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Recursos de apoio ao desenvolvimento do

processo de RVCC, nível secundário

Área de Competências-Chave

Cultura, Língua e Comunicação

RECURSOS DE APOIO À EVIDENCIAÇÃO DE COMPETÊNCIAS

Núcleo Gerador 4 – GESTÃO E ECONOMIA


DR4 – Tema: Usos e Gestão do Tempo

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Tema 4: Usos e Gestão do Tempo

COMPETÊNCIA: Identificar os impactos de evoluções técnicas na gestão do tempo


reconhecendo ainda os seus efeitos nos modos de processar e transmitir
informação.

Chegámos ao tempo do trabalho que parece não ter fim. E agora?

Numa economia que funciona sem interrupções e em que o trabalho assume variadas formas,
há uma nova evolução em curso. O grande desafio do século XXI é conciliar as exigências de um
horário quase interminável com o descanso e a justa remuneração dos trabalhadores.

Durante a Grande Depressão, nos anos de 1930, o economista britânico John Keynes previa que
trabalhar seis horas por dia seria uma realidade para a geração
dos seus netos. Ao longo dos últimos 85 anos, a evolução é
inegável, embora a previsão de Keynes continue por
concretizar. E, quando se olha para o futuro, as perspectivas
são pouco animadoras. A globalização da economia, a
precarização das relações laborais e a crise mundial têm levado
os países a adotar novas formas de organização do tempo, que
obrigam a trabalhar mais pelo mesmo ou até por menos
dinheiro.
Portugal não é exceção. A semana de 40 horas está prevista
na lei desde 1996 (e pode até ser mais curta, se houver acordo
na negociação coletiva), mas entre a teoria e a prática a
diferença é assinalável. Os números mais recentes mostram que, Imagem disponível na Internet: http://www.modelo-

em outubro de 2013, os empregados por conta de outrem curriculum.com/vantagens-do-trabalho-


trabalhavam 43,3 horas semanais, enquanto no setor público o temporario.html

horário semanal aumentou, por lei, de 35 para 40 horas. Fora destas contas fica uma parte da realidade que
passa por trabalho não-pago ou invisível.
“Os últimos 25 anos foram marcados por uma espécie de efeito ondulante. Na linha de uma tendência
europeia dos anos 90, ocorreu uma redução da duração normal de trabalho semanal, a que se seguiu, nos
últimos anos, um aumento efetivo do tempo de
trabalho, tanto no setor privado como no público”, nota
Hermes Costa, investigador do Centro de Estudos Social
(CES) da Universidade de Coimbra. “A perceção que fica,
mais acentuada entre os funcionários públicos, é a de
regressão social e de quebra de expectativas. Tanto
mais que a mais horas trabalhadas não corresponde
retribuição correspondente”, acrescenta o sociólogo.
Entre 2012 (quando foram introduzidos na lei
a redução do pagamento do trabalho suplementar, os
Imagem disponível na Internet: cortes de dias de férias e feriados e os bancos de horas
http://www.blogdogasparetto.com.br/controlando-o-ritmo-de- individuais) e 2013, o CES estima que os trabalhadores
trabalho-%E2%80%93-parte-1/
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do setor privado perderam, em média, 2,3% do salário efetivo e deram à empresa uma semana e meia de
trabalho, sem terem sido pagos por isso.
A este diagnóstico, Luís Gonçalves da Silva, professor
de Direito do Trabalho na Universidade de Lisboa,
acrescenta a “grande tolerância, do ponto de vista social,
para com a extensão do tempo de trabalho”.
“Continuamos a trabalhar mais de 40 horas em Portugal. É
quase tácito. Essa tolerância faz com que o tempo de
trabalho pareça um fator, um bem, que tem pouca
relevância”, acrescenta, lembrando que as formas de
flexibilização dos tempos de trabalho que têm sido
adotadas contribuem para “embaratecer” o trabalho.
Também António Monteiro Fernandes, antigo secretário de Estado do Emprego e professor no ISCTE, não
tem dúvidas de que se trabalha mais e por menos: “Há cada vez mais trabalho não-remunerado. É a
contrapartida de um privilégio que consiste em ter emprego”.

Menos horas e mais trabalho para todos?

Os limites ao tempo de trabalho levaram mais


de um século a erguer. É preciso recuar a Maio de
1886 para se assistir àquela que é considerada a
génese da luta pela redução da jornada de
trabalho do mundo e que, mais tarde, deu origem
à comemoração do 1.º de Maio. Milhares de
trabalhadores, que eram obrigados a trabalhar
13, 14 e até 18 horas por dia, manifestaram-se
Imagem disponível na Internet:
https://portal2013br.wordpress.com/2016/03/05/3-sinais-de- que-o- nas ruas de Chicago pelas oito horas diárias e o
trabalho-corporativo-e-toxico-para-o-espirito-humano/
direito ao descanso.
Cinco anos depois, o Papa Leão XIII publicou a encíclica Rerum Novarum, onde defendia limites ao
trabalho diário e o respetivo repouso, evidenciando particulares preocupações com as mulheres e as
crianças. “(...) O número de horas de trabalho diário não deve exceder a força dos trabalhadores, e a
quantidade de repouso deve ser proporcional à
qualidade do trabalho, às circunstâncias do tempo
e do lugar, à compleição e saúde dos operários”,
escreveu.
Anos mais tarde, em 1919, e fazendo eco das
exigências que emergiam dos movimentos sociais,
a recém-criada Organização Internacional do
Trabalho (OIT) publicou a primeira convenção
sobre as horas de trabalho para a indústria. Em
1935, quando pela primeira vez olhou para a
redução da jornada de trabalho como uma forma
de fomentar o emprego, surge a convenção das 40

horas. A Persistência da Memória de Salvador Dali. Imagem disponível na


Internet:
Nas décadas de 80 e 90 do século XX, vários http://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2012/01/07/903289/co
nheca-persistencia-da-memoria-salvador-dali.html
países europeus, como a França ou a Alemanha,

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adotaram políticas de redução do trabalho semanal. As chamadas medidas de “partilha de trabalho” tinham
subjacente a ideia de que diminuir tempo de
trabalho poderia induzir um aumento do
emprego.
Seguindo a tendência, Portugal reduziu por
duas vezes a duração máxima do trabalho
semanal. A primeira em 1991 (das 48 para as 44
horas) e a segunda em 1996 (Lei das 40 horas).
Esta “partilha de trabalho” não teve, contudo,
os efeitos esperados. Em tese, diz Monteiro
Fernandes, “parece indiscutível que a redução
da semana de trabalho poderia conduzir a um
aumento do emprego”. Mas em Portugal,
alerta, “a grande variável de ajustamento das
empresas às necessidades de trabalho não é a Imagem do filme Tempos Modernos de Charlie Chaplin. Imagem
disponível na Internet: http://jlrodrigues.blogspot.pt/2011/11/o-trabalho-
criação/destruição de emprego, é o trabalho humano.html
extraordinário”.
Um estudo de José Varejão, da Faculdade de Economia do Porto, avaliou o efeito da Lei das 40 horas e
concluiu isso mesmo: as semanas mais curtas traduziram-se num aumento do trabalho extra, em vez de
terem motivado a criação de empregos.
Monteiro Fernandes acredita que traduzir reduções de tempo de trabalho em aumentos de emprego só
seria possível “se se estabelecesse uma limitação eficaz a este recurso”, reduzindo os limites do trabalho
extra ou aumentando o seu preço. As evoluções recentes apontam precisamente no sentido inverso.

Uma fronteira em crise

E no futuro a profecia das seis horas de trabalho diário de Keynes poderá cumprir-se? Cristina
Rodrigues, socióloga que fez a sua tese de doutoramento em torno do tempo de trabalho, receia que não.
Além dos custos salariais, diz, há outros custos a ter em conta, nomeadamente as contribuições para os
sistemas de proteção social, “o que complicaria a operação aritmética de dividir trabalho para criar
empregos e, dessa forma, diminuir desemprego”. Por outro lado, diminuir tempo de trabalho significaria
diminuir salário, “o que, em tempos de erosão de rendimentos, poderia conduzir muitos trabalhadores para
limiares de pobreza e exclusão social”.

Desde meados do século XIX e durante quase


todo o século XX assistiu-se a uma melhoria dos
direitos dos trabalhadores, fruto das suas lutas, da
ação das organizações sindicais, da influência das
organizações internacionais. Mas a questão que
esteve na base desta evolução mantém-se: como
escapar à ditadura do tempo?
Em 1919, a recém-criada Organização
Internacional do Trabalho (OIT) publicou a sua
primeira convenção sobre as horas de trabalho
para a indústria.
Imagem disponível na Internet:
https://portal2013br.wordpress.com/2016/03/05/3-sinais-de- que-o- A resposta parece difícil. A globalização, a
trabalho-corporativo-e-toxico-para-o-espirito-humano/ revolução tecnológica, a economia que funciona

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sem interrupção e os novos hábitos de consumo contribuem para formas diferentes de organização do
tempo de trabalho, que ameaçam o tempo de descanso. Defender o descanso é, por isso, um debate tão
atual como há 130 ou 150 anos. Só que agora o sistema é mais complexo.

Imagem disponível na Internet:


https://portal2013br.wordpress.com/
2016/03/05/3-sinais-de-que-o-
trabalho-corporativo-e-toxico-para-o-

Monteiro Fernandes alerta que, apesar de continuar a haver quem


trabalhe num registo “das nove às cinco”, é “evidente” que a fronteira
entre tempo de trabalho e tempo de lazer tende a esbater-se.
“Estar disponível” tanto no trabalho como fora dele “tornou-se um
imperativo do dia-a-dia”, nota, por seu lado, Hermes Costa. E lembra que
as alterações ao Código do Trabalho de 2012” vieram “legalizar” a já frágil
fronteira entre trabalho e lazer. “Como que se criaram condições para uma
espécie de institucionalização da invasão da esfera privada. Na verdade, a
subtração do tempo de lazer converteu-se em tempo de trabalho, pois, ao
eliminar quatro feriados, três dias de férias e acabando com o descanso
compensatório pelo trabalho suplementar, a lei introduziu, em termos
médios, um corte entre 21% e 30% do tempo de descanso dos
trabalhadores”, exemplifica o sociólogo de Coimbra.
Os desafios do século XXI são, por isso, mais complexos. “O operário
que trabalhava na fábrica, por conta de outrem, durante a semana, deixou
de ser o exemplo típico, e há uma multiplicidade de situações distintas”, diz
Cristina Rodrigues. “Pessoas que trabalham em horários regulares, parciais,
aos fins de semana, à noite, por turnos, a solicitação quando existe
trabalho, em teletrabalho, por conta de empresas de trabalho temporário,
por sua conta”, exemplifica.
“Compatibilizar esta diversidade de formas de trabalho com as exigências de um horário que permita o
descanso diário, semanal e anual, e a dignidade do trabalho e do trabalhador, aqui está o grande desafio”,
destaca.
Martins, Raquel. in jornal Público. Publicado em 5 de março de 2015

"O tempo é um recurso limitado para todos"


No dia-a-dia há uma forma boa de organizar o nosso tempo?
O assunto é vasto. Envolve as atitudes face ao tempo, as metodologias de trabalho, as ferramentas de
suporte e as competências de relacionamento interpessoal e intrapessoal.

