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DIREITO ADMINISTRATIVO – Poderes e Deveres da Administração Pública

Introdução

Os poderes administrativos são as prerrogativas peculiares conferidas pelo ordenamento jurídico a


agentes à sua qualificação de prepostos do Estado, prerrogativas estas indispensáveis à consecução
dos fins públicos.

Os deveres administrativos são os deveres específicos impostos pelo ordenamento jurídico para
aqueles que, atuando em nome do Poder Público, executam as atividades administrativas.

Uso e Abuso de Poder

Uso do Poder – utilização normal, pelos agentes públicos, das prerrogativas que a lei lhes confere.

Poder-Dever de Agir – as prerrogativas públicas, ao mesmo tempo em que constituem poderes para
o administrador público, impõem-lhe o seu exercício e lhe vedam a inércia.

 Ordens de consequência – os poderes públicos são irrenunciáveis e devem ser


obrigatoriamente exercidos pelos titulares.
 Se para o titular o poder de agir é uma faculdade, para o administrador público é uma
obrigação de atuar, desde que se apresente o ensejo de exercitá-lo em benefício da
comunidade (Hely Lopes Meirelles).
 Reserva do possível – nem toda omissão administrativa (omissões genéricas) se qualifica
como ilegal, uma vez que, por vários motivos, nem todas as metas governamentais podem
ser alcançadas, principalmente pela costumeira escassez de recursos financeiros.
o Não é aplicada as omissões específicas, aquelas que estiverem ocorrendo mesmo
diante de expressa imposição legal no sentido do facere administrativo em prazo
determinado, ou ainda quando, mesmo sem prazo fixado, a Administração
permanece omissa em prazo superior ao aceitável dentro de padrões normais de
tolerância ou razoabilidade.

Abuso do Poder – conduta ilegítima do administrador, quando atua fora dos objetivos expressa ou
implicitamente traçados na lei.

 Formas de abuso
o Excesso de poder – o agente atua fora dos limites de sua competência.
 O agente invade atribuições cometidas a outro agente ou se arroga o
exercício de atividades que a lei não lhe conferiu.
o Desvio de poder (desvio de finalidade) – o agente, embora dentro de sua
competência, afasta-se do interesse público que deve nortear todo o desempenho
administrativo.
 Trata-se, pois, de um vício particularmente censurável, já que se traduz em
comportamento soez, insidioso. A autoridade atua embuçada em pretenso
interesse público ocultando dessarte seu malicioso desígnio (Celso Antônio
Bandeira de Mello).
 Genérico – não atende ao interesse público, mas sim ao particular.
 Específico – até atende o interesse público, mas não o interesse
especificamente pretendido pela norma que o fundamenta.
 A conceituação do abuso de poder terá caráter meramente teórico, por isso que, do ponto
de vista prático do cabimento do mandado de segurança, a distinção pouco importa. Sendo o
abuso de poder espécie do gênero ilegalidade, onde esta se constate caberá aquele remédio,
sem embargo da classificação que se lhe possa emprestar (Seabra Fagundes).

Poderes Administrativos

Conceito – conjunto de prerrogativas de direito público eu a ordem jurídica confere aos agentes
administrativos para o fim de permitir que o Estado alcance seus fins.

Poder Discricionário – prerrogativa concedida aos agentes administrativos de elegerem, entre várias
condutas possíveis, a que traduz maior conveniência e oportunidade para o interesse público.

 Conveniência e oportunidade – a primeira indica em que condições vai se conduzir o agente


e a segunda diz respeito ao momento em que a atividade deve ser produzida.
 Limitações
o Se a conduta eleita destoa da finalidade da norma (ausência de adequação), é ela
ilegítima e deve merecer o devido controle judicial.
o Se o agente não permite o exame dos fundamentos de fato ou de direito que
mobilizaram sua decisão em certas situações em que seja necessária à sua
averiguação, haverá, no mínimo, a fundada suspeita de desvio de finalidade.
o Observação – se veda ao Judiciário a aferição dos critérios administrativos
(conveniência e oportunidade) firmados em conformidade com os parâmetros legais.
 Discricionariedade e Arbitrariedade – a liberdade de escolha dos critérios de conveniência e
oportunidade não se coaduna com a atuação fora dos limites da lei.
o Não há discricionariedade contra legem.
 Atividades Vinculadas (Poder Vinculado) – há atividades administrativas cuja execução fica
inteiramente definida na lei, de modo que esta dispõe sobre todos os elementos do ato a ser
praticado pelo agente e não é concedida qualquer liberdade quanto à atividade a ser
desempenhada, devendo submissão inteira ao mandamento legal.
o Ao praticar atos vinculados, o agente limita-se a reproduzir os elementos da lei que
os compõem, sem qualquer avaliação sobre a conveniência e a oportunidade da
conduta.

