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Psicologia da Aprendizagem e da Memória

Introdução

O que é a aprendizagem?

A aprendizagem são o conjunto de processos mediante os quais o comportamento se altera


ao longo do tempo. É um mecanismo de adaptação ao meio ambiente; esta adaptação do
comportamento é mediada por processos: percetivos, cognitivos e de organização motora.

A aprendizagem nem sempre é evidente, e a sua forma mais elementar é o fenómeno da


habituação- redução da força das reações reflexas.

Aprendizagem e memória

Os dois processos estão intimamente relacionados. A aprendizagem é um processo de


mudança no estado de conhecimento do individuo e consequentemente do seu comportamento.
Durante o processo de aquisição, adquirem-se novos conhecimentos e/ou comportamentos que
vão gerir a forma como nos relacionamos com o meio.

A aprendizagem implícita, ou seja, a aquisição de algum tipo de informação, provoca uma


modificação da memoria, sendo um processo dinâmico.

Memória

A memória é composta por um conjunto de mecanismos, biológicos e psicológicos, que


permitem a codificação, armazenamento e recuperação da informação quer seja para uso imediato
ou para utilização posterior.

Podemos estudar a memoria através de uma perspetiva estrutural ou processual.

A memória tem como funções então a codificação, o armazenamento e a recuperação da


informação; existem três tipos, a autobiográfica, a semântica e a procedimental; composta por dois
sistemas, declarativo e procedimental; com três propriedades, a potencia, a dimensão e a
diversificação de registos.
Perspetiva estrutural
O MODELO MODAL

Nos mecanismos ou sistemas de armazenamento de informações, um sistema de PI recebe


uma input externo, manipula-o e emite um output; mas não é menos verdade que o sistema
também deve ter mecanismos de armazenamento onde depositar as informações, temporária ou
permanentemente. Ou seja, um sistema de PI manipula o conhecimento porque ele está
organizado em memórias.

A Tabela representa uma adaptação de um dos diagramas de fluxo mais difundido da


psicologia cognitiva, o modelo modal.

Este modelo de PI mostra que os inputs externos são armazenados numa primeira
estrutura de memória: registos sensoriais (RS). É assumido que cada modalidade sensorial tem o
seu próprio registo sensorial e estes podem ter uma capacidade de armazenamento de informação
praticamente ilimitada, mas ao custo de uma rápida decadência ou perda dele.

A informação selecionada é transferida para o armazenamento de curto prazo (ACP), que


atualmente é entendido como uma memória operativa que contém as informações necessárias
para executar a tarefa específica que nos é exigida em um momento específico, Atkinson e Shiffrin
contemplaram a possibilidade de existir um contato direto entre os RSs e o ALP, portanto, aparece
na forma de uma seta tracejada.

Pela direção das setas, conseguimos entender que as informações depositadas no ACP não
vêm apenas diretamente dos registos sensoriais, mas também podem ser recuperados do
armazenamento da memória de longo prazo. A capacidade de armazenamento de curto prazo é
significativamente menor do que o estimado para registos sensoriais, para este diz-se que este
armazém tem capacidade física limitada, embora agora a taxa de esquecimento de informações
seja muito mais lenta. Tanto os RS quanto o ACP são sistemas temporários de manutenção de
informações porque estas, decaem ou são progressivamente esquecidas. Uma vez concluída a
tarefa necessária, não é mais necessário manter as informações no ACP, podendo ser totalmente
perdidas (esquecidas) ou enviadas para a última das estruturas, o armazenamento de longo prazo
(ALP), onde as informações são permanentemente depositadas.

O ALP seria análogo ao disco rígido que contém dados e nele seriam depositadas todas as
informações que adquirimos ao longo de nossas vidas. Por esta razão, em comparação com os dois
armazéns anteriores, o ALP é um sistema de memória permanente.

As primeiras fases dos sistemas de colheita e manutenção de informações que estão


intimamente ligados ao processamento percetivo são então, os registos sensoriais.
REGISTO SENSORIAL

O conceito de Registo Sensorial

Por registo sensorial (RS) entendemos um primeiro sistema de armazenamento que


mantém a informação por períodos muito curtos. É assumido que cada modalidade sensorial tem
seu próprio registo, embora tenha sido o RS o visual o mais estudado experimentalmente, e em
menor grau o RS auditivo. Originalmente, Neisser (1967), denominava-as memória icônica e
memória ecoica, respetivamente.

O aspecto mais importante dos RSs é sua estreita ligação com os mecanismos percetivos e
atencionais do PI. Tanto que, atualmente, muitos pesquisadores consideram que os RS nada mais
são do que formas iniciais de colheita de informações que têm mais a ver com perceção ou
atenção do que com estruturas ou unidades de armazenamento de memória. Não é em vão que os
registos sensoriais, especialmente o icônico, guardam a informação por frações de menos de um
segundo.

O registo sensorial visual: propriedades

Desde o século XIX houve uma preocupação em saber qual era a maior quantidade de
informação que um indivíduo poderia captar com um único olhar, jogando para o ar uma série de
objetos (moedas ou bolas) as observações apontaram que, em um único olhar, é quase impossível
perceber mais de seis ou sete objetos, o que levou a crer que havia um limite para a capacidade de
capturar informações visuais.

A invenção do taquistoscópio, foi um avanço importante para o desenvolvimento da


pesquisa visual. Este dispositivo permite apresentações de estímulos muito breves (de apenas 50
milissegundos e até menos) que garantem uma fixação de olho único no campo visual. Dessa
forma, as observações pioneiras começaram a ser formalizadas empiricamente e deram origem à
descoberta de um sistema de manutenção de informações visuais de natureza sensorial, de
curtíssima duração, que se convencionou chamar classicamente de memória icônica.

Duas técnicas experimentais têm sido comumente usadas neste âmbito: o relatório total e
o relatório parcial.
Relatório completo e relatório parcial

Usando o taquistoscópio, as primeiras experiências mostraram que, quando os sujeitos são


expostos a conjuntos de estímulos (palavras, letras ou números), a recordação máxima parecia
estar estagnada em cerca de quatro ou cinco itens, independentemente de o conjunto de
estímulos exceder em muito essa quantidade. A esta quantidade de informação que o sujeito é
capaz de reter visualmente após um breve apresentação taquistoscópica que permite uma única
fixação ocular denominou-se como: intervalo de apreensão
da memória visual.

Por exemplo, George Sperling (1960) apresentou


taquistoscopicamente conjuntos de estímulos por apenas 30
ms variando de 3 a 12 letras”, algumas vezes arranjadas em
linhas e outras vezes em forma de matriz. A Tabela descreve
um teste hipotético usando 9 letras na forma matriz. Os conjuntos de estímulos foram precedidos
por um ponto de fixação (+) e os campos visuais pré-exposição e pós-exposição estavam escuros.

A tarefa dos sujeitos consistia em lembrarem-se do maior número possível de letras,


escrevendo-as em protocolos de resposta. A esta técnica experimental em que o sujeito se deve
tentar lembrar de todo o conjunto de itens apresentados visualmente ou o maior número possível
deles é chamado de relatório total.

Como pode ser observado na tabela (linha vermelha


do relato total) o desempenho do sujeito (número de letras
lembradas corretamente) parece ficar estagnado em torno
de 4,5 itens em média. Ou seja, em uma exposição de 50 ms
que permite uma fixação ocular única, o alcance de apreensão do sujeito é de cerca de 4 ou 5
letras, independentemente do tamanho do conjunto apresentado.

Diante desse resultado, o interesse científico residia em explicar quais eram os mecanismos
que limitavam a memória dos sujeitos.

Uma das possibilidades era que as limitações de desempenho estivessem relacionadas a


processos do tipo percetivo (hipótese da limitação percetiva), uma vez que os 50 ms de exposição
constituíram um flash extremamente curto, o que poderia sugerir que não houve tempo suficiente
para perceber todas as letras apresentadas, principalmente com grandes conjuntos de estímulos.
Sperling, em um novo experimento, introduziu uma nova manipulação experimental, que
consistia em usar quatro tempos de exposição diferentes: 15, 50, 200 e 500 ms. Os resultados
obtidos replicaram os acima, ou seja, uma estagnação no desempenho dos sujeitos entre os 4 e os
5 itens. Chamaremos esse resultado de efeito neutro da duração do estímulo no relatório
completo, porque manipular a duração da apresentação do estímulo não afeta o desempenho.

Uma vez descartado que as limitações da memória usando o relatório completo fossem
devidas a mecanismos percetivos, a próxima hipótese que poderia ser averiguada era relacionada
às limitações de memória (hipótese da limitação de memória).

O suporte intuitivo para essa hipótese veio dos próprios protocolos verbais dos sujeitos,
que nas experiências afirmavam ter visto muito mais letras do que conseguiam se lembrar.
Segundo ele, os sujeitos são capazes de perceber adequadamente todas as letras numa espécie de
impressão de memória, embora desapareça num tempo muito menor do que leva para produzir a
resposta verbal.

Para verificar essa nova hipótese, Sperling introduziu uma experiência nova, uma das
técnicas mais importantes para o estudo do RS visual: a técnica do relatório parcial.

Esta técnica permite superar possíveis limitações de memória e facilitar a tarefa do sujeito
em lembrar o material. A técnica é estruturalmente semelhante ao relato completo, exceto que os
sujeitos agora são solicitados aleatoriamente por sugestão, auditiva ou visual, para recordar não
todo o material do estímulo, mas apenas uma parte dele.

Por exemplo, 9 letras eram dispostas na forma de uma matriz 3 x 3, e apareciam por 50 ms.
Imediatamente depois do seu desaparecimento, um sinal, constituído por um tom auditivo alto
(2500 Hz), médio (650 Hz) ou baixo (250 Hz) e que é audível também por 50 ms, indica ao sujeito
se deseja relatar a linha superior, intermediária ou inferior, respetivamente.

O relatório parcial é uma técnica de amostragem aleatória, por esta razão, supõe-se que,
para realizar a tarefa corretamente, deve-se tentar memorizar todo o conjunto de estímulos
apresentados ou o maior número possível.

