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Resumos para a frequência de Intervenções Psicoeducacionais

A Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou


oficialmente, em 1980, o Manual de Classificação das
Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (CIDID ou, em
inglês, ICDH). Esse documento foi fruto de promissoras
discussões ocorridas nos anos 70, e o seu objetivo era o de
contribuir para a promoção da uniformidade de conceitos e
terminologias que são utilizados pelos serviços de medicina,
reabilitação e seguridade social. No entanto, diversas
críticas foram aferidas, sendo as principais referentes à vinculação do seu referencial conceitual ao
modelo médico,

Em 1990, durante a XXIII Conferência Sanitária Panamericana - promovida pela Organização Pan-
americana de Saúde, da OMS - “[...] foram analisados aspetos relacionados com a evolução conceitual,
no contexto da saúde, dos termos: deficiência, incapacidade e menos-valia”' (CARVALHO, 2000, p.
38), também revistos na ICDH de 1993. Os conceitos propostos na referida Conferência e na última
ICDH são utilizados, hoje, por grande parte dos pesquisadores de todo o mundo que trabalham com a
questão da deficiência.

Passemos agora a delimitar o significado de deficiência, incapacidade e desvantagem, termos esses


fundamentais e tantas vezes utilizados de forma inadequada por profissionais das mais diversas
áreas.

Deficiência
Deficiência é toda e qualquer perda, falta ou alteração de estrutura ou de função, qualquer que seja
sua causa. Quando falamos de perda, falta ou alteração de estrutura, estamos nos referindo à
ausência ou anormalidade de parte(s) do corpo, podendo ser membro (mão, braço, perna etc.), órgão
(olho, baço etc.) ou tecido. Portanto, estamos falando de algo que é orgânico, que é concreto, um fato
inquestionável, uma realidade (AMARAL, 1995). Quando falamos de alteração de função, estamos nos
referindo à função de órgãos e à função cognitiva. E dizer que essas estão alteradas, em termos de
deficiência, significa dizer que estão deficitárias.

Outro aspeto importante a ser considerado é que as alterações de estrutura ou de função que
caracterizam a deficiência podem ser temporárias ou permanentes, além de congênitas ou adquiridas.
Isso significa que uma pessoa pode nascer com uma deficiência ou adquiri-la ao longo de sua vida e,
também, que uma deficiência não é, necessariamente, algo estático e determinado.

Exemplificando o conceito que acabamos de analisar, a deficiência pode referir-se a: uma lesão
medular; uma lesão cerebral; inexistência de partes do corpo; lesão no nervo ótico; funcionamento
inadequado do aparelho auditivo; atrofia de membros; fratura óssea de membros inferiores ou
superiores; ineficiência do funcionamento do rim; funcionamento cognitivo deficitário etc. Tais
alterações, de acordo com o tipo de comprometimento que geram, são classificadas como: deficiência
fisica, deficiência intelectual,” deficiência visual, deficiência auditiva, múltipla deficiência sensorial,
insuficiência renal etc.

Incapacidade
A incapacidade surge como consequência direta de
uma deficiência, seja essa de ordem psicológica (função
cognitiva), física, sensorial ou outra. Portanto, a
incapacidade refere-se a qualquer restrição, decorrente
de uma deficiência, da habilidade de desempenhar uma
atividade funcional que se tem por comum para o ser
humano. Ela pode ser temporária ou permanente,
reversível ou irreversível e progressiva ou regressiva.

Amaral (1995, p. 67) diz que a incapacidade afirma,


assim como a deficiência, “[...] uma concretude, uma
realidade”. Exemplificando o conceito que acaba de ver
e articulando-o com o conceito anterior, podemos ter o
Quadro 1.1.

Desvantagem (handicap)
O handicap é uma situação desvantajosa para um determinado indivíduo, como consequência de uma
deficiência e/ou de uma incapacidade que o limita ou o impede de desempenhar um papel que esteja
de acordo com a sua idade e sexo e com os fatores sociais e culturais. Caracteriza-se pela diferença
entre o rendimento do indivíduo e suas próprias expectativas e/ou as do grupo a que pertence.

Quando falamos de desvantagem, falamos sempre de desvantagem em relação a algo ou a alguém, ou


seja, sempre de modo comparativo. Sendo assim, diferentemente da deficiência e da incapacidade,
que são concretas e objetivas, a desvantagem é relativa. Enquanto a deficiência e a incapacidade estão
caracterizadas na própria pessoa que as possui, a desvantagem surge na relação desse indivíduo com
o seu meio ambiente. Segundo Amaral (1995, p. 67), o conceito de desvantagem está “...
profundamente ligado aos valores, normas e padrões do grupo no qual a pessoa com deficiência está
inserida”. A desvantagem reflete a interação do indivíduo com o meio, está relacionada à socialização.

Articulando os três conceitos estudados no atual texto, temos o Quadro 1.2.

Teratologia
Teratologia é o termo que define o ramo da medicina responsável por estudar as causas, mecanismos
e padrões das anomalias congênitas. Simplificadamente trata-se do estudo das anomalias de
desenvolvimento que ocasionam alterações morfológicas ao nascimento. Estas, por sua vez, podem
variar desde malformações defeituosas de um ou mais órgãos até a ausência de um órgão.
Para a prática deste estudo, se faz necessário o conhecimento das etapas do desenvolvimento, uma
vez que algumas dessas etapas são mais suscetíveis a perturbações do que outras.

