Você está na página 1de 15

A ANATOMIA

DA EMPATIA

Robert Lewis, M. D.
I - Introdução
O tema sobre o qual discorrerei hoje será “A anatomia da empatia”. Usarei o pronome
masculino com o objetivo de simplificar. Peço desculpas por um erro na apostila, onde se
lê “pesquisa neurológica”, na verdade, deveria ler-se “pesquisa neurobiológica”.
Examinaremos nosso modelo tradicional de Bioenergética e os últimos progressos feitos
em relação à empatia. Embora tenha usado um título que sugere que a empatia
desenvolveu-se ao ponto em que eu possa desenhar-lhes um mapa dos músculos e sinapses
envolvidos, concluirei que, mesmo com avanços recentes interessantes, ser empático ainda
é, com certeza, uma arte clínica. Imagens do cérebro feitas por aparelhagem específica
confirmam que o cérebro direito é o mediador da empatia, mas ainda não nos ajuda a
intervir melhor clinicamente. Os dados da anatomia comportamental da expressão facial,
do comportamento do olhar, coordenação do ritmo vocal e postura corporal são mais
imediatamente relevantes ao nosso tema. Assim, a empatia é um assunto complexo. Com
base nos insights de Lyons-Ruth (1998), Stern (1985), Tronick (1989), Beebe e Lachmann
(2002) e muitos outros [Sander (1977), Weiss (1970), Fogel (1993)], farei distinção nessa
apostila entre conhecimento explícito e implícito, para compreender melhor a empatia.
Examinaremos os limites do nosso conhecimento explícito, e até que ponto o implícito
pode ser transformado em explícito. Discutirei também que uma visão não-linear dos
sistemas diádicos captura melhor a qualidade bidirecional instantânea da comunicação
empática. Finalmente, abordarei o paradoxo de que a própria ferida que nos leva a ser
terapeutas, sintoniza-nos aos nossos clientes e ao mesmo tempo interfere com estarmos
verdadeiramente com eles. Tentarei ilustrar as questões acima com casos clínicos.

II - Definições
a) Empatia – A palavra empatia é derivada do grego “empatheia”, que significa afeto ou
paixão. A quarta edição do novo World College Dictionary da Webster define empatia
como: “A projeção de sua própria personalidade na personalidade de outra pessoa, a fim de
entendê-la melhor; habilidade de compartilhar as emoções, pensamentos ou sentimentos
com outrem”. Alguns terapeutas, como por exemplo, Tansey e Burke (1989), abraçam uma
definição mais ampla; dizem que somos empáticos quando respondemos à necessidade do
paciente, quando lhe oferecemos o que ele precisa para melhorar, mesmo que isto
signifique reprová-lo (para que desta maneira ele possa re -experienciar e
dominar seus traumas internos). Respondemos empaticamente quando
recebemos as identificações projetivas do cliente, projeções estas que moldam
nossa experiência enquanto aprofundam nossa compreensão do cliente. Para
outros, por exemplo, Stark (1999), esta definição mais inclusiva ofusca uma
distinção crucial entre, de um lado o terapeuta que faz uso da empatia e que
responde a algo dentro da consciência, algo relacionado de perto à experiência
e, de outro lado, o terapeuta que se confronta com o cliente na relação, o qual
responde a algo fora da consciência do cliente.
Mas não quero desencorajá-los tão cedo, em minha palestra, talvez mais tarde. A
maioria de vocês talvez concorde que, embora a empatia não seja fácil de ser definida,
vocês a reconhecem quando a experienciam, percebem-na quando ela está presente... Faz
sentido para vocês? Pergunto, porque um colega contou-me sobre um estudo recente, o
qual sugeria que a percepção da empatia era tão eficaz quanto ela mesma! Isto talvez os
faça lembrar de um ou outro colega - com quem alguns de vocês estejam familiarizados,
cujo preço era alto porque seus clientes sentiam honestidade e sinceridade em seus
límpidos olhos azuis. Seu preço subiu mais alto ainda à medida que seus cabelos se
tornavam grisalhos e seus clientes enxergavam a sabedoria em suas madeixas acinzentadas.
Até que por fim não havia mais o que pagasse suas sessões quando ele começou a sofrer de
hemorróidas e, ao sentar-se com seus clientes, estes percebiam-no sentindo realmente sua
dor.
Uma última definição de Peter Kramer (1989) e que me parece correta sobre a fama do
Prozac, diz: “Tornei-me aquela parte que era mais próxima a ele (seu cliente)” (pg 138). Se
pensarmos sobre o que Kramer descreve, faz sentido o fato de que ser empático é um
processo um tanto diferente para cada um de nós. Provavelmente há uma neurobiologia
comum em nosso córtex orbitofrontal direito que nos permite a todos amplificar a corda
ressonante que existe dentro de nós, quando é atingida pela experiência do nosso cliente.
Mas somos tão complexos e singulares que, por exemplo, de dez terapeutas diferentes, a
ressonância mais próxima de um dado cliente em particular, seria sentida por alguns
terapeutas em suas vísceras, por outros em seus corações, etc. Alguns estariam
razoavelmente confortáveis com o referido sentimento, outros lutariam para tolerá-lo, e
assim por diante.

b) Implícito/explícito – Acredito que ajudaria a compreensão do fenômeno da empatia, se


fizéssemos a distinção entre os modos implícito e explícito de conhecimento. Eles
dependem de caminhos neuroanatômicos diferentes e são definidos da seguinte maneira
(Beebe e Lanchmann, 2002): a memória implícita refere-se tanto à memória emocional
quanto à de conduta, as quais estão do lado de fora da consciência. Os primeiros dois anos
da nossa vida são vividos em nível principalmente implícito, o que explica porque
geralmente temos uma lembrança explícita limitada deles. A memória de conduta inclui
seqüências de ações em código não-simbólico que guiam o comportamento (isto é, como
andar de bicicleta). A memória explícita, tenho certeza de que se lembrarão, é a lembrança
intencional de informações e eventos organizados simbolicamente.

