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ESCOLA SUPERIOR DE GOVERNAÇÃO

CURSO DE LICENCIATURA EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Trabalho de Conclusão de Licenciatura

Papel da Participação Comunitária na Responsabilidade Social das Empresas: O


caso da Mozal na Localidade de Chinonanquila (2015- 2020)

Candidato: Supervisor:

Juliano Carlos Baptista


Maputo, Março de 2022
DECLARAÇÃO DE AUTORIA

Eu, Juliano Carlos Baptista, declaro, por minha honra, que o presente trabalho é da minha autoria e
que nunca foi anteriormente apresentado para avaliação em alguma instituição de ensino superior
nacional ou de outro país.

Maputo, Março de 2022

____________________________________

(Juliano Carlos Baptista)


TERMO DE RESPONSABILIZAÇÃO DA CANDIDATA E DO SUPERVISOR

Papel da Participação Comunitária na Responsabilidade Social das Empresas: O caso da Mozal na


Localidade de Chinonanquila (2015- 2020)

Monografia a ser submetida na Escola Superior de Governação


(ESG) da Universidade Joaquim Chissano (UJC), como
cumprimento parcial dos requisitos necessários para a obtenção
do grau de Licenciatura em Administração Pública (AP).

O candidato O supervisor

____________________________ __________________________________
(Juliano Carlos Baptista) ()

Maputo, Março de 2022


AGRADECIMENTOS

DEDICATÓRIA

EPÍGRAFE

“A democracia participativa aumenta a legitimidade


das decisões tomadas, uma vez que essas devem, em
princípio, serem discutidas com aqueles que serão
afectados por elas”.

(PLOTKE, 1997)

LISTA DE SIGLAS

LISTA DE FIGURAS, GRÁFICO E QUADROS

SUMÁRIO EXECUTIVO

Palavras-Chave:

iv
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema, “Papel da Participação Comunitária na Responsabilidade Social
das Empresas: O caso da Mozal na Localidade de Chinonanquila”. E abrange o período que vai de
2015, ano da reabilitação da Escola Primária Completa 1º de Junho pela Associação Mozal para o
Desenvolvimento da Comunidade (AMDC), até 2020 ano em que se assinala o primeiro caso da
pandemia viral (COVID-19) em Moçambique. Pretende-se com o mesmo, compreender o
envolvimento das comunidades locais em face as acções da Responsabilidade Social das Empresas
(RSE) em Moçambique. Este compreende o espaço afectado pela actividade da Mozambique
Aluminium (MOZAL), com particular destaque para a comunidade de Chinonanquila, no distrito de
Boane.

1.1 Delimitação do Tema no Espaço e no Tempo

A pesquisa foi realizada tendo em conta o envolvimento da comunidade de Chinonanquila em face as


acções socialmente responsáveis desencadeadas pela Mozal. Esta escolha deve-se pelo facto da
comunidade de Chinonanquila, no distrito de Boane, ter sido uma das beneficiadas por estas iniciativas
com a reabilitação da Escola Primária Completa 1º de Junho em 2015. Tal escola funciona como local
de interacção entre os gestores da Mozal e a comunidade na consulta dos problemas que preocupam as
pessoas. Na sua visão de RSE, concretamente na área da educação e formação, a Mozal sustenta que a
educação trás benefícios na participação económica, na saúde e no bem-estar, através do
melhoramento do acesso ao emprego e às oportunidades de negócio nas comunidades.

A amplitude temporal da pesquisa compreende o período de 2015, ano da reabilitação da Escola


Primária e Completa 1º de Junho na comunidade em análise, até 2020, ano em que se assinala o
primeiro caso da pandemia viral (COVID-19) em Moçambique. Pretende-se com esta periodização,
captar a percepção comunitária e a sua participação nas medidas da RSE.

1.2 Contextualização

Numa perspectiva histórica a RSE é uma manifestação actual de debates antigos sobre o papel dos
negócios na sociedade. O fenómeno novo neste debate é o facto de estes debates relacionarem a RSE
com temas como o desenvolvimento, ambiente, direitos humanos, e tem uma amplitude global em
comparação com os períodos anteriores.

A responsabilidade social corporativa era aceite como doutrina nos EUA e Europa até o século XIX,
quando o direito de conduzir negócios de forma corporativa era uma questão de prerrogativa do Estado
ou Monarquia e não um interesse económico privado (Hood, 1998). Com a independência dos EUA,

1
os estados americanos começaram a aprovar a legislação que permitisse a auto-incorporação (Self-
incorporation) como alternativa à incorporação por acto legislativo específico, inicialmente para
serviços de interesse público, como, por exemplo, a construção de canais, e, posteriormente, para
propósitos de condução de negócios privados. Desta forma, até ao início do séc. XX a premissa
fundamental da legislação sobre corporações era de que seu propósito era a realização de lucros para
seus accionistas (Ashley, 2000).

Após os efeitos da Grande Depressão e o período da Segunda Guerra Mundial, a noção de que a
corporação deve responder apenas aos interesses dos seus accionistas sofreu ataques na academia,
principalmente pelos trabalhos de Berle e Means, The Modern Corporation and Private Property
(Berle & Means, 1932), argumentando que os accionistas eram passivos proprietários que abdicavam
controlo e responsabilidade para a direcção da corporação. Estes eventos históricos destacados criaram
um ambiente para uma aceitação gradual da responsabilidade social no contexto académico. Suzana
Leal (2005) destaca as fases importantes que marcam este percurso até às modernas formulações da
responsabilidade social.

Com efeito a responsabilidade social empresarial começa a sofrer uma crescente formalização
enquanto conceito a partir da década de 1960. McGuire (1963) defendeu a ideia de que a
responsabilidade social supõe que a empresa não tem apenas obrigações legais e económicas mas
também algumas responsabilidades para com a sociedade. Por sua vez, Walton (1967) destaca que o
conceito de responsabilidade implica uma intimidade da relação entre empresa e a sociedade, e
defende que tal relação deve ser lembrada pelos gestores de topo à medida que a empresa e os grupos
relacionados prosseguem os respectivos objectivos (Leal, 2005).

Na década de 1970 proliferam as definições da RSE, tendo-se destacado a definição de Davis (1973)
que define a RSE como: “consideração e resposta das empresas a questões que ultrapassam os seus
aspectos económicos, técnicos e legais”. Para este autor a responsabilidade social começa onde a lei
termina. No mesmo contexto Carroll (1979:500) defendeu que: “A responsabilidade social de um
negócio envolve as expectativas económicas, legais, éticas e discricionárias que a sociedade tem em
um determinado período de tempo”. Ora esta definição apresenta quatro componentes, onde se espera
que a empresa produza bens e serviços e que os venda com lucro (componente económica), que
respeite a lei (componente legal), que tenha comportamentos éticos e respeita as normas (componente
ética) e que de forma voluntária desempenhe papéis que beneficie a sociedade (componente
discricionária ou filantrópica).

2
Na década de 1980 surgiram menos definições de RSE e mais aplicações e estudos empíricos sobre o
tema. Em 1984, Drucker defendeu a ideia de que a rentabilidade e a responsabilidade são noções
complementares, bem como, a ideia de que é desejável para os negócios a “concessão” das
responsabilidades sociais em oportunidades de negócio. Tal como referido por Drucker (1984: 59) “To
do good in oder to do well”, isto é, converter as necessidades e problemas sociais em oportunidades de
negócios rentáveis era, na época, raramente considerado pelos que advogavam a responsabilidade
social. Ou seja, a primeira responsabilidade social de qualquer negócio deverá ser ter proveitos
suficientes para cobrir os custos do futuro (Leal, 2005).

No período posterior a 1990 têm sido desenvolvidos conceitos complementares aos da


responsabilidade social, tais como, corporate social responsiveness, corporate social performance
(CSP), public policy, ética nos negócios, gestão dos stakeholders.

1.3 Justificativa

Ao nível social, a escolha do tema sobre a RSE em Moçambique, com particular foco na actuação da
Mozal na vida das comunidades, é um contributo ao debate que já tem acontecido, sobre o
desenvolvimento social e económico que é esperado com a actuação dos megaprojectos, das
multinacionais estrangeiras.

Ao nível da AP, a escolha deste tema é uma oportunidade de discutir a RSE com novas perspectivas de
análise, visto que este tema já tem sido alvo de estudos em ciências como a administração, economia,
gestão, entre outras, e por esta via através da AP podem ser levantados novos problemas e sugestões de
pesquisa.

Em termos de motivação pessoal, pesaram a curiosidade despertada no autor pelo tema da RSE, que
embora não sendo um novo tema, tem a capacidade de despertar animosidades em alguns círculos de
opinião da sociedade Moçambicana. O autor sendo membro desta mesma sociedade, não poderia
deixar de dar o seu contributo para reflexão do tema, com o auxílio da AP.

Por outro lado a questão da participação comunitária em matérias de RSE dos megaprojectos, já deu
provas de ser em algum momento, um terreno aberto a diversas interpretações, tanto por parte dos que
implementam, como também das comunidades que dela se beneficiam. Embora tenham sido feitos
esforços na teorização da RSE, nota-se que ainda persistem lacunas da sua implementação ao nível
empírico.

Portanto a partir de um estudo de caso do megaprojecto Mozal, procuramos compreender os processos


de interacção e diálogo entre a comunidade, na elaboração de acções direccionadas ao bem-estar das

3
comunidades locais. Ou seja, há que perceber até que ponto a comunidade é ouvida na elaboração e
implementação das acções que a empresa faz.

1.4 Problematização

Na visão de Crowther e Aras (2008), apontam elementos como o facto de estas práticas criarem infra-
estruturas e serviços básicos para as comunidades em redor destas empresas, como escolas, postos de
saúde, oficinas, fontenárias, criação de empregos, entre outros, contribuindo assim para a melhoria das
condições de vida e para o desenvolvimento local.

Santos (2012:90), por sua vez defende que “o surgimento de empresas socialmente responsáveis é uma
condição sine qua non para o desenvolvimento endógeno, fazendo com que a empresa crie activos na
relação economia-sociedade-ambiente”.