O desempenho médio dos sujeitos em todas as condições foi superior ao obtido com o
relatório completo. Por exemplo, com conjuntos de estímulos de 12 letras, o desempenho médio
foi de 75% e, portanto, estimou-se que o número de letras disponíveis no armazém icônico era 9.
Estes valores são significativamente maiores do que as 4,5 letras em média que foram lembradas
usando a técnica de relatório total.

A este benefício no desempenho dos sujeitos quando se utiliza a técnica dos relatórios
parciais versus os completos, tem sido chamado de vantagens de relatórios parciais sobre
completos. Segundo Sperling, essa superioridade nos resultados deve-se ao fato de que, após o
desaparecimento físico da matriz de estímulo, uma impressão visual persiste na qual o sujeito
recupera a informação. Esse traço é chamado de ícone (vestígio sensorial visual).

Não é possível quantificar em termos absolutos o número de itens que podem ser
armazenados porque, as percentagens médias de recall estão relacionados ao tamanho do
conjunto de estímulos apresentado. Por esta razão, afirma-se que o registo sensorial visual,
entendido como um armazenamento de memória icônica, tem uma capacidade praticamente
ilimitada, embora a quantificação específica não seja algo absoluto, mas relativo, pois depende de
um fator metodológico como o tamanho total de o conjunto de estímulos apresentado.

Em conclusão, os trabalhos experimentais revelaram, face a apresentações visuais muito


breves, a existência de um ícone ou traço sensorial visual, entendido como uma persistência
informativa do estímulo ao longo do tempo, uma vez que este já desapareceu. Este RS visual foi
originalmente equiparado a uma estrutura de armazenamento de informações a que Neisser
chamou de memória icônica.

REGISTO SENSORIAL VISUAL MÚLTIPLO

Tradicionalmente, o RS visual era considerado como uma estrutura unitária de


armazenamento entendida como memória icônica, com propriedades bem definidas: grande
capacidade, baixíssima duração e pré-codificação categórica.

O ícone era um fenômeno unitário cuja decadência no tempo começava justamente no


momento do desaparecimento do estímulo, de forma análoga a como uma imagem em uma tela
se desvanece progressivamente quando a fonte de luz "halógena" que a projeta se desvanece
pouco a pouco.

No entanto, já há algum tempo, prevalece cada vez mais a ideia de que o RS não se reduz a
um sistema de memória icônico periférico e único, mas que deve haver pelo menos um outro
componente envolvido durante o processamento da informação sensorial.
Quando o estímulo-sugestão ISI é atrasado ao máximo (1 segundo), o desempenho do
sujeito é igual ao do relatório total (cerca de 4,5 itens), mas nunca é zero. Em outras palavras, se o
desempenho no relato parcial dependesse exclusivamente da informação armazenada na memória
icônica -e dado que esta decai progressivamente- após aproximadamente 1 segundo o sujeito não
teria de se lembrar de nada e, no entanto, lembre-se sempre de algum item apresentado, por mais
mínima que seja a performance.

Esta observação sugere que, durante a persistência do ícone, o sujeito extrai a informação e
a envia para um novo sistema de memória
que alguns denominaram armazenamento
durável e outros preferem referir-se a ele.
em termos de memória visual de muito
curto prazo (MCP-C).

Seja qual for a denominação, na tabela mostramos a ideia subjacente se for admitido que o
RS visual tenha duas componentes: a informação é apresentada brevemente e está disponível sob
a forma de uma memória icónica com grande capacidade de informação bruta, mas que
progressivamente começa a decair; o sujeito começa a explorar um após o outro os itens e os
transfere para o MCP-C.

Assim, embora o ISI do sinal-estímulo seja amplo, as informações sempre foram extraídas
para o MCP-C, o que explica que com longos atrasos de sinal o rendimento nunca é 0 itens. Assim,
a MCP-C:

 É um sistema de memória e processamento diferente do sistema de memória icônica;


 Sua principal missão é atuar como buffer ou depósito temporário, em onde a informação é
processada e articulada a nível pré-categorial;
 A informação que não é incorporada neste sistema, ou seja, que não e guardada, decai e é
esquecida muito rapidamente, havendo ainda a possibilidade de que se não for processada
pelo MCP-C o sujeito não toma conhecimento/consciência de sua apresentação;

FUNCIONALIDADE DO REGISTRO SENSORIAL VISUAL

Independentemente de como entendemos o ícone —como uma estrutura unitária de


armazenamento ou como um processo de informação nas primeiras fases da perceção visual—, há
um aspecto importante que deve ser levado em consideração: Para que serve um suposto sistema
de armazenamento com uma duração tão curta? Por que é necessário manter as informações por
períodos tão curtos?

Uma hipótese insiste que a memória icônica é o mecanismo que permite a continuidade
fenoménica temporal da nossa perceção visual.

Esta hipótese de integração de estímulos foi originalmente defendida por Colthard (1983).

Pois bem, se nossa perceção é discreta e há um período que coincide com o movimento
sacádico durante o qual não ocorre captação da informação —supressão sacádica—, é óbvio
pensar que deve haver alguma estrutura de armazenamento que mantenha a informação para
preservar a continuidade fenomenal que caracteriza a visão. Tal papel corresponde à memória
icônica.

Assim, durante o período de supressão sacádica em que o estímulo retiniano desaparece, a


memória icônica armazena a informação da fixação pré-sacádica e a mantém até que ocorra uma
nova fixação pós-sacádica.

Essa proposta de integração visual foi duramente criticada por Haber. Este investigador
entendeu que a continuidade fenomenal na perceção não pode depender de um sistema icónico
de memória, essencialmente porque, em certas situações dinâmicas, como é o caso da perceção
do movimento, uma sucessão de ícones estáticos não facilitaria a perceção, mas interferiria nela.

Longe dessas críticas, é inegável o papel adaptativo que a memória sensorial visual
desempenha em um processo tão intimamente relacionado aos mecanismos da adaptação do
animal ao ambiente, como a perceção, dando-lhe uma continuidade.

REGISTO SENSORIAL VISUAL E CEGUEIRA DE MUDANÇA

O fenómeno denominado cegueira de mudança (CC), revela a incapacidade que as pessoas


demonstram em numerosas ocasiões para detetar as mudanças introduzidas entre cenas
sucessivas.

É difícil explicar porque é que uma alteração introduzida em duas cenas que aparecem
separadas por um intervalo em branco de apenas 80 ms ou menos, é difícil de detetar, apesar do
fato de que a memória icônica tem uma duração temporal muito maior e, acima de tudo, uma
enorme quantidade de informação visual. Se houvesse algum tipo de integração entre os ícones
anteriores e posteriores, o sujeito deveria estar ciente dessa alteração, pois ainda teria
informações detalhadas sobre o ícone anterior que contrastariam com o novo ícone no qual o
ícone foi introduzido.

É por isso que alguns pesquisadores consideram que o ícone não é tão cheio de
informações quanto se acreditava e as pessoas simplesmente capturam detalhes gerais ou um
pequeno número de itens em uma cena visual que é apresentada brevemente.

No entanto, ao contrário dessa ideia, trabalhos experimentais recentes de Becker, Pashler e


Anstis (2000) mostraram que o fenômeno CC é altamente consistente com o desempenho de um
sistema de memória icônico. Seguindo uma lógica muito semelhante à de Sperling ao apresentar o
relato parcial, Becker et al. mostraram que se, durante o ISI entre as imagens anteriores e
posteriores, o sujeito é indicado por meio de um sinal da posição onde uma possível mudança
pode aparecer, o desempenho em detetá-la aumenta dramaticamente.

Uma adaptação da configuração experimental de Becker et al, pode ser vista na tabela
abaixo. Como pode ser visto, é um layout típico do paradigma experimental CC. Sua principal
manipulação consiste em introduzir uma possível seta (como sinal) que indique a posição onde
ocorrerá a mudança e que apareça 16 ms após o
desaparecimento do estímulo, estando presente
continuamente e se sobrepondo ao aparecimento
do segundo estímulo.

Assim, nesses experimentos, uma primeira


variável que é manipulada é a sinalização possível:
há condições de tentativas sinalizadas (desenho à
esquerda em que seta aparece) e não marcado
(desenho à direita, sem sinal). Além disso, uma
segunda variável que é manipulada é o ISI entre a
apresentação da deixa e o aparecimento do
segundo estímulo (0, 66, 133, 199, 256).

A tarefa do sujeito é detetar uma possível


alteração na segunda imagem em relação à primeira.

A apresentação de um sinal indicando o local de uma possível mudança exerce uma


influência positiva (linha vermelha) em relação à condição não sinalizada (linha azul), embora isso
seja verdade apenas para ISls maiores de 0ms. Na condição ISI O ms, o sujeito não se beneficia do
sinal.

O que esses resultados estão nos dizendo (interpretação do gráfico)?

Primeiro, que existe uma representação visual (o ícone) com uma riqueza de informações
muito maior do que o fenômeno CC pode levar a pensar.

Em segundo lugar, quando o sinal e o segundo estímulo aparecem simultaneamente (ISI =


0), o primeiro sinal não facilita a deteção de uma possível alteração, pois o segundo estímulo
mascara ou interrompe o ícone do primeiro.

Em terceiro lugar, com ISls superiores a 0 milissegundos entre o sinal e a apresentação do


segundo estímulo, o primeiro exerce um efeito benéfico, ao direcionar a atenção do sujeito para o
ponto onde a mudança pode ser introduzida.

Em conclusão, os resultados sugerem a presença de um ícone que pode ser substituído ou


mascarado por um estímulo subsequente. Se um sinal for introduzido antes do aparecimento do
segundo estímulo, favorecerá a deteção da mudança, pois controlará a atenção do sujeito,
conduzindo-o para a posição da possível mudança. Porém, se o sinal aparecer coincidindo com o
segundo estímulo (IST 0), não exercerá nenhum tipo de influência, pois o ícone já foi mascarado e,
portanto, o sujeito não se beneficiará do sinal.