Os responsáveis por causar anomalias congênitas são chamados de agentes teratogénicos. Define-se
este último como sendo qualquer substância, organismo, agente físico ou estado de deficiência que,
enquanto presente durante a vida embrionária ou fetal, é capaz de produzir alterações na estrutura
ou função do concepto.

Nem toda a variação presente no desenvolvimento é considerada uma anomalia. Variações anatômicas
habitualmente são encontradas, como, por exemplo, os ossos que variam entre si, não apenas em sua
forma, mas em diminutos detalhes. Deste modo, classificam-se as anomalias congênitas em quatro
tipos:

• Malformações;
• Perturbações;
• Deformações;
• Displasia.

Os fatores que levam às anomalias congênitas são de dois tipos: fatores genéticos e fatores ambientais.
Os fatores genéticos são aqueles passados dos genitores para os seus descendentes e são chamados
de hereditários, como, por exemplo, a polidactilia, enquanto os genéticos cromossômicos resultam de
uma anomalia na estrutura de um cromossomo da espécie, como, por exemplo, a síndrome de Down.

Desenvolvimento Embrionário
Embrião é o produto da conceção (concepto) do momento da fecundação até 8 semanas de vida
embrionária. Feto é o bebê em formação desta época até o fim da gestação. O desenvolvimento do
embrião humano começa com a formação do zigoto, que após passar por muitas divisões celulares
(mitoses), as clivagens, vai se fixar nas paredes do útero (nidação). Ali se formam novas estruturas
(placenta, cordão umbilical, entre outros) e começa a gestação do feto até o seu nascimento durante
o parto.

O período embrionário, que corresponde às primeiras oito semanas a partir do dia da conceção, é
aquele em que todos os órgãos e sistemas se formam (organogénese). Nessa fase o bebê é chamado
de embrião. É um período de intensa proliferação de células. Só para termos uma ideia, o bebê, que
começou a desenvolver-se a partir de duas células, chega ao final da quarta semana com milhões
delas.

Essa é também a época de maior vulnerabilidade aos agentes teratogénicos, ou seja, as substâncias
químicas ou os meios físicos e biológicos causadores de malformações. Nesse período a gestante deve
tomar cuidados para não se expor a Raios-X, como por exemplo, no dentista; deve evitar a ingestão
de substâncias ou remédios sabidamente provocadores dessas malformações, bem como deve evitar
contato com doenças do tipo rubéola, toxoplasmose, etc. também causadoras de malformações ao
bebê. O período fetal inicia-se a partir da 9º semana pós-conceção e vai até o nascimento. Nessa etapa
o bebê será chamado de feto e os órgãos já formados sofrerão um processo de crescimento e
amadurecimento, até se apresentarem em plenas condições de funcionamento no final da gestação.

Embriologia - fases do desenvolvimento embrionário Imagem


A embriologia estuda o processo de formação e desenvolvimento do indivíduo desde o zigoto até o
nascimento. Ao longo do crescimento embrionário alguns genes são ativados e outros desativados.
Dessa maneira surge a diferenciação celular, ou seja, tipos celulares com formatos e funções distintos,
que organizam os diversos tecidos e posteriormente formarão os órgãos. Na espécie humana as
principais fases do desenvolvimento do embrião são a clivagem ou segmentação, gastrulação e
organogénese.

Durante a clivagem as divisões mitóticas são rápidas e dão origem as células chamadas
blablastômeros. Diante da velocidade com que as células se dividem, o embrião apresenta aumento
do número delas, mas não de tamanho. O primeiro estágio da clivagem é a mórula, um maciço celular
originado entre o terceiro e quarto dia após a fecundação. Na segunda e última etapa ocorre a blástula,
onde as células delimitam uma cavidade interna chamada blastocele, cheia de um líquido produzido
pelas próprias células.

Até a fase de blástula as células embrionárias são chamadas de células tronco, que podem originar
todos os diferentes tipos de célula do corpo. A partir da blástula, inicia a fase de gastrulação, onde o
embrião começa a aumentar de tamanho e surge o intestino primitivo ou arquêntero e ocorre a
diferenciação dos folhetos germinativos ou embrionários.

Os folhetos darão origem aos diferentes tecidos do corpo e se dividem em ectoderme, endoderme e
mesoderme.

1. Ectoderme: epiderme, unhas, pelos, córnea, cartilagem e ossos da face, tecidos conjuntivos das
glândulas salivares, lacrimais, timo, tireóidea e hipófise, sistema nervoso, encéfalo e
neurônios, entre outros. Os primeiros órgãos que se formam são o encéfalo, a medula espinhal
e a coluna vertebral. Isso ocorre por volta da terceira semana de gestação, quando a mulher
ainda nem sabe que está grávida, há apenas suspeitas devido à falta da menstruação.

2. Endoderme: pâncreas, sistema respiratório (exceto cavidades nasais), pulmões, fígado e


epitélio da bexiga urinária, entre outros.

3. Mesoderme: derme da pele, músculos, cartilagens e ossos (exceto da face), medula óssea, rim,
útero, coração, sangue, entre outros.

Ao final da gastrulação, o embrião é chamado de gástrula.


A última fase do desenvolvimento embrionário é a
organogénese, onde ocorre a diferenciação dos tecidos e
órgãos. O primeiro estágio dela é a neurulação, quando há
formação do tubo neural, que se diferenciará no sistema
nervoso central. Durante a neurulação, o embrião recebe o
nome de nêurula. A organogénese termina até a oitava
semana de gestação, por*volta do 56º dia. Nesse período, o
embrião mede cerca de 3 cm de comprimento.