Contudo, as críticas lançadas a RSE apontam que o dever dos megaprojectos é do pagamento de
impostos e o cumprimento da lei, e que as acções de cariz social devem ser feitas pelo governo
(Selemane, 2012). As críticas apontam que os incentivos fiscais concedidos a estas empresas, e a
regulação reduzida pelo Estado trazem apenas uma pequena porção dos rendimentos e das riquezas
geradas por estas actividades. Desta forma as empresas são acusadas de usar a RSE como uma capa
para não cumprirem as suas obrigações fiscais (Tourinho, 2007).

A linha que usamos neste estudo, não pretende se limitar a uma crítica dogmática ou a uma celebração
exacerbada da RSE, visto que esta prática tem suas vantagens e desvantagens. No entanto, nos
questionamos se as comunidades locais que são abrangidas pela RSE tomam parte activamente destas
práticas, através de processos de participação, negociação, tomada de decisão ou são actores passivos
que dependem da caridade esporádica e boa vontade destas corporações e multinacionais?

Este questionamento é feito pelo facto de serem as próprias empresas que através da RSE, regulam a
sua própria conduta na sua intervenção social nas comunidades e frequentemente apontam os aspectos
positivos das suas actividades nos seus relatórios de prestação de contas. Neste processo as
comunidades que se beneficiam da RSE, raras vezes tem a oportunidade de intervir e de concordar ou
descordar do posicionamento das empresas. Nesta senda, pesquisas feitas no campo da RSE, analisam
a actuação social das empresas nas comunidades, realçando as questões de participação, negociação e
tomada de decisão dessas mesmas comunidades.

Echave (2006) sustenta que as comunidades ligadas às companhias tem um papel reduzido no processo
de tomada de decisão sobre o desenvolvimento das suas zonas, pois as comunidades tendem a negociar

4
com as empresas sem preparação adequada, não definindo objectivos e estratégias, sem obter a
informação necessária, sem recursos, consultas e sem capacidade organizacional.

As negociações entre empresas e comunidades estão mais concentradas em esquemas de compensação


(pagamento em dinheiro às comunidades pelos reassentamentos das suas áreas de habitação com o
surgimento da companhia petrolífera), do que na definição de estratégias de desenvolvimento a longo
prazo. É de recordar que tais compensações contemplam as fases iniciais dos projectos de mineração,
ou seja, as companhias não reconhecem o seu papel na responsabilidade social como uma relação
contínua no presente e no futuro.

O não envolvimento das populações locais tem como consequências a dependência mental. Visto que a
construção de edifícios e de outros projectos de desenvolvimento não envolvem de forma genuína a
população local, estas iniciativas das companhias são vistas como ofertas, e as populações não se
sentem como donas destes projectos (Frynas, 2005:590).

Assim a participação dos beneficiários tem sido constrangida pela falta de habilidades das companhias
petrolíferas de gerir as questões de desenvolvimento local através da responsabilidade social
empresarial, e também pelas abordagens tecnicistas usadas pelos gestores das companhias no
tratamento das questões sociais.

As abordagens aqui arroladas nos levam a constatar que apesar da emergência da responsabilidade
social empresarial na esfera internacional, frutos da sua teorização e normatização, a sua
implementação ainda é divergente no seio das diferentes empresas e companhias de diversos ramos.

Ligados a este aspecto, a fronteira entre RSE, caridade e filantropia é pouco clara, o que tem criado
disparidades não se sabendo se certas acções fazem parte de uma estratégia de RSE planificada pela
empresa, ou se trate de acções momentâneas de boa vontade. Perante este cenário o que dizer da
realidade moçambicana, onde através da RSE, especialmente dos megaprojectos, estes últimos tem
interagido com as comunidades locais criando impactos de ordem económica, social e ambiental?

Deste modo temos como pergunta de partida: Até que ponto a participação comunitária contribui
nas acções da responsabilidade social das empresas, especificamente a comunidade de
Chinonanquila?

1.5 Objectivos da Pesquisa


1.5.1 Objectivo Geral
 Reflectir em Torno do Papel da Participação Comunitária nas Acções da Responsabilidade Social
das Empresas.

5
1.5.2 Objectivos Específicos
 Identificar os mecanismos de participação usadas pela comunidade de Chinonanquila no âmbito da
RSE da Mozal;
 Descrever o circuito de interacção entre a comunidade e a empresa nas acções de responsabilidade
social;
 Identificar as áreas de intervenção e principais realizações sociais implementadas na comunidade
de Chinonanquila no âmbito da RSE;
 Identificar o papel da participação da comunidade de Chinonanquila nas acções socialmente
responsáveis da Mozal.

1.6 Questões da Pesquisa


 Quais são os mecanismos de participação usadas pela comunidade de Chinonanquila no âmbito da
RSE da Mozal?
 Como é o circuito de interacção entre a comunidade e a empresa nas acções de responsabilidade
social?
 Quais são as áreas de intervenção e principais realizações sociais implementadas na comunidade de
Chinonanquila no âmbito da RSE?
 Qual é o papel da participação da comunidade de Chinonanquila nas acções socialmente
responsáveis da Mozal?

1.7 Hipótese da Pesquisa

H1: O conhecimento de acções de RSE da Mozal influencia na percepção que a comunidade de


Chinonanquila tem da sua participação na tomada de decisão dos projectos de RSE.

1.8 Metodologia do Trabalho

Nesta fase é apresentada a metodologia usada na elaboração do presente trabalho, nomeadamente, a


caracterização da pesquisa, o tipo de pesquisa, técnica de recolha de dados, técnicas de análise e
tratamento de dados e questões de éticas de investigação utilizada.

6
1.8.1 Classificação da Pesquisa

Existem várias formas de classificar as pesquisas. As formas clássicas de classificação são


apresentadas tendo em conta a lógica de Gil (1991):

Do ponto de vista da sua natureza, o estudo classifica-se como Pesquisa Aplicada: que objectiva gerar
conhecimentos para aplicação prática dirigidos à solução de problemas específicos. Envolve verdades
e interesses locais. Para o efeito, através de tal estudo analisa-se a participação da comunidade de
Chinonanquila como factor de sucesso das acções da RS da Mozal.

Quanto à forma de abordagem do problema este estudo segue uma abordagem qualitativa, procurando
desta forma descrever os resultados sem modificar a realidade tal como ela se apresenta do fenómeno
em estudo.

A pesquisa é qualitativa porque visa responder questões particulares com um grau de realidade que não
pode ser quantificado para garantir a representatividade. Trabalha com um universo de significados,
motivos, aspirações, valores, atitudes correspondentes a um espaço mais profundo das relações, dos
processos e dos fenómenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (Minayo,
1993).

A pesquisa descritiva é aquela que observa, regista e correlaciona factos e fenómenos sem manipulá-
los (Mattar, 1997). Também aborda quatro aspectos: descrição, registro, análise e interpretação de
fenómenos actuais, observando o seu funcionamento no presente” (Marconi & Lakatos, 1990). Deste
modo, esta pesquisa é de carácter descritivo, porque apresenta a percepção social acerca da estratégia
da prática de RSE da Mozal bem como a descrição das suas acções sociais praticadas com
repercussões a nível da comunidade local e circunvizinha onde está inserida.

Relativamente aos meios de investigação foi classificada como estudo de caso e bibliográfica. Gil
(2007), entende que o estudo de caso é caracterizado pelo estudo aprofundado e exaustivo de um ou
mais objectos que permita o seu amplo e detalhado conhecimento, tarefa que seria praticamente
impossível mediante outras abordagens. Assim, neste trabalho optou-se por uma abordagem de “estudo
de caso” cuja unidade de análise é uma organização (Mozal) onde se analisa com alguma
profundidade, de forma a contextualizar a abordagem teórica com um exemplo prático.

Para fundamentar e tentar perceber a estratégia da prática de RSE, aplicada a um caso prático que
possibilitou um estudo aprofundado e detalhado sobre os projectos sociais e as acções sociais praticada
pela organização em estudo que contribui para a melhoria das condições de vida da população.

7
Conclui-se que ao efectuar-se um estudo de caso seria um método importante para oferecer a resposta
a esta investigação (Nogueira, 2011). Denker e Bueno (2007), afirmam que o estudo de caso pode
envolver exames de registos, observação de ocorrências de factos, entrevistas estruturadas e não
estruturadas ou qualquer outra técnica de pesquisa. O objecto do estudo de caso, por sua vez, pode ser
um indivíduo, família, um grupo ou comunidade, uma organização, um conjunto de organizações ou
até uma situação para examinar aspectos variados, que pode incluir tanto um estudo de caso simples
e/ou múltiplos. Para a realização deste trabalho foi utilizado o estudo de caso simples, pois aborda um
único caso.

A pesquisa bibliográfica é o estudo sistematizado, desenvolvido em material publicado em livros,


revistas, jornais, redes electrónicas, isto é, material acessível ao público no geral (Vergara, 1997). No
fundo, trata-se de levantamento, selecção e documentação de bibliografia publicada e acessível sobre o
assunto que esta sendo pesquisado, com o objectivo de colocar o pesquisador em contacto directo com
parte do material escrito sobre o assunto.

Nesta perspectiva, esta pesquisa foi classificada como bibliográfica porque procurou explicar, explorar
e abordar o tema a partir de uma análise aprofundada de materiais já publicados na literatura
académica e artigos científicos com acesso no meio electrónico, como em sites da internet e bibliotecas
virtuais, e em outras fontes e recursos, que dessem alguma sustentação à pesquisa e viabilizasse ao
mesmo tempo o trabalho, como dissertações, teses, revistas, jornais, artigos científicos, documentos
institucionais, boletins informativos e documentos diversos.

1.8.2 Técnicas de Recolha de Dados

De acordo com Goya (2007), existem dois tipos de dados recolhidos numa pesquisa, nomeadamente,
primários e secundários. Sendo os dados primários, aqueles obtidos a partir de informações das
próprias organizações, isto é, são originais obtidos através de entrevistas. Os dados secundários
provém de outras fontes como: bibliografia sobre o assunto, sites da internet, artigos científicos, livros,
jornais, revistas, teses, dissertações, documentos institucionais (relatórios de sustentabilidade,
informação pública e publicada), entre outros.