Todos esses resultados estão de acordo com as evidências anteriores que mostramos sobre
o armazenamento icônico. Observe também o paralelismo de Becker et al. com a técnica de
relatório parcial e total usada por Sperling. A condição sinalizada seria comparável a uma situação
de relato parcial, em que o sujeito se beneficia do conhecimento do local onde a alteração pode
ocorrer e dirige sua atenção para aquela posição. Se o ISI for 0, o mascaramento do segundo
estímulo prevalece sobre o possível efeito benéfico do sinal. Como alternativa, a condição sem
sinal é análoga à situação do relatório completo, em que o sujeito deve examinar todos os itens do
ícone, resultando em desempenho inferior.

Essas obras mostram que as pessoas representam iconicamente os estímulos do ambiente,


captando uma infinidade de detalhes.
Perceptivamente, o ícone é muito rico em termos de informação; o problema é que, devido
à sua curta duração, a informação é perdida antes de ser processada com atenção e colocada em
um armazenamento de memória imediata de curto prazo. Observe, nesse sentido, que os déficits
na memória de estímulos apresentados brevemente estariam intimamente ligados a mecanismos
atencionais. Ou dito de outra forma, o fenômeno da cegueira à mudança não seria tanto cegueira
quanto amnésia desatencional, ou seja, falta de memória não tanto porque a riqueza dos
estímulos não foi percebida, mas porque a atenção, como sabemos, deve ser controlado e
redirecionado no espaço, de forma que apenas uma parte mínima dessa informação possa ser
extraída do ícone e colocada em um sistema de memória imediata.

Isso estaria de acordo com as verbalizações dos sujeitos de Sperling, que afirmava ter
percebido muito mais do que conseguiam lembrar. Ou seja, o grau de recordação dos múltiplos
detalhes que são percebidos numa imagem brevemente exposta depende, em grande medida, do
mecanismo atencional que controla o processamento consciente deles.

REGISTO SENSORIAL AUDITIVO

Eventos auditivos, como a compreensão da linguagem, seriam impossíveis se não


tivéssemos a capacidade de reter informações sensoriais sonoras por períodos mais longos do que
sua mera duração física. Portanto, assim como a memória icônica preservou por breves momentos
a informação presente no estímulo visual, a memória ecoica desempenha um papel importante no
armazenamento temporário de estímulos auditivos uma vez que eles tenham desaparecido
fisicamente.

É por isso que a memória ecoica é análoga a uma espécie de "eco" que mantém a
informação sensorial auditiva ativa por breves períodos.

Relatório completo e parcial

Uma vez que o interesse por este campo de trabalho foi posterior, foram adaptadas
técnicas semelhantes às utilizadas na análise da duração da memória icónica: a técnica de atraso
de sinal com reporte parcial e a técnica de mascaramento.

Existem vários trabalhos clássicos em que


experimentos de relatórios parciais foram
projetados para observar a influência que o
atraso do sinal tem na duração da memória ecoica. Esses trabalhos parcialmente relatados são
conhecidos como a técnica do homem de quatro orelhas, descrita na tabela.

O sujeito sentado a uma distância adequada escuta uma sequência de diferentes letras do
alfabeto, que vêm simultaneamente de quatro alto-falantes localizados nos quatro cantos do
laboratório: ou seja, quatro letras coincidem no tempo, cada uma vindo de um alto-falante.

Pois bem, quando se exige que o sujeito relembre o maior número possível de itens
apresentados (ou seja, aplica-se a técnica do relato total) os resultados são muito fracos se
comparados aos obtidos com o relato parcial.

Neste último caso, o acendimento de um dos quatro indicadores ou díodos de luz dispostos
em um painel à frente do sujeito funciona como um sinal e solicita que o sujeito relate
exclusivamente o que foi apresentado por um determinado alto-falante (no exemplo os da frente
esquerda).

Mais uma vez, surge aqui a vantagem do relato parcial sobre o relato total e, seguindo uma
linha de argumentação semelhante à da memória icônica, revela a existência de um
armazenamento ecológico que preserva a informação auditiva por breves momentos de tempo.

Manipulações experimentais

Atraso de sinal (IST de estimulo-sinal):

De forma semelhante ao que foi exposto no estudo do registo icônico, o atraso na


apresentação do sinal em laudo parcial tem efeito perturbador no desempenho dos sujeitos:
atrasos do sinal luminoso de 1 e 2 segundos causam progressiva diminui na execução do sujeito
até que seu desempenho seja igual ao obtido com a técnica de relatório total com atraso de 4
segundos.

Este fato é de extraordinária importância porque parece demonstrar que, usando a técnica
de atraso de sinal no relatório parcial, a vida útil da loja ecoica é significativamente maior que a da
loja icônica: cerca de dois segundos em comparação com os poucos milissegundos que a loja
icônica memória.

Mascaramento:
Essa sobrevivência excessiva do armazenamento ecoico não parece ser demonstrada, no
entanto, usando técnicas de mascaramento retroativo.

Massaro (1970) apresentou a seus sujeitos dois tons para discriminá-los. Um era um tom
alto (870Hz) e o outro era um tom baixo (770Hz) que soava por 20 ms e era seguido por um tom-
máscara, também apresentado por 20 ms e de frequência intermediária (820Hz).

O sujeito deveria responder após a máscara qual dos dois tons havia percebido (alto ou
baixo). O evento mais importante neste experimento foi relacionado ao atraso da máscara em uma
faixa de valores que oscilaram entre os 0 ms e os 500 ms.

Os resultados do trabalho mostraram que a identificação correta dos tons estava


diretamente relacionada ao atraso da máscara: com pequenos intervalos de retardo a máscara
exerceu forte interferência no reconhecimento dos tons, interferência que foi diminuindo
progressivamente à medida que o intervalo de atraso aumentou, causando assim uma melhora no
desempenho do sujeito: após o atraso de 250ms, o desempenho do sujeito experimentou uma
melhora tão grande que fez Massaro pensar que a duração da memória ecoica deveria oscilar em
torno desse valor.

Dados importantes

Os resultados do atraso da mascara num intervalo entre 0 e 500ms, tinham uma ligação
direta com o atraso da mascara: intervalos curtos, tinham uma forte interferência, que diminuía
progressivamente, aumentando o rendimento; a partir dos 250ms o sujeito obteve um grande
rendimento.

Isto levou Massaro a pensar que a duração da memoria ecoica deveria andar a volta desse
valor, no entanto, hoje não é possível falar com certeza sobre a duração do armazenamento
ecoico. Isso se deve à diversidade de técnicas utilizadas e à natureza do material a estimular:
usando a técnica do relatório parcial com atrasos de sinal variáveis foi estimado em cerca de 2
segundos em comparação com a estimativa de 250 ms usando técnicas de mascaramento.

Também a utilização de material de estímulo verbal provoca estimativas de maior


magnitude do que quando se utiliza material não verbal como sons, pois o estímulo da fala verbal
requer maior persistência ecoica para garantir a plena compreensão da fala.
Efeitos de modalidade e sufixo

Suponha que apresentemos nove palavras monossilábicas para serem lembradas


imediatamente. Em uma condição, eles aparecem visualmente em um monitor, enquanto na outra
são apresentados auditivamente.

Os resultados mostram que as pessoas que ouvem as palavras lembram-se das últimas
duas ou três muito melhor do que as pessoas que as veem. O mesmo efeito é obtido se ambos os
grupos veem a lista no monitor, mas um deles é instruído a dizer em voz alta e outro a ler em
silêncio: o grupo que diz em voz alta lembra melhor os últimos itens do que o grupo que lê em
silêncio.

Esse efeito benéfico na memória que a apresentação auditiva tem sobre a visual é chamado
de efeito de modalidade, e é atribuído à existência da memória ecoica onde o eco dos últimos
itens sobrevive no momento da memória.

Agora imagine que apresentamos as mesmas nove palavras auditivamente aos sujeitos
para serem lembradas imediatamente. Terminada a apresentação, podem existir duas
possibilidades: uma chamada sufixo e
outra chamada não sufixo.

Na primeira, após ouvir a


sequência de palavras, os sujeitos ouvem
uma nova palavra (sufixo) indicando que
não devem se lembrar dela e que ela
simplesmente marca o fim da lista.

Na segunda condição, eles não ouvem absolutamente nada apos a sequência de palavras
(não há sufixo).

A recordação aumenta progressivamente à medida que a palavra avança para o final da


apresentação, pois as últimas palavras são mais recentes na apresentação; mas o surpreendente é
que a última palavra da lista é afetada abruptamente quando um sufixo aparece depois dela (linha
azul), algo que não acontece na condição sem sufixo (linha vermelha).

Essa interferência causada pela última palavra tem sido chamada de efeito do sufixo, e foi
demonstrado, como em estudos anteriores, que a interferência do sufixo tende a desaparecer à
medida que aumenta a demora em sua apresentação (com o atraso da sua apresentação).
Esses resultados são importantes, pois a presença de interferência na condição de sufixo,
em oposição à ausência na condição de não sufixo, tem sido interpretada a partir das propriedades
físicas dos estímulos: a palavra do sufixo atua como uma máscara em relação ao conjunto de
estímulos e o efeito de mascaramento se deve à semelhança acústica.

De facto, se ao invés de usar uma nova palavra, o sufixo for um som, o efeito do sufixo
desaparece. Da mesma forma, se o sufixo aparecer visualmente em uma tela, também não
interfere; se a voz que pronuncia a palavra-sufixo for diferente da relatada na lista, o efeito existe,
mas é menor.

O que esses dados estão nos dizendo? Simplesmente que, na memória ecoica, prevalece
um tipo de código sensorial ou pré-categórico que atende exclusivamente a características ou
traços físicos, de forma semelhante ao que aconteceu na memória icônica: apenas a palavra que
atua como sufixo causa interferência, pois fisicamente tem semelhança acústica com as palavras
apresentadas no conjunto de estimulação, não ocorrendo com um simples tom auditivo, daí a
memória ecoica ter sido entendida como um armazenamento acústico pré-categorial.