c) Visão de Sistemas de Terapia Diádica, Não-Linear – Minha palestra hoje se baseia nesta
visão de terapia e neste processo de empatia. Nele, cada membro da díade é visto como
regulador simultâneo de si mesmo e da interação. Como Jaffe e outros (2001) colocam:
“No nível não-verbal das seqüências de ação, a todo instante, qualquer ação em um
relacionamento diádico é definida em conjunto pelo comportamento dos dois parceiros.”
Finalmente, Fogel (1993) diz que em um modelo de sistemas, “todo comportamento é
desenvolvido simultaneamente no indivíduo, enquanto que, ao mesmo tempo, cada um
modifica e é modificado pelo comportamento mutável do parceiro”. Um exemplo disto
seria uma criança pequena que fica muito estimulada pela aproximação do rosto da mãe e
que, então, desvia o olhar e/ou toca em si mesma para auto-regular seu nível de
estimulação. A criança simultaneamente acalmou-se, e enviou uma mensagem a sua
parceira. As pesquisas mostraram que os pais estão totalmente sintonizados ou empáticos
somente de vinte a trinta por cento do tempo. Porém, crianças que têm um vínculo seguro,
têm pais que, sendo eles mesmos seguros e sintonizados, dentro de dois segundos no
máximo, conseguem conceder espaço e liberdade para que a criança regule ao mesmo
tempo a ambos (criança e pais) e a interação. A interação foi “reparada” (Tronick, ’89). As
pesquisas mostraram que este mesmo sistema regulador diádico não-verbal instantâneo
implícito opera durante todo o ciclo de vida.
III - Lembrem-se de que temos as ferramentas da Bioenergética, mas nunca
se esqueçam de que somos, nós mesmos, os instrumentos.
A Análise Bioenergética sempre diz que temos as ferramentas para enxergar a história
de uma pessoa gravada na forma e no movimento do seu corpo. Esta foi uma das mais
originais e profundas contribuições de Wilhelm Reich (1933, 1945). Pode-se levar anos
discutindo quanto da história de uma pessoa pode ser vista em seu corpo, e quanto a
ordem de sucessão de aminoácidos em seus cromossomos também faz parte de sua
história. Entretanto, limitaremos nossa discussão à relevância do insight de Reich para o
terapeuta empático. Mas antes, deixem-me contar-lhes algumas histórias.
Os três professores de Bioenergética com quem primeiramente fiz um vínculo e que,
conseqüentemente, tiveram um impacto profundo em mim foram Alexander Lowen, John
Pierrakos e Bill Walling. Eles eram os gigantes em cujos ombros me apóio hoje. Eles foram
os três fundadores originais do Instituto de Bioenergética. Tendo sido aluno e cliente de
todos estes três homens, e sendo eu mesmo homem, há, no que trago para vocês hoje, uma
falta maciça de perspectiva feminina. Graças a Deus, Helen ficará com a última palavra
amanhã!
Como Bill Walling foi meu primeiro e principal terapeuta, tendo morrido enquanto
ainda estávamos trabalhando juntos, eu provavelmente não tenha uma visão clara sobre ele,
mesmo depois de todos estes anos. Assim, deixem-me compartilhar com vocês um pouco
da minha experiência com Alexander e John. Como muitos de nós dessa época, sentia que
eles se complementavam de um modo profundamente bonito. Lowen era o homem
brilhante e explícito que podia ver muito clara e profundamente a pessoa que estava a sua
frente. Ele nunca disse – nem nunca senti, que ele enfocasse muito seus próprios
sentimentos mais pessoais para apreender a essência de seu cliente. Antes, como uma vez
me contou em uma sessão em que eu era cliente, ouvia o que eu dizia, mas, na realidade,
estava atento ao momento em que, sem me dar conta, meu self não-verbal e mais profundo
se revelasse a ele em um gesto fugaz dos meus olhos, meu tronco, e assim por diante.
Por outro lado, John era o homem profundamente intuitivo que, literalmente, fechava
os olhos quando queria saber o que se passava dentro de você. A seu lado, tinha a
impressão de que ele me procurava em algum lugar no fundo de si mesmo. Todos vocês
sabem que o nome de Alexander Lowen é sinônimo de Bioenergética, mas os mais jovens
dentre vocês talvez não saibam que tanto John quanto Alexander Lowen tiveram um
enorme impacto na Bioenergética, nos seus mais de vinte anos de apaixonado trabalho
conjunto. Minha história reforça-nos duas questões hoje:
A Bioenergética realmente nos fornece ferramentas para ver e sentir a verdade
psicossomática de uma pessoa, e Alexander Lowen e John eram médicos de formação.
Mas, afinal, nós mesmos somos os instrumentos exclusivos que se sintonizam ao
psicossomático de outra pessoa.
Minha segunda questão é que, Lowen e John (pelo menos em minha própria
experiência sobre eles), na maneira em que preferiam me compreender, tendiam a não
responder a aspectos meus aos quais eu estivesse consciente, e, nesse sentido, não estavam
sendo empáticos.

