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EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DO ESTADO PARANÁ

(LUCAS VINICIUS BECKER LIMA, advogado regularmente inscrito


na OAB/PR sob o número OAB/PR 114.693, com endereço profissional situado à
Rua Antônio Barbosa Ferraz Junior, 44, Bairro Portão, Curitiba, Paraná, CEP 81350-
270, vêm perante está Egrégia Corte, com fundamento no artigo 5º, LXVIII, da
Constituição Federal, cominado com o artigo 647 e seguinte do Código de Processo
Penal, impetrar uma ordem de

HABEAS CORPUS

em favor do Paciente (...), contra sentença exarada pela Juiza de Direito da (...)
Vara Criminal da Comarca de (...), que indeferiu, injustificadamente, o pedido de
RELAXAMENTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, sob a alegação de que o auto de prisão
estava totalmente regular, e que o crime imputado, é de natureza hedionda,
caracterizando inequívoco constrangimento ilegal contra o status libertatis do
Paciente, sanável com o presente instituto do habeas corpus com fulcro no artigo
648, I e V do Código de Processo Penal combinado com artigo 5ª LVII, LXVI e
LXVIII da nossa Carta Magna.

DOS FATOS

Conforme documentos em Apenso, (...) o Requerente, foi ilegalmente


preso e autuado em flagrante delito sob a pretensa acusação de ter infringido o
disposto no artigo 213, do Código Penal.

O fato ilícito atribuído ao Requerente ocorreu às (...) horas do dia


(...) do corrente ano, sendo que foi preso em seu local de trabalho por volta das
(...) horas, sem que houvesse qualquer tipo de perseguição ou encontrado de
posse de instrumentos, armas, objetos ou papéis que fizessem presumir ser ele
autor da infração.

É curioso que o Representante da vítima, (...), diz ter sido informado


do fato às (...) horas quando ainda estava em (...), e prestou suas declarações, no
auto de prisão em flagrante (...) minutos após, aqui em (...), vez que no preâmbulo
daquele termo consta que foi iniciado às (...) horas, o que denota que o horário
correto tanto da prisão quanto da lavratura do auto é aquele contido na Nota de
Ciência das Garantia Constitucionais assinado pelo autuado, pois este constitui ato
preparatório daquele.

O Requerente possui endereço certo nesta cidade, exerce profissão


lícita, sendo tecnicamente primário e possuidor de bons antecedentes.

DO DIREITO
Incrustada no pórtico das garantias e direitos fundamentais (art. 5º
LXI CF), está a imperatividade de que o status libertatis de qualquer cidadão não
pode ser suprimido sem que esteja em flagrante delito (art. 302 CPP) ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente.

Edita o artigo 302 do Código de Processo Penal;

Art. 302 - Considera-se em flagrante delito quem: I - está


cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido


ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser
autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas,


objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da
infração.

Consoante o entendimento esposado por nossa melhor doutrina


processual penal, constitui a liberdade física do indivíduo um dos dogmas do Estado
de Direito, sendo natural que a Constituição fixe certas regras fundamentais a
respeito da prisão de qualquer natureza, pois a restrição ao direito de liberdade, em
qualquer caso, é medida extraordinária, cuja adoção deve estar sempre
subordinada a parâmetros de legalidade estrita.

No caso da prisão cautelar, essas exigências se tornam ainda mais


rigorosas, diante do preceito constitucional segundo o qual “ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”
(art. 5.°, inc. LVII, CF); em face do estado de inocência do acusado, a antecipação
do resultado do processo representa providência excepcional, que não pode ser
confundida com a punição, somente justificada em situações de extrema
necessidade.

Além desse postulado fundamental à disciplina da prisão de natureza


cautelar, sobressaem no texto da Lei Maior as garantias da jurisdicionalidade e do
devido processo legal.

Neste parâmetro de imperativos constitucionais, tem-se que o auto


de prisão em flagrante, é sacramental e ritualístico, cujas formalidades exigidas por
lei não podem ser alteradas, invertidas ou omitidas, sob pena de torna-lo
imprestável como instrumento legal de coerção da liberdade individual do cidadão.
Sendo assim, em um primeiro momento sua realização, com relação ao mérito,
deve obedecer as hipóteses definidas nos incisos do artigo 302 do CPP, e, quanto a
forma, a autoridade responsável por sua lavratura, somente poderá fazê-la depois
de obedecidas as condições de procedibilidade, impostas pela lei, dentre elas a
exigência de prévia autorização do ofendido ou seu representante legal, quando o
delito imputado ao conduzido estiver no elenco daqueles cujo início do inquérito
esteja subordinado a representação, nos termos do parágrafo 4º do artigo 5º do
Código de Processo Penal.
Pois bem, o que emerge disso é a conclusão, sob a ótica inquestionável, de que
quando foi encontrado e detido, o Paciente, não estava mais em estado de
flagrância ou quase-flagrância capaz de justificar sua prisão, pois foi preso, várias
horas após o fato, em seu trabalho sem esboçar qualquer atitude denotativa de
fuga pressuposto indeclinável para se chegar ilação que estivesse sendo
perseguido.