Não podemos estabelecer uma analogia completa em termos de propriedades e


funcionamento entre memória icônica e ecoica, pois evidências empíricas parecem indicar que
este último interage ou requer a participação em maior grau de outras estruturas de
armazenamento de informações e, muito especificamente, de memória operacional de curto prazo
cujas propriedades iremos expor no próximo tópico.

Memória de curto prazo e memória de trabalho ou operativa

O conceito de memória de curto prazo sofreu uma evolução teórica desde sua formulação
estrutural no modelo modal, na forma de ACP, até sua consideração atual em termos de memória
de trabalho. Para dar ao leitor uma ideia da importância desse sistema de memória, alguns
pesquisadores chegaram a afirmar que a memória de trabalho é a conquista mais significativa da
evolução mental humana.

Não surpreendentemente, alguns teóricos atuais, entendem que a memória de trabalho


nada mais é do que uma simples ativação de conteúdos parciais do MLP.
PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS BÁSICOS

Normalmente, os experimentos que avaliam a aprendizagem e a subsequente memória do


material apresentam uma estrutura geral composta por duas fases: uma primeira fase,
denominada aprendizagem ou fase de apresentação do estímulo, e uma segunda fase,
denominada avaliação da retenção.

Durante o período de aprendizagem, os


sujeitos recebem um determinado material
(palavras, sílabas sem sentido, números, pares
associados...), cuja memória é medida na fase
seguinte, seja pela contagem das respostas
corretas, seja pela contagem das respostas
corretas e dos erros. Ambos os períodos podem ocorrer em sucessão imediata ou um intervalo de
tempo de atraso variável pode ser introduzido entre eles (de segundos a dias pares).

Dentro deste desenho geral, tem sido utilizada uma série de variantes ou técnicas
experimentais, tanto na forma como a informação vai ser apresentada na fase de aprendizagem
como na forma utilizada para avaliar a retenção da matéria.

Fase 1- Apresentação estimulante:

A apresentação da informação ou material em estudo adota classicamente duas


modalidades: estímulos seriados e pares associados:

- Na aprendizagem serial, como o nome sugere, são apresentadas listas ou séries de itens
compostas por palavras, letras, dígitos ou sílabas sem sentido, com o objetivo de serem
posteriormente, na fase de avaliação, lembradas ou reconhecidas;

-Por sua vez, a aprendizagem dos pares associados é constituída por uma sequência de
pares de palavras ou sílabas, onde o primeiro termo atua como estímulo e o segundo como
resposta (CASA-flor, RELÓGIO-livro...) . Na fase de retenção, são apresentados apenas os estímulos
(CASA. -... RELÓGIO-...) e o sujeito deve emitir a resposta correspondente que lhe foi associada (...-
flor...-livro);

Fase 2- Modalidades de avaliação da retenção:


Dois procedimentos diferentes têm sido usados para avaliar a retenção: recordação e
reconhecimento.

 Recordação
Na evocação, o sujeito deve reproduzir o conjunto de itens apresentados da melhor
forma possível, com três modalidades principais: evocação livre, evocação seriada e
evocação marcada.
-Na recordação livre, o sujeito deve reproduzir os itens estudados na ordem que
desejar.
-Na recordação serial, ele deve comunicá-los na mesma ordem em que foram
apresentados.
-Por fim, na modalidade de recordação marcada, são fornecidos ao sujeito, durante
a fase de retenção, sinais ou pistas que auxiliam ou facilitam a recuperação de
informações, como quando é indicado o nome da categoria à qual pertencem os
itens a serem lembrados. lista de aprendizado: ANIMAIS- vaca, gato, elefante...

Observe também que avaliar a retenção usando pares associados constitui um tipo
de memória sinalizada, pois o termo estímulo constitui o sinal para a recuperação
da resposta correspondente.

 Reconhecimento
Esta técnica varia o procedimento usado para avaliar a memória ou retenção do
sujeito. Os itens estudados na fase de aprendizagem são chamados de itens
antigos, e devem ser corretamente discriminados na fase de retenção de outros
itens adicionados chamados novos itens que atuam como distratores. Um exame
tipo teste com alternativas de resposta nada mais é do que uma situação de
avaliação da aprendizagem por reconhecimento.

A importância da aprendizagem alternativa


Um dos aspetos mais importantes, principalmente com vistas ao estudo do esquecimento
como veremos, é a influência que o aprendizado de algumas listas exerce sobre outras. Essa
influência é chamada de transferência.

A transferência é positiva quando um determinado material ou lista aprendida favorece a


aquisição ou retenção de outro, e inversamente diz-se que é negativa quando um determinado
material ou lista dificulta ou interfere na aprendizagem ou retenção de outro. A transferência
negativa é a base das teorias de interferência para explicar o esquecimento.

Dois tipos de projetos básicos foram usados no estudo de transferência: o projeto de


retroação e o projeto de proação.

O design de retroação permite estudar os


possíveis efeitos de transferência que uma lista
aprendida posteriormente (lista Y) exerce sobre
outra lista aprendida anteriormente (lista X).
Chama-se designs de feedback porque se destina a
analisar os possíveis efeitos de transferência
retroativa da lista Y na lista X.

Alternativamente, o designs de proação


permite estudar os possíveis efeitos de
transferência que uma lista previamente aprendida (lista Y) exerce sobre outra segunda lista
aprendida posteriormente (lista X). Neste caso, trata-se de proação porque se pretende analisar os
efeitos proativos (anteriores) que o estudo da lista Y tem sobre a lista X.

Em ambos os tipos de delineamento, diz-se que há efeitos de transferência quando o


desempenho de memória do grupo experimental difere significativamente daquele obtido pelo
grupo de controle, desde que este último esteja livre da influência de listas alternativas. Se os
efeitos da lista Y sobre a X exercem uma influência negativa sobre a memória, então falamos de
efeitos de interferência retroativos ou proativos, dependendo do design utilizado.

A interferência entre materiais tem sido uma das explicações clássicas para o
esquecimento.

DIFERENCIAÇÃO FUNCIONAL ENTRE SISTEMAS DE MEMÓRIA


DIFERENCIAÇÃO DO MODELO MODAL: ACP vs. ALP

Usando uma analogia, a memória transitória de curto prazo (STM), podemos vê-la como
uma espécie de mesa ou secretária onde depositamos as informações necessárias para realizar a
tarefa que se impõe naquele momento. Portanto, também nos referiremos a ela como memória
de trabalho (OM). Por sua vez, a memória permanente de longo prazo (MLP) é análoga a um
arquivo enorme onde as informações são armazenadas e organizadas com alta precisão, caso
contrário a recuperação dos dados seria praticamente impossível.

Recorrendo ao conceito genérico de MCP e MLP. Entendemos que a dissociação entre


ambas está em admitir um sistema de memória de trabalho de curto prazo que guarda
informações em uma mesa mental metafórica, na medida em que está sendo utilizada para realizar
uma tarefa, e uma memória permanente de longo prazo. que tem todas as informações que
adquirimos em nossas vidas. Esse contraste entre sistemas de memória tem evidências
abundantes, não apenas no campo experimental, mas também no campo neurofisiológico e
clínico.

Evidências neurofisiológicas

Sabemos que Hebb (1949) postulou a existência de dois tipos diferentes de circuitos
neurais constituídos por conexões que poderiam desempenhar um papel relevante na
aprendizagem e na memória humana: montagens celulares transitórias e conjuntos de células
permanentes.

Os primeiros são caracterizados por serem ativados apenas durante o tempo em que há
interação entre os neurônios, por isso são natureza transitória e decadência ao longo do tempo, à
semelhança do que acontece com a informação armazenada no MCP.

Por sua vez, os conjuntos permanentes são constituídos por circuitos celulares estáveis ao
longo do tempo, que podem ser responsáveis pelo armazenamento perene de informações a longo
prazo.

A organização hierárquica e funcional do sistema nervoso não parece indicar que a


memória dependa de centros nervosos isolados ou, exclusivamente, de um único centro cerebral.
É verdade que, através do estudo de lesões cerebrais que causam problemas de amnésia em
pacientes, descobriu-se a enorme importância da amígdala cerebral, e especialmente do
hipocampo e do neocórtex, nos processos de armazenamento de informações.

A limitada sobrevivência temporal do MCP pode estar relacionada não tanto a mudanças
morfológicas ou plásticas permanentes nos neurônios, mas sim à criação momentânea de redes ou
circuitos neuronais fechados, compostos de células que fazem sinapse entre si.

Por sua vez, os correlatos neurofisiológicos do MLP estariam mais relacionados a alterações
neuronais permanentes de natureza morfológica ou plástica que garantiriam a sobrevivência da
informação ao longo do tempo.

Evidencia clínica

No campo clínico, observações em pacientes com lesão cerebral corroboram a distinção


entre uma memória imediata e uma permanente. Dois efeitos contrários foram observados que
parecem refletir um déficit, seja em MLP ou em MCP.

Simplificando, em alguns casos o paciente que sofre de amnésia esquece experiências


anteriores ao momento da lesão, lembrando-se perfeitamente da informação imediatamente
apresentada (por exemplo, uma tarefa de aprendizado serial com recordação imediata). Esse
déficit é chamado de amnésia retrógrada.

Em outros casos, o quadro é o oposto, pois os pacientes têm problemas para lembrar
informações recentemente apresentadas, após a lesão (especificamente, déficits na capacidade de
MCP), embora a memória de eventos passados anteriores ao momento da lesão esteja correta,
indicando que a longo prazo loja permanece relativamente intacta. Esse déficit é chamado de
amnésia anterógrada.

Evidencia experimental

1- Diferenciação funcional entre sistemas de memória em curvas de posição serial

Admitir cientificamente uma distinção entre um sistema transitório de memória de


trabalho de curto prazo e um sistema de memória permanente de longo prazo requer evidências
abundantes.

Um fenômeno observado desde a década de 20 do século passado é o que está


representado nas chamadas curvas seriais de posição. Suponha um experimento no qual os
sujeitos são apresentados a uma longa lista de estímulos (por exemplo, 20 palavras) e a recordação
livre imediata é necessária.