As nossas atitudes face ao tempo não são tão


valorizadas quanto deviam?
Na realidade, há as que favorecem e as que dificultam à
gestão eficiente do nosso tempo. Por exemplo, se uma
pessoa não valoriza o tempo enquanto recurso
estratégico, se não respeita o tempo próprio e dos
outros, se não acredita no planeamento, se coloca o
foco dos problemas nos outros em vez de olhar para si
enquanto causa do que lhe acontece, terá muito mais Imagem disponível na Internet:
http://blog.contratanet.com.br/administracao-do-tempo-nas-
tendência para demonstrar comportamentos empresas/

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ineficientes. Chegará atrasado a reuniões e Para melhorar a eficiência na gestão do e-
compromissos, terá mais imprevistos e problemas de mail
última hora, andará a correr contra o relógio por falta - Responda a horas determinadas. Se reservar no
seu planeamento horas definidas para a leitura e
de organização, o seu trabalho terá menos qualidade, resposta às mensagens de correio eletrónico,
produzirá menos que os colegas e ainda por cima dirá reduzirá o tempo que gasta em cada uma delas,
que é uma vítima de urgências porque o mundo - Utilize os "furos" do dia. Rentabilize aqueles
minutos breves (5' ou 10') entre a realização de
inteiro não se organiza para lhe solicitar as tarefas de diferentes tarefas ou compromissos, para tratar
forma organizada. Há forte desresponsabilização a sua caixa de entrada de correio.
associada a estas atitudes. - Comece pelas mensagens mais recentes. Por
vezes enviam-se mais do que uma mensagem
eletrónica sobre o mesmo tópico. Às vezes
acontece por engano, mas frequentemente
Os métodos de trabalho ajudam a obter ganhos porque se pretender alterar alguma informação
de eficiência? em relação à mensagem original. Se começar
pelas mensagens mais recentes, pode não ser
preciso responder a algumas mais antigas,
Podemos fazer um diagnóstico no sentido de avaliar entretanto desatualizadas.
se as metodologias de securitização, planeamento, - Copie, da mensagem original, apenas o texto
organização pessoal, gestão de reuniões, gestão de necessário. Por norma, não inclua o texto
integral da mensagem original. De modo a
interrupções, trabalho em open space, gestão de poupar tempo na sua leitura ao destinatário
email, gestão de agenda, entre outras, são as mais escreva as suas respostas por baixo das
perguntas, utilizando espaçamentos ou cores
adequadas para que as pessoas sejam produtivas. diferentes Para destacar as respostas.
- Organize o correio por Prioritário o Não
Prioritário. Sempre que possível, deve responder
Pode-se também ter um uso mais proveitoso a uma de correio imediatamente depois de a ler.
das ferramentas de trabalho disponíveis? Estará a poupar tempo, porque não precisa de a
ler outra vez. No entanto, se receber grandes
Uma boa conjugação das várias ferramentas quantidades mensagens, deve dar a prioridade
nas Respostas às mesmas com base no seu grau
eletrónicas que existem, como softwares adequados e de importância e urgência.
utilização do papel, é indispensável. A memória - Avalie o remetente das mensagens. Em certas
situações, as mensagens de determinados
humana foi desenhada num tempo em que as remetentes devem ser lidas assim que chegam.
solicitações eram muito menores. A quantidade de Se a passagem da mensagem por si constituir um
entrave a um determinado processo isto é, se da
informação que o leitor tem nas mãos nesta edição do sua decisão ou fornecimento de informações
"Semanário Económico" é muito maior do que teria depender a ação de pessoas a jusante, essas
mensagens deverão ser respondidas
recebido em toda a vida, se vivesse na Idade Média. prontamente.
Por último, diria, competências de relacionamento - Utilize cabeçalhos de assunto descritivos e, ao
são cruciais. A competência mais importante é a responder, modifique o cabeçalho. Pense no
destinatário utilize cabeçalhos que sejam claros
assertividade: permite negociar melhores condições sobre conteúdo da mensagem. Por exemplo, se
de trabalho, prazos, recursos, etc. Nas intrapessoais é alguém estiver a organizar uma grande reunião
de vendas com muitos participantes, pode dar-se
a gestão do stresse porque mais tarde ou mais cedo ocaso de 90% das mensagens que essa pessoa
enviar ter por tópico "Reunião de vendas",
todos temos picos de trabalho.
- Apenas um tópico por mensagem. Para facilitar
ao destinatário a tarefa de processar e arquivar o
correio, restrinja cada uma das mensagens
Que riscos corremos se houver descontrolo da enviadas a um único tópico. Evita assim que as
nossa agenda? pessoas incluam assuntos urgentes e não
urgentes numa mesma mensagem.
A consequência imediata é produzir muito menos e - Referencie claramente a mensagem a que está
com menos qualidade. Passa uma imagem de falta de a responder. Seja específico nos seus
comentários, nomeadamente quando a resposta
rigor e profissionalismo. Depois vem o stresse não Incluir o conteúdo da mensagem original à
negativo e a fadiga crónica. Dificuldades de qual está a responder.
concentração, problemas de sono, ansiedade, tensão - Tenha cuidado com aquilo que envia ou
reencaminha. Os avisos de vírus, piadas,
arterial elevada, taquicardia, são alguns sintomas. No informações desnecessárias, etc. servem apenas
fim da linha está o esgotamento. para aumentar o lixo eletrónico.

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Quais são os "ladrões do tempo" dos executivos?

Imagem disponível na Internet:


https://www.google.pt/search?q=Tempo+trabalho

O maior ladrão do tempo do gestor é ele próprio. Há um problema grave que afeta a eficácia e eficiência de
forma global: a falta de feedback honesto. A maioria dos colaboradores das empresas jamais dirá ao seu
chefe que ele é mau gestor de pessoas, que não dá autonomia
suficiente, não sabe planear, que dá cabo da produtividade da
equipa com a sua desorganização, etc. Isto faz com que vivam
numa falsa autoimagem de produtividade. O segundo problema é
querer fazer o trabalho dos colaboradores em vez do seu: não
delegar e responsabilizar, desenvolver competências e alinhar
atitudes.

Seria possível trabalhar(mos) menos tempo e produzir


mais?
Para todos nós existe um grau de desperdício que pode ser
eliminado, permitindo-nos produzir mais e com melhor qualidade
em menos tempo. E claro que algumas pessoas terão 1% de
desperdício, enquanto outras terão 50% Quando fazemos consultoria de diagnóstico de produtividade
pessoal encontrarmos um valor médio de cerca de 30% de desperdício. Em teoria, com menos 30% de tempo
as pessoas poderiam produzir o mesmo. Isso não é exatamente assim porque há uma margem de
desperdício inerente aos processos de trabalho de cada empresa impossível reduzir.

Há um tempo pessoal "ótimo"de laboração diária?


O limite de tempo ótimo de trabalho é um valor individual. Há pessoas que conseguem trabalhar mesmo
12/13 horas por dia, mas são uma minoria. Na maioria das vezes, quando dizem que trabalham 12 horas
referem-se ao tempo entre a chegada e a saída. As horas efetivas de trabalho são muito menos porque parte
do tempo é gasto em atividades que não produzem resultados: socialização, mudança de espaço entre
reuniões, conversas de corredor... E importante conhecer o nosso limite de horas máximo por dia, mas mais
importante é conhecer o limite de duração da nossa capacidade de concentração. A maioria das pessoas não
consegue estar mais do que hora e meia em concentração total numa tarefa.
Quando o dizemos estamos a pensar na
Tempo é dinheiro? possibilidade de transformar uma hora do dia
em algo que possa ser vendido. Mas quanto
vale uma hora de lazer? Quanto vale um jantar
com amigos, uma hora a brincar com os filhos, uma
hora de qualidade para o casal? Ver o tempo como
dinheiro é sinal de falta de visão. O dinheiro é um
recurso que podemos aumentar se fizermos as coisas
certas. O tempo é um recurso limitado para todos nós,
que não conseguimos aumentar. Todos temos um
tempo limitado de vida. O nosso tempo é a nossa vida
neste sentido é muito mais importante que o dinheiro.

Imagem disponível na Internet:


http://www.counselingitalia.it/articoli/4172-gratificarsi-con-il-

Vargas Ricardo, In Semanário Económico, publicado 2008. Disponível na Internet em: http://www.consulting-
house.eu/fotos/editor2/otempoeumrecursolimitadoparatodos.pdf
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Gerir o tempo de forma mais eficaz
A má gestão do tempo pode ser um vilão das boas resoluções de Ano Novo, mas há formas de
organização que permitem entrar em modo de atenção ao essencial, eliminar maus hábitos, reduzir o
stresse, e ser mais produtivo. Usar o tempo
a nosso favor e não contra nós. Uma boa
gestão de tempo é fundamental para se ter
uma (boa) vida para além do trabalho.
É preciso conhecer primeiro os objetivos e
as prioridades. Se os dias estão tão cheios de
atividades e o stresse aumenta com tanto para
fazer, em tão pouco tempo, é altura de
adotarmos medidas para administrar melhor
as nossas horas de trabalho. Recorrer a uma
agenda é o ideal, mas uma folha em branco
também ajuda a dar os primeiros passos na
Imagem disponível na Internet: http://setesys.com.br/blog/administrar-tempo-
organização das tarefas. google-spreadsheet/
. Comecemos o dia definindo as tarefas
que pretendemos cumprir. São 10/15 minutos muito bem empregues. A falta de planeamento é um forte
inimigo da produtividade.
. Organizemos os itens por data e prioridade. Os que têm prazos definidos vão para a agenda. Os outros
anotam-se como tarefa.

Fazer a distinção entre tarefas urgentes e tarefas importantes é crucial para uma correta gestão de tempo.
Stephen R. Covey distinguiu-as da seguinte forma no seu livro Os Sete Hábitos das Pessoas Altamente
Eficazes:
 Se é urgente e importante tem prioridade máxima;
 Se é urgente mas não é importante deve delegá-la;
 Se não é urgente mas é importante pode adiá-la;
 Se não é urgente nem importante vai para o fim da lista de tarefas ou, simplesmente, esqueça-a.

. Mantenhamos a agenda atualizada porque é importante para compromissos com data e hora marcadas.
Ter uma agenda online é uma boa ideia, pois pode ser consultada no telemóvel, tablete ou no computador.