IV - Quais os limites do quanto podemos ver conscientemente


(explicitamente) da história de uma pessoa, em oposição a
(implicitamente) sentir sua profundidade e suas nuances.
Deixe-me começar com um caso clínico sobre aprender a confiar em sua própria
intuição – que é uma condição necessária, mas talvez não suficiente, para ser empático.
Quando o Instituto de Bioenergética era jovem, há muitos anos, houve um grande
workshop em Nova Iorque, em que Bill, John e Alexander trabalharam cada qual em um
canto diferente da enorme sala; não consigo lembrar quem trabalhou no canto quatro. Os
participantes movimentavam-se em redor da sala e eram trabalhados cada vez por uma das
minhas idealizadas figuras de vínculo. Era assustador, e ao mesmo tempo trazia um
profundo alívio, descobrir que, cada um deles – Bill, John e Lowen, enfocava e trabalhava
questões completamente diferentes na mesma pessoa. A mensagem deixada: ou não havia
uma história que pudesse ser lida na forma e no movimento do corpo de cada participante,
ou esta história era tão complexa, que cada um dos meus três mentores tinha confiança em
si mesmo para trabalhar aquela parte da história que falava a eles no momento.
Com relação à soma de conhecimentos que qualquer pessoa pode ter sobre a história
de outra, espero que vocês não temam que eu tenha perdido o juízo se perguntar por que
Mona Lisa está sorrindo. Naturalmente, esta é uma pergunta que se tem ponderado a
respeito por quase quinhentos anos, portanto, não se culpem se não souberem a resposta.
Embora não seja perito no campo das belas artes e, portanto, não seja de modo algum
qualificado para dizer o que faz da Mona Lisa a obra-prima que é, acho que Leonardo da Vinci tem algo a
nos ensinar sobre a empatia, sobre como podemos compreender a fundo a experiência do outro. Diz-se que
Leonardo era ao mesmo tempo um completo mestre dos detalhes da natureza, e um homem fascinado
pelos enigmas da vida. Na Mona Lisa, de acordo com E. H. Gombrich em “A História da Arte”
(www.artchive.com/artchive/L/leonardo/monalisa_text.jpg.html ), Leonardo empregou
uma técnica que ele mesmo inventou, chamada “sfumato”. Nesta técnica, o contorno
borrado e as cores suaves permitiam que uma forma se fundisse a outra, sempre deixando
algo à imaginação. O crítico de arte Gombrich descreve como Leonardo deliberadamente
deixou indistintos dois traços decisivos da expressão facial da Mona Lisa: os cantos dos
olhos e os cantos da boca. Gombrich (e muitos outros especialistas) diz que este é pelo
menos parte do motivo pelo qual Lisa parece tão surpreendentemente viva: “Ela realmente
parece olhar para nós e ter pensamento próprio. Como um ser vivo, ela dá a impressão de
modificar-se diante de nossos olhos e, todas as vezes que a vemos novamente, parece um
pouco diferente.” (pg 1). Então, Leonardo criou uma obra de arte em que desafia e ilumina
a arte e a ciência clínica da empatia. Estando indistintas estas duas áreas da anatomia facial,
nunca estamos bem certos sobre o estado de espírito em que ela realmente está olhando
para nós. Sua expressão sempre parece apenas enganar-nos. E, naturalmente, cada vez que
nos colocamos à sua frente, apreendemos uma expressão que é matizada segundo a
condição e estado de espírito em que nos encontramos no momento.
É óbvio que, como terapeutas bioenergéticos, trabalhamos com a expressão do corpo
inteiro, não só com a do rosto. Entretanto, quando consideramos a mais recente pesquisa
em varredura do cérebro na comunicação empática implícita, constatamos que envolve
direcionamento da cabeça, contemplação visual e comportamentos vocais, e expressão dos
músculos faciais. Ekman e Friesen (1980), por exemplo, criaram um sistema para codificar
todas as expressões emocionais possíveis produzidas pelos músculos faciais. Eles afirmam
que, uma vez que este sistema tenha sido explicitamente aprendido, será possível ler o que
se passa no coração e na mente através das nuances fugazes da expressão facial, uma
habilidade que vem de forma natural, só eventualmente, em uma pessoa que tenha um
talento intuitivo especial. Assim, de algum modo, as quinhentas pessoas no mundo,
especializadas no sistema de codificação da ação facial, são como especialistas
bioenergéticos do rosto. Este sistema existe há vinte anos, e é amplamente citado na
literatura. Mas, por que ter mais terapeutas não associados a um sistema que afirma nos
capacitar a ler mentes? Alguns terapeutas são apenas muito preguiçosos para aprender
outro sistema, mas outros provavelmente concordam com a opinião de Irwin Yalom
(1989), em um ensaio intitulado “Dois Sorrisos”. Yalom fala do dilema de ser um terapeuta
empático. Enquanto desejamos conhecer profundamente o outro, seja ele nosso filho,
nosso companheiro ou nosso cliente, ele continua essencialmente incógnito. A cliente de
Yalom sorri duas vezes; cada vez o sorriso expressa uma realidade interna tão complexa e
cheia de nuances, que de maneira nenhuma alguém poderia alcançar seu significado sem
saber muitos detalhes entrecruzados de sua vida atual e passada. Mesmo Ekman e Friesen
não teriam sabido de quê a cliente de Yalom sorria. Yalom faz questão de enfatizar que
depreciamos o cliente se presumirmos que podemos conhecê-lo totalmente. Concordo
com ele. De fato, se a neurociência algum dia avançar até o ponto em que se possa tirar
fotos dos recessos secretos da mente, talvez tenhamos que jogar as fotos fora.
Assim também os participantes do workshop no qual Alexander Lowen, John
Pierrakos e Bill Walling viram, cada qual individualmente, algo diferente. Talvez até mais do
que a Mona Lisa, pois, sendo ao vivo, estes participantes mudavam de momento a
momento, e quando encontravam ou não o olhar único de Bill, John ou Alexander Lowen,
instantaneamente, uma conversa límbica não-verbal sugeria o material para a próxima
“sessão”.
Finalmente de volta à Mona Lisa. Agora a maioria de vocês provavelmente tenha
imaginado porque ela está sorrindo. Está sorrindo porque: a) ela acha divertido que as
pessoas tentem imaginar por que está sorrindo; b) ela está agradecida porque Leonardo,
com sua genialidade e seu “sfumato”, deu-lhe tamanha riqueza e complexidade. Lisa não é
diferente das pessoas reais que chegam aos nossos consultórios terapêuticos. Quanto mais
percebemos que nossa compreensão consciente, explícita sobre elas é apenas a ponta do
iceberg (ou melhor ainda, um diagrama dialético com os sistemas explícito/implícito),
menos seus mistérios implícitos enganarão esta compreensão.