O eixo das abcissas indica a posição do


item na lista (primeiro, segundo... enésimo),
enquanto o eixo das ordenadas indica a
probabilidade de rechamada correta.

Em A observa-se que a taxa de evocação é


melhor para o primeiro e último itens da lista do
que para aqueles localizados em posições
intermediárias.

A taxa de recordação mais alta dos


primeiros itens da lista foi chamada de efeito de
distância ou primazia (sombreamento RN em azul)

A taxa de recordação mais alta dos últimos itens é chamada de efeito de proximidade ou
recência (sombreado em laranja).

Esses dois efeitos foram entendidos como uma dissociação experimental entre dois tipos
diferentes de memória. Entende-se que a taxa de recuperação mais alta dos primeiros itens se
deve à sua recuperação direta de um sistema MLP. Não é de surpreender que, por serem os
primeiros estímulos a aparecer na lista, parece intuitivo a priori pensar que, para garantir sua
recordação posterior, os sujeitos os estudam e repetem mais vezes do que os demais, o que faz
com que sejam transferidos mais provavelmente para o sistema a longo prazo.

Por sua vez, a alta taxa de recordação dos últimos itens se deve ao fato de estarem sendo
recuperados diretamente de um sistema MCP, onde ainda permanecem ativos por serem revistos
mentalmente ou repetidos no futuro mesmo momento da recuperação, e onde não tenham
recebido interferência de qualquer tipo para itens subsequentes.

2- Tarefa de carga simultânea

Suponha que forçamos uma amostra de sujeitos a realizar uma tarefa que consiste em
cancelar letras, de forma que os sujeitos devem circular todas as vogais que aparecem em uma
lista (tarefa principal). No entanto, vamos complicar o seu trabalho e pedir-lhes, ao realizarem esta
tarefa principal, que repitam continuamente em voz alta uma série de dígitos que podem variar de
0 a 9 (tarefa concorrente ou secundária). Observe que o intervalo de dígitos selecionado não é
aleatório, mas obedece a uma suposição teórica: se nosso intervalo ou intervalo imediato de
memória de curto prazo tiver um máximo de cerca de 9 itens, como afirmou Miller, parece lógico
supor que quanto maior o número de dígitos repetidos em voz alta, maiores devem ser os erros
cometidos pelos sujeitos na tarefa principal de raciocínio.

Porquê? Simplesmente porque, sendo o MCP entendido como uma estrutura limitada em
termos de capacidade, quanto mais dígitos se repetirem em voz alta, maior será a ocupação, o que
obviamente terá de interferir ou fragilizar o rendimento obtido na tarefa principal. Isso é, pelo
menos, o que foi hipotetizado até que foi
observado empiricamente que não era assim.

A tabela mostra um padrão típico de


resultados neste tipo de tarefa, que é
chamada de tarefa de carga simultânea.

À medida que o número de dígitos


repetidos em voz alta (abcissas) aumenta, o tempo que a tarefa leva o cancelamento principal é
aumentado (linha azul referente à ordenada Y |).

Porem, os erros cometidos na referida tarefa (barras referidas à ordenada Y,) permanecem
praticamente estáveis e em percentagem mínima, independentemente do número de dígitos que
são repetidos em voz alta.

Estes resultados são aparentemente contraditórios a um sistema MCP com capacidade


limitada, como uma estrutura unitária ou recetáculo, e parecem sugerir que o conceito clássico de
MCP é um rótulo genérico que pode englobar vários subsistemas ativos de processamento de
informação.

MEMÓRIA DE CURTO PRAZO

A importância da revisão

Em uma tarefa de memória imediata, o processo de repetição ou revisão cumpre um duplo


objetivo.

A primeira é manter a informação recirculando e, assim, evitar que o esquecimento se


deteriore. A deterioração é o esquecimento causado como consequência da deterioração sofrida
pelo traço da memória cerebral com o passar do tempo: quando não é usado, ele se deteriora
progressivamente. Consequentemente, o processo de repetição faz com que a informação
recircule continuamente e, assim, evita sua perda.

O segundo objetivo da revisão está relacionado aos mecanismos de transferência entre


MCP e MLP, pois também percebemos que existe uma relação direta entre o grau de repetição de
um material e a probabilidade de armazenamento permanente: quanto maior o número de vezes
que um material é repetido em maior medida, seu armazenamento a longo prazo é reforçado.

Em conclusão, o processo de repetição no modelo modal evita o esquecimento por


decaimento e, além disso, garante a transferência de informações para um sistema permanente de
longo prazo.

O número mágico 7 +/- 2

Miller (1956), em vários atos científicos, afirmou que durante anos foi perseguido por um
número e, realmente, 7 + 2 constitui um marco na psicologia da memória.

Na tabela em B, podemos
representar graficamente seu intervalo de
memória imediato como uma sucessão de
sete células dentro das quais a pessoa
armazenaria as informações de forma que
cada um dos itens apresentados ocupasse uma posição.

Desde que o número de itens a serem lembrados possa ser localizado na caixa, não
haverá problemas de recordação, porém estes começarão a aparecer com números maiores de
itens. Agora suponha a sequência alternativa inferior que aparece em azul com quinze dígitos.
Seguro de que essa pessoa vacilará e, na melhor das hipóteses, atingirá sete dígitos de
memória.

Sete caixas não são suficientes para acomodar quinze números, pois no máximo, cobriria
sete, que é seu intervalo de memória. Agora, nosso amigo é intuitivo e recorre a usar regras
mnemônicas. A sequência de quinze dígitos é agrupada de tal forma que agora ocupa apenas
cinco posições de memória imediata: 1492, 91, 10, 132, 2001.

O que essa pessoa faz é recodificar ou agrupar as informações em unidades que sejam
significativas para ela. E essa, justamente, é a observação mais relevante de Miller, que
demonstrou como a limitada capacidade física do MCP poderia ser superada por meio de um
processo chamado chunking (agrupamento ou recodificação).

O processo de agrupamento consiste justamente em recodificar e, assim, agrupar os itens


em unidades de informação de ordem superior, de forma que, mantendo-se constante a
amplitude física de armazenamento em cerca de 7 itens, aumenta-se a capacidade informativa
de cada um deles.

Para Miller a capacidade do MCP é de cerca de 7 chunks aproximadamente, que pode


conter maior ou menor grau de informação: a sequência T-E-S-X-A-I-S pode ser lembrada como
uma série desconexa de sete chunks ou como um único clunk contendo a informação EXTASIS
(neste último caso, restariam ainda seis células livres), ou seja, cada uma de nossas caixas MCP
hipotéticas corresponderia a um pedaço ou unidade de informação.

O processo de agrupamento é importante porque distingue entre capacidade de


armazenamento físico e capacidade de informação do MCP. A capacidade física de o
armazenamento de curto prazo, conforme contemplado no modelo modal, manteve-se
constante e foi estimado em cerca de sete itens ou clunks (7 + 2, dependendo das pessoas e
situações), que constituem o intervalo de memória imediata (o número de armários); no
entanto, a capacidade informativa pode ser aumentada agrupando ou recodificando em
unidades superiores.

Ou seja, há independência entre o número de itens ou pistas que compõem o intervalo de


memória imediata e a quantidade de informações que cada um contém um item, ou o que é o
mesmo, entre a capacidade de armazenamento físico, que permanece relativamente
constante, e a capacidade de informação que pode ser aumentada por agrupamento ou
chunking.

Mas, além disso, esses resultados são importantes por um segundo motivo adicional.
Quando indicamos que a memória do número 1 4 9 2 seria perfeita para quase todos os
sujeitos, certamente o é porque constitui uma data significativa como a descoberta da América
por Colombo.

Usando informações significativas (conhecimento de eventos históricos ou eventos ligados


à sua própria experiência), os itens são reagrupados na memória imediata, indicando que
existem vínculos estreitos entre esse sistema e a memória permanente de longo prazo, de
forma que a informação significativa depositada nesta última facilita a recordação da primeira.
Ou seja, a dualidade entre os sistemas não exclui de forma alguma os vínculos estreitos
entre os dois, o que é indicativo do funcionamento ativo e coordenado do sistema cognitivo
humano.

MEMÓRIA OPERACIONAL (TRABALHO)

Nas últimas décadas, o MCP tem sido entendido como um mecanismo complexo que opera
diretamente sobre a informação e exerce um controle muito importante sobre o processamento. O
conceito tradicional de MCP como armazenamento unitário deu lugar ao de memória de trabalho
(MO).

No estudo do MO, há apenas um consenso entre os pesquisadores, que é que o MO é


acionado diante de qualquer situação habitual que exija compreensão, raciocínio ou aprendizado.
Durante esse processamento, as informações não devem apenas ser mantidas ativamente, mas
também manipuladas. Portanto, o MO é aquela mesa mental na qual depositamos todas as
informações necessárias para executar as demandas que uma tarefa cognitiva exige em um
determinado momento.

Embora haja um certo consenso na última afirmação, o mesmo não ocorre quando os
pesquisadores enfrentaram a árdua tarefa de oferecer uma descrição a todos os mecanismos
envolvidos no que chamamos de MO.

MODELO DE MEMÓRIA OPERACIONAL MULTI-COMPONENTE

Com base no trabalho pioneiro, o grupo de Baddeley desenvolveu um sofisticado modelo


multicomponente que, sem dúvida, tem sido o foco de atenção há anos. Mais recentemente, o
modelo de Baddeley está sendo criticado em alguns aspetos, o que deu origem à sua extensão ou
desenvolvimento de modelos totalmente diferentes.

Como pode ser visto nesta descrição geral,


a MO é composta por um sistema denominado
executivo central e dois sistemas escravos: o loop
fonológico e a agenda visoespacial.
O executivo central é geralmente entendido como um sistema de IP limitado em termos de
recursos, que atua em qualquer tarefa necessária.

A alça fonológica mantém a informação em um armazenamento fonético por curtos


períodos (cerca de dois ou três segundos), mas pode ser mantida ativa por um processo
articulatório de revisão subvocal ou fala interna. Alguns trabalhos estimam que a alça fonológica
pode manter cerca de três itens recirculando ao mesmo tempo, o que coincidiria com as
observações feitas a respeito do número 4+1.