Neste estudo, a técnica utilizada na recolha de dados primários foi mediante a realização de uma
entrevista semi-estruturada e pessoal, dirigida aos responsáveis com responsabilidades pelas acções da
prática de RS da empresa, com base num guião pré-elaborado, composto por perguntas abertas,
direccionadas ao objectivo do trabalho. A razão que se prende com uso deste tipo, segundo Ludke e
Andrá (2013) é, porque “[…] se desenvolve a partir de um esquema básico, porém não aplicado
rigidamente, permitindo que o entrevistador faça as necessárias adaptações”. A técnica para a recolha

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de dados secundários foi através de artigos científicos, dissertações, teses e sites da internet, para além
da legislação, relatórios e documentação sobre o assunto em apreço, que consistiu na obtenção de um
suporte teórico para compreender os elementos relacionados com a RSE.

Durante as entrevistas, as perguntas seguiam uma ordem lógica com o intuito de facilitar o
entendimento das questões associadas à temática estudada. No entanto, a ordem das perguntas foram
sendo modificadas durante a realização das entrevistas. Essas variações ocorreram devido a
acontecimentos aleatórios, como interrupções e mudança de assunto por parte do entrevistado, dentre
outras. Durante a recolha de dados primários, todas as entrevistas são gravadas e, em seguida,
transcritas para que se pudesse fazer a análise de conteúdo.

1.8.3 Métodos da Pesquisa

O método científico representa o processo racional que se emprega na investigação. É a linha de


raciocínio adoptada no processo de pesquisa (Carvalho, 2009). A realização do presente trabalho foi
feita a partir dos seguintes métodos:

1.8.3.1 Método de Abordagem

É o método Hipotético-Dedutivo, definido por Karl Popper1 a partir de críticas à indução. A indução,
no entender de Popper, não se justifica, pois o alto indutivo de “alguns” para “todos” exigiria que a
observação de factos isolados atingisse o infinito, o que nunca poderia ocorrer, por maior que fosse a
quantidade de factos observados (Gil, 1999). Assim, Marconi e Lakatos (1983) concordam que a
dedução-hipotética consiste na adopção da seguinte linha de raciocínio:

Quando os conhecimentos disponíveis sobre determinado assunto são insuficientes para a


explicação de um fenómeno, surge o problema. Para tentar explicar a dificuldades expressas no
problema, são formuladas conjecturas ou hipóteses. Das hipóteses formuladas, deduzem-se
consequências que deverão ser testadas ou falseadas. Falsear significa tornar falsas as
consequências deduzidas das hipóteses. Enquanto no método dedutivo se procura a todo custo
confirmar a hipótese, no método hipotético-dedutivo, ao contrário, procuram-se evidências
empíricas para derrubá-la.

Baseado neste pressuposto, para o estudo propõe-se o uso deste método, uma vez que se tem em base
dados incompletos para explicar as acções da RSE e o papel que deste decorre para o desenvolvimento
das comunidades, deste problema, o pesquisador já cria postulado (hipótese) para tentar explicar o
facto problemático e assim, são testados, confirmados ou falseados no terreno.

1
POPPER, K. (1935), A lógica da investigação científica.

9
1.8.3.2 Método de Procedimento

Para o estudo aplica-se o método monográfico ou estudo de caso2, chamado por muitos como método
das representatividades. Este método parte do princípio de que o estudo de um caso em profundidade
pode ser considerado representativo de muitos outros ou mesmo de todos os casos semelhantes. Esses
casos podem ser indivíduos, instituições, grupos ou comunidades (Gil, 2009). Assim, o estudo é
exaustivo e representativo ao ponto de se considerar a participação um vector preponderante para o
alcance do sucesso das acções da RSE não só na comunidade em análise como também para as demais
comunidades. Portanto, especificamente este estudo é representativo de caso institucional e territorial.

1.8.4 População e Amostra da Pesquisa

Foi realizado o trabalho de campo na localidade de Chinonanquila, distrito de Boane. A escolha deste
universo físico foi influenciada pelos critérios da Mozal, onde as suas acções de RSE beneficiam as
comunidades existentes num raio de 20 km da empresa, e por via disto, a comunidade de
Chinonanquila é uma das beneficiadas dos projectos de RSE, tendo em conta os critérios da Mozal,
que serão avaliados empiricamente. População (ou universo da pesquisa) é a totalidade de indivíduos
que possuem as mesmas características definidas para um determinado estudo (Yin,1994). Para o
autor, amostra é parte da população ou do universo, seleccionada de acordo com uma regra ou plano.
Entretanto, o universo da pesquisa abarca cerca de ……….. Do universo extraiu-se uma amostra de
…………. Elementos.

1.8.4.1 Processo de Amostragem da Pesquisa

Na pesquisa, o processo de amostragem procura identificar desde a unidade de amostragem, o tamanho


da amostra e como seleccionar. Assim, quanto à técnica de amostragem, a pesquisa beneficia da
amostra não-probabilística, definida por Schiffman e Kanuk (2000) como uma técnica de amostragem
na qual as amostras são recolhidas em um processo que não dá todos os indivíduos da população as
mesmas chances de serem seleccionados.

Assim, para a operacionalização desta técnica são aplicados os seguintes tipos de amostragem:

Amostragem por acessibilidade ou por conveniência: constitui o menos rigoroso de todos os tipos de
amostragem, por isso mesmo é destituída de qualquer rigor estatístico. O pesquisador selecciona os
elementos a que tem acesso, admitindo que estes possam, de alguma forma, representar o universo
(Gil,1999). Aplica-se este tipo de amostragem em estudos descritivos ou qualitativos, onde não é

2
O estudo de caso “visa explorar, descrever ou explicar uma realidade específica, e surge do desejo de compreender
fenómenos sociais complexos, ao mesmo tempo que retém as características significativas e holísticas de eventos da vida
real” (Yin, R., 2010).

10
requerido elevado nível de precisão. Portanto, esta tipologia é aplicada para a selecção dos utentes,
devido a dificuldade para a sua localização.

Amostragem por tipicidade ou intencional: também constitui um tipo de amostragem não


probabilística e consiste em seleccionar um subgrupo da população que, com base nas informações
disponíveis, possa ser considerado representativo de toda a população. A principal vantagem da
amostragem por tipicidade está nos baixos custos de sua selecção. Entretanto, requer considerável
conhecimento da população e do subgrupo seleccionado (Ibid.:94).

1.8.5 Estrutura do Trabalho

Esta monografia está organizada ou estruturada em quatro (4) capítulos. O da Introdução (onde se faz a
breve apresentação do trabalho desde os objectivos, delimitação espácio-temporal, contextualização,
justificativa da sua realização, problematização até ao seu tratamento metodológico);

O segundo capítulo compreende o debate teórico e conceptual, onde são abordados aspectos como o
desenvolvimento teórico que faz o acompanhamento do tema em estudo, faz também a
conceptualização dos conceitos-chave usados com frequência na abordagem do tema;

O terceiro capítulo é reservado para revisão da literatura (abordagens sobre a participação comunitária
e o seu papel nas acções da RSE);

O quarto capítulo faz menção à caracterização do campo de estudo e é ainda neste capítulo que são
apresentados e discutidos os dados colhidos no campo (Mozal e comunidade na localidade de
Chinonanquila). Depois dos capítulos é trazida a conclusão (considerações do pesquisador) sucedida
da página das referências bibliográficas usadas, Apêndices e Anexos.

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CAPÍTULO 2: QUADRO TEÓRICO E CONCEPTUAL

Este capítulo compreende o debate teórico e conceptual, onde são abordados aspectos como o
desenvolvimento teórico que faz o acompanhamento do tema em estudo, a conceptualização dos
conceitos-chave usados na abordagem do tema.

Para interpretar os resultados, a pesquisadora precisa ir além da leitura dos dados, com vista a integrá-
los num universo mais amplo em que poderão ter algum sentido. Esse universo é o dos fundamentos
teóricos da pesquisa e o dos conhecimentos já acumulados em torno das questões abordadas (Gil,
2009).

2.1 Quadro Teórico

Mediante o auxílio de uma Teoria pode-se verificar que por trás dos dados existe uma série complexa
de informações, um grupo de suposições sobre o efeito dos factores sociais no comportamento e um
sistema de proposições sobre a actuação de cada grupo. Assim, as teorias constituem elemento
fundamental para o estabelecimento de generalizações empíricas e sistemas de relações entre
proposições. Assim, o estudo é lido na base da Teoria da Democracia Participativa (TDP)
complementada pela Teoria do Desenvolvimento Endógeno (TDE).

2.1.1 Teoria da Democracia Participativa

Para Langa (2012), Joseph Proudhon3 e Piotr Kropotkine4 formularam os modelos económicos
alternativos, com base no princípio da autogestão, criando deste modo a TDP.

Segundo Cohen (1998: 28), durante o Século XIX, nasce o movimento cooperativo e associativo,
como uma nova forma de organização da Sociedade Civil, colocando este movimento como parceiro
“natural” dos sistemas políticos e económicos, levando a que nos nossos dias, este movimento,
desenvolve-se novas estratégias baseadas, nos actores locais, disponíveis para desencadearam um
processo de diálogo e de negociação, criando assim, uma nova ordem social, baseada no ordenamento
participativo e negociado, promovendo assim o diálogo local.

Surgindo então, nessa época a ideia de autogoverno (sef-goverment), que é defendida, por vários
pensadores políticos, como democracia participativa.
2.1.1.1 Pressupostos da Teoria da Democracia Participativa

A visão Proudhoniana5 apresenta seguintes princípios, (Proudhon, 2001):

3
PROUDHON, P. J. (2001), Do princípio federativo. São Paulo: Nu-Sol. ISBN
4
KROPOTKINE, P. (2009), Ajuda Mútua: Um factor de evolução, São Sebastião: A Senhora Editora.

12
 Autogestão;
 Divisão de poder por todos os elementos que constituem a comunidade;
 Reduzir ao mínimo as funções políticas em simples funções económicas;
 Estrutura da base para o topo (down-top) do Governo.

2.1.2 Génese e Pressupostos da Teoria de Desenvolvimento Endógeno

De acordo com Barquero (2001-37-38)6 in valdemar (2014), o desenvolvimento endógeno originou-se


entre 1980 e 1990 num contexto económico global marcado pela incerteza, aumento de concorrência,
mudança institucional e surgimento de formas mais flexíveis de acumulação de capital. Para reduzir tal
incerteza movida pela globalização, Moraes (2003) enfatiza dizendo que Desenvolvimento Endógeno
surge quando começam a destacar-se propostas de desenvolvimento de base para o topo, partindo do
fortalecimento das potencialidades locais, como forma de transformar, fortalecer e qualificar as
estruturas internas da região ou locais de modo a favorecer os rendimentos crescentes e criar
externalidades positivas.