Embriopatia
Doença ou lesão que afeta o embrião e que vai originar malformações de gravidade e expressão
variáveis.

• Agenesia
Agenesia é a ausência completa ou parcial de determinado órgão. Esse processo ocorre no momento
da formação do embrião. Nesse caso, a pessoa já nasce com a ausência do órgão, como por exemplo:
• Agenesia de rim;
• Agenesia de útero;
• Agenesia dental;
• Agenesia uterina;
• Agenesia vaginal;
• Agenesia vascular, etc.

Em alguns casos, a agenesia não causará danos no desenvolvimento da pessoa (no caso da agenesia
de algum dente). Em outros casos, poderá haver a compensação pelo próprio organismo ou órgão
similar (no caso da agenesia renal, o outro rim fará a função e compensará a ausência do rim).
Algumas agenesias são detetadas durante o pré-natal com os exames de ultrassonografia, enquanto
outras só poderão ser detetadas após o nascimento.
• Hipoplasia
Também chamada de hipolastia, a hipoplasia designa o crescimento insuficiente de um tecido ou
órgão. Falamos, por exemplo, de hipoplasia pulmonar, hipoplasia da tireoide ou hipoplasia do seio.
Definida em 1870 por Rudolph Virchow, essa patologia é geralmente de origem genética, mesmo se
causas toxicológicas possam ser igualmente identificadas. Além disso, a exposição de um embrião a
substâncias químicas ou medicamentosas favorecem as malformações podendo causar hipoplasia.

• Displasia
Displasia é um termo geral usado para designar o surgimento de anomalias durante o
desenvolvimento de um órgão ou tecido corporal, em que ocorre uma proliferação celular que resulta
em células com tamanho, forma e características alteradas. A displasia implica uma alteração
inequívoca do programa de crescimento e diferenciação celular.

Deficiência Motora: o que é?


A deficiência motora assenta na existência de uma ou mais alterações na estrutura ou função
biológica e coordenativa do corpo humano, ou seja, refere-se à dificuldade ou impossibilidade em
mexer, controlar ou coordenar algum tipo de movimento motor. Tal poderá ocorrer de forma
temporária ou permanente e ser de caráter congénito ou adquirido. Pessoas com deficiência motora
têm a sua mobilidade comprometida, devido a limitações ao nível da função, estruturas ósseas e
musculares.

A Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que Portugal assinou em 2007,
reconhece que a deficiência é um conceito em Evolução e que a mesma resulta da interaçaõ entre as
pessoas com incapacidades e barreiras comportamentais e ambientais, que impedem a sua
participação plena e efetiva na sociedade em condições de igualdade com as outras pessoas.

De acordo com o Art.º n.o1 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (...), o conceito
de pessoa com deficiência inclui todas “as pessoas com deficiência incluem aqueles que têm
incapacidades duradouras físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais, que, em interaçaõ com várias
barreiras, podem impedir a sua plena e efetiva participação na sociedade em condições de igualdade
com os outros”. Esta Convenção pretende garantir de forma efetiva o respeito pela integridade,
autonomia, dignidade e liberdade individual das pessoas com deficiência e reforçar a proibição da
discriminação destes cidadãos através de leis, políticas e programas que atendam especificamente às
suas características e promovam a sua participação na sociedade.

Tipos De Deficiência Motora


De acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), a
deficiência motora corresponde a alterações das funções neuromusculoesqueléticas relacionadas com
o movimento. As diferentes alterações ao nível da funcionalidade podem provocar impactos distintos
na participação da pessoa nas atividades do seu quotidiano, exigindo assim diferentes recursos e
estratégias, de forma a potenciar uma maior participação.
As deficiências motoras resultantes de alterações neuromusculoesqueléticas e relacionadas com os
movimentos mais frequentes e comuns, consoante os membros afetados são:

Classificação topográfica da deficiência motora


Paresia: disfunção motora em que há movimento.
Plegia: ausência de movimento, ou paralisia;

Þ Amputação - Inexistência de um ou mais membros do corpo;


Þ Hemiplegia - Paralisia de metade do corpo pelo eixo corporal;
Þ Hemiparesia - Paralisia parcial de metade do corpo pelo eixo corporal;
Þ Monoplegia - Paralisia de apenas um membro do corpo;
Þ Monoparesia - Paralisia parcial de apenas um membro do corpo;
Þ Paraplegia - Paralisia do corpo da cintura para baixo;
Þ Paraparésia - Paralisia parcial do corpo da cintura para baixo;
Þ Tetraplegia - Paralisia do corpo do pescoço para baixo;
Þ Tetraparesia - Paralisia parcial do corpo do pescoço para baixo;
Þ Paralisia geral - Paralisia de todo o corpo;
Þ Paraparésia geral - Paralisia parcial de todo o corpo;
Þ Paralisia Cerebral - Paralisia resultante de uma lesão não progressiva, que pode ocorrer no
período pré-natal, perinatal ou pós-natal, podendo afetar a marcha e o controlo motor.