Da mesma forma, a agenda visuoespacial lida com material em código pictórico e espacial.

O executivo central

Embora pareça paradoxal, e apesar de ser o núcleo do sistema, o executivo central é


provavelmente o componente menos compreendido, dada a dificuldade de conceituação. Sua
análise detalhada foi realizada por um curto período. Longe de ser considerado um homúnculo ou
sistema que atua de forma inespecífica e sem valor explicativo, as poucas pesquisas realizadas a
esse respeito parecem apontar para a ideia de que o executivo é uma espécie de CPU ativa com as
seguintes características:

 O executivo é um sistema isento de modalidades sensoriais (trata informações


visuais, táteis, auditivas...), e tem recursos limitados que são lançados antes das
várias tarefas mentais que são exigidas das pessoas em um momento específico. É
considerado que tem ligações estreitas com o controle dos mecanismos de atenção,
a manipulação mental de informações e a recuperação e/ou transferência de
informações de ou para o MLP;

 -Originalmente, entendia-se que a central executiva era um sistema que tinha


capacidade limitada de armazenamento, como uma estrutura. No entanto,
atualmente a possibilidade de atuar como armazenamento temporário de
informações;

 - Os recursos do executivo central podem ser cedidos a qualquer um dos outros dois
sistemas escravos (a agenda ou o loop) para garantir que as tarefas que executar
são executados com mais agilidade;
 -Por fim, outra de suas missões é exercer controle sobre os outros dois sistemas
subordinados: a alça fonológica e a agenda visuoespacial. A forma de exercer esse
controle não é bem conhecida até o momento;

Apesar destas propostas de Baddeley e dada a escassez de evidência empírica, alguns


investigadores têm vindo a afirmar a ausência de um executivo central unitário, como é o caso é
descrito no modelo MO (Parkin, 1998).

Hoje, com os dados empíricos disponíveis, não é possível tomar uma decisão precisa a esse
respeito e, corroborando essas observações, Baddeley e Logie admitem a possibilidade de que o
executivo central não é um mecanismo tão unitário como se pensava originalmente e é, em vez
disso, composto de vários sistemas especializados.

A alça fonológica ou memória de trabalho verbal (MOVB)

A principal missão da alça fonológica é reter informações em um código verbal e é


frequentemente chamada de memória de trabalho verbal (MOVB). Trabalhos recentes vêm
demonstrando que a alça fonológica é um sistema constituído por dois mecanismos: um
armazenamento fonológico e um processo de controle articulatório.

O armazenamento fonológico contém um registo fonológico muito curto (não mais do que
alguns segundos) de informações apresentadas em qualquer formato (não apenas auditivo, mas
também visual e possivelmente tátil...) desde que seja traduzido para um código fonético (por
exemplo, ler palavras apresentadas visualmente).

Por outro lado, o processo articulatório é um sistema de repetição subvocal ou fala interna,
que permite que o traço auditivo registado no armazém se prolongue no tempo fonológico.

Esta dupla distinção no MOVB advém dos resultados obtidos em várias tarefas
experimentais que analisaram fenómenos de semelhança fonética ou comprimento de palavras.

Muitos pesquisadores entendem que o papel da alça fonológica desempenha um papel


muito importante durante os primeiros anos de vida. Parece que o bom funcionamento do loop é
um requisito necessário para a aquisição de hábitos de leitura. Da mesma forma, descobriu-se uma
relação direta entre o nível de vocabulário com que a criança lida e sua pontuação nos testes de
memória verbal, de forma que um déficit na alça fonológica pode dificultar o aprendizado de novas
palavras.

-Experiência da tarefa da carga simultânea a partir de 3 digitos

Os primeiros trabalhos de Baddeley e Hitch faziam o intervalo de memória imediata


depender da alça fonológica, daí a real capacidade de armazenamento físico de curto prazo,
entendida como memória de trabalho e avaliada pelo intervalo de memória imediata pura, ou seja,
sem a participação de estratégias mnemônicas como chunking ou codificação semântica, ela oscila
em torno de 3 itens.

Este intervalo de cerca de 3 itens corresponderia aproximadamente aqueles que são


retidos passivamente, portanto, extensões de memória mais altas, de cerca de 7 itens, implicam o
início de processos de controle ativo pelo sujeito, que implicam o desempenho de grande parte
dos recursos do executivo central e que podem causar deterioração naquelas tarefas que os
requerem.

A agenda visuoespacial ou memória de trabalho visuoespacial (MOVS)

A agenda visuoespacial ou memória de trabalho visuoespacial (MOVS) é o sistema


responsável por representar a informação visual e espacial. Trabalhos recentes mostram que,
longe de ser um estrutura unitária, parece ser constituída por um sistema visual (o cache visual) e
outra agenda visuoespacial.

O primeiro estaria ligado ao processamento de formas e padrões visuais (pictórica) e


representaria o quê (forma, brilho, cor…), enquanto a segunda seria especializada no
processamento de localização (espacial). Deve entender-se a segunda como semelhante ao
processo articulatório de repetição encoberta da memória operativa verbal.

À semelhança do que aconteceu no loop fonológico, entende-se agora também que um dos
dois componentes, especificamente o visual, seria semelhante a uma estrutura de armazenamento
(daí o cache visual), enquanto o espaço componente deve ser entendido como um processo de
repetição semelhante ao processo articulatório de repetição subvocal do MOVB (daí o escriba
interno).

A dissociação entre ambos os componentes foi obtida em tarefas de carga simultânea em


que as tarefas primárias e secundárias participam do mesmo componentes para verificar a
interferência de um sobre o outro.

Conclusões

Resumindo o exposto, o grupo de Baddeley, defende a necessidade de se contemplar um


sistema de tratamento ativo no processamento da informação, estabelecendo-se como um dos
elementos centrais do sistema cognitivo humano.

O MO é um sistema formado por vários componentes, cada um especializado em um tipo


específico de função. Alimenta-se de informações tanto dos RSs quanto do MLP, com os quais
realiza transferências contínuas de informações. Além disso, este modelo é estrutural e funcional.
É estrutural porque admite no sistema determinados componentes que armazenam a informação
e cuja capacidade é limitada; lembre-se, por exemplo, do armazenamento fonológico ou do cache
visual. Também é funcional porque o MO é um sistema que executa e controla continuamente o
processamento de informações em tarefas cognitivas complexas.

Supõe-se que MO esteja envolvido em qualquer tipo de atividade mental imediata:


aritmética, compreensão linguística ou tarefas de raciocínio e pensamento em geral. Ou seja, o MO
não é um simples armazenamento de informações, mas sim um sistema funcionalmente ativo
durante o processamento cognitivo.

No entanto, apesar de o modelo multicomponente de Baddeley continuar a marcar o que


poderíamos chamar de linha oficial de trabalho no estudo da MO - por ter amplo suporte
experimental e clínico, recentemente baseado em técnicas de neuroimagem existem algumas
propostas alternativas que coletam observações interessantes, entre eles, paradoxalmente, a falta
de envolvimento do MO em determinadas tarefas cognitivas.

O modelo do encaixe (modelo da MO)

Cowan (1995, 1999) entende que o conceito de OM de Baddeley é um artefacto simples


derivado das tarefas experimentais utilizadas (as de carregamento simultâneo, por exemplo). O
MO não deve ser entendido como uma entidade teórica diferente do MLP com o qual manteria
conexões recíprocas, como sustenta Baddeley. Pelo contrário, o que se chama de MO nada mais é
do que um complexo mecanismo de PI que reside no próprio MLP, e cujo funcionamento está
intimamente ligado aos mecanismos atencionais.

Ao se depararem com uma


determinada tarefa que é exigida das
pessoas, elas ativam as informações
necessárias para sua execução no MLP
(amarelo). Esse conhecimento é explorado por
um executivo central que direciona a atenção para eles na forma de um foco atencional (círculo
azul). Aprecie a natureza aninhada do modelo de Cowan: o MLP tem todo o conteúdo;

Parte desses conteúdos são ativados pelas demandas de uma tarefa e, dentre estes, alguns
são selecionados por um foco atencional dirigido por um sistema executivo, que passaria a fazer
parte da consciência imediata do indivíduo.

O conceito de MO de Cowan depende da ativação do conhecimento permanente do LTM.


Assim, Cowan entende que os MO residem dentro de um mesmo MLP, pois não passam de
conteúdos deste último que são ativados e podem acessar a consciência do indivíduo se o foco
atencional for direcionado a eles.

Assim como podemos criar discos virtuais na memória RAM do computador que deixam de
existir quando o desligamos, o conteúdo do MLP ativado deixa de existir quando as demandas da
tarefa mudança ou uma tarefa cognitiva diferente é realizada. Por esse motivo, Cowan às vezes
rotulou a memória virtual de curto prazo de OM.
De referir ainda que o modelo contempla uma ligação a um sistema anterior de RS.
Novamente, de acordo com o apontado por Potter, há uma ligação direta entre os RSs e o MLP,
sem a necessidade de postular estruturas mnésicas intermediárias como um MCP transitório, já
que o OM agora se reduz a uma simples ativação de longa duração. termo conhecimento.

Um fato interessante desse modelo é que alguns conteúdos dos RSs, ao acessar o MLP,
podem ser ativados e exigir a atenção imediata do sujeito: no desenho esse fenômeno seria
representado pela seta com um ponto que acesse o foco atencional.

Este modelo seria, em grande parte, coerente com a observação de Potter sobre o papel do
MCP-C como um sistema mnésico categórico quando confrontado com tarefas que requerem um
PI de alta velocidade.

MEMÓRIA DE LONGO PRAZO

Um disco rígido de computador é um mecanismo de armazenamento magnético que retém


informações, independentemente de o computador estar ligado ou desligado. Da mesma forma,
na cognição humana, entendeu-se que existe um sistema permanente de armazenamento de
informações, onde são depositados todos os conhecimentos e conhecimentos que adquirimos ao
longo de nossas vidas. Na verdade, quando falamos da nossa boa ou má memória no dia a dia,
Estamos nos referindo a esse sistema de armazenamento que tem sido chamado de memória de
longo prazo (MLP).