. Indiquemos o que é preciso fazer para cumprir cada tarefa. Se for um telefonema, quais os nomes e os
telefones necessários. Se for uma reunião, quais os assuntos, os documentos e as pessoas a convocar.
. Antes de um telefonema,
conversa ou reunião
paremos cinco minutos para
pensar nos objetivos que
pretendemos atingir. Isso
ajuda-nos a dirigir a nossa
atenção para essa tarefa e a
preparam-nos para conseguir
atingir os resultados que
Imagem disponível na Internet: http://www.olheforadacaixa.com/semana-ideial-para-
pretendemos. empreendedores/

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. Mantenhamos o local de trabalho organizado. Garantamos que tem tudo o que precisa e libertem-nos de
papelada desnecessária.
. Não deixemos as tarefas
mais difíceis para o final do
dia. É tentador começar pelas
mais fáceis para sentirmos a
satisfação de riscar tarefas da
lista, mas lembremo-nos de
que a nossa energia e
concentração vão diminuindo
ao longo do dia, tornando
mais difícil lidar com situações
complexas.
. Definamos quais as tarefas Imagem disponível na Internet: https://www.brasiliamarketingschool.com.br/blog/5-dicas-para-
que podemos começar a organizar-sua-rotina-e-conseguir-mais-tempo-no-fim-do-dia

realizar de acordo com os


recursos de que já dispomos e identifiquemos os recursos que ainda temos de reunir (nome de pessoas para
contactar, telefones, informações, documentos, etc.) para darmos seguimento a outras. Se necessário
peçamos ajuda. Não caiamos na tentação de querer fazer tudo sozinhos. Normalmente há colegas mais
disponíveis ou colaboradores com a missão de darem apoio à equipa.
. Deleguemos o que for preciso sempre que percebermos que outra pessoa pode executar determinada
tarefa (às vezes até de uma maneira melhor). Peçamos um favor e não nos inibamos de o fazer.
. Comecemos imediatamente. Identifiquemos as distrações e mos para não sermos interrompidos.
. A cada dia revejamos a lista de tarefas, risquemos o que já conseguimos fazer e, se for caso disso,
reorganizemos o que ainda falta fazer.
. No final da semana avaliemos o que ficou feito. Anotemos o que não conseguimos concluir ou que tivemos
de transferir para a semana seguinte. Nem tudo está nas nossas mãos – há tarefas que dependem de outras
pessoas ou acontecimentos.
. Façamos uma nova lista de prioridades para a próxima semana e anotemos as diferenças que
conseguimos na sua vida. De certeza que estaremos mais satisfeitos com o que formos capazes de fazer.

Sugestões para momentos críticos: As interrupções originam incumprimentos de planos e, por isso,
devemos reservar na agenda períodos de tempo só para trabalhar. Sigamos alguns truques para aumentar a
produtividade.
. Trabalhemos de costas para áreas
movimentadas;
. Fechemos a porta do gabinete;
. Não permitamos interrupções;
. Aprendamos a dizer não;
. Mantenhamos o corpo hidratado e
alimentado.

In E executiva. Faria, Helena. Gerir o tempo


de forma mais eficaz. Disponível na Internet
em: http://executiva.pt/11070-2/ (Adaptado)
Imagem disponível na Internet: http://www.sbie.com.br/blog/como-administrar-e-
organizar-seu-tempo-para-ficar-menos-estressado/

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Temos mais tempo, mas não sentimos que o temos”

Para Judy Wajcman, professora de sociologia na London School of Economics e autora de Pressed for Time,
está a criar-se uma cultura na qual o tempo de lazer é desvalorizado.

Professora de sociologia na London School of Economics, Judy Wajcman publicou recentemente um livro
onde analisa a relação com as tecnologias
e a forma como sentimos o
tempo. Em Pressed for time –
The acceleration of life in digital
capitalism, sublinha que as
pessoas não são reféns das
tecnologias; logo, que não são
estas as culpadas de sentirmos
que andamos sempre a correr. A
obra, que evita o facilitismo das Vinhetas extraídas da Banda Desenhada Mafalda de “Quino”Imagem disponível na Internet:
ideias a “preto e branco”, http://blogforbusinessonline.com/letsgetsomefreedom/viver-para-trabalhar-ou-trabalhar-

evidencia factos como estarmos a


viver uma cultura que
valoriza o estar atarefado e a hiperprodutividade. Muitas vezes, com o devido contexto, levanta mais questões
do que dá respostas. Resumindo: faz pensar, algo que requer tempo.

No seu livro refere que há uma espécie de paradoxo, com as pessoas a culparem os produtos tecnológicos
pela pressão, pela noção de falta de tempo, mas, ao mesmo tempo, é a esses mesmos produtos que se
recorre para tentar aliviar essa pressão. A tecnologia está, de facto, a acelerar as nossas vidas?

A tecnologia que temos reflete a sociedade, não a molda. E isso é argumento contra a ideia de que somos
vítimas da tecnologia. A hiperatividade não existe por causa dela. A tecnologia só existe a partir do momento
em é que é fabricada, e lhe damos um sentido.

Mas acha que não estamos a usar tecnologia da forma mais correta?

Uma questão passa pelo facto de a tecnologia estar a ser concebida, de uma forma geral, em Silicon Valley,
por empresas cujo objetivo é o lucro. Mesmo que digam que estão a querer transformar o mundo num sítio
melhor e que estão a construir estas tecnologia a pensar em nós, o seu objetivo é conceber produtos que dêem
dinheiro. Os cidadãos deviam estar mais envolvidos em todo esse processo de criação e conceção. Isto para
termos diferentes produtos tecnológicos, mais afastados da noção de que mais velocidade é igual a progresso,
que melhores vidas dependem da banda larga mais rápida, de que é isso que queremos, em vez de se pensar,
de facto, em ajudar a termos melhores vidas e
que problemas sociais é que queremos
resolver.

Como é que os cidadãos podem estar mais


envolvidos nesse processo?

Primeiro, há um problema no facto de os


engenheiros que estão em Silicon Valley
serem, de uma forma geral, muito jovens,
Imagem disponível na Internet: http://www.estudokids.com.br/o-tempo-e-a-
predominantemente brancos, embora haja tecnologia-historia-e-avancos/

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alguns indianos, e do sexo masculino. Se houvesse mais diversidade, é provável que tivéssemos tecnologias
diferentes. Depois, os governos devem ter um papel mais ativo. Devem estar mais envolvidos na conceção dos
produtos tecnológicos e facilitar o tal envolvimento dos
cidadãos, nomeadamente através da educação ligada à área
de ciência e tecnologia. Devia haver mais organismos onde
se discutisse, de forma coletiva, os caminhos da
investigação e desenvolvimento dos produtos. É sabido que
muita da investigação e desenvolvimento usada em Silicon
Valley tem por base tecnologia militar, como os drones, que
podem entregar pizzas. E podia-se estar a pensar em áreas
como a energia, problemas sociais, em vez de pensar: “há
esta tecnologia dos drones, vamos usar de forma
comercial”.
Imagem disponível na Internet:
http://pt.dreamstime.com/ilustra%C3%A7%C3%A3o-stock-
tempo-%C3%A9-dinheiro-fa%C3%A7a-o-neg%C3%B3cio-da-
Considera que é errada a ideia de ligar a tecnologia a algo
que tem de ser mais rápido?

Sim, quando se pensa que o melhor motor de pesquisa é o que dá resultados de forma mais veloz, mas um
outro motor de pesquisa, menos rápido, com diferentes algoritmos, pode dar outro tipo de respostas ligadas à
informação que se procura, com outro tipo de conhecimento. As pessoas não se questionam sobre porque é
que um determinado algoritmo resulta num tipo de informação e não noutro. E o segredo mais bem guardado
do mundo é o algoritmo do Google.

Falou do papel das empresas. E em relação ao papel dos consumidores, dos cidadãos? Porque a forma
como utilizamos a tecnologia diz algo sobre nós. Quando as pessoas incorporam essa necessidade de
velocidade, o que é que diz delas próprias?

No meu livro tento fugir à polarização, de que algo é totalmente bom ou totalmente mau. De que o problema
se resolve com uma desintoxicação tecnológica. Numa sociedade que valoriza a velocidade, as pessoas tendem
a usar a tecnologia nesse sentido. Quando se olha para os telemóveis, para smartphones, por exemplo, as
pessoas querem estar em estrito contacto com a família e com os seus amigos. Quando os telemóveis surgiram,
pensei que era mais uma ferramenta de trabalho. Como antiga marxista que sou, imaginei logo que seria uma
forma de intensificar o trabalho. Mas todas as pessoas compraram telemóveis, de uma forma tão rápida, e
verificou-se que querem estar em contacto com a família e amigos quando estão à espera do autocarro, por
exemplo, para saber se é preciso ir ao supermercado ou se as crianças estão bem.

Mas os telemóveis vieram intensificar o trabalho,


certo?

Sim, é verdade. Mas não se pode pensar no problema


do tempo e das pessoas como uma questão individual.
É um problema coletivo, ligado à forma como a
sociedade está organizada: espera-se uma resposta
rápida, que a pessoa esteja disponível, etc. Tem de se
lidar com essas questões de forma coletiva, alterando
as práticas do local de trabalho. Em termos históricos,
Imagem disponível na Internet: http://1080.plus/4tlTlDcbIaQ.video os telemóveis são algo muito recente, tal como o
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email, e já usamos o email de forma diferente da que fazíamos há dez anos. Com o tempo as pessoas vão
alterar a forma como utilizam as diferentes tecnologias.

E essa alteração virá


no sentido de
abrandar o ritmo na
forma como se usa os
telemóveis,
desligando mais
vezes ou não
atendendo todas as
Imagem disponível na Internet:
chamadas? http://www.istoe.com.br/reportagens/5602_TEMPO+E+DINHEIRO+CARREIRA+FAMILIA+LAZER+AMIGOS

Não sei se é uma questão de mais ou menos velocidade, mas antes de usar as tecnologias para ter tempo para
as coisas que queremos fazer. Em muitas famílias, os dois membros do casal trabalham. Face ao passado, a
articulação entre os membros da família é mais complicada. E o telemóvel funciona para organizar e
proporcionar tempo para estar com o seu parceiro ou com os seus filhos. Pode-se chamar tempo de qualidade,
o tempo que se pretende ter.

Diz que não podemos olhar para o tempo apenas como as 24 horas do relógio, mas também como espaço,
e que há uma dessincronização entre as pessoas. Por exemplo, entre o pai e a mãe, que estão cada um no
seu trabalho, e o filho, que está na escola. Isto contribui para a sensação de estarmos sempre com pressa?

