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Para os meus pais,
Mabel, que me ensinou o poder e a alegria da palavra
escrita,
E
Herman, um guerreiro até o fim.
E para
Fred, Cynthia e Ural.
“Quando elefantes brigam, a única coisa que sofre é a
grama.”
— Provérbio africano
Chillicothe, Georgia,
agosto de 1979
Nós três ― eu, meu irmão, Sam, e Vera, ou srta. Vee, como
todos em Chillicothe a chamavam ― parecíamos um
pequeno trio de vagabundos enquanto aguardávamos na
Estação de Ônibus Greyhound, o que, em Chillicothe,
significava um ponto de ônibus no estacionamento do Piggly
Wiggly. Graças a Deus, tínhamos sobrevivido aos dias
quentes e às noites úmidas de verão, às picadas das
formigas lavadeiras, aos vergões dos mosquitos, e aos
sussurros que flutuavam pela cidade. O que aconteceu? O
que esses jovens fizeram? Por que Ellie Littlejohn está
saindo da cidade? Por mais que eu estivesse indo para a
Virgínia com uma bolsa integral para estudar no internato,
isso não impediu algumas pessoas na cidade de falar pelos
cantos e fazer perguntas inconvenientes.
O sol da manhã fervia o estacionamento de asfalto
preto com alguns carros amassados e uma velha picape
Ford. Mas éramos os únicos à espera do ônibus das sete e
quinze, que ia em direção ao norte. Eu usava uma camiseta
tie-dye e uma calça jeans que Vera tinha cortado na altura
dos joelhos quando ficou muito curta. Ela ainda não tinha
feito isso com a calça jeans que Sam estava usando, porque
batia uns cinco centímetros acima de seus tornozelos. A
camiseta amarela dele ainda tinha a mancha do picolé de
cereja que chupara no dia anterior. E, pelo jeito, parecia que
ele também não tinha penteado o cabelo.
Eu segurava com força a velha mala de papelão marrom
que Vera havia pegado emprestada de sua amiga, a srta.
Toney. Eu não tinha muita coisa, mas tudo o que era meu
estava cuidadosamente organizado lá dentro, incluindo um
grosso casaco de inverno, dois pares de sapatos novos e
alguns produtos de higiene — cortesia da Vera, que tinha
feito uma vaquinha com os amigos dela e a congregação da
Igreja Batista do Evangelho.
Na outra mão, eu carregava um saco de papel com três
pedaços de frango frito, dois pãezinhos e uma fatia grande
de torta de batata doce. Não tinha dinheiro sobrando para
comer no McDonalds ou no Burguer King durante a viagem.
A prima de Vera, Birdie, nos levou até a estação e ficou
esperando apoiada em seu Impala 68 preto e dourado a
alguns metros de distância, enquanto nos despedíamos. Eu
exalava nervosismo só de pensar em viajar para tão longe
do único lugar que conheci na vida. Estava deixando Sam e
Vera, as únicas pessoas que eu amava.
Mas eu tinha que ir.
Eu era alta para a minha idade, então Vera teve que se
esticar nas pontas dos pés para ajeitar o grosso rabo de
cavalo no topo da minha cabeça.
― Agora me escute, Ellie: foque na escola. Lembre-se,
você tem que se esforçar duas vezes mais do que as
crianças brancas, embora seja tão inteligente quanto elas.
Mire alto. Não tome nada como garantido. ― Ela deu
tapinhas no meu rabo de cavalo, só para reforçar o que
disse. ― Me escreva tanto quanto quiser. Eu coloquei alguns
selos na sua mala. Tudo vai ficar bem.
Vera, uma mulher gorda de pele clara com covinhas
profundas que emolduravam um enorme sorriso de dentes
separados, sempre falava com muita autoridade. Como se
tudo o que dizia fosse certo ou verdadeiro. Ela me deu
aquele sorriso.
― Sim, senhora.
Sam abraçou Vera de lado, arrastando a ponta
emborrachada de seu tênis no asfalto. Embora ele fizesse o
que chamava de “coisas maneiras”, como fumar cigarros e
roubar doces do supermercado, naquele momento parecia
exatamente o que era: um garoto de dez anos, pequeno e
assustado. Coloquei minha mala no chão, com meu saco de
papel sobre ela. Agarrei a mão dele e o puxei para mim,
para falar sem que Vera ouvisse.
― Nada de fumar escondido enquanto eu estiver fora,
ouviu? ― falei.