Classificação nosológica da deficiência motora (DM)


1. DM espástica: Os músculos estão facilmente irritáveis e contraem-se a partir de pequenas
estimulações. Dá-se uma rigidez ou tensão muscular, que origina movimentos rígidos, lentos
e desajeitados. A rigidez aumenta quando a pessoa vai emitir um comportamento voluntário,
quando está aborrecida ou exitada ou quando o corpo está em determinadas posições.
2. DM Atetóide: movimentos com dificuldades no ritmo, concorrentes com movimentos
voluntários, que leva à descoordenação global. Os movimentos são lentos e contorcidos, ou
súbitos e rápidos, nas regiões do corpo. Quando afeta os músculos da fala, as pessoas
apresentam dificuldades em comunicar. Podem estar problemas de visão associados, que vão
dificultar a fixação visual para acompanhar os deslocamentos e a dissociação dos movimentos
olho-cabeça.
3. DM Atáxica: Afeta a área do cerebelo e provocam desequilíbrio motor, falta de coordenação e
nistagmos. Também pode provocar dificuldades em sentar-se ou ficar de pé, cai com frequência,
uso da mão de maneira desajeitada e geralmente precisa de suporte físico para permanecer
sentado.

Estas deficiências podem ter causas diversas, sendo as mais comuns:


Þ Acidentes de viação - Todos os acidentes que ocorrem na via pública, aquando do
manuseamento de veículos;
Þ Acidente Vascular Cerebral - Doença neurológica provocada pela diminuição súbita, restrição
ou alterações da irrigação sanguínea a uma determinada região do cérebro;
Þ Acidentes de trabalho - Acidentes durante o período de trabalho ou na deslocação para o
mesmo;
Þ Acidentes com armas de fogo - Lesões provocadas por disparo de arma de fogo (ex.: revólver,
caçadeira, pistola);
Þ Saltos e acidentes de mergulho - Lesões traumáticas provocadas por impacto do crânio ou de
outra parte do corpo em rochas, no fundo do mar/piscina ou outros;
Þ Doença - Doenças várias que afetam um vasto número de pessoas;
Þ Demência - Alterações provocadas por processos degenerativos das funções cognitivas
(memória, linguagem, atenção, orientação espacial, entre outras), naturais no processo de
envelhecimento;
Þ Problemas durante o parto - Alterações provocadas pelo trabalho de parto.

Para além destas, existem também outros fatores que contribuem para a deficiência motora,
nomeadamente:
Þ Acidentes militares ou de guerra - Acidentes aquando do período de serviço militar ou de
guerra;
Þ Acidentes domésticos e de lazer - Acidentes que ocorrem nos períodos de lazer, quer seja em
casa, na escola, na prática de desporto, resultantes de atos de violência, entre outros;
Þ Doença profissional - Inclui doenças e alterações provocadas pela atividade contínua em
determinada profissão;
Þ Hereditariedade - Alterações causadas por transmissão genética, anomalias nos cromossomas
e doenças de caráter familiar ou hereditário;
Þ Gravidez - Alterações pré-natais e perinatais, isto é, durante o período de gestaçaõ .

Fisiopatologia de algumas doenças e situações que levam às deficiências motoras:


Dentro dos distúrbios neurológicos que podem levar à deficiência motora podemos destacar:

Paralisia cerebral (encefalopatia crônica da infância)


É um distúrbio não progressivo da motricidade, que se evidencia na movimentação e postura. Esse
distúrbio é causado por uma lesão ou mal funcionamento do cérebro, o qual ocorre antes dos 3 (três)
anos de idade. Pode ocorrer por prematuridade; anóxia perinatal; desnutrição materna; rubéola;
toxoplasmose; trauma de parto; subnutrição; entre outras causas. Exemplifica o grupo dos distúrbios
neurológicos de origem encefálica da deficiência motora. Geralmente refere-se ao portador de “PC”
(paralisia cerebral). Causas:
Þ 86% são provenientes de fatores pré e perinatais
Þ 14% são provenientes de fatores pós-natais.

A incidência diminui conforme melhora o conhecimento e o desenvolvimento dos serviços de saúde.


Cada distúrbio é classificado de acordo com alguns fatores que são citados no diagnóstico. Podemos
dizer que temos três tipos de classificação:

Classificação fisiológica (ou quanto ao tônus muscular):


a) rigidez: os músculos dos membros são tensos e se contraem fortemente quando se tenta
movimentá-los ou alongá-los, onde mesmo os reflexos exacerbados são inibidos. É uma forma
severa de espasticidade.

b) Espasticidade: o termo espástico é usado para descrever o tipo de paralisia cerebral onde o
tônus muscular é muito alto (tenso). Os portadores de PC espástica têm movimentos
desajeitados e rígidos porque seus músculos são muito tensos. Eles têm dificuldade ao
modificar sua posição ou ao tentar pegar algo com suas mãos. Este é o tipo mais comum de
PC. Os autores referem que cerca de 50% a 75% dos portadores de paralisia cerebral têm o tipo
espástico (Bleck, 1981; Souza, 1998). Há uma hiperreflexia dos tendões profundos dos
músculos dos membros envolvidos. Os indivíduos ficam sujeitos a contraturas e deformidades
que se desenvolvem durante o crescimento.

c) Atetose: caracterizada por movimentos involuntários e variações do tônus muscular resultante


de lesões dos núcleos situados no interior dos hemisférios cerebrais (sistema extrapiramidal).
O tônus muscular flutua gerando movimentos involuntários e os movimentos voluntários se
deformam ficando retorcidos.

d) Ataxia: caracterizada por diminuição do tônus muscular, incoordenação dos movimentos e


equilíbrio deficiente, devido a lesões no cerebelo ou das vias cerebelares. Os portadores de PC
atáxica parecem muito instáveis e trêmulos.

e) Tremor: aparece apenas na movimentação involuntária. Chamado também de tremor


intencional.

f) Hipotonia: o tônus muscular é baixo. Também chamada de atonia, flacidez ou frouxidão.