Em alternativa ao exemplo do número de telefone onde a informação é guardada


temporariamente outros exemplos que ilustram a funcionalidade do MLP, como o conhecimento
da sua idade, a data do seu nascimento... Mas além disso, nesse sistema mnésico há informações
referentes ao tipo de conhecimento adquirido e exigido para dirigir um veículo, andar de moto,
abrir uma porta, operar um liquidificador, tecer um lenço por renda de bilro e uma infinidade de
outras habilidades necessárias na vida diária que não têm tanto a ver com saber o quê, mas com
saber como. Ou seja, o MLP contém conhecimento declarativo (o que?) e conhecimento
procedimental (o como).

A memória de longo prazo, é o sistema mnésico a que nos referimos quotidianamente


quando falamos de memória, comtemplada como um sistema que não tem limites de capacidade
e aplica prioritariamente os códigos semânticos no armazenamento da informação, sem descartar
os fonéticos e os espácio-temporais, cujos conteúdos podem sobreviver ao longo do tempo.

Caracterização clássica da MLP no modelo modal

Tradicionalmente, a caracterização do MLP tem sido feita em oposição ao MCP, como


consequência da inspiração no modelo modal. No capítulo anterior, apresentamos as evidências
neurofisiológicas (circuitos permanentes e transitórios), clínicas (amnésia para eventos passados,
mas recordação imediata perfeita, ou vice-versa) e experimentais (curvas de posição serial) em
favor de uma dissociação entre dois sistemas de memória, um transitório e um outro permanente.

O contraste entre os dois foi caracterizado levando em conta uma série de propriedades,
como a codificação que prevalece em cada um deles, a capacidade de armazenamento e a duração
ou tempo que são mantidas informações antes que sejam esquecidas ou perdidas.

Codificação

Uma das consequências do modelo modal, para estabelecer uma clara distinção entre
armazéns, foi entender que um tipo de código acústico enquanto no MLP a informação foi
codificada semanticamente. Esta dissociação foi uma simplificação excessiva, porque hoje é
evidente que ambos os tipos de código são aplicáveis nos dois sistemas.

Embora seja verdade que o uso de códigos semânticos que dão sentido ao material
armazenado no MLP favorece a organização e estrutura do mesmo, não é menos verdade que nele
também localizamos o conhecimento da linguagem, o que nos obriga a admitir a necessidade de
códigos acústicos em MLP; e até espacial e visual, já que temos conhecimento de habilidades
manipulativas – dirigir um veículo – cujo conhecimento pode ser representado em um formato que
não é estritamente semântico.

Portanto, a multiplicidade na codificação é agora entendida como uma característica de


vários sistemas de memória. O fato de tradicionalmente se tentar ligar o acústico com o MCP e o
semântico com o MLP foi consequência dos procedimentos experimentais utilizados nos
laboratórios, onde inúmeras tarefas de MCP exigiram a recuperação imediata do material,
evitando assim que os sujeitos apliquem estratégias semânticas em sua codificação. No entanto,
quando essa possibilidade lhes é oferecida, dando-lhes tempo suficiente, eles tendem a recorrer a
eles com frequência: lembre-se do truques mnemónicos ou como o intervalo de memória imediata
pode ser estendido informativamente por meio de fragmentação.

A verdade é que o tipo de codificação interfere definitivamente na qualidade do


armazenamento, pois e tao importante que e muito mais decisivo para a aprendizagem e para a
retenção do que a própria intencionalidade ou a motivação.

Capacidade

A segunda propriedade que define a MLP refere-se a sua capacidade de armazenamento,


deixando claro que esta estrutura de memória possui capacidade ilimitada. Essa capacidade
ilimitada define uma das peculiaridades do armazém de longa permanência, que é o alto grau de
organização que o armazém deve apresentar para as informações ali depositadas. Se o MLP
abrange todo o conhecimento que um indivíduo acumula ao longo de sua vida, deve haver
mecanismos organizacionais que agem de forma semelhante ao que acontece em um escritório,
onde os vários arquivos com informações devem ser classificados corretamente para uma
localização rápida.

A MLP armazena conhecimento de eventos na vida do indivíduo. Por isso, é importante


perceber que as informações armazenadas são variadas e que todas elas devem estar disponíveis
com um grau de organização tal que permita a sua coexistência e acesso rápido. Como tal, a nossa
MLP parece distinguir os conhecimentos, facilitando assim o acesso a informações de outra
natureza: o conhecimento do dia do meu nascimento ocupará um sistema MLP diferente daquele
ocupado pelo conhecimento das formas verbais necessárias para produzir o linguagem.

Duração

Entende-se que a MLP é um sistema de armazenamento permanente, pois o seu conteúdo


é mantido durante toda a vida do indivíduo, pelo menos, os psicólogos assumem que, descartando
a degeneração neuronal ou possíveis lesões cerebrais, as informações inseridas na MLP não
costumam ser perdidas.

Essa afirmação à primeira vista pode surpreender, em inúmeras ocasiões, não é capaz de se
lembrar de determinado fato ou evento. Nesse sentido, vários pesquisadores sustentam que o
esquecimento que ocorre no MLP não é tanto um fenômeno ou problema de perda ou decaimento
de informação, como ocorreu nas memórias sensoriais e no MCP, mas sim que estaria mais
intimamente ligado á codificação ruim ou um problema de recuperação ou acesso.

Codificação semântica vs. Codificação estrutural

Numerosos trabalhos experimentais têm demonstrado, direta ou indiretamente, a


superioridade da codificação semântica em relação à codificação simplesmente estrutural (física
ou fonética) na memória ou reconhecimento de informações. Agora suponha a seguinte
configuração experimental: uma amostra de sujeitos deve julgar o mais rápido possível se duas
cartas apresentadas simultaneamente são iguais ou diferentes, e avaliamos o TR.

Vamos criar três condições experimentais diferentes: na condição de identidade física os


sujeitos devem julgar se as letras apresentadas são iguais em características físicas, por exemplo
(E-E). Na condição de identidade fonética, eles devem julgar se ambas as letras foram
pronunciadas da mesma forma, independentemente de seus gráficos, por exemplo (E-e).
Finalmente, na condição de identidade semântica, os sujeitos devem julgar se ambas as letras são
igualmente vogais ou igualmente consoantes: por exemplo, (E-A) corresponderia à mesma
resposta (ambas as vogais), enquanto (E-C) seria uma resposta diferente (vogal e consoante).

Para executar a tarefa corretamente em cada uma das condições, um código diferente
deve ser aplicado: a primeira condição envolve codificar fisicamente as informações usando o
formulário; a segunda exige o recurso a um código fonético; finalmente, a terceira demanda dos
sujeitos para fazer um julgamento de categorias semânticas a fim de determinar se os estímulos
apresentados pertencem à mesma ou a diferentes categorias (vogais ou consoantes).

Esse arranjo experimental corresponde a um trabalho clássico de Posner.


Os sujeitos são muito mais rápidos na condição de identidade física, aumentam na fonética
e atingem o pico na semântica. Esse aumento progressivo do tempo de reação nada mais é do que
um indicador das demandas de IP da tarefa:

 Na condição de identidade física basta processar os (traços sensoriais) recursos


sensoriais (linhas, conexões ou interseções) portanto basta codificar a informação
em uma superfície nível que consome pouco tempo.
 Por sua vez, a condição de identidade fonética implica (codificação acústica)
demandas intermediárias de processamento ao aplicar uma codificação acústica.
para verificar se as letras são semelhantes na pronúncia.
 Por fim, a condição de identidade semântica exige (categorização) extensas
demandas de processamento, pois é obrigada a decidir se ambas as letras
pertencem à mesma categoria (vogal ou consoante), sendo necessário recorrer a
códigos semânticos.

O trabalho de Posner revela dois fatos importantes. Por um lado, demonstra a possibilidade
de o experimentador controlar o tipo de codificação realizada pelo sujeito, manipulando as
demandas da tarefa.

Mas também, este trabalho indica a existência de um continuum no Pl, de tal forma que os
primeiros níveis de processamento corresponderiam a uma simples codificação estrutural em que
seriam atendidas as características físicas do material (retas, arestas, interseções, ângulos...); em
um nível intermediário de processamento estaria o material codificado foneticamente e,
finalmente, a níveis profundos de processamento corresponderiam a informações codificadas
semanticamente.

Níveis de processamento e codificação

Os dados experimentais que mostramos ao descrever os experimentos de Craik e Tulving


(1975) apontam —independentemente de entendermos níveis de processamento, domínios de
processamento ou elaboração da informação— na mesma direção que foi obtido por Posner: o
que é analisado ou codificado semanticamente é retido e recuperado muito melhor do que a
análise simples, estrutural ou fonética. Os níveis profundos correspondem a um tipo de codificação
semântica, enquanto os níveis superficiais estão vinculados a analise estrutural ou sensorial

Com base na proposta de Craik e Lockhart e nas dificuldades observadas na hipótese dos
níveis de processamento, as pesquisas subsequentes focaram seu interesse em destacar a
importância de outros fatores que poderiam influenciar a codificação e retenção do material,
como a congruência, a distinção e o esforço atencional.

Congruência: Um fator que pode afetar a retenção e a recordação subsequente é a


congruência, ou grau de correspondência que existe entre duas informações ou declarações.
Supõe-se que tal correspondência facilitará a recordação, embora principalmente em situações de
codificação semântica. Com exceção da condição ortográfica (que requer codificação estrutural),
nas condições de rima (codificação fonética) e categoria (codificação semântica), aparecem
diferenças significativas na recordação de palavras antes de respostas afirmativas e negativas,
sempre a favor da primeira. Tentou-se explicar essa diferença recorrendo à congruência que existe
entre a pergunta e a palavra nas condições de resposta afirmativa e a falta de congruência nas
condições de resposta negativa.