V - Qual é a qualidade ou capacidade do estar presente que nos permite


compreender a experiência do outro?
A resposta é que não sabemos exatamente, embora saibamos muito, e aquilo que
saibamos se aproxime de uma unidade psicossomática. Podemos demonstrar, por exemplo,
que a qualidade da sintonia entre mãe e filho transforma-se em equilíbrio ou desequilíbrio
nos sistemas simpático e parassimpático do sistema nervoso autônomo da criança. A
experiência de vínculo da criança, como propõe Allan Schore, foi conectada em seu sistema
límbico direito, como modelo para seus relacionamentos futuros. Podemos descrever o processo de empatia
em vários níveis de organização, sendo que eles todos são válidos. Há a empatia como “ressonância límbica”
pg 63 (Lewis, Amini e Lannon, 2000ª). Empatia como uma “conversa entre sistemas límbicos” pg 266
(Buck, 1994). Empatia como o sentimento das sensações físicas do cliente em seu próprio corpo (Havens,
1979). Empatia como o tornar-se aquela sua parte que está mais perto do cliente (Kramer, 1989).
Como chegamos ao nível neuroanatômico, deixe-me desviar o assunto brevemente
para comentar que Allan Schore (2003) integrou de maneira criativa um grupo respeitável
de pesquisa neuroanatômica sobre o processo empático que indica a área límbica direita e a
área cortical orbitofrontal do cérebro. É sua a hipótese específica de que a empatia envolve
uma conversa de lado direito para lado direito do cérebro. O córtex orbitofrontal direito, o
cíngulo anterior e a amídala, por exemplo, estão crítica e diretamente envolvidos na avaliação das
expressões faciais, direção do olhar e outros comportamentos não-verbais que revelam o que está
acontecendo em uma outra pessoa. Essas informações, mais o estado autônomo do próprio corpo de uma
pessoa são integrados pelo córtex orbitofrontal, em conjunto com outras áreas corticais.
Compreender mais sobre a pesquisa de neurociência original, de onde Schore construiu sua
hipótese, requer uma base técnica que eu não tenho. Schore nos ajudou emprestando o
seguinte do campo da Física:
Na Física, uma propriedade da ressonância é a vibração simpática harmônica, que
é a tendência que um sistema de ressonância tem de expandir-se e amplificar-se
através da combinação com o padrão de freqüência de ressonância de um outro
sistema de ressonância. (pg. 79).
Felizmente, na mesma página, Schore nos esclarece em termos técnicos, como é a
“vibração simpática harmônica”:
O terapeuta sintonizado e intuitivo, desde o primeiro contato, aprende as
estruturas rítmicas que o cliente tem, momento a momento, e modifica flexível e de
maneira fluida seu próprio comportamento para ajustar-se a esta estrutura. (pg. 79)
Deixe-me dar-lhes um exemplo de como eu, Bob Lewis, faço isto, ou melhor, como
isto ocorre comigo:
Meu cliente, por exemplo, trará material de como ele se sente pervertido, ou
como se sente cosmicamente só, ou desenfreadamente grandioso – o fator comum
sendo que a qualidade ou atributo que ele apresenta não é aquele com o qual eu me
identifique prontamente. Está além da configuração da imagem de Bob Lewis que
geralmente apresento. Assim, minha reação interna inicial é algo como “puxa, que
problema terrível esta pessoa tem!” Então, passados alguns momentos ou minutos,
entro vagarosamente em contato com aspectos de mim mesmo que são mesmo
ressonantes com as questões do meu cliente. Por exemplo, Paul, um cliente meu de
quarenta e poucos anos, muito triste e solitário, lamentava-se, desprezando a si mesmo
que, não só jamais havia feito sexo, a não ser com prostitutas, como nunca tinha tido
nenhum movimento que sugerisse o mesmo em relação a qualquer outra mulher.
Como podem suspeitar, eu estava inicialmente instalado de maneira confortável em
uma auto-imagem nem um pouco parecida com a deste homem infeliz. A princípio o
que me vieram à mente foram aventuras juvenis que comprovavam minha virilidade.
Mas então, quando me pus em ressonância com meu cliente infeliz, lembrei-me
lentamente que sabia exatamente do que ele estava falando. Quando tinha catorze
anos, bem no começo do colegial, fiquei com medo de beijar minha primeira
namorada (vou chamá-la “Susan”) no final de nossos encontros... embora seu irmão
mais novo, a pedido de Susan, tenha me contado no vestiário da escola que sua irmã
realmente gostava muito de mim. Assim, à medida que rendo minhas defesas e
imagens ideais ao material do meu cliente, estou mais em contato com minhas
vulnerabilidades, o que acentua minha capacidade de ser empático. Não contei a Paul
sobre a lembrança dolorosa de Susan que me aproximou dele. Teria ficado
envergonhado demais. Mas talvez algo silencioso tenha retornado a ele, a partir da
minha expressão facial e de uma mudança de tom na minha voz.
Beatrice Beebe (2002) fez uma ampla pesquisa sobre o espelhamento facial entre a mãe
e sua criança pequena. Ela relata os seguintes dados nas primeiras experiências sobre
empatia:
O modo como o rosto do parceiro atrai e responde ao rosto do outro é uma das bases
da intimidade durante toda a vida... a ponto de que as interações do espelhamento
facial são positivamente correlacionadas de modo a que os parceiros mudem na
mesma direção afetiva, a criança pequena representa a expectativa de corresponder e
de ser correspondida... (o padrão de excitação concomitante e o modo de auto-
regulação que surgem são parte da representação). O bebê representa a experiência de
ver a expressão facial da mãe mudando continuamente para tornar-se mais parecida à
sua; ele também representa a experiência de sua própria expressão facial em constante
mudança para tornar-se mais parecida à da mãe. Estas experiências “de
correspondência” contribuem para o sentimento de sentir-se conhecido, sintonizado e
no mesmo comprimento de onda. Cada parceiro afeta o outro para combinar a
direção afetiva, e esta combinação proporciona a eles uma base comportamental para
que cada um entre no estado de espírito do outro. (98)
Quais são algumas das amplas evidências de que, como sabemos intuitivamente, “timing
1 é tudo”, não só na infância, mas durante a vida toda? Na verdade, foram os estudos com
adultos que primeiro sugeriram que timing e ritmo sozinhos, independentemente da
essência do comportamento, eram organizadores poderosos de comunicação. Mensagens
vitais são enviadas entre parceiros neste código transitório. Beebe e Lachman (2002), por
exemplo, relatam que quando:
Solicitados a conversar sobre um assunto neutro, constatou-se que adultos que
não se conheciam combinavam os ritmos puramente temporais do diálogo,
independente do conteúdo do discurso... De especial importância foi achar uma
relação entre ritmos combinados de diálogo, e empatia e afeto. Quando os adultos
desconhecidos combinaram os ritmos, gostaram mais um do outro e perceberam-se
mais calorosos e mais parecidos do que eram quando seus ritmos não combinavam.
Portanto, a similaridade no padrão temporário de comportamento comunicativo está
associada à atração interpessoal e empatia.
Inversamente, uma pessoa que fale muito rápido e quase sem pausas
suficientemente longas para que o parceiro dê um aparte, interfere fortemente com a
troca: o parceiro pode ficar frustrado e “dessintonizar”. Mudanças sutis no timing,
como hesitação ou interrupção, também afetam a experiência que o ouvinte tem do
que está sendo relatado. Na conversa entre adultos, dependemos da combinação de
padrões temporais para saber que o outro está “sintonizado”, e para esperar a vez
tranqüilamente. (99)
Além da importância crucial do direcionamento da cabeça e da direção do olhar, Beebe
e Lachmann citam que Trout e Rosenfeld (1980) descobriram que durante as sessões
de psicoterapia (terapeuta e cliente sentados, um de frente para o outro), uma
descrição de alto rapport 2 por cliente e terapeuta está associada com uma alta
incidência em inclinar a parte superior dos corpos um em direção ao outro, e
manter braços e pernas em postura de imagem em espelho. Pode -se inferir
disto que o rapport é perturbado se qualquer dos parceiros mostra algum grau
de aversão orientacional.
Que melhor maneira de encerrar esta sessão do que com um caso de Donald
Winnicott, um perito antigo da empatia implícita? Aqui está ele no método de conduta:
O detalhe que escolhi para descrever refere-se à necessidade absoluta que esta
paciente tinha de estar em contato comigo, de tempos em tempos.
Tentei vários tipos de aproximações, principalmente aquelas relativas a alimentar
e lidar com uma criança pequena. Houve acontecimentos violentos.
Eventualmente acabou acontecendo de estarmos juntos, eu com a cabeça dela em
minhas mãos. Sem ação deliberada de nenhuma das duas partes, desenvolveu-se um
ritmo de acalento. O ritmo era bastante rápido, por volta de setenta balanços por
minuto (confira com o batimento cardíaco), e tive que fazer algum esforço para
adaptar-me a essa velocidade. Apesar disso, lá estávamos nós em um movimento de
acalento, que ambos expressávamos leve, porém persistentemente. Estávamos nos
comunicando um com o outro sem palavras. (258)

VI - Até que ponto os métodos implícito e de conduta podem tornar-se


explícitos?
Jeremy Holmes (1993), autor da maravilhosa biografia de Bowlby, que ilumina a teoria
do vínculo, nos impulsiona com uma observação um tanto fatalista, dependendo se você é
um terapeuta bom ou ruim. Os bons terapeutas, diz ele, “descobrem-se se espelhando
automaticamente nos níveis de volume de tom de voz e na postura de seus clientes” (pg
156). Peter Fernald (2000), um colega da Bioenergética diz o seguinte com relação às suas
tentativas de responder com empatia:
Procuro posicionar a mim mesmo, meu corpo, física ou mentalmente de maneira
tal que relembre bastante a condição do corpo do meu cliente, volume e profundidade
de sua respiração, punhos cerrados, pélvis congelada, e assim por diante. Tento
incorporar o melhor possível a experiência do meu cliente, andar na pista de sua
couraça psicológica e emocional. (pg 3-4)