De acordo com Costa (2002), desde os meados dos anos 80 do século XX, a investigação no âmbito da
teoria do crescimento sofreu um novo impulso e tal impulso deveu-se aos inúmeros trabalhos pioneiros
desenvolvidos por autores como Romer (1986)7 e Lucas8 ( 1988). Os modelos desenvolvidos por esses
autores, bem como outros modelos subsequentes, passaram a designar-se, genericamente como modelo
de crescimento endógeno.

Figueiredo et al (2005), afirmam que Romer é convencionalmente considerado como o fundador da


Teoria do Desenvolvimento Endógeno, pela criação de um modelo que associa a existência de
rendimentos constantes, ao nível macro, para o factor acumulável para a existência de externalidades
positivas geradas pelo investimento de cada empresa e por via das externalidades, cada empresa
enfrentará rendimentos constantes na sua função de produção mas a função de produção agregada
exibirá rendimentos crescentes. Lucas (1988) É um dos autores precursores da TDE tendo criado um
modelo que determinava que “o capital humano designa o conjunto de conhecimentos susceptíveis de
serem utilizados na produção e incorporados nos indivíduos” Figueiredo, 2005:161, considerando
assim o capital humano um factor de crescimento económico.
5
Consiste, em reduzir ao mínimo as funções políticas em simples funções económicas. A constituição desta sociedade é
essencialmente progressiva e que este destino não pode ser concretizado, senão num sistema onde a hierarquia
governamental, em lugar de assentar sobre o topo, é estabelecida a partir da base, ou seja, colocar o povo no topo da
hierarquia. Constituindo grupos pequenos, respectivamente autónomos e uni-los em torno de um pacto de desenvolvimento
económico. Este modelo assente na autonomia e no cooperativismo, tende aproximar-se cada vez mais pela organização em
outras mãos, que não as do Estado (Proudhon, 2001).
6
Barquero, A.V. (2001). Desenvolvimento endógeno em tempos de globalização. Porto Alegre: FEE/UFRGS.
7
Romer. P. (1986). Increasing returns and long-run growth. Journal of Political Economy, v. 94. n.5. pp 1002-1037.
8
Lucas. R. ( 1988) On the mechanics of economic development, J. Monetary Econ. V. 22. n. 1, pp. 3-34.

13
2.1.3 Pressupostos Básicos da Teoria do Desenvolvimento Endógeno

O aspecto endógeno refere-se ao facto do desenvolvimento ser determinado por actores internos à
região, sejam eles empresas, organizações, sindicatos ou outras instituições (Campus et al, 2005).

Para Moraes (2003), a TDE pressupõe o apoio nos factores de produção, sendo estes geridos
endogenamente em cada território e baseia-se na execução de políticas de fortalecimento e qualificação
das estruturas internas dos territórios criando condições sociais e económicas para a geração e atracção
de novas actividades produtivas.

Segundo Vázquez (20019 citado por Ribeiro & Santos, 2005: 56), existem seis pilares da TDE
nomeadamente:

 É, antes de tudo, um modelo de análise voltado para acção;


 Vê o crescimento económico como um modelo dinâmico, cujo futuro é incerto;
 Dá um tratamento territorial à dinâmica económica e produtiva;
 Defende a flexibilidade produtiva, pois dá margem à inserção competitiva de pequenas e
médias empresas na dinâmica da acumulação de capital;
 Considera que existe uma forte imbricação entre economia e sociedade;
 E a inovação obedece a um padrão interactivo não hierarquizado.

2.1.4 Críticas à Teoria do Desenvolvimento Endógeno

Para Oliveira (2001), a questão do desenvolvimento local possui, pelo menos, três limitações.

 A primeira limitação refere-se ao facto de que as propostas de desenvolvimento local centradas na


capacidade de articulação dos atores ignoram a distribuição desigual de poder entre estes, assim
como entre os lugares;

 A segunda limitação da teoria de desenvolvimento local é que devido à distribuição desigual de


poder, existem conflitos internos à localidade. Isso porque ao empoderar determinados actores em
detrimento de outros, podem surgir conflitos e debates que irão dificultar a implantação de
qualquer proposta de desenvolvimento;

 Como consequência, a terceira limitação é que não só os conflitos internos são ignorados pelos
defensores do desenvolvimento local, assim como os conflitos externos, entre o local e o central;

9
Vázquez B. A. (2001). Desenvolvimento endógeno em tempos de globalização. Fundação de Economia e Estatística.
Porto Alegre

14
 A partir da leitura da tese de Oliveira (2001), uma quarta crítica pode ser acrescentada às teorias
de desenvolvimento local: o desenvolvimento global não pode ser concebido como a simples soma
de todos os poderes locais.

2.1.5 Aplicabilidade e Complementaridade das Teorias no Estudo

Cunningham (2009) refere que os teóricos participativos-democratas defendem a tese segundo a qual o
governo e/ou empresas só se torna útil para a materialização dos desejos das pessoas. Para eles, a
participação além de permitir maior interacção entre governos (empresas) e governados (comunidade),
também permite que aqueles prestem mais atenção às preocupações dos cidadãos e se tornam mais
sensíveis às mesmas e cumpram as promessas que fazem diante do seu eleitorado principalmente. Já o
desenvolvimento endógeno resume-se num processo de crescimento económico e de mudança
estrutural, e tem como lema a maior participação possível da população local no uso do seu potencial
de desenvolvimento, que leva à melhoria de vida e dos desejos sociais.

As teorias constituem formas de organização da produção, as quais privilegiam os aspectos locais e,


neles a interacção entre os agentes e a cooperação entre os actores, somado a uma estrutura de
governação fortalecida, sendo estes elementos fundamentais para o processo de desenvolvimento local
originado de baixo para cima. Ela prevê a criação de pequenas e médias empresas como forma de
possibilitar o desenvolvimento local, pois busca melhores perspectivas de crescimento económico,
redução de custos e geração de emprego.

Esta teoria é aplicável a esta pesquisa uma vez que tem como principal característica a ampliação da
base de decisões autónomas por parte dos actores locais, colocando nas mãos destes, o destino da
economia local ou regional. Este modelo caracteriza-se por ser realizado de “baixo para cima”, ou seja,
partindo das potencialidades socioeconómicas originais do local, no lugar de um desenvolvimento
estruturado de “cima para baixo”, isto é, partindo do planeamento e intervenção conduzidos pelo
Estado nacional, (Amaral Filho, 1996).

2.2 Quadro Conceptual

A compressão plena de determinada matéria é, vezes sem conta, determinada pelo entendimento dos
conceitos básicos a sua volta. Para a melhor compreensão desta pesquisa sobre o papel da participação
comunitária nas acções de Responsabilidade Social das empresas, afigura-se importante a definição de
alguns termos, nomeadamente: participação comunitária, Responsabilidade Social e Megaprojectos.

2.2.1 Participação Comunitária

15
No sentido mais amplo, de acordo com Bordenave (1985), participação é “fazer parte”, “tomar parte”
ou “ter parte”. Desta forma, para o autor a questão central da participação não é o quanto se toma parte
mas como se toma parte e distingue entre os processos de micro participação (voltada para interesses
pessoais e imediatos) e macro participação (voltada para a intervenção no âmago das estruturas sociais,
políticas e económicas).

A Participação não nos parece que seja uma obrigação moral ou política da democracia. Todavia, a
participação constitui uma técnica de gestão pela sedução que anda associada ao estilo pessoal de
liderança política dos eleitos. É uma forma de envolver os cidadãos na solução dos seus problemas
(Bilham, 2004:60).

A Participação deve ser entendida como acto e efeito de um processo em que a sociedade civil, a
sociedade política e a sociedade económica tenham tomado uma decisão em conjunto. Klausmeyer e
Ramalho (1995) entendem que ela acontece quando há acesso efectivo dos envolvidos no planeamento
das acções, na execução das actividades e em seu acompanhamento e avaliação.

A Participação é um instrumento importante no sentido de promover a articulação entre os actores


sociais, fortalecendo a coesão da comunidade e melhorando a qualidade das decisões, tornando mais
fácil alcançar objectivos de interesse comum. No entanto, as práticas participativas não podem ser
encaradas como procedimentos infalíveis, capazes de sempre proporcionar soluções adequadas para
problemas de todos os tipos (Bandeira,1999).

Na opinião de Cornely (1978), Participação significa estar presente activamente no designar e no


escolher alternativas, caminhos e em ter possibilidades reais de utilizar toda e qualquer alternativa,
bem como combiná-las. Ela gera a possibilidade de superação da injustiça social.

O conceito de comunidade está intimamente ligado com o surgimento da sociologia como ciência, na
medida em que no referido contexto, as sociedades europeias passavam por transformações profundas,
em que os modos de vida tradicional davam lugar a modernização da sociedade, impulsionados pelos
processos de urbanização e individualização (Peruzzo & Volpato, 2009).

Neste sentido consideramos ser pertinente trazer as reflexões dos clássicos da sociologia como ponto
de partida para a compreensão deste conceito. Na visão de Tonnies (1995), a existência de processos
comunitários estaria ligada, em primeiro lugar, aos laços de sangue, em segundo lugar à aproximação
espacial, e em terceiro lugar à aproximação espiritual. De acordo com Tonnies (1944: 98): “ Pode se
compreender a comunidade como um organismo vivo, e a sociedade como um agregado mecânico e
passageiro”.

16
Nesta vertente Weber (1987:77) define comunidade como: “uma relação social na medida em que a
orientação da acção social, na média ou no tipo-ideal, baseia-se em um sentido de solidariedade: o
resultado de ligações emocionais ou tradicionais dos participantes”. Neste estudo será adoptada a
perspectiva de Brint (2001), que define comunidade como agregados de pessoas que partilham
actividades comuns e crenças, estando ligados por relações de afecto, lealdade, valores comuns ou
preocupações pessoais (Com os acontecimentos das vidas dos seus semelhantes).