Uma das coisas de que se fala muito é de as fronteiras entre lazer e trabalho estarem a mudar e julgo que isso é
verdade. A discussão tem sido sobre como a tecnologia levou o tempo de trabalho a colonizar o tempo em casa
e o tempo de lazer. Mas, por outro lado, a tecnologia permite que as pessoas, quando estão no trabalho,
estejam em contacto com a família e amigos. É um resultado do capitalismo industrial termos uma separação
rigorosa entre trabalho e lazer. Mas talvez dentro de 50 anos seja mais normal não haver esta separação, poder
passar algum tempo no trabalho a fazer compras ou outras coisas na Internet, e compensar isso com trabalho à
noite. Há um conceito de flexibilidade - que é a flexibilidade dos empregadores - que é estarmos sempre
disponíveis para trabalhar. E há a flexibilidade que nós queremos, que é termos mais controlo para organizar
os diferentes aspetos das nossas vidas.

A tecnologia pode tornar esse tipo de flexibilidade possível na generalidade dos países?
Depende do que forem as condições de trabalho e essas não são resultado de smartphones e gadgets. A questão
tem muito mais a ver com a desregulação dos
mercados de trabalho.

A grande intensidade do multitasking no local


de trabalho ajuda à sensação de estarmos
pressionados pelo tempo?

O multitasking é um mito. Os estudos mostram


que as pessoas fazem as coisas numa sequência
rápida, em vez de estarem literalmente a fazer
várias coisas ao mesmo tempo. É mais fácil Imagem disponível na Internet: http://www.clickgratis.com.br/saude/dicas-para-
organizar-seu-tempo-e-evitar-o-estresse/

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queixarmo-nos de que temos a caixa de correio cheia do que falar dos outros problemas de trabalho. Sou cética
em relação à justificação das interrupções
causadas pela tecnologia.

No livro diz que é possível comprar tempo. A que


ponto há uma desigualdade de tempo provocada
por uma desigualdade de riqueza?

Há uma grande desigualdade. E, mais uma vez,


não poria a tecnologia no centro disso…

Sim, é possível comprar serviços, comprar o


trabalho de outros… Imagem disponível na Internet: http://navebook.com/o-uso-da-
tecnologia-para-a-organizacao-do-tempo-na-vida-e-no-trabalho/
Em termos de poupar tempo, o que as pessoas
ricas fazem é comprar muito trabalho dos outros. Uma das coisas de que vale a pena falar é de como o futuro
com que Silicon Valley sonha para todos nós é um mundo com muitos assistentes pessoais nos telemóveis,
como se todos vivêssemos em classes altas com escravos, mas com os escravos a serem máquinas. É uma
fantasia antiga. Mas a maioria dos robôs estão em fábricas de carros, estão a pintar a spray, o que está a ser
automatizado não são os serviços prestados por humanos. A promessa antiga da inteligência artificial e da
robótica é que haverá mais inteligência e não teremos de fazer várias coisas, como cuidar dos mais velhos.
Mas a inteligência artificial não está sequer perto disso. Que tipo de fantasia é esta de querer ter escravos
automáticos? Não é um desejo que eu tenha…

Estamos hoje a trabalhar mais horas, apesar de haver muitas tarefas automatizadas. Mas houve coisas,
como a máquina de lavar, que nos trouxeram mais tempo. Temos mais tempo de lazer do que há 100 anos.
O que precisamos é de um equilíbrio?

Com tecnologias como a máquina de lavar, o que acontece é que os padrões se alteram quando elas aparecem.
Hoje lavamos mais vezes a roupa. Temos mais tempo, mas não sentimos que o temos. Acho que esse é o
paradoxo. Em parte, tem a ver com uma cultura que valoriza o estar atarefado e a hiperprodutividade. Os
heróis de hoje são o Steve Jobs, o Ted Turner (magnata dos media americano), os heróis empreendedores... Li
o perfil do Jony Ive (vice-presidente da Apple) na New Yorker. Falam sempre de ser obsessivos, maníacos, de
trabalhar 24 horas por dia…

Há 100 ou 200 anos, ter tempo para lazer era ter estatuto. Esse estatuto foi substituído por estar
atarefado?

Penso cada vez mais nisso, e julgo que sim. Um


colega disse-me: “Imagina que eu digo que não
tenho assim tanto email e que não tenho assim tanto
para fazer. Toda a gente dirá que sou um falhado.” É
uma americanização do estilo de vida. Está a criar-se
uma cultura em que isso é valorizado e em que o
tempo de lazer é desvalorizado.

Imagem disponível na Internet: http://executiva.pt/11070-2/

Página 14 de 31
Consegue determinar o ponto em que começámos a desvalorizar o lazer e talvez a sobrevalorizar o
trabalho?

Um colega escreveu um trabalho sobre a antiga aristocracia, que se orgulhava de ter uma vida de lazer,
dedicando-se à música, à caça… Tem a
ver com o capitalismo industrial. As
pessoas interiorizaram que o trabalho é
uma coisa boa em si. O Ive, o tipo da
Apple, disse que mesmo quando era novo,
estava sempre a trabalhar! Os
desempregados hoje são vistos apenas
como indolentes, preguiçosos.

Na sua opinião, o trabalho é uma coisa


boa em si mesma?

Tenho de dizer que estou a repensar isso.


Sempre alinhei com a ideia de que não
havia nada mais criativo e mais definidor Imagem disponível na Internet em:
http://blog.blognasajon.com.br/2013/03/07/como-conciliar-empreendedorismo-e-
de identidade. Talvez nos estejamos a
focar demasiado no trabalho e haja mais coisas para fazer com o nosso tempo. Saber se podemos trabalhar
menos, consumir menos e ter uma vida diferente é uma discussão que ainda não estamos a ter. A chave para
isso é a redistribuição do trabalho, de forma a não haver uma sociedade em que há profissionais a trabalharem
imensas horas, e muitas pessoas desempregadas e sem trabalho que chegue.

Escreveu que pode ser que muitos de nós tenhamos mais tempo, mas não o tipo certo de tempo. O que
quer dizer com isto?

Estou a referir-me a tempo com outras pessoas. Há um estudo interessante que diz que tanto desempregados
como empregados se sentem melhor quando o fim de semana está a chegar, e que se sentem pior na segunda-
feira de manhã. Isto acontece porque o tempo de socialização é aos fins de semana. Mesmo os desempregados
sentem isto, porque o fim de semana é a altura em que têm tempo livre ao mesmo tempo que os outros. É uma
questão de ter tempo social, não apenas tempo em abstrato.

Pereira, João Pedro e Villalobos, Luís , in Público. Publicado em 5 de março de 2015

Rumo à cidade em tempo real

"Um mundo feito de redes desafia, em muitas frentes, as categorizações tradicionais e as estruturas
intelectuais. Questiona as velhas conceções de espaço, tempo e poder. Enquanto as antigas economias de
mercado se formaram a partir de ordenações espaciais e temporais da vida das cidades, as economias de
hoje baseiam-se numa ordenação lógica ou “virtual” da comunicação eletrónica, numa nova geografia de
conexões e sistemas, de centros de processamento e controlo (...) Redes de computadores, cabos e
comunicações via rádio governam (agora) o destino das coisas, como elas são remuneradas, e quem tem
acesso a quê. As manifestações físicas de poder - paredes, fronteiras, autoestradas e cidades - foram
sobrepostas por um mundo “virtual” de sistemas de informação, bases de dados e redes. As edificações estão

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a ser redefinidas em função das suas posições nas redes à medida que “casas inteligentes” se juntam a
escritórios eletrónicos e a fábricas automatizadas."
Geoff Mulgan, Communication and Control (1991;3)

À medida que o mundo está a ficar cada vez mais urbanizado, computadores de última geração e sistemas
telemáticos digitais vão penetrando em
todas as áreas da vida urbana. Podemos
afirmar que as duas características que
definem a civilização contemporânea,
embora questionáveis, são os avanços
paralelos rumo a um planeta mais
urbanizado e a uma sociedade cada vez
mais baseada na rapidez dos fluxos
eletrónicos de informação.
A maioria das mudanças contemporâneas
nas economias, na cultura e na vida social das
cidades parecem estar relacionadas com a Imagem disponível na Internet em:
http://www.paradiplomacia.org/noticias.php?lang=po&seccion=3&nota=58
aplicação de novas infraestruturas de
telecomunicações e serviços, ligadas a computadores ou a equipamentos computadorizados, visando a
formação de redes “telemáticas”. Tudo isso transcende, quase que instantaneamente, as barreiras espaciais,
de forma a reordenar as limitações de tempo e de espaço entre e dentro das cidades. Pequenos pontos e
lugares, totalmente separados, estão a ser interligados por todo o mundo urbano, com um mínimo de
tempo diferido - ou seja, quase que aproximando-se do “tempo real”. Fluxos globais de voz, correio
eletrónico, dados, vídeo, fax e sons estão a aumentar exponencialmente, fazendo com que as cidades fiquem
cada vez mais atadas a extensas redes de comunicação humana, a fluxos de serviços e meios de
comunicação, a fluxos de forças de trabalho baseados no ‘teletrabalho”, e aos fluxos de dinheiro eletrónico.
Como parte dessa transformação, tanto as cidades do "Norte", quanto, de forma crescente, as do "Sul",
estão a cobrir-se com aquilo a que podemos denominar "uma teia gigantesca e invisível" de fibras óticas,
cabos de cobre, ondas de rádio e redes de comunicação via satélite. Os corredores que interligam as cidades,
seja na terra, nos oceanos ou no espaço, estão agora a configurar-se como uma imensa cobertura de "teias",
feitas de ligações de telecomunicações avançadas, ligando os sistemas urbanos a redes eletrónicas. São estas
redes que circundam o planeta e constituem a base tecnológica para a aceleração dos fluxos do tráfego
mundial de telecomunicações: fluxos de voz, fax, fluxos de dados, fluxos de imagens, sinais de TV e vídeo. Os
fluxos eletrónicos instantâneos explodem, hoje, no
espaço físico das cidades e dos edifícios, e parecem
sustentar e inter-relacionar todos os elementos da vida
urbana.
Toda estas transformações significam que, à medida
que avançamos, as velhas ideias e premissas sobre o
planeamento, o desenvolvimento e o nascimento das
modernas cidades industriais - estejam elas nos
chamados "Norte" ou "Sul" - pareçam ser cada vez
menos úteis. Todas as noções geralmente aceites sobre
a natureza do espaço, do tempo, da distância e dos
Imagem disponível na Internet em: processos da vida urbana são, igualmente,
http://br.pixersize.com/adesivos/codigo-fluxos-binarios- questionáveis. A vida urbana parece mais volátil e
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acelerada, mais incerta, mais fragmentada e mais difícil de entender hoje do que em qualquer outro
momento desde o final do século passado.
Então, fica claro que as cidades
contemporâneas não são apenas densas
aglomerações físicas de edifícios, de
entroncamentos de redes de transporte, ou
centros da vida económica, social e cultural.
Deve-se considerar, também, as cidades como
sistemas eletrónicos compostos por redes de
telecomunicação e telemática. As áreas
urbanas são os centros dominantes de procura
das telecomunicações e os centros nervosos de
irradiação das redes eletrónicas. De facto,
Imagem disponível na Internet em:
parece existir uma conexão forte entre as http://redecidadedigital.com.br/noticias.php?id=534&fb_comment_id=6189
54554889883_619862598132412
cidades e estas novas infraestruturas
de redes. As cidades - o maior artefacto físico construído pela civilização industrial - são hoje verdadeiras
"casas de força" das comunicações, cujo tráfego flui pela rede global de telecomunicações - o maior
sistema tecnológico até hoje concebido pelo homem.
Mas, quais são as implicações destas transformações? O que será das cidades numa era dominada por
redes e fluxos eletrónicos? Qual será o destino de nossas áreas urbanas num mundo onde imperam as
chamadas "corporações virtuais", as "comunidades virtuais", tudo fluindo por "territórios eletrónicos do
ciberespaço", baseados fundamentalmente no uso da telemática como espaço e tecnologia transcendental?
O uso crescente e a significância das telecomunicações geram diversas questões profundas e
fundamentais, que estão no cerne dos atuais debates sobre as cidades e a vida urbana de hoje e do futuro.
Quatro destas questões são particularmente críticas:
* Primeiro, como poderemos entender as cidades e a vida urbana num mundo onde a proliferação de
redes eletrónicas flui por todas as formas de vida e por todas as escalas geográficas?
* Segundo, o que acontecerá com as cidades ao passarem de uma economia internacional, baseada na
produção e circulação de bens materiais, para uma outra assente cada vez mais em circulação e
consumo de bens simbólicos e "informacionais" a uma escala global? Como se sustentarão
economicamente as cidades dado que, de uma forma crescente, as tradicionais vantagens económicas
estarão acessíveis, "on-line", a partir de qualquer localização virtual?
* Terceiro, como a transição, pelo menos para as elites sociais, de uma vizinhança física e local, para
comunidades segmentadas, sustentadas por
redes eletrónicas - como a comunidade
Internet - afetará a vida social das cidades?
Como serão as relações sociais de poder e os
tradicionais conflitos sociais refletidos nas
cidades dessa nova era das telecomunicações?