Peter descreve o que a maioria de nós tenta fazer, cada um da sua maneira. Helen
Resneck-Sannes (2002) em seu recente artigo no Jornal do IIBA sintoniza-se e é ressonante
com o corpo de seu cliente. O Programa de Treinamento do Sul da Califórnia estimula seus
alunos, desde os primeiros instantes em que olham e escutam seus parceiros diádicos, para
que assumam a atitude deste parceiro e sintam sua história em seus próprios corpos. Eu
mesmo aprendi a confiar e valorizar o conhecimento implícito e empático contido em
minhas mãos. Elas muitas vezes sabem de que maneira se portar com meu cliente antes de
mim. Também aprendi a observar as mãos do meu paciente, uma vez que elas muitas vezes
me contam naquele momento, o que não posso ver de outro modo, e aquilo que meu
cliente não pode me contar. Não podemos esquecer, entretanto, que confrontar nosso
cliente com informações implícitas que estão além do que eles querem ou são capazes de
suportar, é ser não-empático (mas isto é um outro caso).
Voltando-se para outros dados empíricos, Beebe, Lachmann e Jaffe (1997) trabalhando
com “Os mecanismos do espelhamento facial e os precursores da empatia”, descobriram
que:
A semelhança de comportamento implica congruência de sentimento, uma
relação entre combinação e empatia. Como isso poderia funcionar? Duas áreas de
estudo sugerem mecanismos potenciais para os precursores da empatia e maneiras de
traduzir comportamento de correspondência no compartilhar estados subjetivos. O trabalho de
Ekman (1983) e Zajone (1985) mostra que combinar a própria expressão com a do outro está altamente
correlacionado a combinar o padrão de excitação fisiológica. Ekman mostrou que uma expressão facial
específica está associada a um padrão particular de atividade autônoma. Reproduzir a
expressão de outra pessoa produz um estado fisiológico semelhante no observador.
Este mecanismo de empatia é a combinação facial, que é correlacionada à combinação fisiológica.
Este mecanismo de empatia pode ser igualmente relevante para as interações na terapia frente-a-frente
com adultos. (97, pg 161).

Beebe (2003) é tanto humilde quanto otimista sobre a quantidade de processo implícito
que pode ser conscientemente focado para melhorar a qualidade empática do nosso
trabalho clínico. Beebe nos conta que aconteceu de ela ver-se a si mesma em uma sessão de
uma cliente traumatizada, Dolores, gravada em fita de vídeo. Ela, Beebe, descobriu que faz
muito do que Freedman e outros (’78) chamam de toque auto-regulador. Beebe explica:
Eu sabia que esfregava as mãos uma na outra, particularmente quando doíam um
pouco, mas não tinha consciência do quanto faço isto... é muito improvável que algum
dia viesse a me dar conta desse comportamento, sem a ajuda da fita de vídeo. Estes
comportamentos podem permanecer fora da consciência tanto do cliente quanto do analista, mas,
ainda assim, são percebidos subliminarmente e funcionam como informação para ambos... Durante um
episódio no tratamento de Dolores, quando senti que ela estava inacessível, comecei a esfregar meus pés
um no outro. Reconheci isto como um gesto que usava na infância para conseguir adormecer à noite.
Comentei com Dolores que notei que estivera esfregando meus pés um no outro. Dolores foi então
capaz de se aproximar e observar que isto acontecera exatamente quando ela recusara
uma interpretação consoladora que eu estava fazendo a ela, então eu havia me
consolado assim. Gostei bastante de sua observação. Seguiu-se um momento muito
íntimo no qual nos sentimos próximas e ela expressou arrependimento por ter sido
inacessível”. (133)
Achei que o comportamento não-verbal de Beebe foi trazido à consciência focal de
Dolores pelo comentário explícito de Beebe. Esta disposição de compartilhar
explicitamente o que é normalmente informação íntima parece ter vibrado alguma corda
empática em Dolores – empática ao mal-estar que estava causando em Beebe. Dolores então
devolveu a Beebe um presente empático, de significado implícito e explicitamente expresso. Beebe (’03, no
prelo) continua citando Karlen Lyons-Ruth, outra interessante pesquisadora da relação mãe-bebê que é
membro do Grupo de Estudos do Processo de Mudança, de Boston. Lyons-Ruth criou o termo
“conhecimento relacional implícito” (1998) para descrever melhor o que acontece no
processo de empatia. Beebe conta-nos que:
Devido ao fato de que o conhecimento relacional implícito acontece
predominantemente fora da consciência, e raramente na atenção focada, Lyons-Ruth
argumenta que muito das sutilezas e complexidades daquilo que o analista sabe nunca
é colocado em palavras. É por esta razão que a observação das interações na fita de
vídeo revelou muito sobre meu comportamento que, sem a fita, não poderia
descrever, e também porque foi difícil achar uma linguagem para descrever estas
interações. (pg. 58)

Dolores, a cliente de Beebe, disse a ela que também obteve algo precioso por ter visto
os vídeos:
...Vendo o vídeo, Dolores descobriu que eu estava ven do o que ela
mesma “transmitia” em seu rosto, ou “sentia” a respeito de si mesma,
sem ser capaz de descrever verbalmente. Ver meu rosto vendo o dela, e
escutando os sons que eu emitia respondendo aos dela, fez com que
ficasse alerta à sua própria realidade afetiva interna... Dolores viu -se
“vestindo” minhas expressões faciais enquanto assistia à fita de vídeo.
“Assumindo” minhas expressões, Dolores tornou -se mais ciente
afetivamente de sua própria experiência interna, através do feedback
proprioceptivo de seu rosto,...assim como pelo feedback de sistemas
variados de excitação fisiológica... (pg. 49)
Então, em conclusão, não é fácil para Beebe dizer o que ela aprendeu explicitamente. O vídeo ajudou
confrontando-a com o fato de ela estar bem pouco ciente do que estava fazendo quando estava com sua
cliente. Beebe também disse que “muito do meu comportamento não-verbal com ela (Dolores) era baseado
naquilo que as crianças pequenas haviam me ensinado” (pg 58). Beebe conclui que “Podemos ensinar a nós
mesmos como observar essas interações não-verbais implícitas, simultaneamente em nós mesmos e em
nossos clientes, expandindo nossa própria consciência e, quando for útil, a do cliente.” (pg 58). Como não
sou professor, posso dizer o mesmo de forma mais simples. Nossos selfs explícito e implícito começam a
cooperar um com o outro. Alguns de vocês, possivelmente muitos de vocês nesta conferência já fazem isto.
Na verdade não se trata tanto de fazer algo, mas de aprender a estar de uma maneira diferente conosco
mesmos e com os clientes. Não podemos olhar diretamente para o rosto de Deus, ou mesmo para o sol.
Mas ficamos emocionados e tornamo-nos mais ressonantes quando um vislumbre explícito: “Revela
nossas vidas iluminadas pelo brilho difuso de um segundo sol que nunca se vê”.(Lewis,
Amini e Lannon, 2000b) (pg 111).