Os efeitos da congruência estão ausentes quando a tarefa requer codificação estrutural,


aparecem um pouco antes da codificação fonética e são mais proeminentes em situações de
codificação semântica. É precisamente nestas últimas situações que a congruência entre os
materiais provoca um único traço mnésico que recolhe toda a informação apresentada,
favorecendo assim a sua memória posterior; Ao contrário do que acontece em situações
incongruentes, em que a questão exige um traço OU traço diferente do da resposta, dificultando
assim a recuperação da informação.

Diferenciação/ Discriminação: Outra manipulação que pode afetar a codificação do


material e posterior memória é a distintividade, propriedade pela qual uma determinada
informação se destacará de outras alternativas. Sendo uma informação que se destaca, a sua
memória será favorecida pelo simples facto da sua codificação ser qualitativamente diferente, ou
apresentar propriedades não partilhadas com o resto dos itens.

Por exemplo, o efeito Von Restorff é uma consequência da distinção: um elemento


discordante em um campo de informação será lembrado muito melhor do que o resto dos
elementos. Por esta razão, a taxa de recordação de um número em uma lista de palavras (casa,
peixe, árvore, 4, lobo...) será maior do que se ele aparecesse em uma lista de números (5, 6, 9, 2,
4, 3...).

Quantos sistemas de memória existem?


Podemos estabelecer, talvez de forma muito tendenciosa, duas visões diferentes dos vários
tipos de sistemas de memória contemplados no MLP. De um lado, o grupo de Schacter e de Tulving
propõem a dissociação entre quatro sistemas de memória de longo prazo: o episódico, semântico,
processual e o sistema de representação percetiva. A estes quatro sistemas devemos acrescentar o
Sistema MO descrito no tópico anterior.

Por outro lado, os grupos de Squire e Baddeley entende que é preferível entender o MLP
como um sistema unitário de memória declarativa, cujo conteúdo são propositadamente e
intencionalmente acessíveis e, pelo contrário, várias formas de memória não declarativa que
apresentam a particularidade de se manifestarem durante a realização de determinadas tarefas e
não ter capacidade para gerar memórias conscientes (inclui os sistemas procedimentais e SRP de
Tulving e Schacter).

Memória declarativa

Esse sistema de memória é aceito por todos os pesquisadores e corresponde, em grau


muito aproximado, ao que as pessoas entendem intuitivamente por memória. Como o próprio
nome sugere, a memória declarativa armazena conteúdos informativos que podem ser declarados,
ou seja, a memória consciente e manifesto de fatos e eventos. A memória declarativa tem sido a
que classicamente tem interessado os pesquisadores. aprendendo e depois retenção de listas de
palavras sem sentido ou sílabas são medidas da memória declarativa.

Squire, Knowlton e Musen (1993), definiram a memoria declarativa, como a memoria que
armazena conteúdos informativos que podem declarar-se- memoria consciente e de factos.

Os teóricos de sistemas acharam adequado distinguir dois tipos de memória declarativa; o


episódico e o semântico.
Memória episódica e memória semântica

A memória episódica é uma memória autonoética e autobiográfica. Ele armazena


informações relacionadas à vida e à experiência do indivíduo.

O termo autonoética refere-se ao autoconhecimento, ou seja, que a pessoa está ciente


tanto de suas experiências pessoais passadas quanto de seu futuro pessoal (Tulving, 2001).

A memoria autobiográfica, diz respeito a informação relacionada com a vida e experiencias


do individuo, podendo ser retrospetiva ou prospetiva.

Memória episódica retrospetiva significa ter consciência de acontecimentos passados,


como saber que o Luís apareceu para uma entrevista de emprego ontem à tarde ou que meu gato
Aloísio arranhou meu cachorro Aristóteles;

A memória episódica prospetiva é ter consciência de acontecimentos que terão lugar no


futuro próximo, por exemplo, saber que amanhã tenho que telefonar para o Juan, que na próxima
semana tenho que dar uma conferência em Sória, ou que o aniversário da minha mãe é na
próxima segunda-feira e devo visitá-la.

Por sua vez, a memória semântica, é o conhecimento geral sobre o mundo, contém
informações que, a priori, são alheias à experiência pessoal do indivíduo e nela são armazenados
conhecimentos sobre a linguagem e conhecimentos gerais sobre o mundo: por exemplo, o
significado das palavras, que dentro do mesmo dia as 23 horas supõem um momento temporal
mais distante que as 11 horas; que para formar o imperfeito do subjuntivo devemos acrescentar
certas desinências diferentes daquelas usado para o presente do indicativo, ou que o litro é uma
medida diferente do galão.

Formas de memória não declarativa

Em numerosas ocasiões, a palavra memória não declarativa é usada como um simples


contraste terminológico com a memória declarativa. A memória não declarativa deve ser
entendida como manifestações de um conjunto heterogêneo de capacidades e conhecimentos que
influenciam o desempenho de uma tarefa ou comportamento, do qual não é necessária a
recuperação intencional; como tal, são formas não conscientes* de memória.
O grupo de Squire, concebe três tipos de conhecimento não declarativo: o
condicionamento, o conhecimento procedimental e o priming.

A esses três vamos acrescentar um quarto tipo que Schacter e Tulving coletam: o sistema
de representação percetual (SRP).

1. Condicionamento

No condicionamento clássico, como originalmente afirmado por Pavlov, um estímulo


originalmente neutro adquire propriedades de eliciar uma resposta condicionada (RC). Parece que
no condicionamento se descobrem certos saberes que não se tem consciência e que afetam o
comportamento em um momento específico.

2. Conhecimento procedimental (habilidades e hábitos)

O conhecimento procedimental foi originalmente contrastado, no campo da IA, com o


conhecimento declarativo. Esta distinção é baseada na oposição saber o que vs. saber fazer, ou
seja, Memória de enunciados vs. Memória de uso, respetivamente.

Diante do conhecimento declarativo consciente, o conhecimento procedimental é um tipo


de conhecimento de habilidades, destrezas e hábitos, difíceis de verbalizar, e que se manifestam
por meio de comportamento ou ação.

Habilidades são procedimentos preceptivos, motores e/ou cognitivos que nos permitem
agir no mundo com habilidade, à semelhança do que acontece com os hábitos, que são
disposições ou tendências específicas que dirigem nosso comportamento em situações concretas.
Habilidades e hábitos são formas de conhecimento não declarativo das quais, na maioria dos
casos, não temos consciência e que governam o comportamento dos organismos.

Manifestações comportamentais como as descritas são suscetíveis de se tornarem


automatizadas devido à prática repetida.

3. Priming

Uma forma final não declarativa de conhecimento é o fenômeno do priming de repetição. A


palavra priming refere-se à influência que uma determinada aprendizagem exerce sobre uma
tarefa percetiva subsequente sem que a pessoa esteja ciente do episódio de aprendizagem
anterior.

Existem duas possibilidades: priming positivo e negativo, no primeiro caso, o aprendizado


prévio facilita o desempenho da tarefa, enquanto no segundo dificulta.

Tradicionalmente, o estudo dos efeitos de priming significa projetar experimentos


preceptivos que consistem em duas fases: uma fase de estudo e uma fase de teste subsequente.
Entre os dois pode ser intercalado um intervalo de tempo variável. Como exemplo: suponha que
na fase de estudo apresentamos aos sujeitos uma lista de oito palavras para que eles as repitam
em voz alta três vezes seguidas (castelo, candeeiro, cabideiro, ...). As palavras deste lista
constituem o que se chama de material estudado, e em nenhum momento oferecem pistas sobre
a possibilidade de que esses estímulos reapareçam ou uma memória subsequente deles será
necessária.

De seguida, procedemos à segunda fase ou fase de testes em que se pretende descobrir os


possíveis efeitos que a aprendizagem prévia tem sobre uma determinada tarefa e na qual não é
feita referência à fase anterior.

As tarefas usadas para avaliar os efeitos do priming têm sido múltiplas. Alguns deles
consistem em completar trigramas, nos quais se apresenta ao sujeito a sílaba inicial de certas
palavras para que as complete com a primeira coisa que lhe vier à cabeça: cas- (castelo, casa,
casual, ...), loc- (loção, locutor, ...). Outro variante pode consistir em palavras completas, nas quais
as sequências são apresentadas frases verbais fragmentadas que podem corresponder a várias
palavras, a fim de ser preenchido: -a-p--a. (lâmpada, tela, ...).

Pois bem, tendo em conta que durante a fase-teste não se faz referência à fase-estudo, diz-
se que há priming quando os sujeitos completam estímulos muito mais frequentes com palavras
estudadas no primeiro fase do que com os novos ou não estudados.

4. Sistema de representação percetiva (SRP)

O SRP constituiria um sistema que se manifestaria em tarefas de identificação preceptivo


como priming. Poderia ser composto de três subsistemas diferentes (Schacter, 1994): um envolvido
no reconhecimento da forma de palavras apresentadas visualmente, outro segundo responsável
pelas descrições estruturais dos objetos (formas, interseções...), e um terceiro envolvido na
representação de palavras apresentadas auditivamente.
Com base nessa taxonomia tripla e nas possíveis evidências que suportam a presença de
outros sistemas de aprendizado implícitos, os subsistemas SRP compartilhariam as seguintes
características:

• Operar em um nível pré-semântico; ou seja, as representações não têm acesso ao nível


do significado das palavras ou objetos.

• Estar envolvido em manifestações mnésicos não conscientes ligados a experiências


anteriores (situações de priming, por exemplo).

• Dependem de regiões cerebrais diferentes daquelas envolvidas na memória explícito.


Trabalhos recentes com técnicas de neuroimagem fornecem evidências importante na ativação de
certas áreas cerebrais corticais, quando tarefas de priming percetual são necessárias nas quais a
recuperação consciente de informações não é necessária (Schacter et al. 2000).

• Desenvolver muito cedo na infância e permanecer até as idades muito longo

• Ser relativamente imune a drogas e álcool.

É possível a existência de sistemas análogos ao SRP envolvidos em outras modalidades


sensoriais, como auditivas ou hápticas, bem como sistemas de reconhecimento mais específicos,
como reconhecimento facial, e até mesmo alguns envolvidos em processos de raciocínio abstrato.

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