― Não toquei em cigarro nenhum desde que a srta. Vee
me pegou. Não vou passar por aquilo de novo. ― Sam
revirou os olhos.
Eu ri.
― E nada de roubar o supermercado, está bem? Era fofo
quando você era pequeno, mas agora está grande demais
para isso. Pode se meter em uma confusão daquelas,
principalmente se a srta. Vee descobrir.
Ele franziu a testa e desviou o olhar.
― Só não entendo por que você precisa ir embora. Por
que você não pode ir na escola daqui? ― Sam perguntou.
Tirei um fiapo do cabelinho crespo de Sam.
― Te falei. É um tipo diferente de escola. A gente estuda
e mora lá. E não se preocupe. Você ficará seguro agora. Não
tem mais ninguém por aqui para te machucar.
Me abaixei e o abracei com tanta força que, se ele fosse
menor, eu poderia tê-lo partido ao meio. Alguns segundos
depois, Sam se livrou do meu aperto e correu até o carro de
Birdie. Eu sabia que ele estava chorando e não queria que
eu visse.
O ônibus da Greyhound parou diante de nós com um
sibilo longo e alto.
― Aqui ― disse Vera. ― Agora você tem dinheiro
suficiente na bolsa para um táxi quando chegar na Virgínia.
Sei que a escola tem telefones, então não finja que não
tem. Me ligue assim que chegar lá. Ligação a cobrar, está
me ouvindo?
Sorri.
― Sim, senhora.
Vera inclinou seu corpo largo para me abraçar e foi aí
que começou a choradeira entre nós. Vera não era muito de
chorar, mas qualquer um no estacionamento pensaria o
contrário. Quando ela, enfim, me soltou, tirou alguns lenços
de papel do bolso da saia. Usou um para secar o meu rosto
e o entregou para mim.
Eu a encarei.
― Estou com medo.
Ela colocou um braço ao redor da minha cintura.
― Sei que está, querida. Mas tudo vai dar certo. Sua
mãe estava certa sobre uma coisa. Você pode não ter mais
que catorze anos, mas é grande demais para este lugar.
Esta cidade não está pronta para segurar alguém tão
inteligente e forte quanto você. Agora, entre naquele ônibus
e só volte quando Deus quiser. Vá.
O motorista desceu as escadas do ônibus e sorriu para
nós. Ele pegou minha mala e a colocou no bagageiro.
Vera me abraçou de novo.
― Agora, vai lá.
Subi as escadas do ônibus e entrei direto no cheiro
sufocante de produto de limpeza e suor humano.
Já sou uma garota crescida. Vou dar conta.
Passei por uma mulher grávida com duas crianças
pequenas aconchegadas sob seus braços, e por um senhor
e uma senhora sentados lado a lado conversando antes de
me sentar à janela perto do meio do ônibus. Avistei minha
pequena família no estacionamento. Sammy, Vera e Birdie
estavam perto do carro, acenando para mim. Eu os
observei, Vera sorrindo e a srta. Birdie soprando beijos
enquanto o ônibus saía do estacionamento e entrava na
rua. E então chorei por uma hora inteira, sem parar até
cruzar a fronteira estadual entre a Georgia e a Carolina do
Sul.
PARTE 1
OS ELEFANTES
1
Comunicação Interna
Odeio funerais.
Três dias após a morte de Michael, eu tremia enquanto
subia os degraus da frente da Primeira Igreja Presbiteriana
de Buckhead, um prédio pequeno que rapidamente se
enchia. Carros da imprensa estavam estacionados ao longo
da rua, quase tantos quanto no dia da morte dele.
Repórteres grisalhos e novatos estavam parados diante de
câmeras de vídeo enormes, falando em microfones e
apontando para os enlutados. Por que aquele interesse
repentino da mídia outra vez?
Todos entravam na igreja, cabeças baixas, lábios
comprimidos e solenes. A maioria das pessoas se dirigiu
para a primeira fila para oferecer abraços e condolências a
Anna, a esposa de Michael. Eu não conseguia encará-la. Me
esgueirei em silêncio ao longo da parede lateral antes de
me sentar várias fileiras atrás da família dele. Avistei Hardy
do outro lado, junto com os advogados e a equipe do
Departamento Jurídico espalhados entre os enlutados.
Apesar da multidão, apenas um suspiro ou tosse ocasional
quebrava o melancólico silêncio.