VII - Quais são as implicações para a Bioenergética da recente pesquisa que


coloca o processo não-verbal relacional implícito no centro de nosso
(há algum termo mais adequado?) empenho na terapia?
a) É tempo de nos sentirmos orgulhosos – A maioria de nós terapeutas de abordagem
corporal nos sentimos corroborados e valorizados pela pesquisa empírica que enfatiza a
enorme importância da codificação da experiência não-verbal e sensório-motora através da
vida. Todos parecem estar descobrindo que a experiência dos primeiros poucos anos da
vida, ou em qualquer idade, se foi traumática, pode ser acessada implicitamente no nível
corporal. O significado está no ritmo, na música subjacente às palavras. Muitos de nós
envergonhamo-nos bastante por praticar um tipo de terapia pretensamente agressiva,
sexual e geralmente barulhenta. Nosso trabalho normalmente não tem sido aceito como
uma abordagem séria e legítima. Talvez seja bem diferente no Brasil, mas na Europa e na
América do Norte, uma terapia que valoriza o corpo tanto quanto a mente ou o espírito
está à margem da nossa cultura.
Assim, concordo que é mais do que hora de sentirmo-nos orgulhosos de nosso legado.
Concordo com Helen Resneck-Sannes em seu artigo recente no Jornal do IIBA (2002), que
fomos treinados a estar cientes da tensão, forma, fluxo, som e calor do corpo; sua
linguagem sensório-motora deve estar mais consciente em nós do que em nossos colegas
de abordagens não-corporais.
De fato os casos clínicos no mesmo artigo estabelecem altos padrões para qualquer
pessoa. A maneira cheia de nuances com a qual ela se sintoniza com a tolerância de seu
cliente à estimulação, proximidade, modo preferido de comunicação, e com seus próprios
indícios corporais, é de grande importância. Há material de um caso semelhante no
excelente livro de Beebe e Lachmann (’02), citado acima. Eles também focam a atenção na
intensidade, duração e ritmo de comportamentos do olhar e dos padrões de fala, e postura
e orientação. No entanto, eles parecem muito mais limitados do que Helen e a maioria dos
psicoterapeutas de abordagem somática, no que se refere à maior parte do que acontece do
pescoço para baixo, que ainda é tabu.