Assim, a participação comunitária, termo formulado nos meados dos anos 50, surgiu num contexto em
que as iniciativas de desenvolvimento procuravam responder as necessidades dos seus beneficiários,
através do envolvimento activo das comunidades locais na planificação e execução dos projectos, de
modo que estes actores se sentissem partes integrantes dos mesmos, e não somente receptores passivos
(Valá, 1998; UNICEF, 1999).

A definição oficial do governo de Moçambique, no âmbito da política de desenvolvimento rural,


define a participação comunitária como a promoção de acções orientadas para a entrega às
comunidades rurais dos instrumentos que fortalecem a sua capacidade de resolução dos seus problemas
(Boletim da República, 1998). Neste estudo, iremos adoptar a definição de Salim Valá (1998) que
define a participação comunitária como um processo através do qual os membros de uma determinada
comunidade participam de forma activa e organizada na identificação e análise dos seus problemas;
buscam conjuntamente soluções alternativas dos seus problemas, mobilizam recursos para a realização
de intervenções de desenvolvimento.

2.2.2 Responsabilidade Social das Empresas

A responsabilidade social empresarial (RSE), de acordo com Santos (2012) é um conceito difícil de
delimitar porque é essencialmente dinâmico e variável. Neste sentido a amplitude deste conceito por
vezes leva a que seja implementado de forma díspar por parte das empresas, quer de acordo com os
seus recursos, como também pelo contexto em que se encontram. Uma das marcas distintas do
conceito de Responsabilidade social empresarial é a sua relação com a noção de ética.

Para Santos (2012) o conceito de responsabilidade social agrega um imperativo ético ao fazer coisas
que melhoram a sociedade, e não fazer aquelas que poderiam piorá-la. Ou seja a responsabilidade
social da empresa na perspectiva de Santos (2012:83) “é a forma de gestão que se define pela relação
ética e transparente da empresa com os públicos com que se relaciona e pelo estabelecimento de metas
empresariais conciliáveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade”.

Ashley e Cardoso (2002) definem a responsabilidade social como o compromisso de uma organização
para com a sociedade, na medida em que, os actos e atitudes da organização afectam toda a sociedade

17
ou alguma comunidade em particular. A Comissão Europeia (2001) no seu Livro Verde define a
responsabilidade social como um conceito segundo o qual “as empresas numa base voluntária decidem
contribuir para uma sociedade mais justa e para um ambiente mais limpo” (Comissão Europeia,
2001:4). Isto implica para as empresas irem mais além das suas obrigações legais plasmadas nos
quadros jurídicos nacionais e internacionais, através de acções como investimento em capital humano,
no ambiente, e nas relações com outras partes. (Leal, 2001; Santos, 2012).

A definição de RES que adoptamos para este trabalho é a de Neto e Froes, na medida em que
consideram a RSE de um ponto de vista ético e moral, ou seja o papel da empresa vai para além do
cumprimento da lei. A preocupação da empresa em fazer o bem e não o mal para a sociedade
(perspectiva ética), encontram na responsabilidade social um mecanismo de retribuição a sociedade.
Para a Melo Neto e Froes (1999:82): “A RSE é uma forma da empresa retribuir a sociedade pelos
recursos naturais, capitais financeiros e tecnológicos, e força de trabalho usados no seu funcionamento,
recursos estes que pertencem ao património gratuito da humanidade. A RSE é também um mecanismo
de reduzir as diferenças sociais criadas pela empresa”.

Uma das elaborações teóricas com maior adesão na literatura norte-americana sobre RSE é a proposta
apresentada por Carroll em 1979, a qual resistiu, no essencial, até à actualidade, permanecendo
amplamente aceite pela comunidade científica. Carroll estabelece quatro tipos específicos de
responsabilidades sociais das empresas, identificadas com base nas expectativas da sociedade em
relação ao desempenho empresarial. O autor apresenta uma definição de RSE estruturada em quatro
dimensões – económica, legal, ética e filantrópica:

a) Responsabilidade filantrópica: consiste na contribuição activa e voluntária das empresas para a


resolução de problemas sociais e a melhoria da qualidade de vida da sociedade em geral; b)
Responsabilidade ética: É a adopção de uma conduta sintonizada com os códigos morais e os valores
implícitos da sociedade, para além do exclusivo cumprimento da lei; c)Responsabilidade legal:
Necessidade de que o crescimento económico seja alcançado sem violar o quadro normativo e
cumprindo com as obrigações legais; d) Responsabilidade económica: É a obrigação que as empresas
têm de gerar riqueza, manter o crescimento e responder às necessidades de consumo da sociedade.

2.2.3 Mega-Projectos

O tipo de empresa que constitui o nosso objecto de estudo é considerado megaprojectos, na medida em
que este tipo de empresa possui um volume de investimentos elevado. Castel- Branco (2008)
caracteriza os megaprojectos como sendo empresas com investimentos acima de 500 milhões de
dólares norte-americanos, geralmente centram-se em torno de actividades minerais e energéticas –

18
carvão de Moatize, gás de Pande e Temane, areias pesadas de Moma e Chibuto, hidroelétrica de
Cahora-Bassa, e Mozal (Intensiva em energia). São empresas estruturantes das dinâmicas
fundamentais de acumulação e reprodução económica em Moçambique por causa do seu peso no
investimento privado, na produção e no comércio.

Castel-Branco (2008) acrescenta ainda que os megaprojectos são área quase exclusiva de intervenção
de grandes empresas multinacionais por causa dos elevadíssimos custos, das qualificações e
especialização requeridas, da magnitude, das condições competitivas especialização dos mercados
fornecedores e consumidores, geralmente dominados por oligopólios e monopólios. Em economias
menos desenvolvidas, como é o caso de Moçambique, estas empresas podem exercer considerável
poder.

Neste capítulo, para além da apresentação da base teórica, foram desenvolvidas conceptualmente as
expressões-chave que auxiliam a compreensão do presente trabalho, ou seja, os conceitos aqui
debatidos servem de arcabouços para o avanço científico do tema em análise. Já a seguir abre-se o
terceiro capítulo com vista a aprofundar o tema na óptica de vários autores.

CAPÍTULO 3: ABORDAGENS SOBRE A PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA E O SEU


PAPEL NA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL

19
O presente capítulo intitulado revisão da literatura trás várias abordagens com relação ao tema do
estudo. A revisão da literatura consolida alguns subtemas necessários para que o leitor tenha ciência da
necessidade da presente pesquisa, bem como das características, da importância da participação
comunitária, dos actores no processo de RSE, dos motivos que fazem a sociedade se envolver e do
papel das empresas.

3.1 Participação Comunitária como elemento da Responsabilidade Social das Empresas

A interacção entre as comunidades rurais de países da América Latina como o México, Peru e Bolívia,
com as Multinacionais das indústrias mineradoras e petrolíferas, bem como o papel destas indústrias
para o desenvolvimento local e regional, foi um tema estudado por Clark e North (2006) tendo
destacado em particular os processos de negociação entre comunidades e corporações no desenho de
projectos de desenvolvimento local, através da responsabilidade social empresarial.

As reformas estruturais da economia, conhecidas como “Washington Consensus” (o mesmo que


consenso de Washington), na qual grande parte dos países da América Latina aderiu à economia
neoliberal, criaram um cenário no qual o estado já não exercia uma interferência directa na economia,
e se abriu o espaço nos quais empresas e comunidades procuram impor suas visões distintas de
desenvolvimento para preencher o vazio deixado pelo Estado (Clark & North, 2006).

Para Capito (2015), nas negociações entre corporações e as comunidades os desequilíbrios de poder
entre ambas é considerável. Por um lado, as corporações têm em seu dispor, uma série de recursos e
influências e ainda o suporte do Governo Canadense e das Instituições Financeiras Internacionais. Por
outro lado, as comunidades onde operam estas corporações se encontram numa situação de pobreza
resultantes de um processo centenário de marginalização.

Para fazerem face a este criticismo, estas corporações avançaram com o conceito de Responsabilidade
Social Empresarial e diálogo dos Stakeholders (partes interessadas). Embora passos consideráveis
fossem dados em alguns aspectos, na visão de Clark e North (2006) a RSE reforça a retirada do Estado
com o argumento de que as empresas podem gerir seus próprios assuntos. O que está implícito neste
conceito é a noção de que não só os interesses das empresas e das comunidades são semelhantes, mas
também que as diferenças entre os dois são quantitativas (uma questão de dólares e centavos), do que
qualitativas (baseadas em diferentes visões sobre desenvolvimento).

A responsabilidade social empresarial, de acordo com Kuyek (2006,p.214): “representa o esforço das
corporações de definirem unilateralmente os termos de debate com relação às comunidades”. O
diálogo entre as corporações e as comunidades onde decorrem estes projectos mineiros tem como
plataforma o conceito de multistakeholder-dialog (diálogo das partes interessadas), ou seja, as partes

20
que se consideram como fundamentais para o funcionamento das corporações (accionistas,
fornecedores, clientes e as comunidades locais). No entanto para Kuyek (2006), o termo stakeholder é
passível de conduzir ao erro:

Tal como os governos, as comunidades onde funcionam os projectos das companhias


mineradoras, não podem ser enquadradas como “stakeholders”, na medida em que estas têm
direitos e responsabilidades pelas suas terras que estão para além do interesse das empresas
mineradoras. Ou seja os membros das comunidades não são apenas partes interessadas nos
projectos, mas sim, detentores legítimos cuja identidade, autonomia e sobrevivência cultural
está intimamente ligada com a sua ligação com a terra (Kuyek, 2006:215).

O modelo de negociação que tem como base a retórica dos stakeholders (partes interessadas) ignora o
facto de existirem diferenças de poder e recursos entre os diferentes actores. As corporações têm
recursos para o engajamento em discussões infindáveis com os representantes das comunidades, ao
mesmo tempo em que conduzem as suas actividades. As corporações têm capacidade para desencadear
lobbys com o governo, iniciar novos projectos e manipular os media. Para Kuyek (2006:217):
“Aqueles que organizam as mesas de negociação, tem uma vantagem estratégica, na medida em que,
seleccionam previamente de forma limitada os actores que representam os interesses da sociedade.”