Se os curiosos acharam que encontrariam algo,
procurando por evidências cruéis da morte de Michael, Anna
tinha outros planos. Não haveria caixão aberto com o corpo
dele cheio de formol e coberto de maquiagem. Graças a
Deus. Na frente da igreja, uma foto grande de Michael
estava apoiada em um cavalete. Ele tinha um bronzeado, os
cabelos ao vento, sorrindo enquanto conduzia um veleiro.
Uma foto calma e despreocupada que destoava no
desconfortável silêncio da igreja.
E a solenidade respeitosa da missa presbiteriana
também foi percebida. Todos os funerais dos quais participei
antes daquele foram no estilo típico dos Batistas do Sul,
repleto de mulheres chorando e gritando “Por quê, Deus?!”,
um pastor de voz rouca e agressiva, cujo discurso durava
bem mais de uma hora, e caixões abertos que não eram
fechados até o verso final do coro de I’ll Fly Away.
Os dois filhos de Michael, com idade para estarem na
faculdade, sentaram-se ladeando a mãe, os três pintados
em uma tela estoica de luto familiar junto com os pais de
Michael, curvados e de aparência frágil, que pareciam estar
na casa dos oitenta anos. A morte de Michael devia ter
causado devastação suficiente para levar os pais dele à
beira de suas próprias mortes. Ele era o alicerce da família
e, com sua partida tão inesperada, estavam todos entrando
em território desconhecido sem uma bússola emocional
para guiá-los. Vera costumava chamar o momento que se
seguia a morte de um ente querido de “temporada
enfeitiçada” — aquela fase surreal em que todos buscam
um novo normal, mas o vazio é tão profundo que nos deixa
em um limbo emocional.
Observei Anna na primeira fila, vestida com um terno de
lã preta, o rosto contraído e pálido, o olhar vazio de uma
mulher tomada pelo desespero. Por um momento, achei
difícil acreditar que ela era a mesma pessoa que
permanecia ao lado de Michael em jantares e ria das piadas
dele, não importando quantas vezes as tivesse ouvido
antes. Ela era meu exato oposto, o sonho de todo homem
americano branco, desde sua tez pálida e seu coque loiro
preso à nuca, até seu corpo magro mantido assim por
zelosamente evitar carboidratos e manter uma rotina
constante de pilates e balé.
Rudy e a esposa, Kelly, chegaram alguns minutos
depois. Kelly e eu nos abraçamos cordialmente antes de
eles se sentarem ao meu lado, com Rudy no meio. Era assim
que geralmente nos sentávamos em todos os eventos de
trabalho aos quais Kelly comparecia, para que ela não
corresse o risco de se tornar uma cerca humana sobre a
qual Rudy e eu conversávamos. Eles formavam um casal
atraente. Kelly era a boneca Barbie bonita para o Ken alto
que era Rudy. Mas ela também era uma garota sensata. Não
como as falsas com quem estudei na Coventry. Às vezes, eu
tinha vontade de poder sair mais com os dois, mas quis
evitar os boatos de que eu teria favoritos entre a equipe
jurídica. Já era ruim o bastante Rudy passar metade do dia
em meu escritório fofocando.
Ele me empurrou de leve com o ombro.
― Então, cadê seus novos colegas? ― sussurrou.
― Quê?
― Tem alguém aqui que seja do vigésimo andar?
Olhei ao redor. Nem sinal de Nate, Willow ou qualquer
outra pessoa que trabalhasse no andar executivo.
― Hmm… A detetive que foi ao meu escritório naquele
dia me perguntou se Michael tinha alguma desavença com
os colegas de trabalho.
― Deve ter sido um desentendimento e tanto para não
virem ao funeral de alguém que chamavam de “membro da
família Houghton”. Tô só dizendo.
Rudy estava certo. Analisei a igreja de novo. Nem
mesmo a antiga assistente de Michael tinha aparecido.
Um minuto depois, Rudy se inclinou para sussurrar no
meu ouvido.
― Ficou sabendo da última sobre Michael?
― O quê? ― perguntei me empoleirando, nervosa.
― Fiquei sabendo que ele estava tendo um caso.
Meu estômago se revirou em um nó apertado e meus
ouvidos ficaram abafados, como se de repente eu estivesse
debaixo d’água. Talvez fosse meu subconsciente tentando
não ouvir o que eu estava ouvindo.
― De quem você está falando? Quem te contou?