b) Mas não tão orgulhosos – Embora pudesse parar aqui, deixe-me arrumar mais
confusão, lançando um desafio para que não nos congratulemos tão depressa. Quanto à
validade ou legitimidade do nosso trabalho, como é sentido pela comunidade mais
abrangente, tenho três pontos sensíveis: primeiro, deixar que aqueles que dentre nós têm
habilidade se esforcem, como enfatiza Christa Ventling (2002) no artigo do Jornal (2002)
para trazer mais pesquisa empírica para nosso trabalho. Segundo, sejamos cuidadosos em
como usamos palavras como “energia”, a qual definimos de uma maneira que contradiz as
leis da Física, e, terceiro, minha opinião é que devemos todos, inclusive eu mesmo, ler a
literatura e citá-la quando usamos o material de outras pessoas.
Voltando à maior questão da empatia... se eu realmente compreender que o processo
explícito, consciente é a ponta do iceberg implícito (o centro da terra talvez seja uma
metáfora mais calorosa do que o iceberg)... e que mensagens de coração a coração viajam
em frações de segundos... então eu nunca sei de algo claramente por mais do que um
minuto ou dois)... Não tenho escolha a não ser ficar pensando na questão (Maley, 1995).
Há um paradoxo profundo neste ponto. Precisamos perguntar o que fazemos e pelo que
lutamos para validar empiricamente sua eficácia. É sensato esperar que nossos alunos de
Bioenergética tenham uma explicação razoável para suas intervenções, uma explicação que
possam especificar explicitamente. Ao mesmo tempo, os alunos precisam aprender que
suas percepções e seus comportamentos estão sendo influenciados por um processo quase
instantâneo que atua, em grande parte, fora do controle consciente, entre eles e seus
clientes. Este é um processo que me torna humilde, depois de trinta e cinco anos de
prática. Não pode ser assim fácil para um principiante que queira respostas para reprimir
suas ansiedades. Helen Resneck-Sannes (2002) novamente consegue um tom de otimismo
aqui: “Porque os terapeutas psicossomáticos são treinados para estarem cientes de seus
processos corporais internos, o que é inconsciente para o analista, existe em um grau maior
na consciência do analista treinado em Bioenergética.” (pg 115)
Estou menos certo que Helen sobre isto, por várias razões:
I) Primeiro, Helen mal havia nascido quando comecei minha carreira na Bioenergética,
e sou um prisioneiro da perspectiva da minha geração. Por muitos anos a Análise
Bioenergética foi ensinada como Psicologia focada em uma pessoa. Por exemplo,
mostrem-me onde, em algum dos livros de Alexander, sua consciência de seu próprio
processo corporal interno o ajuda a sentir a profundidade ou especificidade do
problema corporal de seu cliente. Claro que aquilo que nos ensinaram e que
experienciamos em nossas carreiras na Bioenergética varia de lugar para lugar, e cada
um de nós tem modelos próprios e preferências inatas onde se apóia. É verdade que
uma segunda e terceira geração de terapeutas e professores de Bioenergética
trouxeram para o nosso trabalho uma psicologia mais focada em duas pessoas
(Schindler 2002). Mas também é verdade que, enquanto falamos, nosso Instituto luta
para integrar esta nova perspectiva relacional, sem perder o poder de nossa abordagem
psicossomática.
II) Segundo, há apenas alguns anos, quando eu era membro do corpo docente
(Faculty), na parte final de “supervisão” do programa de treinamento de
Bioenergética, em que os alunos avançados praticavam “sessões” na frente do grupo,
descobri que sob a pressão de ser observado e julgado, raro era o aluno que se sentia
suficientemente seguro para sintonizar-se com o que estava sentindo sobre si mesmo,
seu “cliente” e a interação. Ao invés disso, “subia” para a cabeça e tentava
compreender o que fazer e, previsivelmente, o que “fazia” não era
sintonizado/empático para seu cliente. Aqui, a novidade não é a respeito de que os
alunos não podiam ficar com o processo momento a momento entre eles e seus
“clientes”. A novidade é que a maioria de nós, mesmo depois de trinta anos, fazemos
a mesma coisa que os alunos, todas as vezes que ficamos ameaçados pelo que nossos
clientes trazem à terapia. O tipo de material primitivo, caótico, visceral (de revirar as
entranhas), que não tem palavras e é liberado de maneira senso-motora na sala, tende
a ser ameaçador para a maioria de nós. Para mim, o é.
III) Terceiro, o problema é até mais básico do que isto. Nós somos o problema.
Vocês se esqueceram de que, como Bob Hilton (’88-89) disse uma vez, “todos fomos
divididos”? Esqueceram-se de que, como nos relembra Michael Maley (’95), somos
curadores feridos? Descobri que sempre que me comprometo a tentar ser um bom
terapeuta e a capturar a interação viva em minha mente, tendo a perder o momento
com meu cliente. Fazia isso freqüentemente há anos, muito tempo antes de eu
descrever a síndrome do choque encefálico. Porém, mesmo então, meu conhecimento
implícito tentou me ajudar com o choque em minha cabeça, choque este que não me
deixava ter maior sintonia de corpo inteiro com meus clientes. Momentos após meu
cliente sair do consultório, no mesmo instante, eu batia com a mão na testa e percebia
que tinha perdido aquilo que era óbvio enquanto estava pensando.
Claro que precisamos também pensar e falar com nossos clientes. Às vezes temos que
parar a ação instantânea e perceber o que houve entre nós e o cliente. Mas falo da ferida
básica em nós, a qual limita nosso contato empático com nossos clientes. Com muitas
variáveis, esta ferida tem a ver com não sermos seres humanos de valor, suficientemente
bons. Assim, muitas vezes sem perceber, tentamos redimir este self partido sendo bons
terapeutas. Podemos tentar nos tornar aqueles terapeutas implicitamente mais sintonizados
com pistas sensório-motoras em nós mesmos, e em nossos clientes. Mas, se também
lembrarmos que fomos divididos e que ainda estamos profundamente feridos,
descobriremos, como na colocação tão bonita de Bob Hilton (2000), “...aquele pedaço de
mim que havia se escondido atrás do meu método terapêutico de interação, qual seja, o
valor do meu self real para o outro.” (pg 10)
Assim, apresentei anteriormente o caso em que senti seguro o suficiente no meu self
carente para permitir que ele viesse para a sala com Paul, meu cliente inadequado, parecido comigo nesse
ponto. De fato, geralmente sou visto como um terapeuta bastante bom nos meus casos. Mas não seria
animador se eu fosse sincero e apresentasse uma série de acontecimentos em que a empatia falhou, ou pelo
menos em que houve algumas rupturas e reparos? A mais recente pesquisa demonstra que, mesmo as mães
e crianças que serão testadas depois como seguramente vinculadas, passam apenas aproximadamente um
terço de seu tempo em estados combinados. No entanto, em dois segundos, 70% das condições não
combinadas voltam a combinar, e tanto mães quanto crianças influenciam nesse ajuste! A neurobiologia
implícita da criança organiza a expectativa de que ela possa participar na reparação das
rupturas afetivamente dolorosas (Tronick e Cohn, ’89). Algo semelhante
acontece também numa situação terapêutica com adultos quando as coisas
funcionam bem.
Neste próximo caso, as coisas não funcionaram bem. O cliente apresentou-se com
sintomas orais, peito magro e colapsado, respiração superficial. Você sugere que ele respire
profundamente para dar-lhe carga maior na parte superior do corpo. Ele lhe diz que
detestou a sugestão, que todas as vezes que tentou isto no passado, sentiu a cabeça muito
leve, mas nada aconteceu... parece-lhe mecânico e manipulativo. Além disso, ele elabora:
“minha respiração”, diz, “tem que vir de algo que esteja fazendo, algo que seja cheio de
vida e genuíno. Vou respirar quando me sentir pronto a respirar, saco!” Sendo um terapeuta empático,
você pára com as sugestões e pergunta ao cliente o que, para ele, pode ser “cheio de vida e genuíno”. Ele
parece muito surpreso, a seguir cada vez mais tocado com o fato de que você está interessado nele o
suficiente para suspender a questão da respiração no momento. Então, enquanto ele está deitado no stool e
alguns minutos se passam em silêncio, você sente que a imobilidade dele é mortal... mal se percebe sua
respiração... você sente seu próprio peito morto e, embora se sinta bastante assustado... você não se
sente confortável com a morte.... você tolera a sensação de vazio e seu medo e nota que sua
respiração tornou-se muito lenta e superficial... vagarosamente, para seu espanto, seu pavor
começa a diminuir e você sente até uma espécie de paz envolvendo-o... depois de algum
tempo, seu cliente se volta para você e mal pode encontrar as palavras para lhe agradecer,
ele diz, por sentir este grande prazer em sua apnéia (ausência de respiração).
Por acaso, posso lhes dizer o nome do cliente: Bob Lewis. O nome é real, mas a sessão
é fictícia. É a sessão que Bob nunca teve. Ao deitar no stool de Bioenergética, Bob nunca
teve coragem nem palavras para contar ao seu terapeuta de Bioenergética quão
envergonhado ficava da imobilidade mortal de seu peito.... dizer-lhe que ele o odiava por
não perceber suas necessidades, mas não podia dizer que sua chama interior era muito
fraca. Que ele, Bob, não respiraria ou não conseguia respirar do lugar morto em seu peito, a
não ser que seu terapeuta pudesse estar com ele no vale das sombras da morte. As palavras que
ele jamais encontrou eram: “Aproxime-se de mim com sua emoção... meu espírito
despertará se você nutrir sua chama... e minha respiração virá de dentro.”)
Em meu último caso clínico sou o terapeuta, e parece que aprendi, depois de muitas
rupturas que não foram reparadas, como estar com minha cliente Florence, de uma
maneira que teria ajudado Bob Lewis e seu stool de Bioenergética. Florence não foi fácil
para mim. Comumente, pareceria estarmos conversando em uma linguagem adulta,
explícita, vinda do hemisfério esquerdo, mas eu me tornava confuso, perturbado e ansioso
à medida que a sala ia sendo preenchida com uma fúria intensa, primal e visceral, dor e
futilidade. Minha tentativa típica de me defender foi tentar recuperar meu equilíbrio via um
rápido recuo ao meu hemisfério esquerdo, de onde apontaria, com uma voz ao mesmo
tempo melancólica e irritada, que algo estava inconsistente, algo que não fazia sentido para
mim nas palavras e sentimentos de Florence. Ela ficaria atônita com meu abandono da
empatia, e as coisas piorariam além de qualquer reparação possível.
Entretanto, tanto eu como Florence padecemos de uma incansável esperança, por isso
ainda estamos trabalhando juntos. Recentemente tivemos uma sessão que me sugeriu que
pode haver uma base real para a esperança. Florence estava no meio de uma experiência
profunda de luto em que nem eu, nem seu pai fomos capazes de lhe dar mais daquilo de
que precisava. Talvez, mais importante ainda, ela precisasse ser capaz de gritar os imensos
sentimentos de fúria e desapontamento e deixar seu corpo contorcer-se em “agonia”, como
ela colocou mais tarde, sem ter de preocupar-se comigo. Assim, preciso ser capaz de sentir
meu rosto tornar-se contorcido e tolerar o calor e o peso em minha cabeça e em meu peito.
À medida que os sentimentos “agonizantes” de Florence por ter sido reprovada por mim e
por seu pai ocupavam a sala, posso sentir o vazio, a tristeza e dor em meu peito (bastante
oral) reconstruído, essencialmente o mesmo peito de Bob Lewis que estava no stool de
Bioenergética há trinta e cinco anos. Uma ou duas vezes Florence disse “não fui tocada”.
Ao escutar um grito particularmente primal de Florence e notar um leve som ressonante e
dolorido provindo de mim, disse-lhe que não sei se tocá-la fisicamente seria uma
necessidade minha ou dela. Não estou certo se meu toque interferiria na plenitude da
experiência que ela teve de ter falhado. Florence me diz como é precioso para ela que eu
compartilhe com ela meu não-saber. Depois de alguns minutos, decidi colocar minha mão
em seu ombro esquerdo, perto do seu coração. Logo depois Florence afastou minha mão,
indicando que isto não ajudava. Quando ela recomeçou o doloroso sofrimento, notei que
meus dedos estavam entrelaçados em um gesto que me surpreendeu e, ao mesmo tempo,
me confortou. O gesto parece muito forte. Minhas mãos juntas, em um ato de
solidariedade, parecem estar me trazendo conforto e senso de unidade. Elas me contam
como traz uma sensação de fragmentação ficar com a incapacidade de Florence de ser
ajudada, e minha impotência em ajudar. Elas me asseguram que estou inteiro e digno,
mesmo como um curador fracassado.
A sessão com Florence que acabei de partilhar com vocês, demonstra o uso implícito
das minhas mãos para me auto-regular melhor (senti-me sintonizado através de minhas
mãos), de modo a que eu possa manter um contato empático com minha cliente. Mas não
entrelacei meus dedos das mãos intencionalmente. Essa pode ser a melhor maneira em que
posso explicar empatia: de algum modo, mergulhando neste assunto nebuloso, minha
consciência focal expandiu-se para incluir mais do meu comportamento implícito. Minha
ressonância empática torna-se mais profunda e mais sábia quando me rendo à vergonha de
não saber e de não enxergar claramente. Somente então eu - e todos nós, podemos sentir
“o brilho intenso e difuso de um sol que nunca vemos”. (Lewis, Amini, Lannon, 2000b) (P.
111).