Geralmente evolui para uma atetose.

g) Mista: em alguns casos observa-se uma variação do tônus de acordo com o grupo muscular
envolvido - em alguns ele é muito baixo e em outros muito alto. A combinação mais comum é
a PC espática-atetóide. Estima-se que 25% dos portadores de PC apresentem um quadro misto.

Classificação topográfica:
a) monoplegia / monoparesia (acometimento de um único membro)
b) hemiplegia / hemiparesia (acometimento de um hemicorpo - um lado do corpo. Pode ser
ocasionada por acidente vascular cerebral; aneurisma cerebral; tumor cerebral e outras.
c) paraplegia / paraparésia (acometimento do tronco e membros inferiores)
d) diplegia / diparesia (membros inferiores mais afetados que os superiores)
e) quadriplegia / quadriparesia (quatro membros afetados de forma semelhante)
f) dupla hemiplegia / dupla hemiparesia (quatro membros afetados, sendo um hemicorpo mais
afetado).

Classificação quanto ao grau de acometimento:


a) leve
b) moderada
c) grave

Seus portadores apresentam problemas como sialorréia, dificuldade para engolir, permanência de
reflexos primitivos. Podem surgir outros distúrbios associados como: distúrbios da fala, distúrbios
sensoriais (visão, audição e outros), convulsões, deficiência mental, distúrbios percepto-motores como
ocorrências mais frequentes.

Espinha bífida
É um defeito congênito da coluna vertebral onde um ou mais arcos vertebrais não se fecham
completamente durante o desenvolvimento fetal, constituindo-se num distúrbio neurológico de origem
espinhal. A natureza e a magnitude da lesão e da paralisia dependem da severidade e da localização
do defeito. A causa é desconhecida. Sabe-se que quando o tubo neural não se desenvolve
completamente, acaba fechando-se nos primeiros 30 dias de gravidez.
Tipos:
a) Oculta: marcada por uma "covinha", sinal ou tufo de pelos. Pode passar desapercebida sem o
aparecimento de problemas neurológicos.
b) Meningocele: é a forma tumoral com protrusão sacular junto a coluna vertebral, a qual contém
líquor, mas a medula e raízes nervosas permanecem em posição normal. É indicada a remoção
cirúrgica após o nascimento ou na primeira infância. Raramente deixa sequelas.
c) Mielomeningocele: é o tipo mais comum, mais severo. Há uma protrusão sacular contendo
líquor, porções medulares e fibras nervosas. É fechada cirurgicamente logo após o nascimento.
Quase sempre apresenta problemas neurológicos, hidrocefalia e deficiência mental. Resulta em
paralisia total ou parcial, distúrbios esfincterianos e falta de sensibilidade abaixo do nível da
lesão.

Dificuldades de Aprendizagem
Numa perspectiva orgânica, as DA são desordens neurológicas que interferem com a receção,
integração ou expressão de informação, caracterizando-se, em geral, por uma discrepância acentuada
entre o potencial estimado do aluno e a sua realização escolar. Numa perspectiva educacional, as DA
refletem uma incapacidade ou impedimento para a aprendizagem da leitura, da escrita, ou do cálculo
ou para a aquisição de aptidões sociais.

Isto quer dizer que os alunos com DA podem apresentar problemas na resolução de algumas tarefas
escolares e serem “brilhantes” na resolução de outras. Quer ainda dizer que, em termos de
inteligência, estes alunos geralmente estão na média ou acima da média. O termo dificuldades de
aprendizagem aparece-nos em 1962 com o fim de situar esta problemática num contexto educacional,
tentando, assim, retirar-lhe o “estigma clínico" que o caracterizava. Surge, então, uma primeira
definição proposta por Kirk (1962) em que era bem evidente a ênfase dada à componente educacional
e o distanciamento, em termos biológicos, de outras problemáticas, tal como deficiência mental,
privação sensorial, privação cultural, entre outras.

“Dificuldades de aprendizagem específica” significa uma perturbação num ou mais dos processos
psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da linguagem falada ou escrita, que
pode manifestar-se por uma aptidão imperfeita de escutar, pensar, ler, escrever, soletrar, ou fazer
cálculos matemáticos. O termo inclui condições como problemas percetivos, lesão cerebral, disfunção
cerebral mínima, dislexia e afasia de desenvolvimento. O termo não engloba as crianças que têm
problemas de aprendizagem resultantes principalmente de deficiências visuais, auditivas ou motoras,
de deficiência mental, de perturbação emocional ou de desvantagens ambientais, culturais ou
económicas (Federal Register, 1977, p. 65083, citado por Correia, 1991).

Assim, uma criança pode ser identificada como inapta para a aprendizagem “típica" se:
1. não alcançar resultados proporcionais aos seus níveis de idade e capacidades numa ou mais
de sete áreas específicas quando lhe são proporcionadas experiências de aprendizagem
adequadas a esses mesmo níveis;

2. apresentar uma discrepância significativa entre a sua realização escolar e capacidade


intelectual numa ou mais das seguintes áreas:
a. Expressão oral;
b. Compreensão auditiva;
c. Expressão escrita;
d. Capacidade básica de leitura;
e. Compreensão da leitura;
f. Cálculos matemáticos; e
g. Raciocínio matemático (Federal Register, 1997, p. 65083, citado por Correia, 1991).

Que causa as dificuldades de aprendizagem?