― Uma das administradoras do vigésimo. Ela disse que
ele tentou terminar e a mulher o matou, fazendo parecer
que foi suicídio.
― Que loucura! ― Uma mulher sentada à minha frente
virou a cabeça e me deu um olhar mortal. Voltei a sussurrar.
― Quer dizer, a polícia disse que foi suicídio. É de se pensar
que eles saibam mais do que uma administradora do
vigésimo. Ela disse quem era a mulher?
― Não.
― Bem, então é só uma especulação boba. Caramba,
você é pior do que uma velha fofoqueira ― falei,
balançando minha cabeça e gesticulando para que ele
fizesse silêncio.
― É, não tenho certeza se é verdade ou não. Michael
sempre me pareceu ser um bom moço, do tipo certinho.
Enfim, com o tanto que ele trabalhava, com quem é que
poderia estar tendo um caso?
― É mentira ― falei, balançando minha cabeça
vigorosamente. ― Pare de falar assim. Estamos no funeral
dele, pelo amor de Deus.
Remexi a alça da minha bolsa e olhei direto para a
frente.
Alguns minutos depois, Rudy tornou a me cutucar. Desta
vez, usou o queixo para gesticular para um estranho
sentado diante de nós.
― Quem é aquele?
Segui o queixo de Rudy. Um homem negro de aparência
séria, com a cabeça raspada, vestindo um terno caro cor de
carvão, olhou em minha direção. Algo em sua postura tinha
uma aura de formalidade, de profissionalismo.
Olhei para Rudy e dei de ombros.
― Também não conheço. Ele parece deslocado aqui ―
disse Rudy baixinho.
― O quê? Você acha que ele parece deslocado porque é
um homem negro no funeral de Michael?
― Só tô dizendo. Você e eu sabemos que tem poucos
homens negros que trabalham na Houghton. Nunca vi ele lá,
nem em nenhuma das festas do Michael.
― Você está tentando me dizer que conhece todo
mundo aqui, exceto aquele homem?
― Não é isso que estou dizendo.
― Michael tinha uma vida fora do trabalho. Talvez ele
seja um amigo.
Rudy balançou a cabeça devagar.
― Hmm… Não sei. Tem algo sobre ele que…
Kelly nos deu um olhar sério.
― Vocês dois parem de fofocar. O pastor está prestes a
começar a oração.
Rudy e eu trocamos um olhar culpado antes de abaixar
nossas cabeças.
Mas ele havia incitado a minha curiosidade. Tornei a
olhar para o homem. Eu podia vê-lo observando o ambiente
como se estivesse fazendo anotações mentais. Rudy estava
certo. Ele parecia deslocado aqui.
O pastor pigarreou no púlpito e a multidão fez silêncio
antes de se preparar para o sermão. Ele começou com
palavras elogiosas sobre a devoção de Michael à sua família
e sua ética de trabalho. Olhei para a foto dele e tentei
pensar em coisas que eu odiava em nós dois, coisas que me
impediriam de chorar. Coisas como o segredo e todas as
falsas promessas de me promover. Fui tão incrivelmente
burra em perder meu tempo com ele. Meu coração doeu
como se um cobertor molhado fosse jogado sobre uma
fogueira, pesado e sufocante. Não importava que eu
estivesse sentada atrás de sua esposa e filhos enlutados, ou
que me sentasse ombro a ombro com um de meus
subordinados diretos que espalhava rumores sobre Michael
ter um romance com uma mulher ainda não identificada.
Estávamos do lado de fora da igreja. Os filhos de Michael e
os pais dele ignoraram as câmeras da imprensa e
lentamente se amontoaram em uma limusine preta, onde
seriam levados para um funeral particular no cemitério. Os
olhos de Anna esbarraram nos meus antes que entrasse no
carro. Ela hesitou um pouco, e seu olhar penetrante me fez
congelar. Por um momento, ficamos encarando uma à outra.
Será que ela sabia? Lembro que Vera costumava dizer que
nem todo marido é fiel à esposa, mas toda esposa sabe a
verdade sobre o marido. “Você só sabe”, ela dizia.
Encarei a pequena família de Michael, agasalhada e
saindo na manhã fria de inverno em direção a uma
despedida particular. Fiquei parada na fumaça do
escapamento da limusine, assistindo ao carro preto
elegante enquanto se afastava da igreja. O vento soprou em
meu rosto. Nada de despedida particular para mim.