Robert Lewis, M.D.,


155 East 91st Street #1B
New York NY 10128, USA,
e-mail: boblewis@inch.com

Referências
BEEBE, B., Lachmann, F., & Jaffe, J. (1997). Mother-infant interaction structures and presymbolic
self and object representations. Psychoanalytic Dialogues 7(2): 133/182.
BEEBE, B. & Lachmann, F. (2002). Infant research and adult treatment. Hillsdale, NJ: The Analytic
Press, Inc.
BEEBE, B., (2003, in press). Faces-in relation: Forms of intersubjectivity in an adult treatment of
early trauma. Psychoanalytic Dialogues.
BUCK, R., (1994). The neuropsychology of communication: Spontaneous and symbolic aspects.
Journal of Pragmatics, 22, 265-278.
EKMAN, P. (1983). Autonomic nervous system activity distinguishes among emotions. Science, 221,
1208-1210.
EKMAN, P., Friesen, W., & Ancoli, S. (1980). Facial signs of emotional experience. Journal of
Personality and Social Psychology, 39, 1125-1134.
FERNALD, P. (2000). “Bioenergetics and modes of therapeutic action: A response to Martha Stark and Robert
Hilton”. Presented at the International Conference on Bioenergetic Analysis. Montebello, Canada,
May, 2000.
FOGEL, A. (1993). Developing through relationships. Chicago: University of Chicago Press.
FREEDMAN, N., Barroso, F., Bucci, W. & Grand, S. (1978). The bodily manifestations of
listening. Psychoanalysis and Contemporary Thought, 1, 156-194.
GOMBRICH, E., www.artchive.com/artchive/L/leonardo/monalisa_text.jpg.html)
HAVENS, L. (1979). Explorations in the uses of language in psychotherapy: Complex empathic statements. Psychiatry,
42, 40-48.
HILTON, R. (1988/89). Narcissism and the therapist’s resistance to working with the body. The
Clinical Journal of the International Institute for Bioenergetic Analysis 3(2): 45-74.
HILTON, R. (2000). “Bioenergetics and modes of therapeutic action.” Presented at the International
Conference on Bioenergetic Analysis. Montebello, Canada, May, 2000.
HOMES, J., (1993). Attachment theory and the practice of psychotherapy. John Bowlby and attachment theory
(149-176). London: Routledge.
JAFFE, J., Beebe, B., Feldstein, S., Crown, C. & Jasnow, M. (2001). Rhythms of dialogue in early
infancy. Monographs of the Society for Research in Child Development, 66(2) serial No. 264, 1-132.
KOEMEDA-LUTZ, M. & Peter, H. (2002). What do human bodies tell us? In search of statistically
significant empirical confirmation for the “language of the body”. A study in bioenergetic body
diagnostics. Bioenergetic Analysis. The Clinical Journal of the International institute for
Bioenergetic Analysis Vol. 13 (1): 77-94 (Published in German (2001) Psychotherapie Forum 9 (20
51-61).
KRAMER, P., (1989). Is empathy necessary? Moments of engagement (129-153). New York: Penguin
Books USA, Inc.
LEWIS, Th., Amini, F., Lannon, R. (2000a). Archimedes’ principle. A general theory of love (35-65).
New York: Vintage.
LEWIS, Th., Amini, F., Lannon, R. (2000b). Gravity’s incarnation. A general theory of love (100-120). New York: Vintage.
LYONS-RUTH, K. (1998). Implicit relational knowing. Infant Mental Health Journal, 19, 282-291.
MALEY, M. (1995). Living in the question. Minneapolis: Bodysmart Publications.
REICH, W. (1933 in German). (1949). Character Analysis. New York: Noonday Press (Farrar,
Straus & Cudahy).
RESNECK-SANNES, H. (2002). Psychobiology of affects: Implications for a somatic
psychotherapy. The Clinical Journal of the International Institute for Bioenergetic Analysis 13(1). Winter,
2002. 111-122.
SANDER, L. (1977). The regulation of exchange in the infant-caretaker system and some aspects
of the context-content relationship. In M. Lewis & L. Rosenblum (Eds.), Interaction, conversation, and
the development of language (pp. 133-156). New York: Wiley.
SCHINDLER, P. (2002) Geschichte und Entwicklung der Bioenergetischen Analyse. Pp. 27-48:
Koemeda-Lutz, M. (Ed.) Körperpsychotherapie – Bioenergetische Konzepte im Wandel. Basel:
Schwabe Verlag.
SCHORE, A., (2003). Affect regulation and the repair of the self. New York: W. W. Norton & Co., Inc.
STARK, M., (1999). Modes of therapeutic action. Northvale, NJ: Jason Aronson, Inc.
STERN, D. (1985). The interpersonal world of an infant. New York: Basic Books, Inc.
TANSEY, M. & Burke, W. (1989). Understanding countertransference: From projective identification to
empathy. Hillsdale, NJ: Analytic Press.
TRONICK, E. (1989). Emotions and emotional communication in infants. The American Psychologist,
44, 112-119.
TRONICK, E., & Cohn, J. (1989). Infant mother face-to-face interaction: Age and gender
differences in coordination and miscoordination. Child Development, 59, 85-92.
TROUT, D. & Rosenfeld, H. (1980). The effect of postural lean and body congruence on the
judgement of psychotherapeutic rapport. Journal of nonverbal behavior, 4, 176-190.
VENTLING, C. (2002) The significance of scientific research for bioenergetics. The Clinical Journal
of the International Institute for Bioenergetic Analysis 13(1) 1-20.
Webster’s New World College Dictionary, Fourth Edition.(2001). Foster City, CA: IDG Books
Worlwide, Inc.
WINNICOT, D. (1989). Mother-infant experience of mutuality. Psychoanalytic explorations (251-260).
Cambridge, MA, Harvard Univ. Press.
YALOM, I., (1989). Two Smiles. Love’s Executioner (167-186). New York: Harper Collins.

Você também pode gostar