3.1.1 Características e tipos de Participação Comunitária

Segundo Cornely (1978), participação significa estar presente activamente no designar e no escolher
alternativas, caminhos e em ter possibilidades reais de utilizar toda e qualquer alternativa, bem como
combiná-las. Ela gera a possibilidade de superação da injustiça social.

Quando se faz referência à participação da sociedade, se está levando em consideração a definição de


Ávila (1991), segundo a qual toda sociedade pode ser concebida como um sistema integrado de quatro
subsistemas: o político, o social, o económico e o cultural. Assim, sua estrutura consiste na relação
mais ou menos estável destes quatro subsistemas.

A participação é um instrumento importante no sentido de promover a articulação entre os atores


sociais, fortalecendo a coesão da comunidade e melhorando a qualidade das decisões, tornando mais
fácil alcançar objectivos de interesse comum. No entanto, as práticas participativas não podem ser
encaradas como procedimentos infalíveis, capazes de sempre proporcionar soluções adequadas para
problemas de todos os tipos (Bandeira,1999).

Os métodos participativos possuem alguns princípios comuns e fundamentais (Fleck, 1998):

 Flexibilidade - Os resultados são produzidos pelo grupo que participa;


 Transparência - Transforma a inteligência individual em colectiva, não induz nem manipula
os participantes;

21
 Multidisciplinaridade - Envolve profissionais de várias áreas de conhecimento;
 Comunicação nas duas direcções - Técnicos e comunidades aprendem;
 Quantidade e Qualidade – A avaliação é realizada levando em consideração os dois métodos;
 Orientação segundo o grupo - Deslocamento do poder de decisão para o grupo;
 Parcela do poder - Envolve o aumento do poder de encaminhamento e decisão por parte do
grupo;
 Presença local - Projectos construídos localmente e com a participação comunitária;
 Documentação - Registro de todas as etapas do processo participativo.

Pinheiro (1997) classifica diversos tipos ou maneiras de como as instituições de desenvolvimento


interpretam e usam o termo participação:

a) Participação passiva: as pessoas participam sendo informadas do que vai acontecer ou já


aconteceu. É uma decisão unilateral, sem qualquer tipo de consulta ou diálogo;
b) Participação via extracções de informações: as pessoas participam respondendo a perguntas
formuladas através de questionários fechados. Os métodos não são discutidos e não há retorno
de dados ou de resultados;
c) Participação consultiva: as pessoas participam sendo consultadas por agentes externos, os
quais definem problemas e propõem soluções com base na consulta, mas sem dividir a tomada
de decisão;
d) Participação por incentivos materiais: as pessoas participam fornecendo recursos como mão-
de-obra e terra em troca de dinheiro, equipamentos, sementes ou outra forma de incentivo. A
maioria dos experimentos em propriedades e projectos agrícolas se encaixa neste tipo. Quando
a ajuda é retirada, o entusiasmo logo termina;
e) Participação funcional: as pessoas participam formando grupos para atender a objectivos pré-
determinados e definidos por agentes externos. Estes grupos em geral dependem dos
facilitadores, mas às vezes se tornam independentes;
f) Participação interactiva: as pessoas participam de forma cooperativa, interagindo através de
planos de acção e análise conjunta, os quais podem dar origem a novas organizações ou
reforçar as já existentes. Estes grupos têm controlo sobre as decisões locais. É dada ênfase a
processos interdisciplinares e sistemas de aprendizado que envolvem múltiplas perspectivas;
g) Participação por automobilização: as pessoas participam tomando iniciativas para mudar os
sistemas independentemente de instituições externas. O resultado dessa acção colectiva pode
ou não mudar uma situação social indesejável (por exemplo, distribuição desigual de renda e de
poder).

22
Visando obter maiores êxitos na participação da comunidade na RSE, muitas ONG(s), órgãos
governamentais, autarquias e consultores da área criaram diversos mecanismos para maximizar a
participação; contudo, neste momento estes não serão tratados, mas sim os diversos mecanismos de
participação.

3.1.2 Os Actores do Processo Participativo

Os actores do processo de desenvolvimento autárquico são denominados nos livros de administração


de stakeholders. Roy (1996) ao trabalhar uma metodologia multicritério de apoio à decisão, diz que
eles são pessoas, grupos ou instituições que possuem alguma influência no processo decisório.

As decisões são realizadas através de um processo que poderá fazê-los demorar mais ou menos tempo
para tomá-las. Elas só são realmente tomadas quando o decisor ou os decisores decidem fazer ou não
fazer algo (Idem). Portanto, se todos os actores realmente participarem do processo, poderão decidir
que acções são prioritárias e quais deverão ser realizadas na sua municipalidade e/ou região.

Quanto maior e representativo for o número de actores envolvidos em um processo participativo, mais
democrático este será e maiores serão os êxitos no desenvolvimento local. Em um processo
participativo, desde a elaboração do planeamento até sua execução, é necessário que as organizações e
os cidadãos participem, em algum momento, de sua elaboração. Além de participar, é importante que
cada organização e todo cidadão conheça o seu papel dentro do sistema planejado, comprometendo-se
com o desenvolvimento local.

Para conseguir este êxito, faz-se necessário o envolvimento, se possível, de todos os sectores sociais,
económicos e políticos da comunidade, bem como de sindicatos, comunidades, secretarias municipais,
prefeito, poder legislativo local, comissões existentes no município, cooperativas, empresas,
agricultores, lideranças, igrejas e ONGs, entre outros.

Dentro desse processo existem dois grupos de organizações que devem participar. O primeiro, é
composto pelas organizações formais e que normalmente são registradas. Mas existe o grupo de
organizações informais, que, segundo Bernardes e Marcondes (2001), é constituído por pessoas que se
reúnem para atingir metas individuais em uma situação cooperativa ou convergente. Este grupo pode
ser apenas um grupo de pessoas que se reúne para jogar futebol e se divertir ou, ainda, um grupo para
defender um ambiente desfavorável, como cobrar uma medida da prefeitura.

Para se envolver as organizações informais, é necessário conhecê-las e saber dos seus interesses, da
representatividade e da importância de cada uma. Jamais deve ser ignorada a existência desse tipo de
organização. Apesar de inicialmente ser utópica a participação de todos os actores citados acima, visto

23
que alguns resistem em participar, torna-se essencial demonstrar sua importância e nunca eliminar
futuras participações dos atores que inicialmente não concordaram com este novo processo de decisão.
Isto porque, se algum deles, além de não participar, minar o processo participativo, tal comportamento
poderá acarretar consequências graves no desenvolvimento local.

Carvalho (1997) sugere que os movimentos e as organizações sociais, assim como as instâncias de
participação social na administração municipal, tenham carácter predominantemente efémero,
modificando-se permanentemente em função dos objectivos e da correlação de forças políticas
conjunturais.

3.1.3 Mecanismos de participação comunitária

O governo procura, na sua essência, que o desenvolvimento local seja realizado com a participação da
comunidade, mas, para assim ocorrer com sucesso, é preciso que haja mecanismos que possibilitem a
participação.

O mecanismo primordial que leva à participação é a sensibilização da comunidade no que se refere à


importância de sua participação no desenvolvimento local. Segundo avança Doniak (2002), esta
sensibilização pode ser feita através de reuniões, eleição democratizada de representantes da
comunidade e consulta prévia dos projectos de desenvolvimento.

Em Moçambique adopta-se o orçamento participativo como um mecanismo de participação das


comunidades para a definição de acções prioritárias dentro da circunscrição territorial a que pertencem,
como por exemplo: recolha de lixo, reabilitação de estradas e gestão do meio ambiente. O “Orçamento
Participativo é um processo social e político muito dinâmico, sendo, por isso, difícil extrair a partir
dele muitas projecções” (Santos, 2002:111).

O orçamento participativo, como um meio de promoção da participação dos cidadãos em decisões que
dizem respeito à justiça (re)distributiva, à eficácia decisória e à responsabilidade do governo local
(Santos, 2002), logo, o envolvimento activo dos cidadãos contribui para o fortalecimento da
democracia local.

O orçamento participativo (descentralização) e a planificação participativa (desconcentração) deveriam


a meu ver, constituir o centro dos vários mecanismos locais de participação da comunidade na
governação porque, não somente contribui para a justiça (re)distributiva, melhor prestação de serviços
públicos, como também resulta numa maior prestação vertical de contas e por conseguinte, maior
probabilidade de transparência na governação local.

24
Em Moçambique, a participação da comunidade no processo de planificação local é assegurada pelos
Conselhos Consultivos Locais onde, juntamente com o Estado, se discutem questões prioritárias locais.
Entre as quais o orçamento do Estado para fazer face aos planos, económico e social e estratégico do
respectivo distrito.

Segundo o artigo 2 do Guião dos Conselhos Locais, o “Conselho Local é um órgão de consulta das
autoridades da administração local, na busca de soluções para questões fundamentais que afectam a
vida das populações, o seu bem-estar e desenvolvimento sustentável, integrado e harmonioso”.

Mas, para que haja participação no desenvolvimento local, é necessário que o governo municipal abra
espaços para a participação, descentralizando o poder. No campo económico, as empresas já verificam
a importância de se estabelecer parcerias para que elas cresçam em consonância com o local onde
estão situadas.

3.2 Responsabilidade Social numa perspectiva histórica

Etimologicamente a palavra responsabilidade deriva do Latim respondere. Deste modo


responsabilidade é a qualidade de responsável, que responde por actos próprios ou de outrem, que deve
satisfazer os seus compromissos ou de outrem. A Responsabilidade social Empresarial é um termo
recente, no entanto, a preocupação com a ética nos negócios e as dimensões sociais destas actividades
existem há já longo período de tempo. As práticas de negócios baseadas em princípios morais, o
controlo da “avidez” e da “cobiça” eram defendidas por pensadores anteriores ao cristianismo como
Cícero no Iº século Antes de Cristo. O Islamismo e a Igreja Cristã na idade média condenavam
publicamente certas práticas de negócios, com destaque para a usura (Blowfield & Frynas, 2005).

Numa perspectiva histórica a RSE é uma manifestação actual de debates antigos sobre o papel dos
negócios na sociedade. O fenómeno novo neste debate é o facto de estes debates relacionarem a RSE
com temas como o desenvolvimento, ambiente, direitos humanos, e tem uma amplitude global em
comparação com os períodos anteriores.