Ninguém para segurar minha mão e me dizer que tudo
ficaria bem com o tempo. Ninguém com quem compartilhar
a temporada enfeitiçada. Pisquei para conter as lágrimas.
Eu encontraria meu próprio caminho. Sempre encontrei.
Observei os repórteres começarem a desmontar e
guardar o equipamento de volta nas vans. Respirei fundo
antes de olhar para o outro lado da rua. Fiquei surpresa
quando avistei um rosto que não esperava ver. Desviei meu
olhar e rapidamente fui em direção a Rudy e Kelly, na frente
da igreja.
― Ei, Rudy, você pode estar certo sobre aquele homem
que estava na igreja, o que você disse que parecia
deslocado.
― É?
― Não olhe agora, mas sabe a pessoa com quem ele
está conversando? Mulher negra atraente, casaco cinza,
pernas longas. Ela é a detetive que foi falar comigo.
Rudy espiou o outro lado da rua.
― Ah, agora faz sentido.
― O que faz sentido?
― Eles estão aqui para ver quem mais veio. E quem não
apareceu. ― Rudy ergueu uma sobrancelha para mim. ― O
irmão da Kelly é policial. Às vezes eles fazem isso.
A detetive Bradfort me viu os olhando e cutucou o
homem de casaco cor de carvão antes de os dois se
aproximarem.
― Olá, srta. Littlejohn ― disse a detetive. Voz firme.
Calma. Perfeita como seu cabelo curto. Olhei para ela e me
perguntei se eu era tão confiante quanto ela quando tinha
trinta e poucos ou em qualquer outro momento da minha
vida. ― Deixe-me apresentar você ao meu parceiro, o
detetive Charles Burke.
Burke assentiu, as mãos enfiadas fundo nos bolsos, sem
intenção de passar pelo protocolo normal da apresentação.
Rudy me deu um olhar estilo eu não disse?.
― Parece que você estava certa ― disse a detetive. ―
Julgando por quem veio ao funeral, muitas pessoas
admiravam o sr. Sayles.
― Sim. ― Assenti.
― Já sabe quem vai substituí-lo?
Bradford me pegou desprevenida. Hesitei, como se
estivesse sendo exposta, como se algum grande segredo
estivesse sendo vazado. As perguntas dela eram sempre tão
diretas. Talvez fosse só o fato de ela ser policial. Mas, de
certo modo, no nosso primeiro encontro, me senti um pouco
fora de forma diante de sua presença.
Dei uma olhada rápida para Rudy e Kelly.
― Eu serei a nova conselheira geral.
Bradford ergueu a sobrancelha, sorrindo.
― Parabéns.
― Obrigada.
― Bem, espero que possa contar com você para me
ajudar na investigação. Talvez queira saber, o legista disse
que o sr. Sayles foi assassinado. Aparentemente, alguém o
matou e encenou sua morte para parecer suicídio.
Alguém o matou.
Meus joelhos ficaram fracos. As palavras da detetive se
repetiram de novo e de novo como minhocas entrando na
minha cabeça. O legista disse que o sr. Sayles foi
assassinado. E bem ali, em frente à Primeira Igreja
Presbiteriana de Buckhead, senti algo mudar. Como o
primeiro pequeno puxão em um fio solto que desenrola uma
tapeçaria. Uma curva preocupante no arco da minha vida. E
tudo o que eu queria fazer era ir embora, fugir
silenciosamente de tudo, como já tinha feito antes.
Chillicothe, Georgia,
agosto de 1979
3 de Janeiro
Para: Nathaniel C. Ashe, CEO & Presidente
Conselho de Diretores da Houghton
De: Michael Sayles, Vice-presidente
Executivo & Conselheiro Geral
28 de Dezembro
Para: Michael Sayles, Vice-presidente executivo
& Conselheiro geral
Houghton Transportes
De: Geoffrey J. Gallagher
28 de Dezembro
18:39
Para: MaxwellLumpkin@Houghton.com
De: MichaelSayles@Houghton.com
Re: Nossa conversa
28 de Dezembro
17:55
Para: MichaelSayles@Hougthon.com
De: MaxwellLumpkin@Houghton.com
Re: Nossa conversa
Michael,
Espero que você tenha reconsiderado. Nossa
organização poderia se beneficiar da ampla
experiência e do amplo alcance da sua rede de
contatos.
Acho que você pode ser um general bastante
útil em nossos esforços para restaurar a ordem onde
outros espalharam o caos.
A luta continua.
Max