* E, por último, como é que todas estas


mudanças influenciarão as formas como as
cidades serão planeadas, administradas e
governadas?
A cidade contemporânea é, mais do que nunca, Imagem disponível na Internet em: http://ipnews.com.br/nordeste-
uma amálgama através da qual os aspetos rígidos tecnologico-conheca-tres-iniciativas-que-mostram-o-investimento-na-
regiao/

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e tangíveis da vida urbana quotidiana interagem continuamente com os intangíveis "espaços eletrónicos"
construídos a partir e por sistemas de telemática e de meios de comunicação digitais. Para a compreensão
dos papéis complementares entre as cidades e a telemática será útil considerarmos que ambas facilitam a
comunicação económica, social e cultural, embora
de formas diferentes.
De um lado, as cidades podem ser
consideradas como concentrações físicas que
auxiliam na superação das restrições de tempo
pela minimização das limitações de espaço. Por
último, e principalmente, concentração nas
cidades significa que a proximidade física
possibilita a operação de mercados de serviços,
propriedade, trabalho e produção já que os
elementos de uma cidade podem ser acedidos e
Imagem disponível na Internet em: http://www.dbiz.com.br/
integrados sem grandes perdas de tempo. As
cidades permitem que os trabalhadores se
desloquem para o trabalho; as pessoas podem obter uma ampla variedade de bens e serviços; e a vida social
e cultural das cidades ocorre através de contactos face a face.
As telecomunicações produzem, por outro lado, efeitos opostos. Elas superam as restrições de espaço
pela minimização das limitações de tempo, interligando pontos distantes através de fluxos de fotões e
eletrões à velocidade da luz. Então, para compreendermos a cidade em tempo real será interessante
caracterizarmos os diferentes atributos do espaço urbano e do espaço eletrónico.
O ponto-chave é que a vida urbana moderna assenta no desenvolvimento interligados do espaço urbano
e do espaço eletrónico. Existem muitos exemplos nos diversos aspetos da vida urbana nos quais foram
construídos sistemas sobrepostos que combinam a presença de espaços urbanos com interações em espaços
eletrónicos. Vejamos, por exemplo:
* os mercados financeiros globalizados, que interligam as bolsas de valores de cidades como Londres,
Nova York e Tóquio através de robustos sistemas eletrónicos que suportam, diariamente, fluxos de
triliões de dólares aplicados em ações, câmbio, mercados futuros, etc.;
* as redes de infraestrutura de escritórios, onde serviços rotineiros como o processamento de dados,
serviços de rádio, apoio a softwares disponibilizados "on-line", a partir de longas distâncias, para os
principais mercados;
* os fluxos globais dos meios de
comunicação, especialmente a TV
via satélite, que transmitem para as
cidades novos tipos de produtos
culturais, a partir de pontos
distantes;
* os debates sobre "edifícios
inteligentes", "cidades inteligentes",
"casas inteligentes" e "cibercafés",
onde a avançadas tecnologias da
informação configuram fábricas de
cidades e edifícios;
* os circuitos fechados de TV e as
Imagem disponível na Internet em: http://itf365.com.br/blogs/post/113677/huawei- redestelemáticasde
ajudando-a-viabilizar-as-cidades-digitais
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rastreamento, onde as cidades, escritórios, prédios e casas são monitorados, na maioria das vezes a
longa distância;
* as interações complexas entre os fluxos de
telecomunicações e transporte, por exemplo,
com o uso da telemóvel e dos computadores
para reduzir os congestionamentos de trânsito
nas grandes cidades;
* as comunidades "virtuais" que operam via
Internet, complementando as interações das
pessoas nas cidades e seus arredores;
* os "espaços eletrónicos cívicos" lançados na
World Wide Web por instituições de todo o
mundo, visando o fomento do desenvolvimento
Imagem disponível na Internet em:
dos espaços urbanos através da construção de http://www.dreamstime.com/royalty-free-stock-images-social-media-

espaços eletrónicos.
Assim, construções permanentes em espaços e edifícios urbanos, ligadas a redes e "espaços" eletrónicos
poderão constituir-se na definição daquilo a que poderemos denominar urbanismo contemporâneo. Juntos,
esses espaços eletrónicos levam a um universo escondido e paralelo de movimentadas redes eletrónicas.
Completamente livres das restrições de tempo e espaço, elas interagem e influenciam a dinâmica tangível e
conhecida da vida urbana, 24 horas por dia e em qualquer escala geográfica. Assim, viagens de carro,
comboio, avião ou autocarro e os fluxos físicos das águas, dos produtos manufaturados e da energia são
suportados por um "mundo de redes" (networld) paralelo e eletrónico. Elas monitoram, formatam e
controlam os fluxos físicos numa base de tempo real. Um congestionamento de trânsito transforma-se,
agora, na plataforma de lançamento para incontáveis conversações eletrónicas e interações através do
telemóvel e dos computadores.
O mundo aparentemente sem vida de um conjunto de escritórios esconde "edifícios inteligentes" - um
sistema dentro de um universo eletrónico por onde fluem, 24 horas por dia, fluxos de capitais, serviços e
força de trabalho via redes corporativas telemáticas.
Em muitas cidades, a rotina diária dos moradores urbanos dá-se através de um conjunto contínuo de
"imagens digitais" captadas por um amplo sistema de rastreamento - câmaras de circuito fechado de TV,
sistemas de transação eletrónica, informática para o transporte rodoviário, entre outras. Arredores ricos e
encastelados nas grandes cidades como Los Angelos e São Paulo dependem de portas e altos muros,
interligados a sofisticados sistemas eletrónicos
de vigilância. O mais modesto dos subúrbios de
muitas cidades configura-se, agora, num
sistema dentro da crescente cacofonia
eletrónica dos fluxos globais de imagens e
meios, além dos seus moradores assumirem
um papel participativo nas comunidades
virtuais, quase que sempre numa escala global.
Esse nebuloso mundo de espaços eletrónicos
concretiza-se através dos fluxos instantâneos
de fotões e eletrões que circulam dentro das
cidades e através das redes metropolitanas
Imagem disponível na Internet em:
planetárias. Tais fluxos são a base virtual de
http://www.electronicproducts.com/Computer_Peripherals/Storage/Think_tha
t_factory_reset_wiped_everything_from_your_phone_Think_again.aspx?id=10 tudo aquilo que vemos e experimentamos no
Página 19 de 31
nosso quotidiano. (...)
Assim, as cidades podem, cada vez mais, serem vistas como centros de cruzamento e interconexão de
redes sociais, institucionais e tecnológicas. Ao mesmo tempo em que se estabelecem algumas destas
interconexões e sobreposições pelo espaço urbano físico, formando nós na rede, não existem,
necessariamente, correlações entre proximidade física e relações significativas, como era frequentemente
assumido pelas antigas ideias sobre cidades. Assim, as cidades estão a tornar-se mais fragmentadas física,
económica, social e culturalmente. São, então, mais adequadas as combinações complexas da proximidade
eletrónica através dos espaços eletrónicos do "reino do não-espaço urbano", onde as proximidades baseadas
no lugar físico deverão ser consideradas em paralelo. As pessoas têm ligações sociais mais íntimas com
outras que estão do outro lado do mundo, através de grupos de discussão na Internet, mas não sabem o
nome de seu vizinho. Uma região de escritórios em Lisboa provavelmente negocia diariamente bilhões de
dólares por dia com mercados financeiros eletrónicos em Londres, Nova Iorque e Tóquio, mas não
estabelece conexões com as pessoas que estão à sua volta e nas vizinhanças. E a vida cultural das cidades
talvez seja mais influenciada pela MTV, captada via satélite de longa distância, do que pela tradicional visão
modernista de interação de grupos sociais nos espaços públicos dos centros das cidades.