Ora, como se sabe de sobejo, o artigo 302, do CPP, preconiza que


alguém só pode ser preso em flagrante delito quando: 1 - está cometendo a
infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela
autoridade, etc .; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, arma, objetos
ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

Embora o lapso temporal entre o fato e a prisão não tenha sido


elástico, o Paciente, em momento algum esteve sob perseguição. Consoante os
ensinamentos de nossa melhor doutrina a perseguição hão de ser realizada em
seguida ao crime, insistente e contínua, de tal sorte que “não tenha o autor, entre
o instante em que efetuou a infração, e o em que é seguro, tido um momento de
tranquilidade, liberto da perseguição, sem haver passado a outra atividade”.
Noutras palavras, que seja seguido, sem solução de continuidade. Ou, como
ensinou Ubaldo Pergola, a prisão em flagrante deve, sem interrupção na
perseguição, ser sucessiva ao crime, ao procedimento ilícito do réu, não influindo,
em absoluto, a sua relação com a verificação do evento consequencial.

Oportuno o exemplo dado pelo mestre Tales Castelo Branco, em sua


obra “Da Prisão em Flagrante”, 3ª Edição, pag. 52, quando leciona:

“Se A fere B, e permanece no local, sem ser preso, porque ninguém deu
importância ao caso; mas, sucede que, horas depois, B falece, por motivo da
lesão, não será possível, então, prender A, em flagrante, como autor do
crime, embora se não tenha afastado do local. C dá uma letra a D, que lhe
entrega a quantia do desconto; D dirige-se ao tabelião e verifica que C
falsificou a firma do avalista; não haverá prisão em flagrante de C embora
tenha acompanhado sempre a D.’

A esse propósito, a boa lição de JÚLIO FABBRINI MIRABETE


(“Processo Penal”, Atlas, SP, 1991, pág. 356).

“Não encontra fundamento algum a crença popular de que é 24h o prazo


entre a hora do crime e a prisão em flagrante, para permitir a captura do
autor do crime. Não tendo havido perseguição logo após o ilícito não é legal
a prisão em flagrante efetuada depois de vários dias, no dia seguinte, ou
mesmo algumas horas após o crime”.

A jurisprudência mais abalizada, vale gizar, é nesse exato sentido:

“Habeas corpus – Estupro – Prisão em Flagrante – invalidade do auto –


Concessão da Ordem. - Não configura quase-flagrante, tampouco o flagrante
presumido, a prisão do presumido autor da prática do estupro que é preso,
em sua residência, várias horas depois da ocorrência delituosa, por
informação e a pedido da mãe da suposta ofendida” (TJPB – HC 96.000845-
1 – Rel. Manoel Taigy Filho)

“Não tendo sido o indiciado surpreendido cometendo a infração penal, ou


quando acabava de cometê-la, e tampouco perseguido em situação que
fizesse presumir fosse o autor de diligências policiais, não há falar em
flagrante delito” (TJSP, RT 568/253). “Prisão em flagrante - Abigeato -
Suínos encontrados abatidos na casa do acusado - Furto que teria ocorrido
12h antes - Inexistência de percepção - Relaxamento - HC concedido -
Inteligência do artigo 302 do CPP. Prisão em flagrante. E ilegal quando não
se enquadra nas hipóteses do artigo 302 do CPP. Concessão da ordem”
(TAPR, Rel. Juiz COSTA LIMA, RT 589/389).

O quadro fático reclama, no caso, a anulação do auto de prisão em


flagrante, pois se ninguém está acima da lei, ninguém, da mesma forma, pode ficar
ao seu desamparo, por pior criminoso que seja.

Flagrante, a rigor, tecnicamente não existiu e, pois, daí, é inevitável


reconhecer-se a arbitrariedade da prisão que pesa contra o Requente, Por isso que,
inocorreu o estado de flagrância, pois a prisão do paciente foi efetivada horas após
o conhecimento, pela autoridade policial, dos fatos atribuídos àquele, sem que
houvesse perseguição ao mesmo, e sem que com ele fosse encontrado qualquer
objeto que o vinculasse ao delito.