Poder Vinculado Poder Discricionário


Não encerra prerrogativa do Poder Público. Encerra prerrogativa do Poder Público, uma vez
Sujeita à lei em praticamente todos os aspectos.que a lei deixa aspectos do ato a serem
Elementos definidos em lei de forma objetiva. apreciados pela Administração diante do caso
concreto.
Conceitos jurídicos indeterminados.
O legislador preestabelece todos os requisitos Implica liberdade a ser exercida nos limites da
do ato, de forma que só cabe à autoridade ei, pois a Administração exercerá juízo de
editá-lo, sem apreciação de conveniência, conveniência, oportunidade, interesse público,
oportunidade, interesse púbico ou equidade. equidade.
o José dos Santos Carvalho Filho – não considera os atos vinculados como Poder
Vinculado, eis que não é conferida qualquer prerrogativa de direito público; a
atuação vinculada reflete uma imposição ao administrador, obrigando-o a conduzir-
se rigorosamente em conformidade com os parâmetros legais, caracterizando-se
mais como restrição.
 Controle Judicial – todos os atos administrativos podem submeter-se à apreciação judicial de
sua legalidade.
o Se o juiz se atém ao exame da legalidade dos atos, não poderá questionar critérios
que a própria lei defere ao administrador.
 Discricionariedade e conceitos jurídicos indeterminados – os conceitos jurídicos
indeterminados são termos ou expressões contidos em normas jurídicas, que, por não terem
exatidão em seu sentido, permitem que o intérprete ou o aplicador possam atribuir certo
significado, mutável em função da valoração que se proceda diante dos pressupostos da
norma, enquanto a discricionariedade não pressupõe imprecisão de sentido, mas espelha a
situação jurídica diante da qual o administrador pode optar por uma dentre várias condutas
lícitas e possíveis.

Poder Regulamentar (Normativo) – prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos


gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação.

 Observação – a prerrogativa é apenas para complementar a lei, não pode, pois, a


Administração, alterá-la a pretexto de estar regulamentando.
 Regulamentos executivos (ou decretos regulamentares) – complementa a lei, contém
normas para sua fiel execução.
 Regulamentos autônomos ou independentes – inova na ordem jurídica, porque
estabelece normas sobre matérias não disciplinadas em lei.
o REsp. 584.798 – Os regulamentos autônomos são vedados no ordenamento
jurídico brasileiro, a não ser pela exceção do art. 84, VI, da Constituição Federal
 Art. 84, da Constituição Federal – Compete privativamente ao Presidente
da República: [...] VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e
funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento
de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de
funções ou cargos públicos, quando vagos;
 Controle dos atos de regulamentação – é competência exclusiva do Congresso Nacional
sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou
dos limites de delegação legislativa (art. 49, V, da Constituição Federal).
o No caso de ato regulamentar contra legem, aquele que extrapola os limites da
lei, é viável apenas o controle de legalidade resultante do confronto do ato com
a lei, ainda eu tenha caráter normativo.
o Se a interpretação administrativa d lei que vier a consubstanciar-se em decreto
executivo divergir do sentido e do conteúdo da norma legal, eu o ato secundário
pretendeu regulamentar, quer porque tenha este se projetado ultra legem, quer
porque tenha permanecido citra legem, quer ainda, porque tenha investido
contra legem, a questão caracterizará, sempre, típica crise de legalidade, e não
de inconstitucionalidade. (STF, ADIN n. 996-6)
 Lei pendente de regulamento – o legislador, ao instituir a lei, prevê que o Poder
Executivo deve proceder a sua regulamentação. Quando o legislador contempla essa
previsão, está implicitamente admitindo que a lei precisa ser complementada para
merecer devida e correta aplicação. E ao Poder Executivo, como regra, incumbe
desempenhar essa função complementadora do mandamento legal através dos
respectivos atos de regulamentação.
o A lei que autoriza o Chefe do Executivo a regulamentar a ei deve
necessariamente pontar o prazo fixado para ser expedido o ato de
regulamentação.
Poder Hierárquico – escalonamento em plano vertical dos órgãos e agentes da Administração que
tem objetivo a organização da função administrativa.

 Efeitos
o Poder de comando de agentes superiores sobre outros hierarquicamente inferiores –
dever de obediência destes para com aqueles, cabendo-lhes executar as tarefas em
conformidade com as determinações superiores.
o Fiscalização das atividades desempenhadas por agentes de plano hierárquico inferior
para a verificação de sua conduta não somente em relação às normas legais e
regulamentares, como ainda no que disser respeito às diretrizes fixadas por agentes
superiores.
o Poder de revisão dos atos praticados por agentes de nível hierárquico mais baixo,
pode o agente superior rever o ato para ajustamento a orientação ou restauração de
legalidade.
o Delegação – transferência de atribuições de um órgão a outro no aparelho
administrativo. Somente de funções genéricas e comuns.
o Avocação – o chefe superior pode substituir-se ao subalterno, chamando a si as
questões afetas a este, salvo quando a lei só lhe permita intervir nelas após a decisão
dada pelo subalterno. Caráter excepcional.
 Subordinação e Vinculação – a primeira tem caráter interno e se estabelece entre órgãos de
uma mesma pessoa administrativa como fator decorrente da hierarquia, ao passo que a
segunda possui caráter externo e resulta do controle que pessoas federativas exercem sobre
as pessoas pertencentes à Administração Indireta.
 Hierarquia e Funções Estatais – inexiste hierarquia entre os agentes que exercem função
jurisdicional ou legislativa.
o Na função jurisdicional, prevalece o princípio da livre convicção do juiz, pelo qual age
este com independência, sem subordinação jurídica aos tribunais superiores.
o Na função legislativa vigora o princípio da partilha das competências constitucionais,
de modo que o poder legiferante já se encontra delineado na Constituição.