Graham, Stephen In Rumo à Cidade em Tempo Real - Desenvolvimento Urbano numa Sociedade Globalizada e Telemediática.
Disponível na Internet em : http://www.wisetel.com.br/espaco_de_futuros/vcidade.htm

Informação… em tempo real

Nos tempos atuais, confrontamo-nos diariamente com informação obtida instantaneamente, ou seja em
tempo real, através de equipamentos móveis, portáteis ou de computadores ligados à internet. Um pedido
efetuado através da internet, uma transação com cartão débito/crédito ou um acesso à rede GPS são
exemplos de transações em tempo real.
Contudo, há cerca de 30 anos, este privilégio era limitado apenas aos utilizadores de informática que se
localizavam junto dos computadores centrais
existentes na altura. De facto, a maior parte da
informação era fornecida em tempo diferido (batch),
ou seja, os pedidos eram enviados para o centro de
informática em formato de papel ou cartões e o
computador tratava essa informação nos dias
seguintes, de acordo com as prioridades definidas
pelos operadores desse centro.
A diferença entre informação em tempo diferido
e em tempo real resulta da gigantesca e
surpreendente evolução tecnológica que ocorreu nos Imagem disponível na Internet em:
http://www.adweek.com/socialtimes/report-only-4-of-marketers-
últimos anos, cujas diferenças enumeramos aqui: can-respond-to-breaking-news-and-trends-in-real-time/621423
- Um computador central processa atualmente
várias dezenas de milhares de vezes mais informação que um grande computador (mainframe) da altura,
tem uma dimensão centenas de vezes inferior e pode custar apenas 0.01 %;
- Os atuais equipamentos móveis processam informação à velocidade de milhões de instruções por
segundo e têm memórias de biliões de carateres quando os terminais antigos apenas transferiam os dados
introduzidos a velocidades reduzidas, para além do seu peso ser equivalente ao das antigas televisões;

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Esta evolução tecnológica suportada por
mecanismos de integração entre os equipamentos
móveis dos utilizadores, a rede de comunicações da
internet e os computadores remotos que processam a
informação, fazem as delícias de todos os que hoje já
não conseguem viver sem a informação em tempo
real.

Imagem disponível na Internet em:


https://gigaom.com/2014/05/16/grasswire-founder-austen-allred-is-
trying-to-build-a-wikipedia-style-platform-for-real-time-news/

Contudo para que esta informação esteja sempre


disponível é preciso que este sistema integrado
(computadores, rede e equipamentos móveis) nunca
falhe. Um exemplo limite é o sistema desenvolvido
pela Atos para os Jogos Olímpicos de Londres em que
toda a informação vai ser gerada, processada e
distribuída para mais de 8 mil milhões de equipamentos móveis espalhados pelo Mundo e com tempos de
resposta inferiores a meio segundo.
In SAPOTEK. Por João Lopes, Diretor-Geral da Atos Portugal. Disponível na Internet e:
http://tek.sapo.pt/opiniao/artigo/opiniao_informacao_em_tempo_real-1255108tek.html

Políticos ou a pressão de existir

Cada vez mais vigiados e escrutinados por cidadãos e media, com dificuldades em seguir uma agenda
própria e quase sem espaço temporal de decisão, os políticos vivem no eterno pânico de se perderem nos
circuitos do timing.
Depois do esplendor da Belle Époque proporcionado por quatro décadas de paz, há 100 anos a Europa
vivia mergulhada no horror da I Guerra Mundial. Para além da disputa entre blocos de poder e dos
alinhamentos geoestratégicos entre as grandes potências — a Alemanha (a que se juntou o império Austro-
Húngaro), contra França e a Inglaterra (depois apoiadas pela Rússia) — o que se decidia nas trincheiras era o
destino de dois mundos. De um lado, estruturas de poder arcaicas fundadas em grandes impérios, na
expansão colonial, na exploração de fluxos comerciais, na enorme concentração da riqueza e na miséria das
populações. Do outro, a modernização dos sistemas políticos, o avanço da técnica e da ciência, o
fortalecimento do movimento operário e dos sindicatos, as novas ideias. Nessa altura, as ideologias faziam
mover o mundo e nunca tanta gente aceitara catalogar-se atrás amnésia histórica do centro-
de siglas ou tantos decidiram organizar-se em partidos políticos. direita relativamente ao seu
Sociais-democratas, liberais, socialistas, comunistas, papel na criação do Estado
anarquistas com múltiplas declinações. social e a desorientação
Tudo isto mudou. Por toda a parte nascem agora partidos ou isolacionista à
movimentos sem grandes balizas ideológicas e cujos nomes não
refletem à partida qualquer preocupação política. Em
“Podemos”, “Ciudadanos”, “Livre/Tempo de Avançar”, “Os
Finlandeses” ou mesmo no UKIP britânico, entre outros, lê-se
mais um sentido de urgência, de convocatória e de ação do que
outra coisa qualquer. Ora a ação é tempo em movimento e a
profunda crise de identidade da social-democracia europeia, a
Imagem disponível na Internet em:
http://www.pstu.org.br/node/16969
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esquerda estão a travar a resolução dos problemas. O que se verifica, à direita e à esquerda, é o nascimento
de novas formas de organização de forças que se

Imagem disponível na Internet em:


http://tranversaldotempo.blogspot.pt/2012/08/a-politica-e-

Imagem disponível na Internet


emhttp://www.forbes.com/forbes/welcome/

libertam do arcaísmo das fórmulas tradicionais,


incapazes de se reinventarem e de perceberem os
sinais. Como há cem anos, olha-se à nossa volta e
distingue-se bem esse mundo que nasce do caos
aparente que só o tempo há-de decifrar. Como agora,
então tudo era novo e empolgante. Da teoria da
relatividade ao inconsciente de Freud, da eletricidade à
distorção das formas nas meninas de Picasso, do cinema
aos primeiros automóveis. Um século depois não se
aprendeu nada. Também hoje “tudo é novo, tudo é
experimental”, segundo o ex-ministro Luís Amado e
como bem provam os programas de ajustamento
testados pela primeira vez nos povos do Sul, com as
consequências que se conhecem. Afinal, até que ponto o tempo é importante em política?

A importância do tempo

Há muitas variáveis para se determinar a relevância


do tempo em política. Por exemplo, a posição em que
se está. (...) Numa crise o tempo acelera. Agora,
imagine-se um corte de estrada ou uma manifestação
de rua — uma ordem desfasada das circunstâncias em
que a ação decorre pode ser fatal. “Já nas crises
externas e em toda a área da política externa, o tempo
tem uma modelação diferente”, diz o ex-governante.
Porquê? “Resulta da perceção que o decisor tem da sua
margem de manobra” e, depois, “há problemas que
não têm solução”. Exemplo? “O problema palestiniano. Terá solução um dia, mas não na focagem do meu
tempo de governo”. Entre a tentação de afunilar as respostas para os ritmos mais curtos, relegando para
segundo plano tudo o que tem a ver com o longo prazo como as políticas sobre as alterações climáticas; ou
valorizando a agenda doméstica em detrimento da procura de soluções globais para problemas globais, os
políticos vivem numa tensão permanente entre as várias agendas, sejam de cariz mediático e de lóbis
cruzados, ou a sua própria. Mas será que os políticos
ainda têm agenda?

Quando não havia Internet, telemóveis ou redes


sociais e os canais de televisão eram do Estado.
Quando não existiam meios para difundir, escrutinar e
comentar a atividade de quem manda no espaço de
minutos em qualquer lugar do planeta, três políticos
podiam sentar-se na sala de um palácio na Crimeia e
dividir o mundo. Foi isso que fizeram Churchill,
Estaline e Roosevelt, em Ialta, no final da II Guerra
Mundial. A proposta que fez com que a Grécia ficasse Imagem disponível na Internet em:
http://www.nytimes.com/2015/09/17/us/politics/candidates-use-
do lado ocidental foi desenhada pelo político britânico

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num pequeno mapa, que colocou em cima da mesa para os outros verem. O russo olhou e abanou a
cabeça em sinal de aceitação e assim ficou. Está nas atas.
Hoje, isto não seria possível. Mas é possível que A responsabilidades dos media
num país longínquo da África ocidental como é o enquanto prestadores de serviço
Burkina Faso, cuja população tem tão parcos
público:
recursos e níveis de bem-estar tão desiguais face
aos das democracias europeias, um presidente
tenha sido obrigado a demitir-se por força de
manifestações gigantescas organizadas através
das redes sociais. Aconteceu no final de Outubro
do ano passado, com Blaise Compaoré que
governava o país há 27 anos e que achou possível Em 2014, protestos organizados nas redes sociais conduziram à queda do
manter-se no poder à custa de uma alteração então Presidente do Burkina Faso

constitucional. O povo trocou-lhe as voltas e, de repente, um milhão de pessoas nas ruas não lhe deixou
grandes alternativas. Ou mandava os tanques dizimar os manifestantes, ou saía de cena. Optou pela segunda
hipótese, livrando-se do julgamento no Tribunal Penal Internacional.
Hoje, não se podem desligar as agendas do impacto brutal da mudança nas formas
Imagem denacomunicação.
disponível Internet em: E isso
coloca outros problemas. Passou-se de uma fase em que a política se ancorava numa ideologia, imutável ou
https://www.esec.pt/noticia.php?id=433

muito pouco permeável, e em que ao líder bastava ficar na trincheira e resistir, para uma espécie de
extremos em que “a política se faz 24 sobre 24 horas com basicamente as frases do dia”, como diz Rui
Tavares. O perigo, segundo o historiador, é o “excesso de taticismo”, que cria “mais um fator de desligamento
das pessoas em relação aos partidos”. Para Marques Mendes, advogado e ex-líder do PSD, o controlo da
agenda por parte dos políticos tem outras condicionantes para além da pressão mediática. Por um lado, há a
incerteza das conjunturas económicas e financeiras; por outro, o facto de a gestão das crises já não estar
exclusivamente em mãos nacionais. Esta gestão possibilitava o controlo dos ciclos, enquadrando-os nos
mandatos, que António Barreto qualifica como um dos “condimentos” da democracia. “Hoje não é o
mandato que conta, é o tempo real. Ao tomar decisões, o político está a pensar nos noticiários das 20h, no
online ou nas sondagens. Isto não é democracia!”