Vale ainda dizer que não estão presentes a hipóteses que


autorizariam a custódia cautelar processual, insertas no artigo 312 do Código
Processo Penal, mesmo se tratando de crime de natureza grave, haja vista que se
perdeu na medieva história do direito a figura da prisão preventiva compulsória,
abolida em nosso ordenamento jurídico com o advento da Lei 6.416/77, ainda mais
com o advento da Lei 12.403, de 04.05.2011 - DOU 05.05.2011 que instituiu as
medidas cautelares alternativas à prisão, em nosso ordenamento jurídico, bem
como a moderna escola da ciência criminal adotada pelos nossos Superiores
Tribunais,

“STF.CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL - Tráfico de drogas - Lei nº


11.343/06, artigo 44, caput - Vedação à liberdade provisória -
Inconstitucionalidade (HC 104.339/SP, Plenário, Min. Gilmar Mendes, DJE de
06.12.2012) - Prisão preventiva - Gravidade abstrata do delito -
Fundamento insubsistente - Precedentes.

1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no HC 104.339/SP (Min. Gilmar


Mendes, DJE de 06.12.2012), em evolução jurisprudencial, declarou a
inconstitucionalidade da vedação à liberdade provisória prevista no artigo
44, caput, da Lei nº 11.343/06. Entendeu-se que a vedação apriorística à
concessão de liberdade provisória é incompatível com os princípios
constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, bem
assim com o mandamento constitucional que exige a fundamentação para
todo e qualquer tipo de prisão. 2. Ademais, a gravidade abstrata do delito de
tráfico de entorpecentes não constitui fundamentação idônea para a
decretação da custódia cautelar. Precedentes.
3. Ordem concedida.”

“PROCESSUAL PENAL - Habeas Corpus - Prisão Preventiva - Liberdade


Provisória - Garantia da Ordem Pública - Princípio da Necessidade -
Antecipação indevida da prisão-pena.

1. A prisão preventiva, medida de natureza cautelar, rege-se pelo princípio


da necessidade, pois viola o estado de liberdade de uma pessoa que ainda
não foi julgada e que tem a seu favor a presunção constitucional de
inocência, somente devendo ser decretada em último caso, quando não por
possível a sua substituição por outra medida cautelar (artigo 282, parágrafo
6º. CPP), quando, em face do material informativo dos autos, revele-se
imprescindível como garantir da ordem pública, da ordem econômica, por
conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da Lei
Penal.

2. O paciente, preso em flagrante, apontou endereço certo, é primário e não


registra antecedentes negativos. O indeferimento do seu pedido de liberdade
provisória, em nome da garantia da ordem pública, não contém a adequada
fundamentação. Não basta, como fundamento da decretação da prisão
preventiva, a referência às palavras da Lei, quando enumera os seus
requisitos (artigo 312. CPP); ou a visão e os temores subjetivos do
magistrado de que o acusado voltará a cometer novos crimes. A prisão,
antes da condenação, sem espeque na necessidade fático-jurídica do
cárcere, constitui uma antecipação inconstitucional da prisão pena.

3. Concessão da ordem de habeas corpus. Comparecimento periódico em


juízo e a todos os atos do processo.”

Vale ainda dizer, que o indeferimento do pedido de relaxamento de


prisão, ficou carente de fundamentação, uma vez que não explicita de modo
objetivo quanto a necessariedade da manutenção da prisão cautelar, que é tida
como medida drástica e excepcional, cabível apenas em situações de extrema
relevância.

Na realidade, o que paira contra a pessoa do Requerente, até o


presente momento, é uma mera suspeita da prática de um delito tido como grave,
porém sem nenhuma evidência concreta da realidade da autoria, mormente quando
pela documentação em apenso, percebe-se que se trata de jovem trabalhador, sem
qualquer mácula judicial pretérita, e inexistente qualquer das hipóteses
autorizadoras de sua prisão preventiva inscritas no artigo 311 e 312 do CPP, dando
com isto ampla e irrestrita garantia ao juízo.

DO PEDIDO

Espera o Impetrante, seja a presente ordem de HABEAS CORPUS,


conhecida e deferida, para fazer cessar a coação ilegal de que está sendo vítima, o
Paciente, mandando que se expeça, o competente ALVARÁ DE SOLTURA, cassando
e revogando a prisão processual do Paciente, pelos fatos e fundamentos ut retro
perfilados, oficiando-se a Juíza, aqui nominada de autoridade coatora, para prestar
suas informações em caráter de urgência, pois desta forma esse Egrégio Sodalício,
estará como de costume restabelecendo o império da Lei, do Direito e da Excelsa
JUSTIÇA.
Termos em que pede deferimento.

Curitiba, 19 de April de 2023.

(assinado digitalmente)

LUCAS VINÍCIUS BECKER LIMA

OAB/PR 114.693

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