A responsabilidade social corporativa era aceite como doutrina nos EUA e Europa até o século XIX,
quando o direito de conduzir negócios de forma corporativa era uma questão de prerrogativa do Estado
ou Monarquia e não um interesse económico privado (Hood, 1998). Com a independência dos EUA,
os estados americanos começaram a aprovar a legislação que permitisse a auto-incorporação (Self-
incorporation) como alternativa à incorporação por acto legislativo específico, inicialmente para
serviços de interesse público, como, por exemplo, a construção de canais, e, posteriormente, para
propósitos de condução de negócios privados. Desta forma, até ao início do séc. XX a premissa

25
fundamental da legislação sobre corporações era de que seu propósito era a realização de lucros para
seus accionistas (Ashley, 2000).

Desse modo, a prática de acções sociais pelas empresas não era estimulada, sendo até condenada. A
responsabilidade social empresarial limitava-se apenas ao acto filantrópico, isto é, uma acção de
natureza assistencialista, caridosa e predominantemente temporária, de carácter pessoal, representada
por doações de empresários ou, por exemplo, pela criação de fundações americanas, como a Rockfeller
(criada em 1913), a Gugenheim (em 1922) e a Fundação Ford (em 1936) (Costa, 2005).

Após os efeitos da Grande Depressão e o período da Segunda Guerra Mundial, a noção de que a
corporação deve responder apenas aos interesses dos seus accionistas sofreu ataques na academia,
principalmente pelos trabalhos de Berle e Means, The Modern Corporation and Private Property
(Berle & Means, 1932), argumentando que os accionistas eram passivos proprietários que abdicavam
controlo e responsabilidade para a direcção da corporação. Estes eventos históricos destacados criaram
um ambiente para uma aceitação gradual da responsabilidade social no contexto académico. Suzana
Leal (2005) destaca as fases importantes que marcam este percurso até às modernas formulações da
responsabilidade social.

Com efeito a responsabilidade social empresarial começa a sofrer uma crescente formalização
enquanto conceito a partir da década de 1960. Dos contributos mais relevantes destacam-se Davis
(1960, 1967), McGuire (1963), Davis e Blomstrom (1966) e Walton (1967). McGuire (1963) defendeu
a ideia de que a responsabilidade social supõe que a empresa não tem apenas obrigações legais e
económicas mas também algumas responsabilidades para com a sociedade. Por sua vez, Walton (1967)
destaca que o conceito de responsabilidade implica uma intimidade da relação entre empresa e a
sociedade, e defende que tal relação deve ser lembrada pelos gestores de topo à medida que a empresa
e os grupos relacionados prosseguem os respectivos objectivos (Leal, 2005).

No período posterior a 1990 têm sido desenvolvidos conceitos complementares aos da


responsabilidade social, tais como, corporate social responsiveness, corporate social performance
(CSP), public policy, ética nos negócios, gestão dos stakeholders, etc.

3.2.1 Dimensões da Responsabilidade Social das Empresas

Tendo como base o livro verde, Mogele e Troop (2010), consideram que o exercício empresarial
pressupõe uma atitude eficaz da empresa em duas dimensões: interna e externa.

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Interna é a dimensão que está centrada nos trabalhadores da empresa e compreende a adopção de
práticas socialmente responsáveis no seio da empresa, no âmbito da gestão de recursos humanos
(GRH), através da implementação de medidas que visem melhorar a saúde e segurança no trabalho, a
capacidade de adaptação às mudanças e, igualmente, a gestão do impacto ambiental e dos recursos
naturais no seu processo produtivo (Comissão das Comunidades Europeias, 2001).

Do ponto de vista GRH é particularmente importante o incentivo à formação contínua dos


trabalhadores que poderá passar, entre outras medidas, pelo estabelecimento de protocolos com
instituições de ensino, de modo a atrair novos trabalhadores e a estimular os já existentes a obterem
maior conhecimento, ou seja, a existência de trabalhadores qualificados na empresa. Por conseguinte, a
empresa beneficiaria não só de um enriquecimento técnico dos seus quadros que lhe permitiria obter
um desempenho mais profícuo das tarefas realizadas, como promoveria o bem-estar e a realização
pessoal de cada um dos seus trabalhadores (Silva, 2011).

Neto e Froes (1999) referem que a dimensão interna direcciona acções para os trabalhadores e suas
famílias, tendo como principal objectivo desenvolver um ambiente de trabalho de salutar e contribuir,
assim, para o bem-estar dos que ali trabalham, deixando-os mais satisfeitos. Para além do investimento
no desenvolvimento pessoal e profissional dos trabalhadores, bem como na melhoria das condições de
trabalho, exige-se também um estreitamento nas relações com os trabalhadores. O ganho para a
empresa ao investir nos trabalhadores e suas famílias é considerável, pois os trabalhadores tornam-se
mais dedicados, empenhados, proporcionando, muitas vezes, um ganho a nível da motivação que se
traduz num maior retorno de produtividade para os accionistas (Neto & Froes, 1999).

Já a dimensão externa ultrapassa a expectativa da própria empresa e estende-se à gestão das relações
com as comunidades locais envolventes, os parceiros de negócio, fornecedores, accionistas,
autoridades públicas, consumidores, baseados na observância dos direitos humanos e a questão da
protecção do meio ambiente global (Comissão das Comunidades Europeia, 2001).

No que diz respeito à comunidade local, a empresa tem de se preocupar em resolver a carência dos
locais aonde estiver inserida, ajudando na implantação de centros comunitários que integram a
empresa na comunidade, procurando a preservação dos recursos naturais, protecção ambiental e o
reforço da sustentabilidade das comunidades. Estas acções, contribuem para melhorar a qualidade de
vida da população da comunidade e consequentemente o desenvolvimento comunitário bem como o
respeito aos costumes, às culturas locais, o empenho na educação e na disseminação de valores sociais
através de um relacionamento ético, transparente e responsável com as minorias e instituições que
representam seus interesses (Oliveira & Scwertner, 2007).

27
As empresas dependem em grande medida da estabilidade social, política e económica das
comunidades onde se inserem. Contudo, para as comunidades também se torna um factor benéfico pois
as empresas dão um contributo para a vida das comunidades, em termos de oportunidade de emprego,
remunerações, impostos e outros benefícios que contribuirão para a existência de uma comunidade
próspera e estável, elementos fundamentais para a viabilização de qualquer negócio (Oliveira, 2010).

Muitas empresas empenham-se em causas locais, nomeadamente pela oferta de espaços adicionais de
formação, apoio de acções de promoção ambiental, recrutamento de mão-de-obra local, bem como o
recrutamento de vítimas de exclusão social, a disponibilização de cuidados à infância para filhos dos
trabalhadores, parceiros e comunidades, disponibilização de infra-estruturas públicas e sociais, o
patrocínio de eventos culturais e desportivos a nível local e donativos para acções de caridade
(Comissão das Comunidades Europeia, 2001).

3.2.2 Modelos da Responsabilidade Social

Vejamos então alguns modelos de responsabilidade social que podem ser aplicáveis no contexto
moçambicano em especial.

Modelo de Carroll (1991) foi construído a partir de análise de resultados obtidos anteriormente por
outros autores, sugerindo um modelo baseado na relação entre a responsabilidade social e a
rentabilidade. Este modelo trouxe nova visão ao conceito de RSE ao considerar que ela é composta por
quatro responsabilidades (Económica, Legal, Ética e filantrópica), como se apresenta na figura 1.

Figura 1. Pirâmide de RSE de Carroll (1991)

28
Responsa
bilidades
Filantróp
icas
ser um
bom
cidadão
Contribui
r com
recursos
para a
comunida
Responsabilidades
de, Éticas
m elhorar
Ser ético
a
Obrigação de fazer o que é certo, justo
qualidade
e evitar
de vidadanos.
.

Responsabilidades legais
Obedecer a lei
A legislação é a codificação do certo e errado num a sociedade.
Jogar dentro das regras do jogo
Responsabilidades Económ icas
Ser lucrativo
A base da pirâm ide da qual derivam as demais responsabilidades .

Fonte: elaborado pela autora, com base em Ferreira (2012: 27; Carroll, 1991)

Visser (2005), ao analisar o modelo de Carroll, chega a conclusão de que a ordem das
responsabilidades está dependente do local. Explica que o modelo de RSE quando aplicado no
contexto africano verifica-se uma mudança na sua disposição sendo que, a fase quatro (filantrópica)
passa para fase dois (legal), motivado por fraco nível de investimento estrangeiro nas economias em
causa, provocando altos índices de desemprego.

Baseando-se em dados estatísticos chega a conclusão de que até 1997, apenas 43% dos trabalhadores
participavam na economia, e na generalidade dos países analisados apresentavam altos índices de
pobreza extrema e com elevada dependência externa (Visser, 2005; 37-38).

Na perspectiva de Visser (2005), o modelo de Carrol não é compatível para a realidade africana
conforme exposto acima. Nesta óptica, a pirâmide foi reformulada da seguinte maneira: (i)
responsabilidade económica; (ii) responsabilidade filantrópica; (iii) responsabilidade legal e (iv)
responsabilidade ética.

A responsabilidade filantrópica (discricionária) foi transferida para o segundo lugar, justifica se pelo
facto de que “as empresas também percebem que não podem ter êxito em sociedades que falham e a
filantropia é vista como a maneira mais directa de melhorar as perspectivas das comunidades nas quais
as empresas operam” (Vesser, 2005).

29
3.2.3 Vantagens da adopção da estratégia da prática de RSE

A prática de RSE gera bons resultados, vantagens, lucros, crescimento das próprias empresas e da
economia no geral (Comissão das Comunidades Europeias, 2001). Adoptar uma postura empresarial
responsável é proporcionar vantagens directas para a empresa, garantir a competitividade e a
sustentabilidade a longo prazo.

De acordo com Biorumo (2005), são apresentadas algumas das vantagens da adopção da estratégia da
prática da RSE:

a) Antecipa os problemas e os riscos que possam surgir decorrentes das suas actividades e que
causam marcas profundas na imagem e sobrevivência;
b) Permite um maior índice de inovação através do aproveitamento de oportunidades e do
estímulo da criatividade que lhes traz valor acrescentado e maior qualidade percebida
fidelizando os clientes;
c) Posiciona a empresa como atente às necessidades dos novos consumidores permitindo a sua
diferenciação face à concorrência e, logo, potenciando o valor percebido da marca;
d) Provoca uma melhoria das condições de vida da comunidade, o que tem um efeito reconhecido
através da melhoria da imagem da empresa e sua reputação no mercado permitindo abraçar
novas oportunidades;
e) Decorrente de todos os factores anteriores a performance económica e financeira está
assegurada.