Para evitar a deriva e o risco real de decisões cada vez mais erráticas e perigosas, Luís Amado propõe o
“sentido do compromisso” assente em “acordos de regime mais ou menos prolongados no tempo”, capazes
de focar as propostas que dêem conteúdo a uma legislatura. Chegará? A realidade é que os cidadãos
exigem respostas permanentes e se quem os representa não as

dá, a tendência será substituírem as velhas formas


de representação. Com a experiência que hoje temos,
seria possível a adesão ao euro sem a participação ativa
dos cidadãos nessa tomada de decisão? Não parece.
Assim como é certo e sabido que qualquer matéria
europeia está hoje muito mais sujeita a todo o tipo de
escrutínio. Rui Tavares fala em “dar mais e melhores
ferramentas à democracia”, mas quem fica à espera do
tempo dos
políticos?
(...) Imagem disponível na Internet em:
É curioso que hoje já só há heróis anónimos. Quem
http://www.techguru.com.br/85-dos-usuarios-veem-as-redes-

vive sob os holofotes não resiste à função predadora

das luzes da ribalta. E o mais certo é que nem Churchill, um dos mais admirados políticos do século XX,
resistiria à voracidade do escrutínio público.
Imagem disponível na Internet em: https://aventar.eu/2014/03/19/

Sampaio, Áurea. Publicado no Jornal Publico em 3 de março de 2015

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emissão em tempo real e em tempo diferido

O conhecimento de como funciona a produção de informação em geral e da televisão em


particular é
fundamental para o público em geral, uma vez esta
representa um poderoso mediador social. Ao lado dos
agentes de socialização tradicionais, a Televisão
desempenha um papel relevante como interveniente do
sistema social.
Para muitas pessoas a Televisão constitui a única fonte
de informação, o que aumenta a sua responsabilidade social
face às opções dos seus conteúdos e do seu largo consumo
pelo público. Ela confere um vínculo social entre aqueles
que a veem em simultâneo, constituindo uma das raras
instâncias onde a própria sociedade se revê, o que
inevitavelmente amplifica as suas responsabilidades perante
a própria sociedade e os seus cidadãos. A forte influência
deste meio de comunicação social, que marcou a era
eletrónica da comunicação de massas, relativamente aos
outros agentes socializadoras, deve-se precisamente à sua
ampla visibilidade e à sua extensa audiência.
Ao nível da informação, a responsabilidade da televisão torna-se ainda maior, visto que, apesar
de já se ter ultrapassado o mito da neutralidade e da objetividade absolutas no tratamento
noticioso, o facto de a imagem mostrar as imagens com sons, transmite a impressão da realidade e
não apenas a sua representação simbólica. É, neste sentido, que os media, em geral, mas
particularmente a televisão determinam as formas de orientação da atenção pública, a agenda de
temas dominantes que reclamam essa atenção e a sua posterior atenção pública, a hierarquização
da relevância dos temas e a capacidade de descriminação temática que os indivíduos manifestam.
Os alinhamentos informativos constituem a disposição da tematização no noticiário televisivo.
Através deles, há material noticioso que ganha mais notabilidade, quer pelo tempo disponibilizado,
quer pela sua posição hierárquica nos serviços noticiosos. A disposição dos setores temáticos tem
uma relativa mobilidade, sendo os factos mais mediáticos colocados à frente, podendo mais tarde
ser retomados com maior desenvolvimento.
Todos estes aspetos levam a que a agenda dos públicos seja condicionada pela agenda dos media.
Por
outro lado, a elaboração do alinhamento noticioso estimula um certo número de características às
diferentes
notícias, o que concede aos media, e mais concretamente à televisão, um papel relevante na
construção /
desconstrução / reconstrução da realidade social, que não raro conduz a situações de estereotipia.
(...) Os
meios de comunicação social, em geral, e a
televisão, em particular, enquanto importantes
instâncias socializadoras da contemporaneidade,
ajudam a uniformizar de uma forma globalizada
essa estereotipização. As imagens e representações
do mundo veiculadas através do ecrã possuem já,
em si, a ideia de consenso, de partilha por uma
vasta comunidade, facilitando a
adesão
conformista. Por outro lado, o caráter técnico
formal da televisão permite fazer corresponder a
cada palavra um rosto, a cada conceito ou
ideia

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uma imagem, fazendo com que o mundo seja percebido como um conjunto de rostos, imagens e símbolos,
nos quais se inscrevem as ideias mais abstratas, conferindo-lhes a materialidade de que necessitam para
viver, reproduzir-se e tornar-se “realidade”. (...)

Imagem disponível na Internet em:


http://fantastictvsite.blogspot.pt/2013/01/mudancas-tambem-

Um reflexão necessária a fazer quando abordamos o


papel dos media e particularmente da televisão e mais
recentemente da internet, tem a ver com a forma como
a informação é transmitida, isto é se em tempo real se
em tempo diferido. A rádio foi o primeiro media a
transmitir em tempo real. Mas foi a televisão que
aliando a imagem ao som, veio dar outra força ao
direto, à transmissão dos factos em tempo real, e que
hoje é graças aos avanços da tecnologia da transmissão
de dados como o streaming, passou a ser banal em
muitas plataformas disponíveis na Internet acedida por
computadores, telemóveis e outros equipamentos de comunicação.
A informação em “primeira-mão”, em tempo real, acaba por ser vista como mais objetiva, genuína do
que a transmitida em diferido, considerada mais subjetiva devido ao facto de ter sofrido tratamento
prévio, pois passou por um processo valorativo aquando da edição.
Por outro lado, a emissão em tempo real induz o espetador a dar maior importância aos
acontecimentos, uma vez que a atualidade é um dos critérios mais valiosos dos meios de informação. A
atualidade máxima é a captação do acontecimento no instante da sua ocorrência. Contudo, podemos
antecipar que na maior parte das vezes é no direto que são cometidas as maiores distorções pela falta de
preparação por parte dos repórteres. Geralmente é um formato mais utilizados para transmitir factos com
forte carga emocional.
A Televisão – pelo uso da imagem – acaba por exercer maior influência e, como tal, deter maior
responsabilidade junto dos seus telespetadores. A televisão, pela riqueza dos seus canais discursivos, tem
tudo para ser o media mais habilitado: a disponibilizar uma visão global e contextualizada dos factos, a
procurar o contraste das fontes diversificadas; a fazer uma rigorosa depuração dos dados, a promover o
aprofundamento das consequências sociais, políticas e económicas; a debater-se por um equilíbrio na
cobertura territorial, social e cultural; a introduzir um enfoque pluralista e imparcial nas opiniões veiculadas,
enfim a integrar os princípios estruturantes do serviço público, que
não poderá estar adstrito exclusivamente à TV estatal, mas a todos
os meios conscientes que fazem, diariamente, uma construção
social da realidade.
Contudo, tal, tendo em conta os moldes de produção audiovisual
contemporânea, não nos parece tarefa fácil. Pelo contrário,
tememos que a estereotipização aliada a todos os componentes da
informação audiovisual moderna – dificuldades de financiamento,
desafios das novas tecnologias, fragmentação, dramatização,
institucionalização, centralização, parcialidade – focada na
concorrência pelas audiências, façam culminar numa comunicação
autocrática do “mundo”, baseada num etnocentrismo cultural cada
vez mais difícil de contornar.

Imagem disponível na Internet em: Cruz, Carla Isabel Simões dos Santos.
http://www.cfp.pt/prespubint/entrevista-do- A Desconstrução do Jornal. Uma análise metodológica para a desmontagem dos
vice-presidente-do-cfp-jurgen- von-hagen-ao- noticiários televisivos. Disponível na internet em:
http://www.aps.pt/vicongresso/pdfs/490.pdf (adaptado)
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O serviço público de televisão versus interesse económico

Nos últimos anos, o serviço público que inclui as áreas da saúde, educação e televisão, está em Portugal
e na generalidade dos países a ser objecto de uma profunda reflexão. Por um lado estão aqueles que
defendem uma forte diminuição do serviço
público. Estes argumentam que o serviço público
tem sido uma espécie de buffet, onde cada um
tem consumido à discrição e à custa do erário
público. Por outro lado estão os que defendem
um renovado compromisso com o serviço
público em que se combatam os abusos do
passado. Estes alegam que um serviço público de
qualidade é essencial para garantir a
universalidade de acesso aos bens públicos e
deste modo à igualdade de oportunidades na
sociedade, que é trave mestra da democracia.
A este propósito a BBC (televisão pública do
Imagem disponível na Internet em:
Reino Unido) publicou em 2013 um estudo sobre
https://www.youtube.com/watch?v=hJEDce-7dCQ
a relação entre o serviço público e o serviço
privado de televisão: “Public and private broadcasters across the world – The race to the top”. Este estudo
analisa se a existência do serviço público de televisão é positivo para os concorrentes privados e para o
público. Duas questões são colocadas: quais os efeitos do serviço público de televisão no investimento em
programas e na qualidade do serviço privado de televisão; quais os efeitos do serviço público de televisão na
diversidade de opiniões na comunicação social, a chamada pluralidade dos media.
Nos últimos tempos tem ganhado preponderância a ideia de que os serviços públicos diminuem as
oportunidades de negócio para os serviços privados, o chamado crowd-out. O relatório da BBC contradiz esta
posição no que diz respeito ao setor da televisão. O estudo demonstra que os países com um maior
financiamento estatal do serviço público de televisão (países Nórdicos, Austrália e Reino Unido) têm um
setor televisivo privado com maior qualidade, mais diversificado em termos de conteúdos, mais plural e com
maiores receitas. O contrário acontece nos países com um serviço público de televisão mais fraco em termos
de financiamento estatal, como é o caso de Portugal e de Itália.
Como explicar estes resultados? A visão do crowd-out tem duas limitações. Em primeiro lugar tem uma
visão estática da economia. Em segundo lugar não reconhece a existência de falhas de mercado, ou seja,
situações em que não é lucrativo para um ator privado fornecer um bem ou serviço.
Uma visão estática do mercado significa
entre outras coisas que este não cresce. Neste
contexto, a presença de um ator público tira
sempre o lugar a atores privados. Ora se os
atores privados forem mais eficientes que os
atores públicos, então estes últimos reduzem a
produtividade da economia. No mundo real, no
entanto, os mercados são dinâmicos. Por
exemplo, o investimento realizado pelas
empresas pode não só aumentar o tamanho
dos mercados como criar novos mercados.
Imagem disponível na Internet em:
https://viagemdasletras.wordpress.com/2015/01/13/literatura-agora-rtp2/ Dirão agora que as empresas privadas
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também fazem investimentos, e como tal não há necessidade de empresas públicas. O problema é que
empresas privadas nem sempre o fazem, principalmente no que diz respeito aos serviços públicos, porque
o fornecimento destes nem sempre é lucrativo para elas. De facto, como se sabe, o objetivo das empresas
privadas é maximizar os lucros, não o bem-estar
social. No caso dos media, é por exemplo razoável
assumir que as empresas privadas não estarão
especialmente interessadas em programas
culturais, educacionais ou direcionados às minorias
e a grupos sociais mais desfavorecidos, porque
estes têm menores audiências. De facto muitos
analistas dos media consideram que em Portugal a
introdução dos canais privados não conduziu a um
aumento da qualidade nem da pluralidade na
televisão portuguesa. Imagem disponível na Internet em:
http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/sic_e_tvi_consid
Uma solução para este tipo de falhas de mercado
seria a regulação, como por exemplo quotas para música nacional que existe na Rádio em países como
Portugal e França. No entanto, a regulação pode também envolver os seus problemas. Primeiro, a regulação
nem sempre é possível implementar, como quando por exemplo esta tem a oposição de grupos de interesse
poderosos. Segundo, o Estado por vezes não tem a capacidade ou o poder suficiente para fazer uma
regulação competente (ver o caso do sector financeiro). Terceiro, nalguns setores a regulação pode ir contra
princípios basilares da sociedade, como a liberdade de expressão nos media. Veja-se o escândalo das escutas
do News of the World no Reino Unido em que, apesar dos graves factos imputados a este jornal, os media
ingleses mesmo assim recusaram qualquer tipo de regulação por parte do Estado, em nome da
independência dos media face ao governo.
Existe no entanto uma alternativa à regulação: a presença no mercado de uma empresa pública que tem
como função maximizar o bem-estar social, ou seja os lucros das empresas em conjunto com a qualidade
deste serviço. Esta solução é chamada na teoria económica por “regulação por participação”. Neste caso, a
função do serviço público de televisão teria que ser no sentido de aumentar as expectativas das audiências
de forma a pressionar os atores privados a investir igualmente na diversidade de conteúdos e na qualidade
dos programas. Ou seja uma race to the top.
No entanto, para que a race to the top aconteça é preciso que o serviço público de televisão seja
independente do poder político. Estudos demonstram que em países onde os media são independentes do
poder político (mais uma vez os países Nórdicos, Austrália e Reino Unido), o serviço público de televisão
contribui positivamente para a pluralidade dos
media. O contrário acontece nos países onde os
media são controlados pelo Estado, tal como
acontece na Rússia e na Itália.
Assim, para que a “regulação por
participação” por parte do serviço público
funcione é necessário que este tenha como
objectivo maximizar o bem-estar social e que
este seja independente do poder político. Por
outro lado, um serviço público de qualidade não
pode sobreviver sem audiências que exijam
Imagem disponível na Internet em:
https://www.publico.pt/politica/noticia/sic-e-tvi-rejeitam-contrato-de- qualidade e diversidade. De facto, sendo os
concessao-para-a-rtp-que-distorce-o-mercado-1611808
media um negócio, são as audiências que ditam a
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escolha da programação. É nestes três aspectos que o sector público, a sociedade civil e a democracia em
Portugal são mais débeis, e como tal onde mais tem que evoluir. Sem eles dificilmente poderemos ter um
sector dos media com qualidade e plural.