Como já o mencionámos anteriormente, a origem das DA encontra-se presumivelmente no sistema
nervoso central do indivíduo podendo um conjunto diversificado de fatores contribuir para esse facto.
Um primeiro factor a ter em conta será a hereditariedade (fundamento genético) que, como afirma
Johnson (1998), parece ligar a família às DA.

Há um outro conjunto de fatores (pré ou perinatais) que podem vir a causar DA. Entre eles, são de
destacar os excessos de radiação, o uso de álcool e/ou drogas durante a gravidez, as insuficiências
placentárias, a incompatibilidade RH com a mãe (quando não tratada), o parto prolongado ou difícil,
as hemorragias intracranianas durante o nascimento ou a privação de oxigénio (anoxia). No que diz
respeito a fatores pós-natais que podem causar DA, eles estão geralmente associados a traumatismos
cranianos, a tumores e derrames cerebrais, a malnutrição, a substâncias tóxicas (por exemplo, o
chumbo) e a negligência ou abuso físico.

Em suma, a miríade de potenciais causas das DA não deve ser interpretada como condição sine qua
non de que toda a criança com DA esteja presa a determinada etiologia. Como referimos
anteriormente, chamamos a atenção do leitor para o facto de que as causas das DA se mantêm
desconhecidas na maioria dos casos.

Como identificar e avaliar as dificuldades de aprendizagem?


A identificação das DA deve ser feita o mais precocemente possível, contribuindo para este facto uma
observação cuidada dos comportamentos da criança. Assim, os profissionais (especialmente os
educadores e professores) e os pais devem estar atentos a um conjunto de sinais, que a criança exiba,
contínua e frequentemente, uma vez que não existem indicadores isolados para a identificação das
DA.

Principais Dificuldades de Aprendizagem


Þ Dislexia: Incapacidade severa de leitura (Hallahan, Kauffman e Loyd, 1999); dificuldade no
processamento da linguagem cujo impacto se reflete na leitura, na escrita e na soletração
(NCLD, 1997).

Þ Disgrafia: Dificuldade na escrita. Os problemas podem estar relacionados com a componente


grafomotora (padrão motor) da escrita (e. g., forma das letras, espaço entre palavras, pressão
do traço); com a soletração; e com a produção de textos escritos (NCLD, 1997).

Þ Discalculia: Dificuldade na realização de cálculos matemáticos (Hallahan, Kauffman e Loyd,


1999).

Estigma
O conceito de estigma sob a visão de que estigma é um processo constituído socialmente
O conceito de estigma proposto por Goffman é permeado pela ideia da presença física entre
estigmatizados e normais, ou seja, todos os conceitos apresentados abaixo remetem à ideia da
presença corporal entre tais grupos. A relação social cotidiana em ambientes já estabelecidos propicia
um relacionamento entre pessoas previstas e esperadas a tal lugar, sem atenção ou reflexão particular
umas com as outras. Assim, as pessoas normais2 preveem as categorias e os atributos de um estranho
que se aproxima. Essas preconceções, elaboradas pelos normais, são transformadas em “expectativas
normativas, em exigências apresentadas de modo rigoroso” (Goffman, 1975:12). No entanto, os
normais, cotidianamente, ignoram essas preconceções até o surgimento de uma questão que seja
efetiva para a realização de suas exigências. É neste momento que os normais podem perceber que
fazem afirmações daquilo que o outro deveria ser.

Portanto, para Goffman (1975:12) “a sociedade estabelece os meios de categorizar as pessoas e o total
de atributos considerados como comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias”.
Goffman (1975) acredita que a pessoa estigmatizada possui duas identidades: a real e a virtual. A
identidade real é o conjunto de categorias e atributos que uma pessoa prova ter; e a identidade virtual
é o conjunto de categorias e atributos que as pessoas têm para com o estranho que aparece a sua
volta, portanto, são exigências e imputações de caráter, feitas pelos normais, quanto ao que o estranho
deveria ser. Deste modo, uma dada característica pode ser um estigma, especialmente quando há uma
discrepância específica entre a identidade social virtual e a identidade social real.

Pautando-se na relação entre as identidades real e virtual, pode-se afirmar que, o processo de
estigmatização não ocorre devido à existência do atributo em si, mas, pela relação incongruente entre
os atributos e os estereótipos. Os normais criam estereótipos distintos dos atributos de um
determinado indivíduo, caracterizando, portanto, o processo de estigmatização. “O termo estigma,
portanto, será usado em referência a um atributo profundamente depreciativo” (Goffman, 1975:13)
numa linguagem de relações e, não de atributos em si. De acordo com os estudos de Melo (2000),
estigmas, para Goffman são identidades deterioradas, por uma ação social, que representam algo mau
dentro da sociedade e, por isso, deve ser evitado.

Goffman (1975) afirma que o estigma pode ocorrer devido a três circunstâncias: abominações do
corpo, como as diversas deformidades físicas; culpas de caráter individual, como: vontade fraca,
desonestidade, crenças falsas; e estigmas tribais de raça, nação e religião que podem ser transmitidos
pela linguagem. Em todas essas tipologias pode-se encontrar a mesma característica sociológica: “um
indivíduo que poderia ser facilmente recebido na relação social quotidiana possui um traço que se
pode impor atenção e afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para
outros atributos seus” (Goffman, 1975:14).
O processo de estigmatização pode variar de acordo com a evidência e a exposição das características
do indivíduo. Goffman (1975) caracteriza dois tipos de grupos de indivíduos de acordo com seu
estereótipo: o desacreditado e o desacreditável. O indivíduo desacreditado possui características
distintas em relação aos normais, sendo estas conhecidas e percetíveis por estes. O desacreditável
também possui características distintas das dos normais, mas nem sempre conhecidas e percebidas
por eles. Essas duas realidades podem encontrar-se respetivamente na relação estigmatizados e
normais.

