efemeridade da vida e a inexorabilidade da morte.
2. Os “píncaros” simbolizam os excessos da vida humana, as emoções intensas. Através
da expressão “Tudo pois refusemos, que nos alce/A irrespiráveis píncaros,” o sujeito
poético reforça a necessidade de rejeição dos excessos e a aceitação de uma vida
plena, marcada pela ataraxia, isto é, tranquilidade sem perturbações. Segundo o
sujeito lírico, ao evitarmos emoções intensas, boas ou más, evitamos dores também
intensas: a resignação à inexorabilidade da morte evita o sofrimento do compromisso.

Álvaro de Campos

«Ode Triunfal»

1. A reprodução do ambiente moderno e urbano, bem como a exaltação exacerbada das


máquinas e da turbulência da tecnologia enfatizam a dinâmica conturbada e intensa
dos tempos contemporâneos
2. O sujeito poético descreve o meio em que se encontra relacionando-o com a realidade
que o rodeia.
3. O sujeito poético encontra-se numa fábrica
a. A metáfora presente no verso 32 (“Desta flora estupenda, negra, artificial e
insaciável”) põe em paralelo a Natureza com a vida mecânica, sendo a última a
mais verdadeira, a mais pura, por corresponder aos tempos modernos
b. O ambiente provoca no sujeito lírico “febre”.

«Lisbon revisited (1923)»

1. O sujeito poético menciona o seu individualismo, a sua independência em relação aos


estigmas e normas da sociedade. Impaciente com as faces rotineiras da vida, critica a
passividade da sociedade, aceitando a sua condição de antissocial. Saturado da ciência,
da modernidade, do futurismo, vira-se para a infância onde encontra a verdadeira
felicidade que passou a vida a procurar.
2. O verso surge como uma repudia do sujeito poético à resignação da sociedade perante
as normas passivamente aceites pelas pessoas em geral. Assim, reforça o seu
individualismo e condição antissocial, de recusa das normas impostas.
3. As duas últimas estrofes invocam os tempos da infância do sujeito poético com um
sentimento de devota nostalgia. O regresso a Lisboa procura reencontrar o seu
passado tranquilo, seguro, mas depara-se com um enorme sentimento de tristeza e
abatimento, desamparo e angústia. Assim, o sujeito poético liga-se à única verdade: o
passado não regressa, a única conclusão é morrer.
4. A existência de um interlocutor a quem o sujeito poético se dirige, a utilização do
modo conjuntivo, de valor imperativo, e as frases interrogativas.

Página 199

1. O sujeito poético absorve a Natureza e a realidade em que se insere através dos seus 5
sentidos, privilegiando a visão. De facto, esta sua perceção da Natureza é física e não
intelectual ou racionalizada. Tal, pode ser comprovado através de versos como “(…)
bate-me a Natureza de chapa”.
2. Alberto Caeiro recusa a racionalização dos sentimentos e emoções: a realidade só
pode ser apreendida através dos 5 sentidos. Assim, e derivado do seu total objetivismo
e sensacionismo, de grande rejeição por qualquer intelectualização emocional, as
perguntas retóricas presentes na segunda estrofe enfatizam a sua renúncia ao
pensamento. Demonstra, por isso, o seu desagrado consigo mesmo, por ter tentado
“perceber” a Natureza que ele “espreita”, ou seja, por ter caído no erro da tentativa de
racionalizar o que os seus sentidos lhe revelavam.
3. A personificação a que o sujeito poético recorre nos versos 9 e 10 enfatizam o
contacto físico e não psicológico com o real que Alberto Caeiro descreve nos seus
poemas. Assim, e para provar que a verdade só pode ser apreendida através dos seus
sentidos e não pela racionalização do observável, o sujeito lírico aponta o contacto
direto que a Natureza tem consigo, já que “o verão me passa pela cara/a mão leve e
quente da sua brisa”. Instituindo, com isto, uma relação física com a realidade, o “eu”
lírico renuncia ao pensamento, à necessidade de intelectualização do mundo que o
rodeia.

Página 201

1. O sujeito poético encara a Natureza através de uma perspetiva contemplativa, sem ter
um papel direto que influencie o mundo a seu redor. Esta atitude surge de uma total
consciência pela inexorabilidade da morte e efemeridade da vida, que levam o sujeito
lírico a rejeitar os excessos da vida, as emoções fortes e intensas que pudessem
causar-lhe sofrimento ou angústia. Assim, com o objetivo de atingir a plena ataraxia,
ou seja, tranquilidade sem qualquer perturbação, o “eu” poético senta-se a observar a
paisagem tranquilamente, livre de emoções fortes, vendo passar o tempo calmamente
e aceitando a inevitabilidade da sua morte.
2. A filosofia de Ricardo Reis é caracterizada pela plena consciência da efemeridade da
vida e da inexorabilidade da morte através de um tom moralista, que persuade a viver
na busca da ataraxia, ou seja, tranquilidade sem perturbações. Nesta linha de
pensamento, o sujeito poético interpela a Neera e evoca o seu desejo de não desejar,
isto é, a sua renúncia a emoções excessivas, a sentimentos que não plenitude e
tranquilidade. Ao aceitar a sua condição de mortal, o sujeito poético procura ausentar-
se de qualquer sofrimento; afinal, sem as paixões não virão os desgostos, sem a
felicidade não virá a tristeza.

Página 202

1. O poema é uma clara apologia ao moderno e ao tecnológico, numa expressão efusiva


de entusiasmo e excitação pelos avanços do mundo contemporâneo.
2. O sujeito poético revela-se eufórico, estasiado, incomparavelmente obcecado pelas
“máquinas”, pelo moderno e pela tecnologia. “Tenho febre e escrevo”, verso que
sintetiza as fortes emoções que o cosmopolitismo desenvolve no sujeito lírico.
Caracterizado por um notório sentido de masoquismo e sadismo, o sujeito poético
revela, de forma contraditória, o desconforto que o ambiente lhe provoca e, ainda
assim, o seu entusiasmo e felicidade com o que o rodeia. Revela o seu desejo de plena
integração com as máquinas, estimulado pelo barulho da tecnologia que o cerca

Página 203,

1. Alberto Caeiro, heterónimo sensacionista e bucólico marcado pelo objetivismo,


defende a recusa da intelectualização dos sentimentos; afinal, a sua devota tentativa
de integração total na Natureza é fruto da primazia que este heterónimo dá aos seus 5
sentidos, como único verdadeiro meio de apreensão da realidade. Assim, a
comparação utilizada no primeiro verso enfatiza a profunda conexão do sujeito
poético com a Natureza, bem como a naturalidade da sua apreensão, sem recurso ao
seu intelecto.
2.

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