3.1.1 Razões adjacentes à prática da Responsabilidade Social

A empresa quando adopta a Responsabilidade Social assume um compromisso em relação a


comunidade e a humanidade em geral, ela presta contas do seu desempenho baseada na apropriação e
uso de recursos o que constitui sua fonte de geração de lucros.

Segundo Melo Neto e Froes (2001), a empresa deve financiar projectos sociais porque é correcto, e é
justo fazer isto. Esta actividade não é actividade de caridade, típica dos donos das empresas capitalistas
do início do século XX, que utilizavam a filantropia como forma de expiração dos seus sentimentos de
culpa por obterem lucros fáceis às custas de exploração do trabalho das pessoas e dos recursos naturais
abundantes.

Sabe-se que a Responsabilidade Social e empresarial é um conceito que está associado à firma
moderna e nasce no âmbito dos demais objectivos desta, em consequência de exigências do mercado e

30
de pressões sociais resultantes da avaliação dos impactos que a nova orientação capitalista traz ao
mundo dos negócios.

A Responsabilidade Social, é vista como um compromisso da empresa em relação à sociedade e à


humanidade em geral, e uma forma de prestação de contas do seu desempenho, baseada na apropriação
e uso de recursos que não lhe pertencendo, constitui sua fonte geradora de lucros.

3.2.4 Responsabilidade Social em Moçambique

A RSE em Moçambique encontra-se ainda numa fase embrionária, num processo lento de
desenvolvimento, em certa medida resultado da existência de grupos da sociedade civil ainda em
constituição; baixa incorporação na agenda do Governo; existência de poucas ONG´s bem
estabelecidas com plano estratégico, estrutura criada, recursos financeiros e resultados palpáveis;
reduzidos incentivos e pressões às empresas para adopção de altos padrões ambientais e sociais;
fraquíssima capacidade humana e institucional; inexistência de instrumentos de RSE; provável
inexistência de legislação específica de RSE e ainda uma visão de curto prazo por parte de algumas
empresas (Cabral, 2009).

Durante as últimas três décadas, Moçambique sofreu profundas transformações socioeconómicas,


jurídicas e políticas. Após o fim da guerra civil dos 16 anos em 1992, Moçambique tem vindo a
registar um dos mais altos crescimentos económicos no continente africano, com um crescimento
estimado na ordem dos 7% na última década (Brynildsen & Nombora, 2013). Dispondo de uma vasta
reserva de recursos naturais, Moçambique tem sido um dos destinos privilegiados do investimento
directo estrangeiro.

Assim as empresas multinacionais que exploram estes recursos naturais são consideradas actores
chaves na divulgação da Responsabilidade social empresarial em Moçambique. As companhias
multinacionais estão engajadas em actividades de Investimento Social Corporativo (CSI), como parte
do compromisso com o governo, e por esta via se beneficiam de benefícios fiscais e administrativos
(Global Compact, 2007).

No que diz respeito às pequenas e médias empresas do sector privado local, existe pouco envolvimento
destas nas iniciativas de responsabilidade social empresarial, na medida em que a RSE não é vista por
estas empresas como uma estratégia-chave para os seus negócios, mas sim, a RSE está dependente de
recursos financeiros disponíveis.

Do lado governamental, a RSE é da tutela do Ministério da Mulher e Acção Social (MMAS). O papel
fundamental do ministério é de promover a cidadania empresarial, liderança política em questões-

31
chave, coordenar as actividades de RSE a nível central e descentralizado, garantir o conhecimento da
perspectiva governamental da RSE. Em 1994 o governo moçambicano aprovou a lei nº 4/94 de 13 de
Setembro, iniciativa da qual contribuiu a Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade. Esta lei
permitia a isenção fiscal das companhias que doassem valores monetários para o desenvolvimento de
iniciativas sociais e culturais.

No que concerne as empresas detidas pelo estado, é importante notar que durante duas décadas,
constituíram os principais atores corporativos em Moçambique. Após a adopção de políticas de
privatização pelo governo no princípio dos anos 90, parte considerável das empresas detidas pelo
estado, foram privatizadas. No entanto algumas destas empresas não sobreviveram tendo as suas
actividades reduzido a níveis mínimos, tal não se verificou com as companhias responsáveis pela
prestação de serviços como abastecimento de energia, telecomunicações e transporte (UN Global
Compact, 2007).

A noção de responsabilidade social das empresas detidas pelo Estado estava relacionada com o sentido
de prestígio nacional, onde estas eram chamadas a contribuir financeiramente em situações
conjunturais como calamidades naturais. Por outro lado as suas acções se resumiam a construção de
infantários para os filhos de funcionários, e apoio a iniciativas desportivas e actividades recreativas. Os
investimentos sociais nestas empresas não seguiam estratégias ou políticas específicas (Idem).

3.3 Relação Entre Responsabilidade Social e Desenvolvimento socioeconómico

As empresas têm sido tradicionalmente importantes na cooperação para o desenvolvimento


fundamentalmente como fornecedores de produtos e serviços como a construção de infra-estruturas e
aquisição de equipamentos, grande parte dos fundos públicos destinados à Ajuda para o
Desenvolvimento e á realização dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Nos últimos anos tem
surgido uma nova abordagem10 de aproximação das empresas em matéria de desenvolvimento liderado
pela ONU.

A responsabilidade social e o desenvolvimento económico são temáticas actuais que se relacionam


mutuamente nas acções e práticas éticas levadas a cabo pelas empresas ou organizações, tanto privadas
como públicas na resposta aos desafios sociais globais que afectam sobremaneira as comunidades.

A concepção moderna de desenvolvimento, que abarca várias dimensões já referidas neste estudo,
requer que os projectos como práticas sociais tenham um processo inclusivo e interactivo com activo
10
Esta nova nva abordagem iniciou em 1999, quando o então secretário da ONU, Kofi Annan, propôs a criação de uma
aliança entre as Nações Unidas e o sector privado, um "pacto global de valores e princípios comuns" (Discurso de Kofi
Annan no World Economic Forum de 1999, Davos). Esta proposta levou ao estabelecimento dum Pacto Global, que solicita
às empresas que adotem, apoiem e ponham em prática determinados valores baseados nos direitos humanos, normas de
trabalho, meio ambiente e combate à corrupção.

32
envolvimento de grupos de interesses (stakeholders). É nas práticas quotidianas interactivas que os
projectos sociais adquirem a significação, reforçando os valores e afectos. É dentro desta lógica que
hoje a responsabilidade social não se limita à resolução dos problemas e ao alcance das metas
lucrativas da empresa, mas também à produção de bens e serviços úteis às pessoas, incluindo a criação
de empregos e garantia do bem-estar na lógica do contributo económico da empresa na sociedade.

Como observa McIntosh (2003) as corporações são nossas corporações. Elas são nosso coração e solo.
Nelas investimos nossas pensões, nossas vidas em trabalho e nossos costumes. Quando elas actuam
tanto como entidades privadas quanto públicas”. Acrescenta este autor que cresceu o peso da empresa
e da sua universalidade tornando-a alvo da opinião pública ou do escrutínio público sobre o seu
desempenho na satisfação das necessidades prementes da sociedade.

Para outros autores como Carroll (1991), a responsabilidade social da empresa de negócios inclui
simultaneamente a satisfação dos seus objectivos económicos, legais, éticos e filantrópicos. A
responsabilidade social da empresa permite o alinhamento dos objectivos sociais e económicos e
aumenta a possibilidade e o potencial de uma empresa em desenvolver-se por muito tempo, isto é, a
longo prazo (Porter & Kramer, 2002). A actuação da empresa no domínio social e no ambiental
fortalece igualmente as capacidades institucionais e de empoderamento, bem como o relacionamento
da empresa no apoio a causas sociais (Costa, 2005:14).

Na verdade, o que notamos na actualidade é que as empresas incorporam na sua agenda discursos
éticos que testemunham uma evolução positiva do seu papel social. A mudança discursiva resulta em
parte dos escândalos empresariais vividos no passado e na actualidade e da crescente globalização
(Banerjee, 2007). Para as empresas a responsabilidade social constitui um compromisso ou
“obrigação” moral para com a sociedade.

Durante muito tempo a responsabilidade social das empresas circunscrevia nas acções de caridade
dominantes no período da revolução industrial, tendo este modelo sofrido alterações profundas já nos
tempos modernos, isto é, no século XX quando é incorporada a necessidade da garantia dos direitos a
todos membros da sociedade humana através das acções de capacitação ou educação cívica cidadã.

Sobre esta matéria, Gago et al. (2005) sublinham que os deveres da empresa-cidadã tem a ver com as
contribuições que, na decorrência da sua actividade, queira para uma sociedade mais justa para as
pessoas, bem como actividades económica, comercial e financeira sejam mais transparentes. Como foi
referido, as exigências das Nações Unidas também jogam um papel determinante na reconfiguração
das relações entre as empresas e a sociedade no seu todo.

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Alguns instrumentos legais aprovados como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),
GRI (Global Report Ininiciative) criado em 2002, tem colaborado com UNEP (Programa das Nações
Unidas para o ambiente), etc., e os compromissos globais sobre o meio ambiente e desenvolvimento
sustentável, na lógica de não deixar ninguém atrás (lema actual das Nações Unidas), reforçam os
argumentos para as empresas assumirem a responsabilidade social.

Portanto, o desenvolvimento socioeconómico hoje não pode estar dissociado da responsabilidade


social dos principais intervenientes tais como consumidores, empregados, comunidades e instituições
público-privadas para responder as demandas crescentes da sociedade.

Apresentados os pontos diversos dos autores respectivamente a responsabilidade social das empresas e
o seu contributo no desenvolvimento socioeconómico das comunidades beneficiárias, percebe-se que
este é um tema de grande interesse sobretudo em países em desenvolvimento como Moçambique,
portanto, o próximo capítulo aborda esta questão tendo em conta os dados do campo.

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