Goffman (1975) afirma que os normais constroem uma teoria do estigma. Eles constroem uma
ideologia para explicar a inferioridade das pessoas com um estigma e para ter controle do perigo que
ela representa, acreditando que alguém com um estigma não é verdadeiramente humano. Para Melo
(2000:2), o “social anula a individualidade e determina o modelo que interessa para manter o padrão
de poder e anula todos os que rompem ou tentam romper com o modelo social”. Os estigmatizados
possuem uma marca, significando então que, sua identidade social é deteriorada para conviver com
os outros. Para Goffman (1975:148), “normais e estigmatizados são perspetivas que são geradas em
situações sociais durante os contatos mistos, em virtude de normas não cumpridas que provavelmente
atuam sobre o encontro”.

O que é a Síndrome de Rett?


Esta síndrome consiste numa perturbação grave do neurodesenvolvimento que conduz a severas
limitações funcionais associadas a sintomas motricionais progressivos. Uma das principais
características da Síndrome de Rett consiste no desenvolvimento de múltiplos deficits específicos
após um período de funcionamento normal durante os primeiros meses de vida. Com efeito, durante
os primeiros 6 meses de vida, as crianças apresentam um desenvolvimento aparentemente normal
nos períodos pré-natal e perinatal, ao qual se segue uma perda de competências. A regressão envolve
especificamente as capacidades psicomotoras (com perda significativa de aquisições motoras)
associada a estereotipias das mãos (por ex., gestos como torcer ou lavar as mãos) e a outras
manifestações comportamentais específicas. Estas estereotipias manuais com perda de
funcionalidade, intensas e por vezes contínuas, constituem outra das principais “marcas” da
Síndrome de Rett. Surge também uma ataxia de tronco, o que significa que quando está sentada e
sem apoio, a criança pode apresentar um movimento de balanço e de instabilidade do tronco.

O interesse pelo ambiente social diminui nos primeiros anos após o início da Síndrome. Existe,
também, severo prejuízo no desenvolvimento da linguagem expressiva ou recetiva. Entre os doze
meses e os quatro anos de idade, são detetáveis défices cognitivos graves, a par de uma expressão
linguística pobre (a criança pode utilizar com frequência os olhos para apontar para as coisas que
quer, ou para expressar determinadas emoções). O perímetro craniano é normal ao nascimento, no
entanto, durante este processo, verifica-se uma desaceleração do crescimento craniano entre os 5 e
os 48 meses de idade. Em muitos casos, pode evoluir para microcefalia. Esta microcefalia adquirida
é considerada como outra das características mais significativas da Síndrome de Rett.

Qual a evolução dos sintomas na Síndrome de Rett?


Podem ser observados no desenvolvimento normal alguns períodos de regressão, porém não se
apresentam tão severos e tão prolongados quanto na Síndrome de Rett. Esta Síndrome é permanente,
sendo que a perda das competências é geralmente persistente e progressiva. Neste sentido, as
dificuldades ao nível da comunicação e do comportamento tendem a permanecer relativamente
constantes ao longo do ciclo vital.

O que ter em conta no Diagnóstico Diferencial?


Pela predominância de défices na comunicação e reciprocidade social, assim como pela manifestação
de estereotipias manuais, para o diagnóstico diferencial importa distinguir entre Síndrome de Rett e
Perturbação do Espectro do Autismo (nomeadamente, Perturbação de Asperger). Tal constitui um
factor que dificulta o diagnóstico, no entanto existem particularidades que facilitam a identificação e
diagnóstico da Síndrome de Rett.

Há que ter em conta que na Síndrome de Rett existe um padrão característico de desaceleração do
crescimento craniano, associado à perda de competências adquiridas anteriormente, com
aparecimento de marcha ou movimentos do tronco fracamente coordenados. O diagnóstico de
Síndrome de Rett também deve ter conta a existência de apraxia manual, ou seja, incapacidade para
efetuar sequências de movimentos com as mãos, bem como hiperventilações e apneias frequentes,
que não constituem sintomas característicos das Perturbações do Espetro do Autismo (O autismo é
um transtorno do neurodesenvolvimento complexo envolvendo a dificuldade de comunicação e
socialização e um repertório limitado de comportamentos e interesses).

Como intervir na Síndrome de Rett?


Se detetou alguns destes sintomas no seu filho, deverá procurar acompanhamento clínico com
urgência. É necessário confirmar a suspeita de Perturbação do Neurodesenvolvimento e avaliar as
funções cognitivas e sensoriais afetadas para traçar uma intervenção eficaz.
Um Psicólogo poderá também ajudá-lo/a na avaliação de competências nas diferentes áreas do
desenvolvimento, com recurso a instrumentos de avaliação devidamente padronizados. A sua
intervenção com a criança poderá centrar-se no desenvolvimento e estimulação das funções
cognitivas, das capacidades comunicacionais e socioafetivas, assim como poderá ser um elemento
fundamental para atuar como suporte emocional aos pais.

O conceito de estigma evidenciando as situações de relacionamento entre estigmatizados e


estigma
Goffman (1982) esclarece o conceito de estigma como um processo de construção histórico-social que
passou por diversas modificações, desde os tempos antigos até os atuais. Na Grécia Antiga: sinais
corporais usados para ressaltar alguma característica ruim e indesejável do indivíduo e alertar as
demais pessoas para a inconveniência e perigo do contato. Na era Cristã: conotação positiva, sinal
corporal da graça de Deus. Nos dias atuais: prevalecimento da conotação negativa, referindo-se menos
à evidência corporal e mais à condição de exclusão social.