Pires, Armando José Garcia. Publicado no Jornal Jornal Público em 6 de novembro de 2014

A comunicação rádio: tempo real versus tempo diferido.

O século XIX assistiu ao alvorecer de uma nova conceção de escrita. A fotografia, o cinema e o fonógrafo,
propunham uma nova forma de registo das
manifestações da natureza e das culturas humanas,
capazes de captar de maneira simultânea e
automática uma grande variedade de nuances e tons
(de luz ou de som). No plano da linguagem, estas
formas de registo mecânico (depois aperfeiçoadas
pela eletrónica) permitiram conservar e reproduzir
em qualquer tempo e lugar os componentes
analógicos que anteriormente eram prisioneiros da
realidade subjacente.
Mas o discurso da rádio não se limitava a uma
nova escrita feita pela composição de sons. O
discurso do rádio é isso e algo mais, e este algo mais é
dado pela sua enunciação em tempo real. A
radiodifusão distingue-se da imprensa pela sua Imagem disponível na Internet em:

condição ao vivo, e é percebida como tal, o que http://radiocritica.blogspot.pt/2015/02/dia-mundial-da-


provoca um forte efeito de realidade e, através dele, a
empatia do público. Porém, a simultaneidade a que esta condição idealmente se refere, no caso do rádio
jornalismo, ocupa apenas uma parcela do tempo do fluxo. Esta parcela é geralmente menor do que aparenta,
uma vez que a condição fonográfica de um enunciado raramente é explicitada, enquanto os momentos de
transmissão direta têm sempre esta condição enfatizada e, não raramente, simulada. (…)
O vivo que caracteriza a rádio torna-se mais intenso conforme a forma de produção do enunciado. Um
texto escrito, memorizado ou planeado antecipadamente para ser interpretado na rádio, embora não
caracterize ainda a dupla simultaneidade da transmissão direta, agrega à primeira simultaneidade do
discurso mais um elemento ao vivo - a interpretação do locutor. Por isso, o discurso produzido pela
apresentação de um texto ao microfone, embora mantenha as características de um conteúdo produzido
antecipadamente, pode ser considerado um vivo em segundo grau.
Em termos da composição do discurso da rádio informativo, os avanços tecnológicos tornaram possível a
enunciação diferida em toda a sua potencialidade. O diferido libertou a expressão sonora da tirania do
presente extratextual, permitindo ao discurso do radiojornalismo reassumir totalmente o domínio sobre a
definição dos limites da atualidade.
Quando um enunciado diferido é incluído no fluxo radiofónico (uma declaração, uma reportagem, uma
música), sofre uma mudança qualitativa. Cumpre uma função comunicativa diversa pela mudança do
contexto. De enunciado autónomo, passa a fazer parte de um enunciado maior (um programa, uma
programação) que tem outro autor, outra intenção, outra leitura, outra relação com a realidade.

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A transmissão ao vivo possibilitada pela tecnologia eletrónica incluiu o momento presente no campo da
noticiabilidade. O rádio foi o primeiro meio de comunicação de massa a operar em tempo real, e esta
característica estritamente electrónica de
combinar a transmissão direta com a diferida
é que distingue a sua linguagem em relação à
da gravação. (…)
A rádio pode criar imagens, conduzir a
imaginação do ouvinte. A diferença é que
essas imagens interiores, produzidas na
mente, não podem ser confundidas com as
imagens que se vêem num ecrã. São imagens
muito mais ricas - podem comportar três
dimensões, e também incluir sensações Imagem disponível na Internet em: http://www.rtp.pt/antena1/

táteis, olfativas, auditivas - e também muito


mais económicas: muitas vezes são dispensadas sem que isso prejudique a comunicação. Ao ouvir-se um
noticiário, por exemplo, ninguém fica imaginando o rosto do locutor ou o estúdio de onde fala, porque isso
não é importante para a mensagem.
Para distinguir a linguagem da rádio tanto do disco como do cinema (estas concebidas na era mecânica,
embora aperfeiçoadas depois pela eletrónica), é preciso defini-la como uma composição sonora invisível de
palavra, música, ruído e silêncio, enunciada em tempo real. Esta definição comporta não apenas a rádio
tradicional, difundido por diversas faixas de ondas de radiofrequência (AM, FM, OC, etc.), mas também as
possibilidades que se abrem através sua difusão e transmissão por cabo, por satélite ou pela Internet. A
identidade da rádio na era eletrónica não radica mais na forma como é difundida, mas na especificidade do
seu discurso sonoro, invisível, enunciado por diversos meios, em tempo real.

Meditsch, Eduardo, 1997. Disponível na Internet em: http://bocc.ubi.pt/pag/meditsch-eduardo-discurso-


radiojornalismo.html

Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vive sem Horas


Vontades
Vive sem horas. Quanto mede
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
pesa, E quanto pensas mede.
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Num fluido incerto nexo, como o
Todo o mundo é composto de mudança,
rio Cujas ondas são ele,
Tomando sempre novas qualidades.
Assim teus dias vê, e se te vires
Continuamente vemos novidades, Passar, como a outrem, cala.
Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança, E Ricardo Reis, in "Odes"
Heterónimo de Fernando Pessoa
do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.

Luís Vaz de Camões


Para ouvir poema cantado por José Mário Branco carregue aqui.
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Aproveitar o Tempo (Passageira que viajaras tantas vezes
Aproveitar o tempo! no mesmo compartimento comigo
Mas o que é o tempo, que eu o aproveite? No comboio suburbano, Chegaste a
Aproveitar o tempo!
interessar-te por mim? Aproveitei o
Nenhum dia sem linha...
tempo olhando para ti? Qual foi o
O trabalho honesto e superior...
O trabalho à Virgílio, à Mílton... ritmo do nosso sossego no comboio
Mas é tão difícil ser honesto ou superior! andante?
É tão pouco provável ser Milton ou ser Virgílio! Qual foi o entendimento que não
chegámos a ter?
Aproveitar o tempo!
Qual foi a vida que houve nisto? Que foi
Tirar da alma os bocados precisos - nem mais nem menos -
isto a vida?)
Para com eles juntar os cubos ajustados
Que fazem gravuras certas na história
(E estão certas também do lado de baixo que se não Aproveitar o tempo!
vê)... Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China Ah, deixem-me não aproveitar nada! Nem
dos serões,
tempo, nem ser, nem memórias de tempo
E os pensamentos em dominó, igual contra
ou de ser!...
igual, E a vontade em carambola difícil.
Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos - Deixem-me ser uma folha de árvore, titilada
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida. por brisa,
A poeira de uma estrada involuntária
Verbalismo... e sozinha,
Sim, verbalismo...
Aproveitar o tempo! O vinco deixado na estrada pelas
Não ter um minuto que o exame de consciência rodas enquanto não vêm outras,
desconheça... O pião do garoto, que vai a parar,
Não ter um ato indefinido nem factício... E oscila, no mesmo movimento que o da
Não ter um movimento desconforme com propósitos... alma,
Boas maneiras da alma...
Elegância de persistir... E cai, como caem os deuses, no chão
do Destino.
Aproveitar o tempo!
Meu coração está cansado como mendigo verdadeiro. Álvaro de Campos, in "Poemas"
Meu cérebro está pronto como um fardo posto ao canto. Heterónimo de Fernando Pessoa
Meu canto (verbalismo!) está tal como está e é triste.
Aproveitar o tempo!
Desde que comecei a escrever passaram cinco
minutos. Aproveitei-os ou não?
Se não sei se os aproveitei, que saberei de outros minutos?!

E por Vezes E por vezes lembramos que por vezes

E por vezes as noites duram meses ao tomarmos o gosto aos oceanos


E por vezes os meses oceanos só o sarro das noites não dos meses lá
E por vezes os braços que apertamos no fundo dos copos encontramos
nunca mais são os mesmos E por vezes
E por vezes sorrimos ou choramos E
encontramos de nós em poucos meses por vezes por vezes ah por vezes num
o que a noite nos fez em muitos anos E segundo se evolam tantos anos
por vezes fingimos que lembramos
David Mourão-Ferreira

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Tempo Tempo de Poesia

Tempo — definição da angústia. Todo o tempo é de poesia


Pudesse ao menos eu agrilhoar-te
Ao coração pulsátil dum poema! Desde a névoa da manhã
Era o devir eterno em harmonia. à névoa do outo dia.
Mas foges das vogais, como a frescura Desde a quentura do ventre
Da tinta com que escrevo. à frigidez da agonia
Fica apenas a tua negra sombra:
— O passado, Todo o tempo é de poesia
Amargura maior, fotografada.
Entre bombas que deflagram.
Tempo... Corolas que se desdobram.
E não haver nada, Corpos que em sangue soçobram.
Ninguém, Vidas qua amar se consagram.
Uma alma penada
Que estrangule a ampulheta duma vez! Sob a cúpula sombria
das mãos que pedem vingança.
Que realize o crime e a perfeição Sob o arco da aliança
De cortar aquele fio movediço da celeste alegoria.
De areia
Que nenhum tecelão Todo o tempo é de poesia.
Écapaz de tecer na sua teia!
Desde a arrumação ao caos
Miguel Torga à confusão da harmonia.

António Gedeão

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