Poder Disciplinar – situação de respeito que os agentes da Administração devem ter para com as
normas que os regem, em cumprimento aos deveres e obrigações a eles impostos.

 Direito Punitivo Funcional – emana da relação entre a Administração Pública e os seus


servidores, exatamente para preservar a disciplina que deve reinar na organização
administrativa.
 Ilicitude Administrativo-Funcional – como regra, a lei enumera os deveres e as obrigações
funcionais e, ainda, sanções, sem, contudo, uni-los de forma discriminada, o que afasta o
sistema da rígida tipicidade.
 Aplicação de Sanções – de acordo com a gravidade da conduta, a autoridade escolherá, entre
as penas legais, a que consulte ao interesse o serviço e a que mais reprima a falta cometida.
 Observações
o A instauração do processo disciplinar é obrigatória (ato vinculado).
o Instaurado o processo, para definir se a infração ocorreu, é preciso juízo de valor,
pois os conceitos são vagos (ato discricionário).
o Configurada a infração, a pena aplicada será a prevista em lei (ato vinculado).
 A administração pública, quando se depara com situação em que a conduta
do investigado se amolda às hipóteses de demissão ou de cassação de
aposentadoria, não dispõe de discricionariedade para aplicar pana menos
gravosa por se tratar de ato vinculado.

 Observação – José dos Santos Carvalho Filho considera a Hierarquia e a Disciplina fatos
administrativos, pois representam acontecimentos normais surgidos no âmbito da
organização administrativa, faltando-lhes a fisionomia de prerrogativas de direito para serem
consideradas poderes.

Poder de Polícia – prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração
Pública a restringir o uso e gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade.

 Sentido amplo – toda e qualquer ação restritiva do Estado em relação aos direitos
individuais.
 Sentido estrito – verdadeira prerrogativa conferida aos agentes da Administração,
consistente no poder de restringir e condicionar a liberdade e a propriedade.
 Art. 78 do Código Tributário Nacional – considera-se poder de polícia atividade da
administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula
a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à
segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao
exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder
Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou
coletivos.
 Competência – os assuntos de interesse nacional ficam sujeitos à regulamentação e
policiamento da União; as matérias de interesse regional sujeitam-se às normas e à polícia
estadual; e os assuntos de interesse local subordinam-se aos regulamentos edilícios e ao
policiamento administrativo municipal.
o RE 633.782 Repercussão Geral – É constitucional a delegação de poder de polícia, por
meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração
Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem serviço
público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial.
o Observação – somente atos relativos ao consentimento e à fiscalização são
delegáveis (REsp 817.534), Supremo Tribunal Federal entende que atos de sanção
também podem ser delegados, de modo que somente a ordem de polícia (função
legislativa) não é delegável.
 Características
o Discricionariedade e Vinculação – em regra é discricionário, a Administração pode
levar em consideração a área de atividade em que vai impor a restrição em favor do
interesse público e, depois de escolhê-la, o conteúdo e a dimensão das limitações.
o Autoexecutoriedade – prerrogativa de praticar atos e colocá-los em imediata
execução, sem dependência à manifestação judicial.
o Coercibilidade – possibilidade de o Estado se valer de meios indiretos de coerção,
para fazer com que o administrado cumpra as normas administrativas.
o Imperatividade – o Estado impõe as atividades do poder de polícia de forma
unilateral, independentemente da vontade do particular.
 Ciclos do Poder de Polícia
o 1º ciclo – ordem ou legislação – previsão normativa a partir da qual vai ser exercida a
atividade administrativa.
o 2º ciclo – consentimento – ato administrativo que manifesta a aquiescência da
Administração com a conduta do particular, a ser produzido nos casos em que a lei
estipula ser necessário.
o 3º ciclo – fiscalização – verificação da observância das regras de polícia
administrativa.
o 4º ciclo – sanção – imposição de penalidades nas situações em que se verifica
descumprimento das normas impostas.

Deveres da Administração Pública – deveres que devem ser observados para que os administradores
públicos não sejam responsabilizados pelo seu descumprimento.

 Dever de Probidade – a atuação deve, em qualquer hipótese, pautar-se pelos princípios da


honestidade e moralidade, quer em face dos administrados, quer em face da própria
Administração.
 Dever de Prestar Contas – como é encargo dos administradores públicos a gestão de bens e
interesses da coletividade, decorre daí o natural dever de prestar contas de sua atividade.
 Dever de Eficiência – necessidade de tornar cada vez mais qualitativa a atividade
administrativa.

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