O estigma social é definido pela desaprovação das características e crenças pessoais que confrontam
as normas culturais prevalentes em determinado grupo social, conduzindo os portadores destas
características ou adeptos destas crenças à marginalização. Portanto, o estigma é a “situação do
indivíduo que é inabilitado para a aceitação social plena” e refere-se a “um atributo profundamente
depreciativo” (Goffman, 1982, p. 8), ou seja, é a condição de não possuir atributos considerados
importantes por um grupo social.

Segundo Goffman (1982), existem três formas de estigma: deformidades físicas (deficiências
motoras, auditivas, visuais, desfigurações do rosto ou corpo); características pessoais e
comportamentais (distúrbios mentais, comportamento político radical, desemprego,
toxicodependências, vícios, prisão) e estigmas tribais (pertencimento a uma raça, nação, religião).

O conceito de estigma apresenta variantes de acordo com cada sociedade, sendo um fenômeno
relativo, considerando-se que o que constitui um estigma em um grupo social não o é necessariamente
em outro. Alguns comportamentos ou atributos podem ser universais quando se relacionam ao
estigma e outros podem ser específicos de uma dada cultura. Alguns estigmas são mantidos ao longo
do tempo, enquanto outros estão presentes e são característicos de um determinado período histórico-
social e cultural. Logo, um atributo ou comportamento terá o significado que a cultura lhe atribuir.

A sociedade categoriza as pessoas, estabelecendo os atributos “comuns e naturais” para os


pertencentes às categorias previamente determinadas. Baseadas nisto, as relações sociais ocorrem
sem que haja atenção e reflexão de seus atores em relação uns aos outros, estando eivadas de pre-
conceções que são transformadas “em expectativas normativas”: exigências rigorosas criadoras da
identidade social de cada elemento desta relação social (Goffman, 1982).

Há dois tipos de identidade social: i) “identidade social virtual”, correspondente à soma do caráter
imputado ao indivíduo com as expectativas normativas ou demandas explicitadas; ii) “identidade
social real”, constituída pela categoria e atributos que o indivíduo possui. Quanto maior a discrepância
entre a identidade virtual e real, mais forte será o estigma; quanto mais percetível e acentuada a
diferença entre o indivíduo estigmatizado e os normais, mais estigmatizante ela será; quanto maior
a diferença entre os atributos reais e atribuídos, mais acentuada será sua problemática, devido ao
controle social e submissão a ele (Goffman, 1982). Tal discrepância é prejudicial à identidade social,
pois o indivíduo assume uma posição isolada da sociedade e de si, tornando-se um desacreditado.
Consequentemente, não se aceita. O autoconceito é marcado pelo estigma e pelas relações
interpessoais, que exercem influência negativa no autoconhecimento e na formação da autoestima e
do autoconceito.

O indivíduo estigmatizado é “o” diferente em uma sociedade que exige a semelhança, não
reconhecendo as diferenças dentro da semelhança. O diferente tende à conotação de nocivo e incapaz
por fugir aos parâmetros estabelecidos na formação do padrão. O social tenta manter a imagem
deteriorada, objetivando conservar a eficácia do simbólico e ocultar a manutenção do sistema de
controle social. O indivíduo estigmatizado não tem espaço nem voz, papéis a exercer, funções a
executar, não pode ser sujeito da ação, tornando-se uma pessoa sem valor nas relações sociais
(Goffman, 1982).

De acordo com Goffman (1982), os estigmatizados possuem as mesmas caraterísticas sociológicas: o


indivíduo é apartado da sociedade, não conseguindo aceitação social plena por possuir um traço
distintivo que não corresponde às demandas a ele dirigidas e se sobrepõe aos demais atributos,
impedindo que sejam percebidos. Aqueles que possuem aceitação social plena, por não se afastarem
das expectativas normativas e possuírem os atributos adequados à sua categorização, são os
“normais”. Sintetizando: a sociedade estabelece meios para a categorização (Goffman, 1982).

Resumo:
Três tipos de estigma: por deformidades físicas, por desvios de caráter e por linhagem.
Þ Deformações físicas: Sensoriais, motoras, e desfiguração de rosto;
Þ Desvios de caráter: distúrbios mentais, toxicodependência; Reclusão e doenças associadas ao
comportamento sexual;
Þ Linhagem: Raça, religião, nação;

1. tese de Goffman: A estigmatização age a partir de uma perspetiva interacionista. A pessoa


identifica outra segundo os atributos significativamente reconhecidos pelo sujeito.
2. tese de Goffman: Traz um novo foco integracionista para se pensar o estigma. Considera que
a conceção de estigma está relacionada com o processo social no qual os dois papeis se
interpenetram, o do normal e o do estigmatizado.

Qualquer pessoa em qualquer momento da sua vida viveu as duas situações. A relação entre os
normais e o estigmatizado: É definida pela forma como se gerem discrepâncias. Entre as
características atribuídas ao individuo e aquilo que ele realmente é. Isto é, a discrepância entre a
identidade social virtual e a identidade social real. Os estigmatizados sabem o peso do estigma sobre
as suas vidas. Podem sentir-se descredibilizados e isso acontece quando sabem que o seu estigma é
conhecido. O problema não é ser diferente, é ser tratado de maneira diferente.

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